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Incorporando o risco soberano no desenho operacional do regime de metas de inflação

Incorporating sovereign risk into the design of the inflation targeting regime

Resumo:

O objetivo deste artigo é analisar os mecanismos de coordenação entre políticas monetária e fiscal, em uma economia com regime monetário do tipo metas de inflação, que permitam acomodar choques exógenos e manter tal economia em um equilíbrio estável em um ambiente em que o risco de default contribui para a instabilidade da dívida e da taxa de juros de política monetária. É desenvolvida uma estrutura analítica no intuito de capturar os mecanismos de transmissão do risco soberano e seus efeitos na definição de funções-reações para a autoridade monetária e fiscal. Para isso, utilizou-se um modelo de equações diferenciais simultâneas de primeira ordem em que se analisou o equilíbrio intertemporal do modelo e sua estabilidade. Os principais resultados mostram que na hipótese de regras fiscais, com a imposição de um superávit primário, a autoridade monetária deve apresentar um peso maior dos desvios da inflação em relação à meta de inflação, de modo que um controle fiscal é desejado para que a economia não seja muito vulnerável a choques de risco soberano. Em uma configuração em que não há regra fiscal, é necessário que a autoridade monetária acomode os choques do risco soberano com aumentos na taxa básica de juros.

Palavras chaves:
risco soberano; coordenação de políticas econômicas; dinâmica econômica.

Abstract:

The paper analyzes the coordination between monetary and fiscal policy in an emerging economy with monetary regime type inflation targets, to accommodate exogenous shocks and to maintain such economy in a stable equilibrium in a situation where the risk of default contributes to the instability of the debt and the monetary policy interest rate. An analytical framework is developed to capture the mechanisms of transmission of sovereign risk and its effects on the definition of reactions functions for monetary and fiscal authority. For this, a model of simultaneous first order differential equations was used, where the steady state of the model and its stability were analyzed. The main results show that in case of fiscal rules, with the imposition of a primary surplus, the monetary authority should have a higher weight of inflation deviations from the inflation target, so that a tax control is desired for the economy is not very vulnerable to sovereign risk shocks. In a setting where there is no fiscal rule it is necessary that the monetary authority accommodates the shock of sovereign risk, through increases in the basic interest rate.

Keywords:
Sovereign Risk; Policy Coordination; Economic Dynamics.

1 Introdução

Diante do consenso de que é desejada uma inflação baixa e estável, as experiências na condução do regime de metas inflacionárias em muitos países vêm mostrando que o arcabouço operacional da política econômica está associado a medidas não só de cunho monetário, mas de busca pelo equilíbrio fiscal nas contas públicas, sobretudo em economias emergentes em que elevados níveis de Dívida Pública podem transmitir efeitos não desejáveis ao equilíbrio macroeconômico.

