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O modelo keynesiano de James Meade

Resumos

Este artigo reavalia o "modelo simplificado" da Teoria Geral de Keynes elaborado por James Meade e procura complementar alguns dos argumentos teóricos que Meade deixou apenas indicados. O artigo também responde às solicitações de Frisch a Meade, quanto à explicação do significado de estabilidade e à explicitação dos pressupostos que garantem suas conclusões. Além disso, apresenta alguns dos cálculos não desenvolvidos por Meade, e, quando necessário, suas devidas correções.

Teoria Keynesiana; Investimento e Poupança; Equilíbrio; Estabilidade; Expectativas


The paper reassesses the "simplified model" of Keynes's General Theory developed by James Meade and attempts to complement some of the theoretical arguments that Meade only left indicated. It also answers Frisch's questions to Meade with regard to explanation of the mean of stability and elaboration of the assumptions that support his conclusions. The paper also presents some of the calculations undeveloped by Meade and, when necessary, their corrections.

Keynesian theory; Investment and Saving; Equilibrium; Stability; Expectations


ESTANTE DE HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO E ECONOMIA POLÍTICA

O modelo keynesiano de James Meade

Claudia HellerI; Roselaine Bonfim de AlmeidaII

IDepartamento de Economia, Faculdade de Ciências e Letras – UNESP

IIDoutoranda em Economia Aplicada – PPGEA/ESALQ/USP

RESUMO

Este artigo reavalia o "modelo simplificado" da Teoria Geral de Keynes elaborado por James Meade e procura complementar alguns dos argumentos teóricos que Meade deixou apenas indicados. O artigo também responde às solicitações de Frisch a Meade, quanto à explicação do significado de estabilidade e à explicitação dos pressupostos que garantem suas conclusões. Além disso, apresenta alguns dos cálculos não desenvolvidos por Meade, e, quando necessário, suas devidas correções.

Palavras-chave: Teoria Keynesiana; Investimento e Poupança; Equilíbrio; Estabilidade; Expectativas

Classificação JEL B22, B31, E12

ABSTRACT

The paper reassesses the "simplified model" of Keynes's General Theory developed by James Meade and attempts to complement some of the theoretical arguments that Meade only left indicated. It also answers Frisch's questions to Meade with regard to explanation of the mean of stability and elaboration of the assumptions that support his conclusions. The paper also presents some of the calculations undeveloped by Meade and, when necessary, their corrections.

Key-words: Keynesian theory; Investment and Saving; Equilibrium; Stability; Expectations

JEL Classification B22, B31, E12

1_Introdução

Uma das primeiras tentativas de simplificar a Teoria Geral do Emprego, dos Juros e da Moeda de John Maynard Keynes através de um conjunto de equações matemáticas foi a de James Edward Meade, que apresentou sua interpretação no Simpósio "Mr. Keynes' System", durante a Sexta Conferência Europeia da Sociedade de Econometria, realizada em Oxford, de 25 a 29 de setembro de 1936. Também compareceram a este evento Roy Harrod e John Hicks, cujas contribuições ("Mr. Keynes and traditional theory" e "Mr. Keynes and the 'Classics': a suggested interpretation") foram publicadas na revista Econometrica em janeiro e abril de 1937, respectivamente.

Há indícios de que a versão apresentada por Meade no mencionado Simpósio não é a mesma que foi publicada na Review of Economic Studies, em fevereiro de 1937. O primeiro é uma carta de Ragnar Frisch, editor de Econometrica, enviada a Meade em 08 de outubro de 1936 (reproduzida em YOUNG, 1987, p. 36). O outro é uma carta de Ursula Hicks, editora da Review of Economic Studies, enviada a Meade em 30 de novembro de 1936 (também reproduzida em YOUNG, 1987, p. 37). Frisch solicitava uma revisão que incorporasse o "significado exato de estabilidade" e a descrição "dos pressupostos que garantem suas [de Meade] conclusões". Ursula Hicks solicitava a inclusão de notas de rodapé e um apêndice matemático, para que "o problema, o argumento e as conclusões ficassem cristalinamente claros". Aparentemente Meade discordou das modificações sugeridas por Frisch e, em consequência, embora Econometrica tenha publicado a íntegra dos trabalhos de Hicks e de Harrod, só publicou um resumo do de Meade, incorporado ao texto do relatório da Conferência redigido por Phelps-Brown. As sugestões de Ursula Hicks devem ter sido consideradas como suficientemente contempladas, já que o artigo "A simplified model of Mr. Keynes's system" foi publicado na Review of Economic Studies (com notas de rodapé e um apêndice matemático).1 1 Um aspecto frequentemente mencionado na literatura sobre o tema refere-se à circulação prévia dos textos apresentados no Simpósio. O único que não circulou antes do evento foi o de Hicks (YOUNG, 1987, p. 31-32), mas não há certeza se Meade chegou a ter acesso ao de Harrod. Fazendo referência à troca de correspondência entre Hicks, Harrod e Meade registrada em Young (1987), Heller (2007) conjectura que o mais provável é que Meade tenha escrito o seu de forma independente, isto é, sem ter lido o de Hicks nem o de Harrod. Por outro lado, Heller (2007) reconhece que é possível que Meade tenha tido a oportunidade de ler outros trabalhos que procuravam representar a Teoria Geral através de formalizações algébricas, como é o caso dos artigos de David Champernowne ("Unemployment, basic and monetary: the Classical analysis and the Keynesian") e de Brian Reddaway ("The General Theory of Employment, Interest and Money"), publicados em junho de 1936, antes da Conferência de Oxford. O fato é que as informações disponíveis sobre a circulação prévia do texto de Meade são precárias. O único registro é um cartão postal enviado por Keynes a Meade, datado de 14 de setembro de 1936 (YOUNG, 1987, p. 34 e 189), indicando que Keynes conhecia o trabalho antes da apresentação em Oxford.

Uma leitura cuidadosa do artigo de Meade revela que há um conceito de estabilidade, assim como supostos que sustentam suas conclusões, embora não estejam tão explícitos como foi solicitado por Frisch; revela, também, que nem sempre os argumentos teóricos que ligam os supostos às conclusões estão completos. O presente texto procura corrigir essas falhas. Além disso, embora a versão publicada inclua um apêndice matemático, várias expressões algébricas utilizadas por Meade ao longo do seu artigo não estão suficientemente desenvolvidas nesse apêndice. O presente texto procura também preencher as principais lacunas matemáticas deixadas por Meade, explicitando as simplificações necessárias para alcançar os resultados do autor, e/ou fazendo as devidas correções. É bom ressaltar que o texto não tem a pretensão de comparar a interpretação de Meade com a dos seus contemporâneos nem de apresentar uma nova visão da história da síntese neoclássica, mas apenas contribuir com uma análise acurada de um dos textos que compõem a etapa inicial dessa história que, curiosamente, embora tenha sido negligenciada por meio século, vem sendo recentemente revista por vários autores.

