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Falha na ativação da equipe de emergência intra-hospitalar: causas e consequências

RESUMO

Objetivo:

Determinar a incidência de falha na ativação da via aferente da Equipe de Emergência Médica intra-hospitalar, caraterizando-a e comparando a mortalidade dessa população com a da população em que não se verificou falha na ativação da via aferente.

Métodos:

Entre janeiro de 2013 e julho de 2015, ocorreram 478 ativações da Equipe de Emergência Médica do Hospital Pedro Hispano. Após a exclusão de registos incompletos e ativações para doentes com menos de 6 horas de internamento hospitalar, obtivemos uma amostra de 285 ativações. A amostra foi dividida em dois grupos: o grupo com falha na ativação da via aferente e o grupo em que não ocorreu falha na ativação da via aferente da Equipe de Emergência Médica. As duas populações foram caracterizadas e comparadas. A significância estatística foi considerada para p ≤ 0,05.

Resultado:

Em 22,1% das ativações, verificou-se falha na ativação da via aferente. Relativamente ao estudo causal, verificamos existir diferença estatisticamente significativa quanto aos critérios de ativação da Equipe de Emergência Médica (p = 0,003) no grupo com falha na ativação da via aferente, encontrando taxa mais elevada de ativação da Equipe de Emergência Médica por paragem cardiorrespiratória e disfunção cardiovascular. Em relação às consequências, no grupo em que ocorreu falha na ativação da via aferente houve uma maior taxa de mortalidade imediata e à data de alta hospitalar, sem significado estatístico. Não encontramos diferenças significativas com relação aos outros parâmetros.

Conclusão:

Nos doentes em que houve falha da ativação da via aferente da Equipe de Emergência Médica, a incidência de paragem cardiorrespiratória e a taxa de mortalidade foram maiores. Este estudo reforça a necessidade de as unidades de saúde investirem na formação de todos os profissionais de saúde sobre os critérios de ativação da Equipe de Emergência Médica e o funcionamento do sistema de resposta a emergência médica.

Descritores:
Equipe de respostas rápidas de hospitais; Vias aferentes; Mortalidade hospitalar

ABSTRACT

Objective:

To determine the incidence of afferent limb failure of the in-hospital Medical Emergency Team, characterizing it and comparing the mortality between the population experiencing afferent limb failure and the population not experiencing afferent limb failure.

Methods:

A total of 478 activations of the Medical Emergency Team of Hospital Pedro Hispano occurred from January 2013 to July 2015. A sample of 285 activations was obtained after excluding incomplete records and activations for patients with less than 6 hours of hospitalization. The sample was divided into two groups: the group experiencing afferent limb failure and the group not experiencing afferent limb failure of the Medical Emergency Team. Both populations were characterized and compared. Statistical significance was set at p ≤ 0.05.

Result:

Afferent limb failure was observed in 22.1% of activations. The causal analysis revealed significant differences in Medical Emergency Team activation criteria (p = 0.003) in the group experiencing afferent limb failure, with higher rates of Medical Emergency Team activation for cardiac arrest and cardiovascular dysfunction. Regarding patient outcomes, the group experiencing afferent limb failure had higher immediate mortality rates and higher mortality rates at hospital discharge, with no significant differences. No significant differences were found for the other parameters.

Conclusion:

The incidence of cardiac arrest and the mortality rate were higher in patients experiencing failure of the afferent limb of the Medical Emergency Team. This study highlights the need for health units to invest in the training of all healthcare professionals regarding the Medical Emergency Team activation criteria and emergency medical response system operations.