Há uma série de trabalhos que chama a atenção para a relação entre política fiscal e política monetária. Entre eles merecem destaque, Sargent e Wallace (1981SARGENT, T.; WALLACE, N. Some unpleasant monetarist arithmetic. Quartely Review, Federal Reserve Bank of Minneapolis, p. 1-17, 1981.), Woodford (1995WOODFORD, M. Price-level determinacy without control of a monetary aggregate. Carnegie-Rochester.Conference Series on Public Policy, v. 43, p. 1-46, 1995.,1996WOODFORD, M. Control of Public Debt: A Requirement for Price Stability, NBER Working Paper, 5684, 1996., 2001WOODFORD, M. Fiscal requirements for price stability. Journal of Money, Credit and Banking, v. 33, n. 3, p. 669-728, 2001.), Leeper (1991LEEPER, E. M. Equilibria under active and passive monetary and fiscal policies. Journal of Monetary Economics, v. 27, n. 1, p. 129-147, 1991., 2009LEEPER, E. M. Anchors away: how fiscal policy can undermine the taylor principle. NBER Working Paper Series, Cambridge, MA: MIT Press, Working Paper 15514, NBER, 2009. ), Greenlaw et al. (2013GREENLAW, D.; HAMILTON, J. D.; HOOPER, P.; MISHKIN, F. S. Crunch time: Fiscal crises and the role of monetary policy (n. w19297). National Bureau of Economic Research, 2013), Favero e Giavazzi (2003FAVERO, C.; GIAVAZZI, F. Targeting inflation when debt and risk premia are high: lessons from Brazil. IGIER, BocconiUniversity, May. Mimeo, 2003.) e Blanchard (2004BLANCHARD, O. Fiscal dominance and inflation targeting: lessons from Brazil NBER Working Paper Series. Cambridge, MA: MIT Press, Working Paper 10389, 2004.). Em geral, a hipótese subjacente a tais trabalhos é de que um ambiente fiscal pernicioso pode levar a uma situação de dominância fiscal. Nesses dois últimos artigos, o trabalho empírico utilizou dados da economia brasileira, que permitiram observar se a possível eleição de um candidato de esquerda possibilitaria que o risco de default se tornaria um componente que levaria à dominância fiscal. Mais trabalhos aplicados à economia brasileira são, Morais e Andrade (2004MORAIS, J. F. M.; ANDRADE, J. P. Como a Dívida Pública Afeta a Política Monetária Ótima? Brasília: ESAF, Monografia premiada em 3º lugar no IX Prêmio Tesouro Nacional, 2004. ), Moreira et al. (2007MOREIRA, T. B. S.; ALMEIDA, C. L.; SOUZA, G. S. E. Política fiscal e monetária: ativa ou passiva? Uma análise empírica e suas implicações sobre as regras ótimas de política monetária. In: ESAF. (org.). Cadernos de Finanças Públicas - Esaf. Brasília, 2007.), e Matos e Andrade Neto (2015MATOS, P. R. F.; ANDRADE NETO, J. Analyzing COPOM's Decisions. Brazilian Business Review, v. 12, n. 6, p. 24-47, 2015.).

Uma questão central no que se refere à literatura que busca investigar a coordenação monetária e fiscal é a generalidade com a qual os mecanismos de transmissão das políticas econômicas são tratados, sendo que na maior parte dos trabalhos há uma ausência de identificação de regras monetárias que incorporem uma reação da autoridade monetária a mudanças no cenário de política fiscal. Em um regime de metas de inflação, no qual há uma regra de política monetária semelhante a Taylor (1993TAYLOR, J. B. Discretion versus Policy Rules in Practice. Carnegie-Rochester Conference Series on Public Policy, 39, p. 195-214, 1993.), o comportamento adverso de algumas variáveis fiscais pode prejudicar o bom funcionamento da política monetária. Relaxar a hipótese de uma política fiscal ativa, bem como ignorar seus efeitos sobre as funções de reação da autoridade monetária, pode, de certa forma, suscitar numa perda de informações acerca dos reais efeitos que a política fiscal pode transmitir para o desempenho da política monetária, sobretudo os canais de transmissão que tais instrumentos fiscais exercem sobre o risco soberano e assim seus reflexos sobre a eficácia da política monetária.

Torna-se importante, portanto, voltar a atenção para aspectos relacionados ao efeito dos choques econômicos exógenos - choques de risco, por exemplo - sobre a dívida pública, uma vez que regimes monetários do tipo metas de inflação buscam controlar tais choques a que está suscetível a economia por meio da operacionalização da taxa nominal de juros. Assim, o efeito da política monetária sobre a dívida pública se propaga em variáveis do tipo composição do endividamento público e crises de confiança.

É necessário compreender melhor essa relação colocada entre a manipulação da política monetária e comportamento da dívida pública em um ambiente em que o risco soberano pode levar ao desiquilíbrio macroeconômico. Isso posto, o objetivo deste artigo é analisar como deve ser realizada a coordenação entre políticas monetária e fiscal em uma economia emergente com regime monetário de metas de inflação, em um contexto em que choques no risco soberano podem levar à existência de desequilíbrios macroeconômicos.

As principais contribuições deste trabalho serão: i) sugerir um arcabouço operacional de política monetária que leve em consideração uma variável fiscal, mais especificamente o desvio da dívida pública em relação a uma meta e; ii) estabelecer um modelo em que o risco é um fator que pode levar ao desequilíbrio macroeconômico por meio de seu efeito sobre o câmbio, taxa de juros e, sobre a dívida pública e a inflação. Em outras palavras, buscar-se-á responder a seguinte pergunta: como deve ser realizada a coordenação entre as políticas monetária e fiscal em uma economia emergente quando se deseja alcançar a estabilidade da taxa de juros nominal em um regime de metas de inflação, do risco soberano e da dívida pública?