De modo genérico, os intérpretes de Meade procuram reformular seu sistema de equações e traduzi-lo em diagramas (supostamente compatíveis com o modelo IS-LM). Uma das abordagens é a que foi iniciada com o artigo de Darity e Cottrell (1987), dando origem ao diagrama AA — MEK, posteriormente ampliada por Alanez (2001).2 2 O termo "MEK" representa o setor produtor de bens de capital e o termo "AA" representa o mercado de ativos. Outra abordagem é o diagrama PI — PS, proposto por Rappoport (1992) e desenvolvido por Assous (2004).3 3 p I e p S representam o preço de demanda e o preço de oferta de bens de capital, respectivamente. Os dois tipos de diagramas são inspirados na crítica, inicialmente elaborada por Darity e Cottrell (1987), de que no sistema de Meade os detentores de riqueza não têm alternativas – exceto o investimento produtivo – caso queiram abrir mão da liquidez. Por isso, os autores sugerem distinguir o conceito de taxa de juros do de eficiência marginal do capital através da introdução explícita de algum tipo de ativo que não é nem moeda nem estoque de capital produtivo. Em outras palavras, introduzem um mercado financeiro que, no sistema original de Meade, estava apenas implícito.

Todos os intérpretes mencionados acima consideram que o modelo proposto por Meade é superior aos seus congêneres – as referências são Hicks (1937) e Harrod (1937) – principalmente por incluir uma variável que representa o estado de expectativas. Essa é uma das características que Darity e Cottrell (1987) ressaltam ao considerarem que o esquema de Meade tem essência keynesiana e é o que justifica a análise proposta por Alanez (2001), que distingue expectativas exógenas de expectativas estáticas no arcabouço de Meade, para avaliar se os resultados são semelhantes aos da abordagem de Hicks (1937) ou aos propostos por Keynes (1936). Rappoport (1992) também enfatiza o papel das expectativas como o elemento central do modelo de Meade, em contraponto ao modelo IS-LM convencional, e Assous (2004) destaca o papel das expectativas na discussão sobre os efeitos da redução de salários sobre o nível de emprego como critério de distinção entre modelos de caráter clássico ou keynesiano.

O estudo desses intérpretes recentes foi feito por Almeida (2008), que observa que, a despeito da variedade de recursos algébricos utilizados por esses autores, suas conclusões não divergem essencialmente dos resultados que Meade alcançou em seu texto original. Por essa razão o presente texto limita-se à análise do "modelo simplificado" de Meade, e procura fazer algumas das devidas complementações aos argumentos que ele deixou inacabados.

O texto está dividido em duas partes, além desta Introdução e da Conclusão. Na primeira explicitam-se o conceito de equilíbrio e as condições de sua estabilidade, conforme solicitado por Frisch. Na segunda discutem-se os efeitos de mudanças exógenas na taxa de juros, na oferta de moeda, nos salários e na propensão a poupar sobre o nível de emprego, o que permite atender à segunda solicitação de Frisch, de explicar os pressupostos que garantem as conclusões de Meade. O desenvolvimento de algumas das expressões algébricas de Meade (e as eventuais correções) encontra-se nos Anexos.

2_ O conceito de estabilidade

2.1_ As condições de equilíbrio

Meade tem por objetivo construir um modelo simples da Teoria Geral do Emprego, dos Juros e da Moeda de Keynes com a finalidade de ilustrar três aspectos:

;i. ;as condições necessárias para o equilíbrio;

;ii. ;as condições necessárias para a estabilidade do equilíbrio; e

;iii. ;o efeito, sobre o emprego, das mudanças em certas variáveis. (MEADE, 1937, p. 98)

O modelo está baseado em suposições simplificadoras que descrevem uma economia fechada em concorrência perfeita com dois setores, um que produz bens de capital e outro que produz bens de consumo, ambos com a mesma elasticidade de oferta de curto prazo. Em cada setor existem apenas dois fatores de produção, trabalho e capital. O fator trabalho representa o único custo direto e o fator capital dura eternamente, pois não se desgasta nem se deprecia. O dispêndio monetário total em bens de consumo e de investimento constitui a renda nacional que se reparte na forma de salários e lucros.

Embora seja um modelo de curto prazo, definido como "o período no qual a razão entre a produção de novos bens de capital e o estoque existente de bens de capital é pequena, de modo que as alterações no estoque de bens de capital podem ser negligenciadas" (MEADE, 1937, p. 98), o modelo permite ajustes no volume de produção, na taxa de investimento e/ou no montante gasto e poupado de cada indivíduo. O ajuste no volume de produção permite que o custo marginal de cada bem se iguale ao seu preço e o ajuste da taxa de investimento permite que a taxa de juros se iguale à eficiência marginal do capital. Alterações no dispêndio ou no montante poupado, por sua vez, podem ser decorrentes de mudanças no nível de renda e/ou da propensão a poupar.

Essas suposições formam a base do conjunto de equações que descrevem o modelo:4 4 Essas equações constam do apêndice matemático fornecido por Meade (1937, p. 105), mas a notação utilizada neste texto é um pouco diferente da notação do autor. No lugar dos subscritos "x" e "y" usamos os subscritos "I" e "C" para designar os setores produtores de bens de capital e de bens de consumo, respectivamente. O símbolo "I" foi trocado por "Y" para designar a renda ou produto. O lucro corrente é representado por "P", o lucro esperado por "P *", o nível de preços por "p" ("p I" e "p C" em cada setor), a quantidade produzida por "q" ("q I" e "q C" em cada setor), o estoque de capital por "K" e a parcela da renda que os agentes demandam na forma líquida por "k". "M" representa a quantidade de moeda, "N" o nível de emprego, "w" o salário per capita e "r" a taxa de juros. "S" é o montante de poupança e "s" a propensão a poupar.

As duas primeiras equações descrevem a condição de equilíbrio, no mercado de trabalho, do setor produtor de bens de capital e do setor produtor de bens de consumo, respectivamente, em que o salário real iguala o produto marginal5 5 Equivalente, na forma genérica (ou agregada), a . . Embora Meade não explicite funções de produção, elas estão implícitas nessas duas equações, dando origem à medida da elasticidade de oferta (supostamente igual nos dois setores), que é dada por

A terceira equação descreve a igualdade entre o produto total e a renda e a quarta descreve a decomposição da renda em lucros e salários. Esta dá origem à definição da participação dos lucros na renda, dada por

6 6 Onde com 0 < l < 1.

A quinta equação descreve a distribuição do volume total de emprego entre os dois setores e a sexta equação descreve a condição de equilíbrio em que o investimento (I = p1q1) iguala a poupança (S = sY).

A sétima equação descreve a igualdade entre a taxa de juros e a eficiência marginal do capital. Meade não explicita os determinantes da taxa de juros, mas implicitamente considera que ela ajusta a oferta de moeda à demanda por moeda, ou seja, é determinada no mercado monetário e não pela igualdade entre investimento e poupança. A eficiência marginal do capital, por sua vez, é descrita como a relação entre o lucro esperado e o preço corrente de uma unidade de capital, ou seja, emc = Vale ressaltar que o lucro esperado refere-se à renda esperada, em cada período futuro, de uma unidade de bem de capital instalada no presente ao preço P1. Para simplificar, Meade supõe que o mesmo lucro é esperado nos próximos períodos e que depende do lucro corrente P. A relação entre ambos é a medida de sensibilidade dos lucros futuros à variação dos lucros correntes, dada por .

