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Desnutrição como fator de risco para o desenvolvimento de úlceras por pressão

Resumos

A desnutrição - como aspecto fundamental tanto na gênese como na cicatrização das úlceras por pressão - é objeto deste artigo de atualização. Inúmeros estudos salientam a desnutrição, alterações da função imune, hipoalbuminemia, níveis baixos de hemoglobina bem como a baixa aceitação dietética como responsáveis por aumentar o risco para o desenvolvimento dessas lesões. É, portanto, fundamental incluir a avaliação do estado nutricional - monitorização da ingestão calórico-protéica e das dificuldades para o aproveitamento dos nutrientes nos protocolos de prevenção e tratamento desse tipo de ferida crônica.

Desnutrição; Úlcera de pressão; Fatores de risco; Avaliação nutricional


Malnutrition - as a fundamental aspect both in genesis as in healing of pressure ulcers - is the object of this update paper. Countless studies point out that malnutrition, immune function alterations, hypoalbuminemia, low hemoglobin levels, as well as low diet intake, as responsible for an increase in the risk of developing these lesions. Therefore, it is essential to include the assessment of the nutrition status - monitoring of the calorie-protein intake and the difficulties to use the nutrients - in the prevention and treatment protocols of this type of chronic wound.

Malnutrition; Pressure ulcer; Risk factors; Nutrition assessment


La desnutrición - como aspecto fundamental en la génesis y cicatrización de las úlceras por presión (UP) - es el tema de esta atualización. Muchos estudios destacan la desnutrición, los cambios del funcionamiento imunológico, la hipoalbuminemia, los bajos niveles de hemoglobina así como la baja aceptación alimentaria como los responsables del aumento del riesgo para el desarrollo de las UP. En conclusión, es fundamental incluir la evaluación del estado nutricional en los protocolos de prevención y tratamiento de las UP. Esa evaluación debe incluir medidas objetivas, seguimiento de la ingestión calórica y protéica y además de las dificultades para el aprovechamiento de los nutrientes.

Desnutrición; Úlceras por presión; Factores de riesgo; Evaluación nutricional


ARTIGO ATUALIZAÇÃO

Desnutrição como fator de risco para o desenvolvimento de úlceras por pressão

Desnutrición como factor de riesgo para el desarrollo de las úlceras por presión

Letícia Faria SerpaI; Vera Lúcia Conceição de Gouveia SantosII

IDoutora em Saúde do Adulto pela Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, Enfermeira do Hospital Alemão Oswaldo Cruz São Paulo (SP), Brasil

IIEnfermeira Estomaterapeuta (TiSOBEST), Professora Associada do Departamento de Enfermagem Médico-Cirúrgica da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo - USP São Paulo (SP), Brasil

Autor Correspondente

RESUMO

A desnutrição - como aspecto fundamental tanto na gênese como na cicatrização das úlceras por pressão - é objeto deste artigo de atualização. Inúmeros estudos salientam a desnutrição, alterações da função imune, hipoalbuminemia, níveis baixos de hemoglobina bem como a baixa aceitação dietética como responsáveis por aumentar o risco para o desenvolvimento dessas lesões. É, portanto, fundamental incluir a avaliação do estado nutricional - monitorização da ingestão calórico-protéica e das dificuldades para o aproveitamento dos nutrientes – nos protocolos de prevenção e tratamento desse tipo de ferida crônica.

Descritores: Desnutrição; Úlcera de pressão; Fatores de risco; Avaliação nutricional

RESUMEN

La desnutrición – como aspecto fundamental en la génesis y cicatrización de las úlceras por presión (UP) - es el tema de esta atualización. Muchos estudios destacan la desnutrición, los cambios del funcionamiento imunológico, la hipoalbuminemia, los bajos niveles de hemoglobina así como la baja aceptación alimentaria como los responsables del aumento del riesgo para el desarrollo de las UP. En conclusión, es fundamental incluir la evaluación del estado nutricional en los protocolos de prevención y tratamiento de las UP. Esa evaluación debe incluir medidas objetivas, seguimiento de la ingestión calórica y protéica y además de las dificultades para el aprovechamiento de los nutrientes.

Descriptores: Desnutrición; Úlceras por presión; Factores de riesgo; Evaluación nutricional

INTRODUÇÃO

As úlceras por pressão (UP) ainda constituem importante desafio para os profissionais da saúde. Muito se tem discutido sobre sua causalidade, fisiopatogenia e estratégias de prevenção e tratamento voltadas, principalmente, para as populações de maior risco, como os pacientes com doenças críticas e crônicas, além dos idosos(1). Alguns estudos têm apontado prevalências de até 66% em unidades de terapia intensiva(2-3). Souza(4) mostra uma incidência cumulativa de UP de 39,4%, em idosos institucionalizados.