Keywords:
Hospital rapid response team; Afferent pathways; Hospital mortality

INTRODUÇÃO

A paragem cardiorrespiratória (PCR) em ambiente intra-hospitalar ocorre em até 5:1.000 admissões hospitalares de adultos.(11 Sandroni C, Nolan J, Cavallaro F, Antonelli M. In-hospital cardiac arrest: incidence, prognosis and possible measures to improve survival. Intensive Care Med. 2007;33(2):237-45. Review.) Apesar dos cuidados pós-ressuscitação, a PCR intra-hospitalar (PCRi) está habitualmente associada a um pior prognóstico em comparação com a PCR extra-hospitalar.(22 McCurdy MT, Wood SL. Rapid response systems: identification and management of the "prearrest state". Emerg Med Clin North Am. 2012;30(1):141-52.) Acresce que cerca de 50% destas ocorrências são potencialmente evitáveis,(33 Hodgetts TJ, Kenward G, Vlackonikolis I, Payne S, Castle N, Crouch R, et al. Incidence, location and reasons for avoidable in-hospital cardiac arrest in a district general hospital. Resuscitation. 2002;54(2):115-23.) uma vez que existe, habitualmente, deterioração clínica progressiva.(44 DeVita MA, Smith GB, Adam SK, Adams-Pizarro I, Buist M, Bellomo R, et al. "Identifying the hospitalised patient in crisis"-a consensus conference on the afferent limb of rapid response systems. Resuscitation. 2010;81(4):375-82.,55 Lighthall GK, Markar S, Hsiung R. Abnormal vital signs are associated with an increased risk for critical events in US veteran inpatients. Resuscitation. 2009;80(11):1264-9. Erratum in Resuscitation. 2012;83(7):e153.)

Várias unidades hospitalares desenvolveram sistemas de resposta a emergência médica (SREM) com o objetivo de prevenir a PCR identificando e corrigindo a tempo fatores em doentes com risco de PCRi.(66 Chan PS, Jain R, Nallmothu BK, Berg RA, Sasson C. Rapid response teams: a systematic review and meta-analysis. Arch Intern Med. 2010;170(1):18-26.

7 Priestley G, Watson W, Rashidian A, Mozley C, Russell D, Wilson J, et al. Introducing Critical Care Outreach: a ward-randomised trial of phased introduction in a general hospital. Intensive Care Med. 2004;30(7):1398-404.
-88 Tobin AE, Santamaria JD. Medical emergency teams are associated with reduced mortality across a major metropolitan health network after two years service: a retrospective study using government administrative data. Crit Care. 2012;16(5):R210.) Independentemente do modelo, estes sistemas têm um ramo aferente e um eferente. O ramo aferente consiste na monitorização e vigilância clínica, na detecção da deterioração clínica do doente, no conhecimento dos critérios de ativação da Equipe de Emergência Médica (EEM) e na ativação da mesma. A EEM constitui o ramo eferente. Os profissionais de saúde de cada instituição devem estar sensibilizados e familiarizados com os critérios de ativação da EEM vigentes em seu hospital. Apesar do investimento nesta vertente da formação, a literatura reconhece a existência de níveis de conhecimento deficitários e a persistência de barreiras, que resultam em atrasos na ativação das EEM. Em 30 a 78% dos doentes com critérios de ativação da EEM, esta não é ativada e, mesmo nos casos em que tal acontece, existe um atraso médio de 16 horas.(99 Trinkle RM, Flabouris A. Documenting Rapid Response System afferent limb failure and associated patient outcomes. Resuscitation. 2011;82(7):810-4.

10 Hillman K, Chen J, Cretikos M, Bellomo R, Brown D, Doig G, Finfer S, Flabouris A; MERIT study investigators. Introduction of the medical emergency team (MET) system: a cluster-randomised controlled trial. Lancet. 2005;365(9477):2091-7. Erratum in: Lancet. 2005;366(9492):1164.

11 Calzavacca P, Licari E, Tee A, Egi M, Downey A, Quach J, et al. The impact of Rapid Response System on delayed emergency team activation patient characteristics and outcomes-a follow-up study. Resuscitation. 2010;81(1): 31-5.

12 Downey AW, Quach JL, Haase M, Haase-Fielitz A, Jones D, Bellomo R. Characteristics and outcomes of patients receiving a medical emergency team review for acute change in conscious state or arrhythmias. Crit Care Med. 2008;36(2):477-81.
-1313 Coventry C, Flabouris A, Sundararajan K, Cramey T. Rapid response team calls patients with a pre-existing not for resuscitation order. Resuscitation. 2013;84(8):1035-9.) Esta falha na ativação da via aferente (FAVA) tem um impacto negativo no prognóstico,(1414 Tirkkonen J, Ylä-Mattila J, Olkkola KT, Huhtala H, Tenhunen J, Hoppu S. Factors associated with delayed activation of medical emergency team and excess mortality: an Utstein-style analysis. Resuscitation. 2013;84(2):173-8.) bem como encargos óbvios para o sistema de saúde.