A oitava equação descreve a demanda por moeda através do conceito de preferência pela liquidez, que depende da razão entre o valor do estoque de capital instalado e a quantidade de moeda "ociosa", isto é, a parcela do montante total de moeda que não é demandada pelo motivo transação. A elasticidade da preferência pela liquidez em relação à taxa de juros é dada por .

As oito equações descrevem as condições de equilíbrio e estão referidas a oito incógnitas (quantidades produzidas de bens de capital e de consumo (qI,qC), seus respectivos preços (PI, PC), a renda agregada Y , o lucro P, a taxa de juros r e o volume de emprego N ), duas constantes (o estoque de bens de capital K e a proporção k da renda que as pessoas desejam manter na forma de moeda a qualquer momento para financiar as transações correntes), e três variáveis independentes (a quantidade de moeda M, o salário per capita w e a proporção poupada da renda s). Assim, dadas as constantes e as variáveis independentes, determina-se o volume de emprego.7 7 Heller (2001) destaca que não são relações de causalidade, as quais só podem ser inferidas dos argumentos em prosa fornecidos por Meade, já que não correspondem a qualquer equação do seu sistema, e identifica apenas três relações de causalidade: (i) entre o consumo e a renda; (ii) entre a demanda por moeda (por um lado) e a renda e a taxa de juros (por outro); e (iii) entre a demanda por moeda pelos motivos precaução e especulação (por um lado) e a taxa de juros (por outro).

2.2_ As condições de estabilidade do equilíbrio

Para tratar das condições de estabilidade do equilíbrio, Meade sugere partir de um suposto "aumento acidental" (exógeno) nos gastos de bens de capital e de consumo que, por ser acompanhado por um aumento adequado da oferta, não gera pressão sobre preços; ademais, todas as outras variáveis (dependentes e independentes) permanecem inalteradas. As consequências imediatas do aumento do gasto são "(a) a elevação das rendas e, portanto, do montante que as pessoas desejam poupar; (b) o aumento dos lucros e, portanto, das expectativas de lucro futuro, gerando um incentivo para a tomada de empréstimos para investir" (MEADE, 1937, p. 100). Em outras palavras, o aumento inicial e exógeno do dispêndio gera um aumento da poupança (em decorrência do aumento da renda) e um aumento do investimento (em decorrência do aumento dos lucros). Dependendo da relação entre o aumento da poupança e o do investimento, o sistema poderá estar em equilíbrio estável ou instável.

Segundo a concepção de Meade, se a poupança aumentar mais do que o investimento o sistema estará em equilíbrio estável, pois nesse caso não é possível sustentar o nível mais elevado da renda – ou seja, ela retorna ao seu nível de equilíbrio inicial. No caso contrário (se a poupança aumentar menos do que o investimento), a renda continuará crescendo até encontrar um novo nível de equilíbrio mais alto. Isto, para Meade, significa que o equilíbrio é instável. Esse é o significado de estabilidade solicitado por Frisch.

2.3_ Os testes de estabilidade

Mas, para além da definição das condições básicas de equilíbrio estável, Meade sugere um teste de estabilidade em que distingue duas políticas bancárias possíveis frente ao "aumento acidental" dos gastos: uma na qual os bancos não alteram a quantidade de moeda (uma das três variáveis independentes) e outra na qual eles não alteram a taxa de juros (que, no entanto, havia definido como variável dependente). Esse exercício é depois complementado com considerações sobre as consequências de mudanças em outras variáveis, sem a suposição inicial do aumento dos gastos (tratadas na segunda seção deste texto). A análise de Meade baseia-se em medidas de elasticidade que estão listadas em seu apêndice matemático, mas cujo cálculo ele não demonstra, a saber: 8 8 Nossos anexos demonstram (e corrigem) as duas primeiras medidas de elasticidade.

Vale lembrar que:

é a elasticidade de oferta
(supostemente igual nos
dois setores); é a participação
dos salários na renda; é a sensibilidade dos
lucros futuros à variação dos
lucros correntes; é a proporção de moeda
"ociosa" em relação à
quantidade total de
moeda; é a elasticidade da
preferência pela liquidez
em relação à taxa de juros.

a. O teste de estabilidade com juros constantes

No caso em que, com o aumento dos gastos, os bancos decidem manter a taxa de juros constante, Meade conclui que o equilíbrio será estável se, mantidas inalteradas as variáveis independentes (taxa nominal de salários e proporção poupada da renda), a elevação exógena do gasto provocar pressão pela redução da taxa de juros, pois isso indica que o investimento foi pouco estimulado – o que para o autor representa um equilíbrio estável. Simetricamente, o equilíbrio será instável se for preciso elevar a taxa de juros para que o investimento seja desestimulado.9 9 Nas palavras do autor, o equilíbrio é estável se, em consequência do aumento do gasto, "for preciso reduzir a taxa de juros... à medida que o emprego aumenta, pois a menos que a taxa de juros caia, qualquer aumento eventual da renda, dos lucros e do emprego estimularia o investimento numa proporção menor do que a poupança, e esta expansão não poderia ser mantida" (MEADE, 1937, p. 100). Por sua vez, o equilíbrio será instável se, em consequência do aumento do gasto, "for preciso elevar a taxa de juros para preservar o equilíbrio à medida que o emprego aumenta, pois isto significa que qualquer aumento eventual da renda, dos lucros e do emprego estimularia o investimento numa proporção maior do que a poupança..." (MEADE, 1937, p. 100).

Para analisar essa relação, Meade utiliza a elasticidade do nível de emprego em relação à taxa de juros dada pela equação (9), em que . Ou seja, supõe que a política escolhida é a que mantém a taxa de juros constante, e ao mesmo tempo usa a elasticidade do nível de emprego em relação à taxa de juros para avaliar as condições de estabilidade do sistema. Vale notar que Meade não explora todas as relações que suas medidas de elasticidade permitiriam explorar, restringindo-se a avaliar se elas são positivas ou negativas, isto é, se o impacto da alteração de uma variável sobre a outra se dá na mesma direção ou na direção contrária, deixando de lado considerações sobre esse impacto ser maior ou menor do que a variação original. Nesse sentido, pode-se concluir que não há em Meade uma análise quantitativa propriamente dita, mas apenas qualitativa.

Importa ressaltar que mesmo sendo uma análise fundamentalmente qualitativa, Meade nem sempre explica o conteúdo econômico das suas relações matemáticas – nem apresenta os passos das relações matemáticas que constrói. No caso em questão, consideramos ser possível sustentar a conclusão de Meade de que o equilíbrio é estável se π < (1 – l) com base em dois pressupostos: i) a sensibilidade do lucro esperado a mudanças no lucro corrente (π) determina o investimento e ii) a participaηão dos lucros na renda determina a propensão a poupar a partir do lucro. Sendo assim, como a estabilidade do equilíbrio exige que o incentivo a investir seja menor do que o incentivo a poupar, temos que o equilíbrio estável exige que π < (1 – l). Essa condição implica que εr < 0.