Dessa forma, serão analisados os mecanismos de coordenação entre política fiscal e monetária em uma economia sob o regime de metas de inflação na presença de risco soberano sobre quatro cenários diferentes: i) um regime de regra de superávit primário e taxa de câmbio exógena; ii) política fiscal flexível e taxa de câmbio exógena; iii) um regime de regra de superávit primário e taxa de câmbio determinada pelo risco soberano; iv) política fiscal flexível e taxa de câmbio determinada pelo risco soberano.

Para isso, o artigo foi dividido de acordo com a seguinte estrutura: na segunda seção foi trabalhado um modelo teórico de coordenação entre políticas econômicas para uma economia com regime monetário de metas de inflação e em um ambiente de risco de default. Adicionalmente, foi feito o estudo do comportamento de curto prazo com a análise da estática comparativa. Na seção três, estudou-se a estabilidade dinâmica para o modelo em uma configuração em que há uma regra de superávit primário e, posteriormente, para a ausência de tal regra. Na quarta seção, se entendeu o modelo por meio da inserção do prêmio de risco na determinação da taxa de câmbio. Nesse caso, o risco soberano é parte do argumento da função que determina essa taxa. Na sequência, busca-se apresentar projeções orçamentárias fazendo uso dos resultados da restrição orçamentária do governo, comparando os resultados com os valores projetados no Plano Plurianual - PPA: 2016-2019. Por último, chega-se à conclusão e afirma-se que, de modo geral, o modelo sugere que o controle da inflação deve ser o objetivo principal da autoridade monetária em um regime de metas de inflação, e caberia à autoridade fiscal trabalhar com um papel passivo de gerar superávits para estabilizar a dívida pública e garantir sua solvência intertemporal.

2 Risco, juros e dívida: identificando os mecanismos de transmissão do risco da dívida

A seguir, será apresentado um modelo macroeconômico que busca representar hipóteses para uma economia emergente sob o regime de metas de inflação, no qual a coordenação entre as políticas econômicas atua no sentido de minimizar possíveis efeitos nocivos gerados por choques de risco.

Algumas considerações adicionais devem ser feitas antes da apresentação do arcabouço básico do modelo. Considerando que economias com regime de metas de inflação podem estar expostas a choques na taxa de câmbio, uma vez que a flexibilidade cambial é condição necessária na instrumentalização de tal regime monetário - quando há livre mobilidade de capital -, muitos autores incluem em suas análises a taxa de câmbio como variável presente na função-reação do Banco Central. Ball (1999BALL, L. Policy rules for open economies. In: Taylor, J. Monetary Policy Rules, London: The University of Chicago Press, 1999. p. 127-144.), supondo uma economia aberta com um regime monetário do tipo metas de inflação, sugere que a função de reação de uma política monetária ótima deveria contemplar as variáveis taxa de juros, taxa de câmbio e uma medida para a meta de inflação.

No entanto, a análise de Ball (1999BALL, L. Policy rules for open economies. In: Taylor, J. Monetary Policy Rules, London: The University of Chicago Press, 1999. p. 127-144.) padece de algumas limitações quando se trata de economias emergentes, em que a percepção de riscos elevados pode comprometer o objetivo da política monetária. Em economias com essas características, observa-se uma relação positiva entre o prêmio de risco e a taxa de câmbio.1 1 Os trabalhos de Svensson (2000) e Ball (1999) supõem que nos países industrializados o prêmio de risco se comporta como um passeio aleatório, não afetando a condução da política monetária; no caso dos países em desenvolvimento, há uma forte relação entre a percepção de risco na determinação dos fluxos de capitais, gerando efeitos na taxa de câmbio e na inflação. Tal argumento é complementar à definição de economia emergente elaborada anteriormente. Assim, uma função de reação do tipo regra de Taylor poderia elevar a percepção de risco por meio de elevações da taxa de juros e gerar frequentes choques na taxa de câmbio, como discutido em Favero e Giavazzi (2003FAVERO, C.; GIAVAZZI, F. Targeting inflation when debt and risk premia are high: lessons from Brazil. IGIER, BocconiUniversity, May. Mimeo, 2003.) e Blanchard (2004BLANCHARD, O. Fiscal dominance and inflation targeting: lessons from Brazil NBER Working Paper Series. Cambridge, MA: MIT Press, Working Paper 10389, 2004.).