O Hospital Pedro Hispano mantém em funcionamento desde 1998 um SREM. Até 2002, os critérios de ativação eram exclusivamente a PCR ou paragem respiratória. A partir de 2002, os critérios foram alargados e as equipes acorrem a ativações motivadas por critérios predefinidos,(1515 Granja C, Mendes A, Carvalho F, Dias C. Paragem cardíaca intra-hospitalar: factores associados à decisão de não reanimar. O impacto da emergência intra-hospitalar organizada. Rev Port Cardiol. 2009;28(2):131-41.) fazendo deslocar ao local uma equipe com experiência em emergência e na gestão do doente grave. Tendo como base os registos das ativações da EEM do Hospital Pedro Hispano, objetivamos determinar a incidência de falha na ativação da via aferente da Equipe de Emergência Médica intra-hospitalar, caraterizando-a e comparando a mortalidade dessa população com a população em que não se verificou FAVA.

MÉTODOS

O estudo decorreu no Hospital Pedro Hispano, da Unidade Local de Matosinhos (ULSM), E.P.E, que serve o conselho de Matosinhos e seus 175.478 habitantes. Este hospital tinha 345 leitos distribuídos por diferentes especialidades médicas (medicina interna, cardiologia, cirurgia geral, oftalmologia, otorrinolaringologia, ginecologia, obstetrícia, pediatria, urologia, ortopedia, serviço de medicina intensiva - SMI e unidade de cuidados intermédios polivalente - UCIP).(1616 Serviço Nacional de Saúde. Unidade Local de Saúde de Matosinhos. Relatório e Contas 2014. 2014. Disponível em http://www.ulsm.min-saude.pt/ebook.aspx?menuid=12
http://www.ulsm.min-saude.pt/ebook.aspx?...
) Recebia doentes referenciados do Centro Hospitalar da Póvoa de Varzim/Vila do Conde, que tinha capacidade de 145 leitos e servia uma população de 143 mil habitantes.(1717 Centro Hospitalar Povoa do Varzim/Vila do Conde. Relatorio de Gestão e Contas 2014. Disponível em http://www.chpvvc.pt/imagens/geral/mhospital/rel_contas/Relatorio__Contas_2014.pdf
http://www.chpvvc.pt/imagens/geral/mhosp...
)

Os dados foram extraídos dos formulários de emergência interna, que ficava disponível no processo clínico eletrônico e era preenchido pelo médico da EEM, no final de cada ativação. Com recurso aos registros de parâmetros vitais, registrados pelos enfermeiros, no Sistema SClínico® (Ministério da Saúde do Governo de Portugal, Lisboa, Portugal), foram completados alguns dos formulários que se apresentavam incompletos e em que era possível obter os dados em falta.

Foram consideradas todas as ativações da EEM entre janeiro de 2013 e julho de 2015, em um total de 478. Foram excluídas as ativações para doentes não internados (n = 29), doentes internados há menos de 6 horas (n = 48) e ativações cujos formulários estavam incompletos (n = 116). A amostra foi formada por 285 ativações.

O SREM tem sediado no SMI sua via eferente, que, uma vez ativada, faz deslocar uma equipe qualificada na abordagem e na gestão do doente grave. A via aferente baseia-se nos profissionais de saúde que exercem atividade nas enfermarias e que são alvo de formação em Suporte Básico de Vida (SBV) e no reconhecimento de critérios de ativação da EEM. Ainda enquadrado neste modelo, inclui-se um programa de formação, com recertificação regular, em SBV, Suporte Imediato de Vida (SIV) e Suporte Avançado de Vida (SAV), para populações-alvo selecionadas, em função de responsabilidades assistenciais dos profissionais. O programa de formação é concretizado por meio da escola de Emergência da ULSM, creditada pelo Conselho Português de Ressuscitação. O SREM inclui carros de emergência com conteúdo normalizado e distribuídos em locais selecionados do hospital e que apoiam a resposta a situações emergentes. Existe um meio de comunicação preferencial por meio de um número de telefone interno dedicado. Um programa de auditorias à qualidade da manutenção do sistema faz parte integrante do SREM, existindo responsáveis designados para a gestão de todo o sistema.