b. O teste e estabilidade com oferta de moeda constante

Alternativamente, se ao invés de manterem a taxa de juros constante quando há um aumento dos gastos, os bancos mantiverem o estoque de moeda constante, a condição de estabilidade é menos severa. Nesse caso, o aumento da renda e dos gastos reduzirá a quantidade de moeda "ociosa" em decorrência do aumento da demanda por moeda pelo motivo transação. Isso pressionará pelo aumento da taxa de juros. A regra geral de condição de estabilidade é a mesma (estabilidade quando a poupança se eleva mais do que o investimento e vice-versa), e como o aumento da taxa de juros reduz o incentivo a investir, é menos provável que o investimento cresça mais que a poupança. Ou seja, o equilíbrio é estável se for preciso elevar a oferta de moeda, indicando que a elevação dos juros decorrente do aumento dos gastos reduz o investimento. Por outro lado, se for preciso reduzir a oferta de moeda o equilíbrio é instável, pois a elevação dos juros não teria sido suficiente para reduzir o investimento. Para esse caso, Meade também usa um cálculo de elasticidade, agora do nível de emprego em relação à oferta de moeda, dada pela equação (10) em que .10 10 Corrigida para: Aqui também se observa que Meade supõe que a política escolhida é a que mantém a oferta de moeda constante, e ao mesmo tempo usa a elasticidade do nível de emprego em relação à oferta de moeda para avaliar as condições de estabilidade do sistema. Para Meade, se essa elasticidade é positiva, ela indica que uma variação da oferta de moeda provoca uma variação no nível de emprego na mesma direção.11 11 E isso só é possível quando o denominador do último termo do lado direito da equação for positivo: usando a equação original de Meade, temos que se (1 – l)(1 + η[1 – m] + m λ) – m λπ > 0, então e, consequentemente, . Usando a equação corrigida, temos que se (1 – l)[1 + (1 – m)( η – l) + m λ– m λπ] > 0, então

É importante chamar a atenção para o fato de que na suposição anterior (a de que os bancos mantêm a taxa de juros constante), o equilíbrio é estável se π < (1 – l) . Nesse caso, o equilíbrio certamente é estável com uma oferta de moeda constante (já que o aumento dos gastos pressiona pela elevação dos juros, reduzindo o incentivo ao investimento). Mas o equilíbrio pode ser estável quando a oferta de moeda é constante, embora não o seja quando a taxa de juros é constante. Isso ocorre quando o aumento do gasto exige uma elevação da taxa de juros (para desestimular o investimento).

Ao considerar a condição de equilíbrio dada por , Meade conclui que o equilíbrio é provavelmente mais estável quanto menores forem os valores de π e l, m e λ e quanto maior for o valor de η.12 12 Observe-se que essas condições permanecem as mesmas para a equação corrigida. No que diz respeito a π e l , valem as nossas explicações anteriores.13 13 Se π determina o investimento e (1 – l) determina a poupança, e se a estabilidade do equilíbrio exige que o incentivo a investir seja menor do que o incentivo a poupar, temos que π < (1 – l) é a condição de estabilidade. No que se refere às demais variáveis, sugerimos considerar os seguintes pressupostos:

_se o montante de moeda "ociosa" é uma pequena proporção da quantidade total de moeda (m = pequeno), um aumento na demanda por moeda decorrente do aumento dos gastos não tem como ser suprido pela quantidade de moeda ociosa (que é pequena em relação ao total disponível), o que gera grande pressão sobre os juros, reduzindo o incentivo a investir. O equilíbrio tende a ser estável, conforme alega Meade;

_se a elasticidade da preferência pela liquidez em relação à taxa de juros é pequena, o aumento do gasto exige uma grande elevação da taxa de juros para "liberar" liquidez, o que reduz o incentivo a investir e, portanto, o equilíbrio também tende a ser estável, de acordo com a conclusão de Meade;

_a interpretação sobre o tamanho da elasticidade da oferta não está clara.

Meade afirma que η precisa ser grande para que o equilíbrio seja estável, mas η grande significa que um aumento do gasto induz um grande aumento no nível de emprego, o que de acordo com a definição de Meade é a característica de um equilíbrio instável. Aqui sugerimos uma interpretação perfeitamente compatível com o ambiente da época, que é o pressuposto de que o crescimento do nível de emprego ocorre a partir de um alto nível de desemprego inicial (e talvez esta seja a razão pela qual Meade discuta outras influências sobre o nível de emprego, tema da nossa próxima seção).

3_ Efeitos de outras mudanças exógenas sobre o nível de emprego

Conforme anunciado, Meade também discute os efeitos de outras mudanças exógenas sobre a demanda por trabalho. As mudanças em questão são (i) uma redução na taxa de juros; (ii) uma elevação da oferta de moeda; (iii) uma redução dos salários e (iv) uma redução da propensão a poupar.

Tal como faz para determinar as condições em que o equilíbrio pode ser considerado estável, aqui também Meade utiliza elasticidades para identificar as condições que devem ser satisfeitas para que o nível de emprego aumente.14 14 Heller (2001) destaca que, nessa parte do seu artigo, Meade usa a expressão "demanda por trabalho" em vez do termo "emprego", o que permite afirmar que para Meade o nível de emprego não é determinado pelo equilíbrio no mercado de trabalho e sim que depende da demanda por trabalho, e que esta, por sua vez, é influenciada pelas variáveis mencionadas, das quais uma (a taxa de juros) é uma variável dependente no seu modelo de oito equações.

3.1_ Efeito da variação dos juros

Supondo que a taxa de salário nominal w e a proporção da renda a poupar s sejam constantes, e que os bancos reduzem a taxa de juros, que permanece constante neste novo nível, Meade utiliza a elasticidade da demanda por trabalho em relação à taxa de juros dada pela equação (9). O nível de emprego varia inversamente à variação da taxa de juros, o que significa que εr < 0, ou seja, uma redução dos juros tende a elevar o nível de emprego. Para que isso não ocorra (a condição de estabilidade), é preciso que tanto η quanto π sejam pequenos. Isso condiz com os pressupostos discutidos anteriormente, embora na discussão das condições de estabilidade o ponto de partida tenha sido uma elevação dos gastos e seu efeito sobre o investimento e a poupança, e agora a equação seja usada para discutir o efeito de uma redução da taxa de juros. Meade nada diz sobre (1 - l) – a participação dos lucros na renda –, mas é possível considerar que essa variável também tem que ser pequena, pois é um dos componentes da demanda agregada. Finalmente, note-se que ao variar os juros, ele fixa os salários w e a propensão a poupar s, mas não tece considerações sobre a oferta de moeda M.

3.2_ Efeito da variação da oferta de moeda

As considerações sobre os efeitos de uma variação da oferta de moeda sobre a demanda por trabalho supõem novamente que o salário nominal w e a proporção da renda poupada s sejam constantes, mas que os bancos aumentem a oferta total de moeda, que permanece constante no novo nível. Meade usa a elasticidade da demanda por trabalho em relação à da oferta de moeda, dada pela equação (10). Como antes, εr < 0 representa a concepção de que uma elevação da quantidade de moeda tende a elevar o nível de emprego. Para que isso não ocorra (a condição de estabilidade), é preciso que η, π e m sejam pequenos e que λ seja grande. Novamente, Meade não fornece explicações de caráter teórico para esses resultados. A explicação que sugerimos para o tamanho pequeno de η e π são as mesmas de antes. A condição de λ grande implica que o desejo de converter ativos não líquidos em moeda é muito sensível à taxa de juros. Ou seja: o aumento da oferta de moeda, que reduz a taxa de juros, libera liquidez suficiente sem reduzir os juros (e, portanto, sem incentivar o investimento). A condição de m pequeno, por sua vez, significa que não há uma grande demanda por liquidez e essa é uma razão adicional para que os juros não tenham que ser reduzidos. Observa-se, mais uma vez, que também aqui Meade nada diz sobre , a participação dos lucros na renda, mas como antes é possível considerar que essa variável deve ser pequena. Finalmente, note-se que ao variar a quantidade de moeda, Meade fixa os salários w e a propensão a poupar s, mas não tece considerações sobre a taxa de juros r.15 15 Aqui também o uso da equação corrigida não altera os resultados teóricos.