Várias escalas para avaliar o risco de seu desenvolvimento estão disponíveis, sendo as mais utilizadas as de Braden e de Waterlow, ambas validadas para a população brasileira. A Escala de Braden foi desenvolvida por Bergstrom et al, em 1987, como meio para otimizar estratégias de prevenção e, assim, diminuir a incidência desse tipo de úlcera(5). Essas autoras estabeleceram um esquema conceitual para o estudo da etiologia das UP, envolvendo os dois determinantes críticos: intensidade e duração da pressão e a tolerância da pele e estruturas subjacentes para suportá-la. A nutrição compõe uma das sub escalas da Escala de Braden – relacionada à tolerância tissular – e destina-se à avaliação da ingestão de nutrientes(5). A Escala de Waterlow foi desenvolvida por Waterlow, em 1985, e inclui maior número de variáveis, dentre elas, o estado nutricional traduzido pela avaliação do Índice de Massa Corporal (IMC) e apetite, além de algumas características da pele(6).

Considerando-se a nutrição como fator fundamental na etiopatogenia das UP, esta atualização bibliográfica visou a analisar alguns aspectos nutricionais que interferem no desenvolvimento e cicatrização dessas lesões bem como sugerir algumas atividades, no âmbito da Enfermagem, que possam atenuar essas alterações.

DESNUTRIÇÃO E ÚLCERAS POR PRESSÃO

A desnutrição protéico-calórica grave altera a regeneração tissular, a reação inflamatória e a função imune(7), tornando os indivíduos mais vulneráveis ao desenvolvimento de UP(1,8-9). Em idosos, o baixo nível de albumina sérica pode ser considerado evidência de desnutrição protéica e hipercatabolismo(4, 10).

A seguir, descrevem-se os principais indicadores nutricionais e os estudos que os têm relacionado ao desenvolvimento de UP.

O peso corpóreo – como importante componente de indicadores nutricionais - tem sido apontado como um fator relacionado ao desenvolvimento e gravidade das UP(3,11). O emagrecimento reduz a camada de gordura espessa e, conseqüentemente, reduz a proteção contra a pressão. Fife(3) sugere medidas preventivas agressivas nos pacientes com escore de Braden < 13 e com baixo índice de massa corporal (IMC), na admissão.

A anemia pode contribuir para a formação de UP ao diminuir a quantidade de oxigênio para os fibroblastos e, com isso, reduzir a formação de colágeno e aumentar a susceptibilidade do tecido ao desenvolvimento desse e de outros tipos de lesões(12).

Além disso, o aporte calórico-protéico reduzido pode predizer o desenvolvimento de UP, devendo-se ressaltar algumas causas dessa diminuição como a persistente falta de apetite e as restrições alimentares impostas pelo tratamento(8). Para os idosos, incluem-se a dependência de ajuda para comer, o comprometimento cognitivo e da comunicação, o uso de medicações que interferem no apetite e aumentam a perda de nutrientes e os fatores psicossociais, como isolamento e depressão(8). Pacientes que receberam maior aporte protéico e energético assim como nutrientes específicos tenderam a desenvolver menos UP e a apresentar melhor cicatrização(13-14). Estudos mais recentes ressaltam a importância de alguns nutrientes em cada etapa do processo de cicatrização: inflamatória, proliferativa e de remodelação(14-15). Em uma revisão sistemática e metanálise, constatou-se que a terapia nutricional, particularmente a suplementação nutricional oral com alto teor protéico, pode diminuir significativamente o risco de desenvolvimento das UP(9). Houwing et al(13) verificaram que os pacientes que receberam suplemento dietético enriquecido com proteína, arginina, zinco e antioxidantes apresentaram menor índice de UP em estágio II, comparativamente ao grupo controle. Em outro estudo, a suplementação nutricional oral específica resultou em diminuição significativa na área da ferida e em melhoria das condições das UP em estágios III e IV(16). Em pacientes sob estresse, a retenção de nitrogênio e a oferta de micronutrientes são prioritárias para a cicatrização de UP(15).

Entre as estratégias de prevenção de UP estão a capacidade dos profissionais em reconhecer os pacientes de risco para o desenvolvimento de UP e a avaliação do estado nutricional(17). Devem-se valorizar as necessidades protéico-energéticas, preferências individuais e hidratação. Em vigência de terapia nutricional por via enteral ou parenteral, deve-se estabelecer um protocolo de cuidados com as vias de acesso, a administração dos nutrientes e prevenção de complicações.