A EEM é constituída por um médico e um enfermeiro com formação em SAV e experiência em reanimação, que trabalham predominantemente no SMI. A EEM está disponível 24 horas por dia e é ativada na presença de critérios específicos por meio do número dedicado (2211), localizado no SMI.

Considerou-se FAVA a existência de um atraso na ativação da EEM superior a 15 minutos, na presença de critérios de ativação. Este tempo foi medido usando a hora da ativação da EEM e a hora da medição de sinais vitais ou registo clínico que configurasse critério de ativação. A amostra foi dividida em dois grupos: o grupo com FAVA da EEM e o grupo sem falha na FAVA da EEM. Os critérios de ativação estão apresentado no quadro 1.

Quadro 1
Critérios de ativação da Equipe de Emergência Médica

Análise estatística

A análise estatística foi realizada com recurso ao programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 17.0 (SPSS Inc., Chicago, Ilinóis, Estados Unidos). A descrição estatística foi realizada utilizando as contagens e porcentagens para variáveis categóricas, e mediana, valor máximo e mínimo para variáveis contínuas. A comparação entre amostras foi efetuada por meio do teste qui quadrado. Consideramos um resultado com significado estatístico quando p < 0,05.

RESULTADOS

Entre janeiro de 2013 e julho de 2015, ocorreram 478 ativações da EEM do Hospital Pedro Hispano. A amostra final encontra-se caracterizada na tabela 1.

Tabela 1
Caraterização da população em estudo

De um total de 285 ativações, 58,6% eram doentes do sexo feminino. As idades variaram ente 11 e 94 anos, com mediana de 75 anos. A maioria das ativações ocorreu para doentes com idade superior a 75 anos (55,1%). Relativamente ao local de ativação da EEM, a maioria (52,3%) verificou-se para doentes internados em enfermarias cirúrgicas (cirurgia geral, otorrinolaringologia, oftalmologia, ginecologia, ortopedia e urologia), em comparação com 43,5% dos casos para enfermarias médicas (medicina interna e pediatria). Em 4,2% dos casos, os doentes estavam no serviço de imagiologia. Das 285 ativações, 10,9% foram para doentes que tinham realizado procedimentos invasivos nas 24 horas anteriores (0,7% cateterismo cardíaco e 10,2% procedimentos cirúrgicos); em 5,6% dos casos os doentes estiveram, nas 24 horas prévias, no SMI, UCIP ou na sala de emergência.

O critério de ativação da EEM mais frequente foi a alteração da consciência (43,2%), seguido de PCR (33,0%) e permeabilidade ameaçada da via aérea (19,2%). Em 10,9% dos casos existia indicação prévia para limitação terapêutica e em 4,2% estava assumida a decisão de não reanimação (DNR). No final da intervenção da EEM, foram verificados 28,4% de óbitos; em 5,6% dos casos assumiu-se DNR e, em 8,8%, houve indicação para limitação terapêutica. A mortalidade hospitalar global foi de 51,2%. Para nove doentes (3,15%) ocorreram múltiplas ativações da EEM em um mesmo episódio de internação hospitalar.

Verificou-se FAVA em 22,1% das ativações. A tabela 2 apresenta a comparação entre os grupos em estudo. Verificamos existir diferença estatisticamente significativa quanto aos critérios de ativação da EEM. O grupo com FAVA apresentou taxa mais elevada de ativação da EEM por PCR e frequência cardíaca (FC) < 40 ou > 140bpm e ou pressão arterial sistólica (PAS) < 90mmHg. Verificou-se também que, no grupo em que ocorreu FAVA, existe uma maior taxa de mortalidade imediata e à data de alta hospitalar, mas sem atingir significado estatístico. Não encontramos diferenças significativas com relação aos outros parâmetros.

Tabela 2
Comparação dos dois grupos em estudo

DISCUSSÃO

Este estudo retrospectivo transversal avaliou os dados relativos aos doentes assistidos pela EEM. Uma em cada cinco ativações foram suscitadas por situações cuja avaliação posterior identificou a existência de critérios de ativação da EEM nas 6 horas prévias, havendo, portanto, falha da ativação da EEM. Daqui resultou um maior número de ativações por PCR e maior mortalidade.