3.3_ Efeito da variação dos salários

Para a análise dos efeitos de uma variação dos salários nominais sobre o nível de emprego, Meade utiliza a medida da elasticidade do emprego em relação ao salário, dada pela equação (11). Nesse caso, ele avalia os resultados de acordo com três alternativas para o valor de π, a sensibilidade dos lucros futuros à variação dos lucros correntes, quais sejam, π = 1, π < 1 e π > 1.

a. Efeito da variação dos salários para π = 1

Meade conclui que se π = 1, uma dada redução na taxa de salário nominal terá o mesmo efeito sobre o aumento do emprego que um aumento, na mesma proporção, da oferta de moeda, já que nesse caso temos εw = εM. Aqui parece que Meade desconsidera os argumentos de Keynes, pois para Keynes a queda no salário nominal não aumenta o nível de emprego ou do produto, a menos que haja uma variação em algum dos determinantes da demanda efetiva. Conforme destacado por Almeida (2008), segundo Keynes o nível de emprego depende unicamente da demanda efetiva medida em unidades de salários, e sendo essa a soma do consumo provável e do investimento provável, não pode variar se a propensão a consumir, a eficiência marginal do capital ou a taxa de juros (os determinantes da demanda efetiva) permanecerem constantes. De fato:

Para refutar a conclusão sumária de que uma redução dos salários nominais aumentaria o emprego "porque reduz o custo de produção", talvez seja útil seguir o curso dos acontecimentos na hipótese mais adequada a esse raciocínio, isto é, que os empresários esperam que a redução dos salários nominais produza esse efeito. Sem dúvida, não é improvável que o empresário individual, vendo diminuir seus próprios custos, comece negligenciando efeitos sobre a demanda de seu produto e atue baseado na hipótese de que será capaz de vender com lucro uma produção maior que a de antes. Se os empresários em geral regularem sua atitude baseando-se nesta expectativa, conseguirão eles na realidade aumentar os seus lucros? Somente se a propensão marginal a consumir da comunidade for igual à unidade, de modo que não haja lacuna entre o incremento dos rendimentos e o incremento do consumo: ou então se houver um aumento no investimento que corresponda à lacuna existente entre o incremento da renda e o incremento do consumo, o que só acontecerá no caso de a curva das eficiências marginais do capital ter aumentado relativamente à taxa de juros. Desse modo, os resultados obtidos com o aumento de produção desanimarão os empresários, e o emprego voltará, outra vez, ao seu nível anterior, salvo se a propensão marginal a consumir for igual à unidade ou a redução nos salários nominais resultar num aumento da escala das eficiências marginais do capital em relação à taxa de juros e, portanto, no montante do investimento. (KEYNES, 1936, p. 250)

O argumento de Meade se desenvolve com base em um exemplo numérico no qual supõe uma redução de 10% do salário nominal combinada com uma redução de 10% na oferta de moeda, sem alteração na taxa de juros.16 16 Para uma redução de 10% do salário nominal combinada com uma redução de 10% na oferta de moeda, se π = 1 então ε w = – ε M, os efeitos se anularão. Assim, a produção e o emprego permanecem inalterados, o custo primário marginal e o preço de todos os bens caem 10% (em vista dos 10% de queda dos salários nominais) e consequentemente a renda nominal cai em 10% (mas a renda real ou o produto não se alteram, pois os preços caem). Isso faz com que 10% menos moeda seja necessária para as transações correntes e, como a oferta total de moeda também foi reduzida em 10%, a oferta de moeda "ociosa" também cai em 10%. Mas, como o preço dos bens de capital também cai em 10%, a relação entre o valor dos ativos não líquidos e o montante de moeda "ociosa" não muda, e consequentemente não há alteração na preferência pela liquidez e a taxa de juros fica inalterada. Além disso, a poupança nominal cai em 10% devido à queda de 10% na renda nominal, e o investimento nominal também cai 10% se os lucros esperados caírem na mesma proporção; como a taxa de juros não se altera, e o preço da oferta de bens de capital e o produto nominal esperado sobre eles caem 10%, não há incentivo para mudanças no valor do investimento real e, portanto, o valor nominal do investimento cai à mesma taxa que o preço dos bens de capital. Meade supõe que a redução dos salários reduz o preço dos bens de capital, ao mesmo tempo que a queda da oferta de moeda – na mesma proporção que a redução dos salários – reduz a demanda por moeda "ociosa". Nesse caso específico, em que se atribui o valor unitário à elasticidade dos lucros esperados em relação aos lucros correntes (π = 1), para que ocorra aumento do nível de emprego é preciso que haja ou uma redução dos salários ou uma elevação da oferta de moeda, mas nunca uma variação proporcionalmente igual (e na mesma direção) das duas variáveis.17 17 Heller (2001) nota que a consideração simultânea dos efeitos de uma variação nos salários e na oferta de moeda inexiste nos manuais de macroeconomia. Nesses, a taxa de juros se reduz se houver um aumento da oferta de moeda para uma demanda por moeda inalterada (ou se houver uma redução da demanda por moeda para uma dada oferta de moeda). Variações dos salários não têm influência sobre a taxa de juros. No argumento de Meade, no entanto (mas apenas implicitamente), há a sugestão de que a redução dos salários também reduz a taxa de juros, pois a redução dos salários reduz os preços e a renda nominal, reduzindo, por consequência, a demanda por moeda.

Assim, pode-se afirmar que Meade chega às mesmas conclusões que Keynes – mas desde que, junto com a queda do salário, haja também a queda de um dos determinantes da demanda efetiva que determina o emprego (no caso, queda da taxa de juros).18 18 O raciocínio de Meade equivale ao chamado "efeito Keynes", que se refere ao impacto da redução de preços (causada pela redução dos salários) sobre a demanda por moeda pelo motivo transação, que diminui em decorrência da menor necessidade de moeda, já que os preços se reduziram. Para uma dada oferta de moeda, a escassez relativa da demanda por moeda provoca redução da taxa de juros e, portanto, elevação de investimentos e do nível de emprego.