Desse modo, tratando-se de uma economia na qual a fragilidade de algumas variáveis fiscais poderia afetar a conduta da política monetária, em face à relação entre câmbio e prêmio de risco, não seria infundado admitir que bancos centrais reajam à percepção de risco dos agentes.

Tem-se que a magnitude do prêmio de risco envolve as incertezas embutidas no comprometimento de remunerar o título público até o seu vencimento. Portanto, nunca é demais lembrar que os choques a que estão suscetíveis à estrutura a termo da taxa de juros tornam o componente prêmio de risco sujeito a choques expectacionais, tendo em vista que, num ambiente em que a política fiscal não esteja comprometida com a estabilidade da relação (dívida do setor público/PIB), os agentes podem exigir uma taxa de remuneração elevada em função do alto risco de carregar uma dívida com probabilidade de alto risco soberano. Alguns trabalhos levantaram questões semelhantes, tendo como referência a economia brasileira, como por exemplo em Morais e Andrade (2004MORAIS, J. F. M.; ANDRADE, J. P. Como a Dívida Pública Afeta a Política Monetária Ótima? Brasília: ESAF, Monografia premiada em 3º lugar no IX Prêmio Tesouro Nacional, 2004. ) e Matos e Andrade Neto (2015MATOS, P. R. F.; ANDRADE NETO, J. Analyzing COPOM's Decisions. Brazilian Business Review, v. 12, n. 6, p. 24-47, 2015.).

Diante de tais colocações, buscar-se-á desenvolver um modelo com três equações diferenciais simultâneas de primeira ordem, lineares e não-homogêneas, que permita estudar a coordenação entre política fiscal e monetária. O modelo terá como variáveis de longo prazo o prêmio de risco e a taxa de juros nominal, além do comportamento da relação dívida/PIB. Será, portanto, verificado o equilíbrio de longo prazo das variáveis estudadas e sua estabilidade, isto é, se elas convergem, ou não, para seus valores de steady state ao longo do tempo. Em outras palavras, verificar-se-á se o equilíbrio é dinamicamente estável. Cabe destacar que a estabilidade da variável de risco no longo prazo é o resultado desejado para que se garanta a estabilidade macroeconômica e a eficiência da política monetária sob um regime de metas de inflação.

2.1 Um modelo de mecanismos de transmissão do risco soberano

De acordo com a estrutura a termo da taxa de juros, a taxa de rendimento sobre um título de dívida no momento t depende da média da taxa de juros de curto prazo durante o seu prazo de duração n, mais um prêmio de risco correspondente às condições do mercado de tal título. Portanto, a relação entre as taxas de juros de curto e longo prazo pode ser escrita da seguinte forma:

\[{{r}_{nt}}=\frac{{{r}_{t}}+r_{t+1}^{e}+r_{t+3}^{e}+\ldots +r_{t+\left( n-1 \right)}^{e}}{n}+{{R}_{nt}}~\]

Onde rnt denota a taxa real de juros de longo prazo de vencimento do título de dívida, a rt taxa real de juros de curto prazo para o período t, rt e a taxa de juros real esperada para o período t e, por fim, R é o prêmio de risco.

Podemos simplificar a estrutura de prazo até o vencimento da taxa de juros sobre o título da dívida pública da seguinte forma:

\[r={{r}^{e}}+R \] (1)

A equação (1) decompõe a taxa de remuneração dos títulos do governo em dois componentes, o primeiro referente às expectativas da taxa real de juros de curto prazo até o vencimento (rt e) e o segundo, R, é o prêmio de risco, como anunciado anteriormente. Este último expressa o risco a que estão expostos os compradores de títulos.