Este problema está já identificado na literatura no estudo de Trinkle et al.,(99 Trinkle RM, Flabouris A. Documenting Rapid Response System afferent limb failure and associated patient outcomes. Resuscitation. 2011;82(7):810-4.) que verificaram a FAVA, definida como presença de critérios de ativação da EEM, entre 15 minutos a 24 horas prévias à ativação, PCR ou admissão na UCI. Dos 575 eventos registados, a prevalência de FAVA foi de 22,8%. O número de FAVA encontrado no nosso estudo foi semelhante (22,1%), sendo que esta elevada incidência justifica uma reflexão no sentido de identificar causas passíveis de serem corrigidas e iniciar uma intervenção corretiva urgente.

No nosso estudo, observamos que, em doentes em quem ocorre FAVA da EEM, verifica-se uma maior porcentagem de casos de PCR, disfunção cardiovascular, maior taxa de mortalidade imediata e mortalidade à data de alta hospitalar, quando comparados com os doentes em quem não se verificou FAVA, não obstante não terem atingido significância estatística. Os resultados obtidos estão de acordo com a literatura. Estudo prospectivo observacional de Tirkkonen et al.(1414 Tirkkonen J, Ylä-Mattila J, Olkkola KT, Huhtala H, Tenhunen J, Hoppu S. Factors associated with delayed activation of medical emergency team and excess mortality: an Utstein-style analysis. Resuscitation. 2013;84(2):173-8.) descreve que a FAVA está associada de forma independente a um aumento da mortalidade hospitalar.

Neste ponto, temos que considerar vários fatores, como a maturação da EEM e a formação dos profissionais de saúde que trabalham em enfermarias e nas unidades hospitalares com diferentes níveis de monitorização do doente, como é o caso dos serviços de medicina intensiva, as unidades de cuidados intermédios e o bloco operatório. É também importante refletir sobre as situações em que se verificam indicação para DNR e limitação terapêutica, mas que não estejam assumidas de forma explícita e que podem condicionar ativações inadequadas da EEM. Outro fator que pode ter contribuído para esta grande taxa de FAVA é a sensibilidade dos critérios de ativação utilizados.

Em relação às características da EEM em questão, vemos que são semelhantes às características descritas para outras EEM. Calzavacca et al.(1111 Calzavacca P, Licari E, Tee A, Egi M, Downey A, Quach J, et al. The impact of Rapid Response System on delayed emergency team activation patient characteristics and outcomes-a follow-up study. Resuscitation. 2010;81(1): 31-5.) descrevem que, no Hospital de Melbourne, na Austrália, a EEM também é constituída por um médico e um enfermeiro com formação específica em SAV e reanimação. Funciona 24 horas por dia e, no final de cada ativação, tal como no nosso SREM, realizam-se registos eletrônicos de todas as ativações. A EEM pode ser ativada por qualquer pessoa na presença de critérios. Calzavacca et al. compararam dois grupos de doentes com características semelhantes: um para o qual a EEM foi ativada no início da sua implementação e outro grupo para o qual a EEM ativada já existia há 5 anos, concluindo que, no grupo com a equipe dos 5 anos, verificou-se menor FAVA, justificando que a maturidade da equipe leva à redução de falhas na ativação.(1111 Calzavacca P, Licari E, Tee A, Egi M, Downey A, Quach J, et al. The impact of Rapid Response System on delayed emergency team activation patient characteristics and outcomes-a follow-up study. Resuscitation. 2010;81(1): 31-5.)

A EEM analisada neste estudo existe no hospital desde 1998. Entre 1998 e 2002, os critérios de ativação eram exclusivamente a PCR ou paragem respiratória; desde 2002 os critérios foram alargados. Estudo realizado no nosso hospital incluiu todas as ativações da EEM, para doentes internados entre 2002 e 2006, tendo-se verificado uma diminuição da PCR em correlação com o aumento da maturidade da EEM, juntamente de um programa de formação integrado dos profissionais de saúde.(1818 Campello G, Granja C, Carvalho F, Dias C, Azevedo LF, Costa-Pereira A. Immediate and long-term impact of medical emergency teams on cardiac arrest prevalence and mortality: a plea for periodic basic life-support training programs. Crit Care Med. 2009;37(12):3054-61.) Assim, no presente momento, parece-nos possível assumir a equipe e todo o sistema como maduros e que não haveria, neste caso, relação com as falhas de ativação.