b. Efeito da variação dos salários para π < 1

O significado de é π < 1 que uma queda de, por exemplo, 10% nos lucros correntes, fará o lucro futuro esperado cair menos que 10%. Nesse caso, segundo Meade, uma queda de 10% no salário nominal, que é acompanhada de uma redução do preço de oferta nominal corrente dos bens de capital (pI) e do lucro nominal corrente (P), leva a um aumento da relação entre os lucros esperados e o preço de oferta dos bens de capital (eficiência marginal do capital) e, portanto, encoraja o investimento. Assim, nessas condições, uma redução do salário nominal é mais eficaz em aumentar o emprego que um aumento na mesma proporção da oferta de moeda, já que agora, além da queda na taxa de juros, teremos também o aumento da eficiência marginal do capital, que faz com que o investimento aumente ainda mais. Também nesse caso pode-se afirmar que Meade chega às mesmas conclusões que Keynes – mas desde que junto com a queda do salário haja também a elevação da eficiência marginal do capital, um dos determinantes da demanda efetiva que por sua vez determina o nível de emprego.19 19 Em termos algébricos, e de acordo com a formulação da elasticidade da demanda por trabalho em relação aos salários dada por ε w = – ε M (1 – m λ[π – 1]) a suposição π < 1 resulta que, em valores absolutos, | ε w| < | ε M|. Esse resultado, que contradiz a argumentação de Meade, considera: (i) que λ < 0, pois a preferência pela liquidez varia na direção oposta da variação da taxa de juros, e (ii) que π > 0, pois os lucros esperados variam na mesma direção que a variação dos lucros correntes (neste caso, portanto, 0 < π < 1). Além disso, 0 < m < 0.

c. Efeito da variação dos salários para π > 1

Inversamente, se π > 1 a queda no lucro nominal esperado é maior que a queda, em proporção, dos lucros nominais correntes. Nesse caso, uma redução do salário nominal tem um efeito menor sobre o nível de emprego do que uma elevação (na mesma proporção) da oferta de moeda. Em outras palavras, a redução do salário nominal leva a uma menor eficiência marginal do capital. Assim, apesar de a taxa de juros cair, a eficiência marginal do capital também se reduz e, portanto, o aumento no emprego, dado o aumento no investimento, é menor.

3.4_ Efeito da variação da propensão a poupar

Finalmente, para avaliar os efeitos de uma variação na propensão a poupar sobre o nível de emprego, Meade utiliza a medida da elasticidade do emprego em relação à propensão a poupar dada pela equação (12), e supõe que a taxa de salário nominal w e a oferta de moeda M são constantes. Como vimos, εM é positiva e, portanto, εs deve ser negativa. Como a propensão a consumir é o complementar da propensão a poupar, pode-se dizer que, com esta elasticidade, Meade analisa o terceiro componente da demanda efetiva (lembrando que os anteriores são a taxa de juros e a eficiência marginal do capital). Mas, como nos demais casos, Meade restringe a análise à avaliação da direção do impacto da variação de uma dada variável sobre o nível de emprego, sem discutir o tamanho desse impacto. Aqui, ao menos, ele reconhece que uma queda na proporção a poupar (que equivale a uma elevação da propensão a consumir) levará a um aumento do emprego, e explicita esse argumento de forma muito clara:

Uma redução da proporção poupada da renda aumenta o gasto em consumo; haverá então um aumento do gasto total e do emprego, a não ser que o investimento caia na mesma proporção que o aumento do consumo. Mas o investimento só cai se houver uma elevação da taxa de juros, e a taxa de juros só se eleva se houver uma redução da oferta de moeda "ociosa". Mas, para uma dada oferta total de moeda, a oferta de moeda "ociosa" só cai se houver um aumento no gasto total, provocando um aumento da demanda por moeda para financiar as transações correntes. Portanto, a taxa de juros não pode se elevar o suficiente para reduzir o investimento na mesma proporção em que o gasto em consumo se elevou (MEADE, 1937, p. 104).

4_ Conclusão – uma síntese da contribuição de Meade

A partir do que foi exposto anteriormente, verifica-se que Meade constrói um sistema de oito equações para determinar as condições de equilíbrio de curto prazo de uma economia em concorrência perfeita, fechada e sem governo, produtora de bens de consumo e de bens de investimento. Essas oito equações também servem para determinar as condições de estabilidade desse equilíbrio, em que estabilidade é entendida como a situação em que o sistema, depois de submetido a um choque de demanda (aumento exógeno do dispêndio), retorna à posição inicial. Na formulação de Meade, isso significa que o estímulo que o choque de demanda exerce sobre o investimento deve ser inferior ao que exerce sobre a poupança. Essa é a definição de estabilidade solicitada por Frisch.

A análise de Meade é mais qualitativa do que quantitativa, e ele nem sempre explicita o raciocínio econômico que sustenta suas conclusões. Procuramos complementar essas lacunas ao longo do texto, e aqui apresentamos um resumo das principais relações teóricas propostas, mas de forma mais genérica do que anteriormente: (i) além da taxa de juros e da eficiência marginal do capital, o lucro esperado também determina o incentivo a investir; (ii) o montante de moeda "ociosa" em relação à quantidade total de moeda determina o impacto que uma variação na demanda por moeda, decorrente de uma variação dos gastos, tem sobre a taxa de juros e, consequentemente, sobre o incentivo a investir; (iii) a elasticidade da preferência pela liquidez em relação à taxa de juros permite que uma variação da oferta de moeda altere a liquidez do sistema sem afetar a taxa de juros; e (iv) o efeito da variação dos salários sobre o nível de emprego (em comparação com o efeito de uma política monetária expansiva) depende do valor da elasticidade dos lucros esperados em relação aos lucros correntes.

A análise de Meade prioriza a reação do sistema bancário (que decide manter inalterada a taxa de juros ou, alternativamente, a oferta de moeda). A sensibilidade dos lucros esperados à variação dos lucros presentes é a variável-chave e original da sua contribuição, e o papel destacado das expectativas esclarece porque os intérpretes de Meade consideram que seu modelo se assemelha muito mais ao livro de Keynes do que as contribuições de Harrod (1937) e de Hicks (1937). Em particular, destaca-se que na análise de Meade a redução dos salários pode ter efeito positivo sobre o nível de emprego desde que haja também a queda de um dos determinantes da demanda efetiva que determina o emprego (queda da taxa de juros), e/ou a elevação da eficiência marginal do capital – em ambos os casos, sempre dependendo do valor da elasticidade dos lucros esperados em relação aos lucros correntes.

Referências Bibliográficas

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ASSOUS, M. (2004) Le modèle keynésien de Meade (1937): première analyse dynamique du sous-emploi? Conferencia "La réception de la Théorie Générale 1936-1939», Association pour le Developpement des Etudes Keynesiennes – ADEK, Sceaux, França, outubro de 2004.

CHAMPERNOWNE, David Gawen (1935-36): Unemployment, Basic and Monetary: the classical analysis and the keynesian. Review of Economic Studies, v. 3, 1935-36, p. 201-216.

DARITY, W. e COTTRELL, A. F. (1987): Meade's 'General Theory' model: a geometric reprise. Journal of Money, Credit and Banking, v. 18, n. 2, p. 210-21.

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HICKS, J. R. (1937) Mr. Keynes and the 'classics': a suggested interpretation. Econometrica, v. 5, abril 1937, p. 147-159.

KEYNES, J. M. (1936) A teoria geral do emprego, do juro e da moeda. Nova Cultural, São Paulo, 1996

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RAPPOPORT, P. (1992): Meade's General Theory model: stability and the role of expectations. Journal of Money, Credit and Banking, v. 24, p. 356-69.

REDDAWAY, W.B. (1936): The General Theory of Employment, Interest and Money. Economic Record, v. 12, junho, p. 28-36.

YOUNG, Warren (1987). Interpreting Keynes: The IS/LM Enigma, Boulder, Colorado: Westview Press; Oxford: Basil Blackwell.