Pacientes com restrições de movimento e algum grau de dependência também necessitam de orientação e medidas de suporte da equipe ou familiar, principalmente os idosos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pode-se afirmar que algumas variáveis nutricionais têm sido consideradas preditoras de risco para o desenvolvimento de UP. Dessa maneira, é fundamental que outras estratégias objetivas de avaliação do estado nutricional, que podem ser realizadas pelo enfermeiro, sejam incorporadas às escalas de avaliação de risco.

Recente estudo mostrou que, no aspecto nutricional, a albumina e a avaliação nutricional subjetiva global foram as principais variáveis preditivas de risco para o desenvolvimento de UP(18).

Certamente, é fundamental estabelecer programas de prevenção institucional que subsidiem as intervenções da equipe multidisciplinar de saúde, em busca do controle dos fatores de risco, incluindo-se os parâmetros nutricionais.

REFERÊNCIAS

  • 1. Donini LM, De Felice MR, Tagliaccica A, De Bernardini L, Cannella C. Nutritional status and evolution of pressure sores in geriatric patients. J Nutr Health Aging. 2005; 9(6): 446-54.
  • 2. Rogenski NMB, Santos VLCG. Estudo sobre a prevalência de úlceras por pressão em um hospital universitário. Estima. 2006; 4(2):16-22.
  • 3. Fife C, Otto G, Capsuto EG, Brandt K, Lyssy K, Murphy K, Short C. Incidence of pressure ulcers in a neurologic intensive care unit. Crit Care Med. 2001; 29(2):283- 90.
  • 4. Souza DMST, Santos VLCG. Incidência de úlceras por pressão e fatores de risco em idosos institucionalizados. Estima. 2006; 4(1):45.
  • 5. Bergstrom N, Braden BJ, Laguzza A, Holman V. The Braden Scale for Predicting Pressure Sore Risk. Nurs Res. 1987; 36(4):205-10.
  • 6. Waterlow J. Pressure sores: a risk assessment card. Nurs Times. 1985; 81(48):49-55.
  • 7. Young ME. Malnutrition and wound healing. Heart Lung.1988; 17(1):60-7. Review.
  • 8. Harris CL, Fraser C. Malnutrition in the institutionalized elderly: the effects on wound healing. Ostomy Wound Manage. 2004; 50(10):54-63. Erratum in: Ostomy Wound Manage. 2004; 50(11):10.
  • 9. Stratton RJ. Elucidating effective ways to identify and treat malnutrition. Proc Nutr Soc. 2005; 64(3):305-11.
  • 10. Bours GJ, Halfens RJ, Abu-Saad HH, Grol, RT. Prevalence, prevention, and treatment of pressure ulcers: descriptive study in 89 institutions in the Netherlands. Res Nurs Health. 2002; 25(2):99-110.
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  • 13. Houwing RH, Rozendaal M, Wouters-Wesseling W, Beulens JW, Buskens E, Haalboom JR. A randomised, double-blind assessment of the effect of nutritional supplementation on the prevention of pressure ulcers in hip-fracture patients. Clin Nutr. 2003; 22(4):401-5.
  • 14. Lee SK, Posthauer ME, Dorner B, Redovian V, Maloney MJ. Pressure ulcer healing with a concentrated, fortified, collagen protein hydrolysate supplement: a randomized controlled trial. Adv Skin Wound Care. 2006; 19(2): 92-6.
  • 15. Mechanick JL. Practical aspects of nutritional support for wound-healing patients. Am J Surg. 2004; 188 (1A Suppl):52-6.
  • 16. Frías Soriano L, Lage Vázquez MA, Maristany CP, Xandri Graupera JM, Wouters-Wesseling W, Wagenaar L. The effectiveness of oral nutritional supplementation in the healing of pressure ulcers. J Wound Care. 2004, 13(8):319-22.
  • 17. Thomas DR. Prevention and treatment of pressure ulcers. J Am Med Dir Assoc. 2006; 7(1):46-59.
  • 18. Serpa LF. Capacidade preditiva da subescala Nutrição da Escala de Braden para avaliar o risco de desenvolvimento de úlceras por pressão [tese]. São Paulo: Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo; 2006.
  • Corresponding Author:
    Letícia Faria Serpa
    R. das Uvaias, 179 - Saúde
    São Paulo - SP CEP. 04055-110
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      22 Jul 2008
    • Data do Fascículo
      2008

    Histórico

    • Aceito
      17 Ago 2007
    • Recebido
      20 Dez 2006
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