Nos hospitais, ocorre constantemente a integração de novos profissionais, nomeadamente nas equipes de enfermagem. Estes novos elementos podem não estar adequadamente esclarecidos e familiarizados com os critérios e o método de ativação da EEM, ou ainda podem ter medo de efetuar uma ativação desnecessária, condicionando um aumento na FAVA da EEM. Vários estudos sugerem que o aumento e melhoria da formação, a familiarização, o treino contínuo dos profissionais de saúde e a existência de auditorias e feedback das EEM são essenciais para o sucesso da EEM e a redução da FAVA.(1414 Tirkkonen J, Ylä-Mattila J, Olkkola KT, Huhtala H, Tenhunen J, Hoppu S. Factors associated with delayed activation of medical emergency team and excess mortality: an Utstein-style analysis. Resuscitation. 2013;84(2):173-8.,1919 Cretikos MA, Chen J, Hillman KM, Bellomo R, Finfer SR, Flabouris A; MERIT Study Investigators. The effectiveness of implementation of the medical emergency team (MET) system and factors associated with use during the MERIT study. Crit Care Resusc. 2007;9(2):205-12.,2020 Azzopardi P, Kinney S, Moulden A, Tibbals J. Attitudes and barriers to a Medical Emergency Team system at a tertiary paediatric hospital. Resuscitation. 2011;82(2):167-74.) Salienta-se a necessidade de reforçar, por meio da implementação de ações de formação e da apresentação dos dados que este estudo revelou, a interiorização dos critérios de ativação da EEM por parte de quem avalia e regista os parâmetros de monitorização dos doentes. No caso específico do nosso sistema de emergência intra-hospitalar, tem havido uma redução na formação em SBV, na dependência de constrangimentos orçamentais, que podem não ser alheios a este aumento da falha de ativação das equipes de SAV.

Outro fator que pode ter contribuído para os valores de FAVA obtidos é que, em 5,6% das ativações da EEM, os doentes apresentavam-se com um internamento prévio, para o mesmo internamento, em unidades hospitalares diferenciadas, como bloco operatório, SMI, UCIP e sala de emergência. Não se pode excluir que tenham ocorrido altas precoces daquelas unidades hospitalares, considerando pertinente um maior investimento no sentido de aumentar a sensibilidade e o conhecimento dos profissionais de saúde, sobre procedimentos e patologias que necessitem de um internamento mais prolongado em unidades diferenciadas, com maior nível de vigilância e monitorização clínica.

O nível de monitorização dos doentes depende do serviço hospitalar em que se encontram internados. No nosso estudo, a maioria das ativações ocorreram para enfermarias, onde a monitorização se faz com avaliação padronizada de sinais vitais cada 6 horas e está de acordo com as recomendações da Conferência de Consenso da Rapid Response Team, que defende que os sinais vitais devem ser avaliados cada 6 a 12 horas.(2121 DeVita MA, Bellomo R, Hillman K, Kellum J, Rotondi A, Teres D, et al. Findings of the first consensus conference on medical emergency teams. Crit Care Med. 2006;34(9):2463-78. Erratum in: Crit Care Med. 2006;34(12):3070. Harvey, Maurene [added].) No entanto, a monitorização contínua está associada a um melhor resultado em pacientes com PCRi prévia,(22 McCurdy MT, Wood SL. Rapid response systems: identification and management of the "prearrest state". Emerg Med Clin North Am. 2012;30(1):141-52.,2222 Herlitz J, Bang A, Aune S, Ekström L, Lundström G, Holmberg S. Characteristics and outcome among patients suffering in-hospital cardiac arrest in monitored and non-monitored areas. Resuscitation. 2001;48(2):125-35.) sabendo que o controlo menos frequente pode atrasar a detecção de instabilidade e contribuir para aumento da FAVA da EEM. Outros estudos não apoiam esta premissa, um desses estudos refere que em 40,6% das anomalias encontradas na monitorização contínua se devia a artefactos.(2323 Hravnak M, Edwards L, Clontz A, Valenta C, Devita MA, Pinsky MR. Defining the incidence of cardiorespiratory instability in patients in step-down units using an electronic integrated monitoring system. Arch Intern Med. 2008;168(12):1300-8.)