Artigo recebido em novembro de 2009 e aprovado em maio de 2011.

E-mail de contato dos autores:hellerc@fclar.unesp.br, rose2almeida@yahoo.com.br

Agradecemos o apoio financeiro da FAPESP à pesquisa desenvolvida como Iniciação Científica por Roselaine Bonfim de Almeida, orientada por Claudia Heller, bem como o auxílio do Prof. Dr. Alexandre Sartoris Neto e os comentários do parecerista anônimo. Eventuais erros e omissões, como de praxe, são de nossa responsabilidade.

Anexos Matemáticos

Anexo I

Cálculo das diferenciações das relações básicas do modelo de Meade

Para as equações (1a) e (2a), diferenciamos a expressão genérica , onde e .

Substituindo no 1º termo do lado direito de , temos .

Rearranjando:

A 1ª parte do 2º termo do lado direito é o custo marginal que, em equilíbrio, é igual ao preço p.

Fazendo a devida substituição, temos .

Multiplicando e dividindo o segundo termo do lado direito por .

Considerando que a elasticidade da oferta é , temos .

O lado direito de corresponde aos dois últimos termos do lado direito de .

Substituindo, temos .

Para a equação (3a) usamos a equação (3): Y = pIqI + pCqC

Simplificando, e considerando que e que , .

Simplificando novamente: .

Para a equação (4a) usamos a equação (4): Y = P + wN , onde e

Portanto: .

Para a equação (5a) usamos a equação (5): N = NI + NC

Multiplicando e dividindo o 1º termo do lado direito de por q1, w e e o 2º termo do lado direito de por qc , w , e dqc , temos .

Rearranjando:

,

onde (genericamente) .

Divida o numerador e o denominador de cada termo de por Y e considere que .

Portanto: .

Para a equação (6a) usamos a equação (6):

Portanto: .

Para a equação (7a) usamos a equação (7):

Considerando que , temos que .

Substituindo, chegamos a .

Para a equação (8a) usamos a equação (8): e as definições .

Diferenciando em função das três variáveis endógenas ( p1, M e Y ):

Substituindo no lado direito: .

Simplificando: , de (8) temos que .

Substituindo M – kY = mM em , temos .

Multiplicando por m: .

Sabemos que .

Sabemos que .

Substituindo , temos .

Portanto: .

Anexos Matemáticos

Anexo II

Cálculo da elasticidade dada pela equação (9)

Partindo das equações (5a) e (7a), em que e , respectivamente, temos .

Nas equações (1a) e (2a) supomos que os salários não variam (isto é = 0), de modo que de (1a) , temos , e de (2a) , temos .

Substituindo em , temos .

Simflificando, temos .

Supondo que os preços variam na mesma proporção nos dois setores, chegamos a e, supondo que os preços variam na mesma proporção que os lucros (de modo que ), temos .

Finalmente, multiplicando e dividindo por (1 – l), temos .

Para chegar ar resultado de Meade, é preciso desprezar πl no denominador, de modo que .

Vale ressaltar que Meade não desenvolve esse cálculo nem fornece quaisquer indicações de argumentos que sustentariam o procedimento de desprezar o termo πl no denominador. Tradicionalmente, isso poderia ser desprezado se tanto π quanto l fossem muito pequenos. Vimos que a condição de estabilidade é dada por π < (1 – l). Lembrando que l representa a proporção dos salários na renda, é razoável supor que 0 < l < 1 e, portanto, em condições de estabilidade, é possível justificar o procedimento de desprezar πl. O mesmo se aplica à discussão que trata do efeito da variação dos juros sobre o nível de emprego, na qual a conclusão é a de que π pequeno é uma das condições de estabilidade – embora sem referências a (1 – l). Finalmente, observe-se que no restante do artigo Meade usa outras elasticidades, dispensando as considerações sobre a grandeza de π e de l para justificar o procedimento de desprezar πl.

ANEXOS MATEMÁTICOS

Anexo III

Cálculo da elasticidade dada pela equação (10)

Partindo das equações (5a) e (8a), em que e , (pois ), respectivamente, temos .

Como no cálculo anterior, supondo que os salários não variam (de modo que = 0), e que os preços variam na mesma proporção nos dois setores (de modo que ), temos , que pode ser simplificado para .

No denominador, substituir (4a) , que com os mesmos supostos adotados anteriormente se torna , onde , ou seja, .

Supondo que os preços variam na mesma proporção que os lucros: .

Ainda no denominador, podemos substituir que, com o mesmo suposto de que os preços variam na mesma proporção que os lucros, se torna .

Portanto:

.

Simplificando

.

:

Multiplicando o numerador e o denominador por 1 – l:

Embora nosso resultado corrija o resultado de Meade (para quem ), isso não altera as conclusões anteriores.

  • ALANEZ, E. L. (2001). El modelo algebraico de Meade (1937): El sistema económico simplificado de Keynes. Investigación Económica, v. 61, n. 238, octubre-diciembre , p. 69-108.
  • ALMEIDA, R. 6. (2008). James Meade e a Teoria Geral do Emprego, dos Juros e da Moeda Monografia de Conclusão de Curso. Departamento de Economia. Unesp, Araraquara. Mimeo, 2008.
  • ASSOUS, M. (2004) Le modèle keynésien de Meade (1937): première analyse dynamique du sous-emploi? Conferencia "La réception de la Théorie Générale 1936-1939ť, Association pour le Developpement des Etudes Keynesiennes ADEK, Sceaux, França, outubro de 2004.
  • CHAMPERNOWNE, David Gawen (1935-36): Unemployment, Basic and Monetary: the classical analysis and the keynesian. Review of Economic Studies, v. 3, 1935-36, p. 201-216.
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  • REDDAWAY, W.B. (1936): The General Theory of Employment, Interest and Money. Economic Record, v. 12, junho, p. 28-36.
  • YOUNG, Warren (1987). Interpreting Keynes: The IS/LM Enigma, Boulder, Colorado: Westview Press; Oxford: Basil Blackwell.
  • 1
    Um aspecto frequentemente mencionado na literatura sobre o tema refere-se à circulação prévia dos textos apresentados no Simpósio. O único que não circulou antes do evento foi o de Hicks (YOUNG, 1987, p. 31-32), mas não há certeza se Meade chegou a ter acesso ao de Harrod. Fazendo referência à troca de correspondência entre Hicks, Harrod e Meade registrada em Young (1987), Heller (2007) conjectura que o mais provável é que Meade tenha escrito o seu de forma independente, isto é, sem ter lido o de Hicks nem o de Harrod. Por outro lado, Heller (2007) reconhece que é possível que Meade tenha tido a oportunidade de ler outros trabalhos que procuravam representar a
    Teoria Geral através de formalizações algébricas, como é o caso dos artigos de David Champernowne ("Unemployment, basic and monetary: the Classical analysis and the Keynesian") e de Brian Reddaway ("The General Theory of Employment, Interest and Money"), publicados em junho de 1936, antes da Conferência de Oxford. O fato é que as informações disponíveis sobre a circulação prévia do texto de Meade são precárias. O único registro é um cartão postal enviado por Keynes a Meade, datado de 14 de setembro de 1936 (YOUNG, 1987, p. 34 e 189), indicando que Keynes conhecia o trabalho antes da apresentação em Oxford.
  • 2
    O termo "MEK" representa o setor produtor de bens de capital e o termo "AA" representa o mercado de ativos.
  • 3
    p
    I e p
    S representam o preço de demanda e o preço de oferta de bens de capital, respectivamente.
  • 4
    Essas equações constam do apêndice matemático fornecido por Meade (1937, p. 105), mas a notação utilizada neste texto é um pouco diferente da notação do autor. No lugar dos subscritos "x" e "y" usamos os subscritos "I" e "C" para designar os setores produtores de bens de capital e de bens de consumo, respectivamente. O símbolo "I" foi trocado por "Y" para designar a renda ou produto. O lucro corrente é representado por "P", o lucro esperado por "P
    *", o nível de preços por "p" ("p
    I" e "p
    C" em cada setor), a quantidade produzida por "q" ("q
    I" e "q
    C" em cada setor), o estoque de capital por "K" e a parcela da renda que os agentes demandam na forma líquida por "k". "M" representa a quantidade de moeda, "N" o nível de emprego, "w" o salário per capita e "r" a taxa de juros. "S" é o montante de poupança e "s" a propensão a poupar.
  • 5
    Equivalente, na forma genérica (ou agregada), a
    .
  • 6
    Onde
    com 0 <
    l < 1.
  • 7
    Heller (2001) destaca que não são relações de causalidade, as quais só podem ser inferidas dos argumentos em prosa fornecidos por Meade, já que não correspondem a qualquer equação do seu sistema, e identifica apenas três relações de causalidade: (i) entre o consumo e a renda; (ii) entre a demanda por moeda (por um lado) e a renda e a taxa de juros (por outro); e (iii) entre a demanda por moeda pelos motivos precaução e especulação (por um lado) e a taxa de juros (por outro).
  • 8
    Nossos anexos demonstram (e corrigem) as duas primeiras medidas de elasticidade.
  • 9
    Nas palavras do autor, o equilíbrio é estável se, em consequência do aumento do gasto, "for preciso reduzir a taxa de juros... à medida que o emprego aumenta, pois a menos que a taxa de juros caia, qualquer aumento eventual da renda, dos lucros e do emprego estimularia o investimento numa proporção menor do que a poupança, e esta expansão não poderia ser mantida" (MEADE, 1937, p. 100). Por sua vez, o equilíbrio será instável se, em consequência do aumento do gasto, "for preciso elevar a taxa de juros para preservar o equilíbrio à medida que o emprego aumenta, pois isto significa que qualquer aumento eventual da renda, dos lucros e do emprego estimularia o investimento numa proporção maior do que a poupança..." (MEADE, 1937, p. 100).
  • 10
    Corrigida para:
  • 11
    E isso só é possível quando o denominador do último termo do lado direito da equação for positivo: usando a equação original de Meade, temos que se (1 –
    l)(1 +
    η[1 –
    m] +
    m
    λ) –
    m
    λπ > 0, então
    e, consequentemente,
    . Usando a equação corrigida, temos que se (1 –
    l)[1 + (1 –
    m)(
    η –
    l) +
    m
    λ–
    m
    λπ] > 0, então
  • 12
    Observe-se que essas condições permanecem as mesmas para a equação corrigida.
  • 13
    Se π determina o investimento e (1 –
    l) determina a poupança, e se a estabilidade do equilíbrio exige que o incentivo a investir seja menor do que o incentivo a poupar, temos que π < (1 –
    l) é a condição de estabilidade.
  • 14
    Heller (2001) destaca que, nessa parte do seu artigo, Meade usa a expressão "demanda por trabalho" em vez do termo "emprego", o que permite afirmar que para Meade o nível de emprego não é determinado pelo equilíbrio no mercado de trabalho e sim que depende da demanda por trabalho, e que esta, por sua vez, é influenciada pelas variáveis mencionadas, das quais uma (a taxa de juros) é uma variável dependente no seu modelo de oito equações.
  • 15
    Aqui também o uso da equação corrigida não altera os resultados teóricos.
  • 16
    Para uma redução de 10% do salário nominal combinada com uma redução de 10% na oferta de moeda, se π = 1 então
    ε
    w = –
    ε
    M, os efeitos se anularão. Assim, a produção e o emprego permanecem inalterados, o custo primário marginal e o preço de todos os bens caem 10% (em vista dos 10% de queda dos salários nominais) e consequentemente a renda nominal cai em 10% (mas a renda real ou o produto não se alteram, pois os preços caem). Isso faz com que 10% menos moeda seja necessária para as transações correntes e, como a oferta total de moeda também foi reduzida em 10%, a oferta de moeda "ociosa" também cai em 10%. Mas, como o preço dos bens de capital também cai em 10%, a relação entre o valor dos ativos não líquidos e o montante de moeda "ociosa" não muda, e consequentemente não há alteração na preferência pela liquidez e a taxa de juros fica inalterada. Além disso, a poupança nominal cai em 10% devido à queda de 10% na renda nominal, e o investimento nominal também cai 10% se os lucros esperados caírem na mesma proporção; como a taxa de juros não se altera, e o preço da oferta de bens de capital e o produto nominal esperado sobre eles caem 10%, não há incentivo para mudanças no valor do investimento real e, portanto, o valor nominal do investimento cai à mesma taxa que o preço dos bens de capital.
  • 17
    Heller (2001) nota que a consideração simultânea dos efeitos de uma variação nos salários e na oferta de moeda inexiste nos manuais de macroeconomia. Nesses, a taxa de juros se reduz se houver um aumento da oferta de moeda para uma demanda por moeda inalterada (ou se houver uma redução da demanda por moeda para uma dada oferta de moeda). Variações dos salários não têm influência sobre a taxa de juros. No argumento de Meade, no entanto (mas apenas implicitamente), há a sugestão de que a redução dos salários também reduz a taxa de juros, pois a redução dos salários reduz os preços e a renda nominal, reduzindo, por consequência, a demanda por moeda.
  • 18
    O raciocínio de Meade equivale ao chamado "efeito Keynes", que se refere ao impacto da redução de preços (causada pela redução dos salários) sobre a demanda por moeda pelo motivo transação, que diminui em decorrência da menor necessidade de moeda, já que os preços se reduziram. Para uma dada oferta de moeda, a escassez relativa da demanda por moeda provoca redução da taxa de juros e, portanto, elevação de investimentos e do nível de emprego.
  • 19
    Em termos algébricos, e de acordo com a formulação da elasticidade da demanda por trabalho em relação aos salários dada por
    ε
    w = –
    ε
    M (1 –
    m
    λ[π – 1]) a suposição π < 1 resulta que, em valores absolutos, |
    ε
    w| < |
    ε
    M|. Esse resultado, que contradiz a argumentação de Meade, considera: (i) que
    λ < 0, pois a preferência pela liquidez varia na direção oposta da variação da taxa de juros, e (ii) que
    π > 0, pois os lucros esperados variam na mesma direção que a variação dos lucros correntes (neste caso, portanto, 0 <
    π < 1). Além disso, 0 <
    m < 0.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Maio 2013
    • Data do Fascículo
      Dez 2012

    Histórico

    • Recebido
      Nov 2009
    • Aceito
      Maio 2011
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