Outro fator que pode ter contribuído para um viés na taxa de FAVA da EEM encontrada no nosso estudo é a existência de ativações para doentes com indicação prévia para DNR (4,2%) e limitação terapêutica (10,9%). Nestes casos, ocorre mais frequentemente tolerância, diante de valores anormais de sinais vitais e adiamento na ativação da EEM. A porcentagem de casos encontrados no nosso estudo é semelhante à de casos descritos pelo estudo multicêntrico MERIT (7,85%).(2424 Chen J, Flabouris A, Bellomo R, Hillman K, Finfer S; MERIT Study Investigators for the Simpson Centre and the ANZICS Clinical Trials Group. The Medical Emergency Team System and not-for-resuscitation orders: results from the MERIT study. Resuscitation. 2008;79(3):391-7.)

Além dos casos em que há DNR previamente documentada, deve-se ter em conta que podem existir casos de DNR estabelecidas, mas não documentadas ou transmitidas à equipe de enfermagem da enfermaria nem à EEM. Mitchell et al.(2525 Mitchell IA, McKay H, Van Leuvan C, Berry R, McCutcheon C, Avard B, et al. A prospective controlled trial of the effect of a multi-faceted intervention on early recognition and intervention in deteriorating hospital patients. Resuscitation. 2010;81(6):658-66.) descrevem que em 6,2% dos casos existiam DNR, mas não estavam documentadas ou não foram transmitidas à EEM. O processo de DNR/limitação terapêutica requer tempo de comunicação com o doente, familiares e entre os clínicos envolvidos no tratamento do doente. A ativação da EEM pode ser uma oportunidade valiosa para iniciar este processo.(2525 Mitchell IA, McKay H, Van Leuvan C, Berry R, McCutcheon C, Avard B, et al. A prospective controlled trial of the effect of a multi-faceted intervention on early recognition and intervention in deteriorating hospital patients. Resuscitation. 2010;81(6):658-66.) No caso do nosso estudo, no final da atuação da EEM, relativamente aos doentes que apresentaram FAVA da EEM, verificaram-se taxa mais elevada de DNR (6,35%) e indicação para limitação terapêutica (14,3%) em comparação com o grupo onde não ocorreu FAVA.

É importante desenvolver estratégias que tornem a DNR mais efetiva, bem como a sua documentação e a transmissão da decisão aos restantes elementos da equipe.

Outro fator que pode ter contribuído para esta alta taxa de FAVA da EEM é a utilização pelo nosso sistema de critérios de ativação relativamente pouco sensíveis. Há, na literatura, sistemas de emergência intra-hospitalar que utilizam critérios mais sensíveis, como o National Early Warning System (NEWS) e o Modified Early Warning System (MEWS), que fazem um sistema de pontuação e alerta a partir de um conjunto de critérios que incluem, nomeadamente, a temperatura e a saturação de oxigênio, além do débito urinário.(2626 van Galen LS, Dijkstra CC, Ludikhuize J, Kramer MH, Nanayakkara PW. A Protocolised Once a Day Modified Early Warning Score (MEWS) Measurement Is an Appropriate Screening Tool for Major Adverse Events in a General Hospital Population. PLoS One. 2016;11(8):e0160811.,2727 Royal College of Physicians. National Early Warning Score (NEWS): Standardising the assessment of acute-illness severity in the NHS. Report of a working party. London: RCP; 2012.)

Limitações do estudo

Este estudo foi realizado em apenas um centro, e os resultados podem não se aplicarem a outros contextos. Além disso, a análise dos critérios de ativação presente 6 horas antes da efetiva ativação da equipe apresentava alguns registros incompletos, de modo que esses doentes não fizeram parte da análise, o que pode ter levado a um viés na amostra.

CONCLUSÃO

O reconhecimento a tempo dos doentes que se apresentam com deterioração clínica nem sempre é uma realidade nas unidades hospitalares. Nos doentes em que este reconhecimento falha, verificam-se uma maior incidência de paragem cardiorrespiratória e maior taxa de mortalidade.

Este estudo demonstrou a necessidade das unidades hospitalares investirem na formação e na familiarização de todos os profissionais de saúde em relação aos critérios de ativação da Equipe de Emergência Médica e ao funcionamento do sistema de emergência interno intra-hospitalar.

  • Editor responsável: Glauco Adrieno Westphal

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2016

Histórico

  • Recebido
    24 Jul 2016
  • Aceito
    09 Out 2016
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