O prêmio de risco R é uma medida para o risco soberano que captura as incertezas relacionadas ao comprometimento de remunerar o título público até o seu vencimento. Em geral, quanto mais longa a maturidade de um título, maiores serão seus retornos e seus riscos. A percepção dos agentes acerca da magnitude de variação do risco soberano depende da comparação entre um título que remunera a taxa r nt em detrimento de outro título livre de risco, no caso, i. Como i representa a taxa nominal de um título livre de risco,2 2 Em geral, consideram-se títulos livres de riscos para investidores internacionais os T-Bonds emitidos pelo tesouro norte-americano. podemos supor que a variação do risco R no tempo é refletida, portanto, pela diferença entre essas duas taxas, ou seja, pela diferença entre a taxa r e a taxa i. A ideia é que tal diferença entre ambas as taxas é consequência de uma compensação pelo risco exigido pelos agentes, de modo que, no longo prazo, quanto maior essa diferença, maior a variação do risco default no tempo, como mostra a equação diferencial (2) a seguir:

\[\dot{R}=\sigma \left( r-\bar{i} \right)~,~\sigma >0 \] (2)

Sendo assim, o coeficiente σ captaria a sensibilidade do risco soberano R em relação ao diferencial das taxas de retorno de títulos com riscos positivos e títulos livres de risco. Analogamente, o coeficiente capta a aversão ao risco dos agentes econômicos. Espera-se que o coeficiente tenha uma relação direta com a relação dívida/PIB.

A taxa nominal de juros da economia em questão é definida pela taxa real de juros (r) mais a taxa de inflação π, semelhante à regra de Fisher. Tal relação é dada pela equação (3) a seguir:

\[i=r+\pi \] (3)

A equação acima sugere que a taxa nominal de juros pode variar tanto quando há uma mudança da taxa real de juros, quanto há variações na taxa de inflação.

É assumido que a taxa nominal de juros de curto prazo é definida pelo Banco Central (i*), sendo este o principal instrumento de política monetária para guiar a inflação à meta desejada, e se difere de i por ser a taxa básica de juros almejada pela autoridade monetária, ou seja:

\[i={{i}^{*}}\] (4)

Um comportamento de expansão da dívida pública pode também fazer com que a autoridade monetária perca o controle sobre a inflação. Logo, uma meta que leve em conta a relação dívida/PIB e que atenda à restrição orçamentária intertemporal do governo pode ser necessária para o sucesso do regime de metas de inflação. Dessa forma, a função de reação do Banco Central poderia levar em consideração choques fiscais na economia.

Consequentemente, são estabelecidos três fatores que influenciam a decisão do Banco Central ao fixar a taxa nominal de juros intertemporalmente para o caso de uma economia emergente: por um lado, quando a inflação π se desvia da meta π* preestabelecida pela autoridade monetária, ela reage com um aumento da taxa nominal de juros, de forma a conter tal desvio. Por outro lado, como essa taxa é a mesma que remunera os títulos públicos, conforme equação (3), presume-se que a taxa de juro deva reagir a desvios da dívida pública b em relação a uma meta b*, estabelecida conforme as diretrizes de política econômica, com o objetivo de manter a dívida pública sustentável, ou seja, igualar as despesas e receitas do governo atualizadas para o período presente. Nesse sentido, é pressuposto um componente de coordenação de política econômica presente na função-reação da autoridade monetária.

Essa reação da taxa de juros nominal se deve ao fato de que uma possível insolvência da dívida levaria a autoridade monetária a recorrer ao imposto inflacionário, perdendo o controle sobre a taxa inflação. Deve-se também ao fato da dívida pública gerar um efeito autônomo no prêmio de risco (R). O desvio da dívida da meta preestabelecida atua com uma espécie de termômetro para os investidores sobre o risco de inadimplência dos títulos do governo. Lembrando que um incremento no risco soberano pode estabelecer uma fuga de capital e, consequentemente, depreciação cambial, culminando em pressões inflacionárias adicionais por meio do canal do câmbio.

O terceiro componente da função de reação proposta para a autoridade monetária é o diferencial entre as taxas de juros nominal estabelecido pela política monetária i* e a taxa de juros nominal no mercado externo i. Quanto maior esse diferencial, menor a necessidade da autoridade monetária de recorrer a uma política monetária contracionista, tendo em vista que reduções da taxa de juros estrangeira, mantida constante a taxa de juros interna, estimula uma apreciação cambial, o que contribui para a estabilidade dos preços. Busca-se, portanto, captar o efeito indireto da taxa de câmbio sobre a inflação. Dessa forma, o parâmetro µ abaixo faz referência à preocupação do Banco Central em relação a variações na taxa de câmbio. Essa dinâmica é exposta na equação diferencial a seguir, uma adaptação da regra de Taylor (1993TAYLOR, J. B. Discretion versus Policy Rules in Practice. Carnegie-Rochester Conference Series on Public Policy, 39, p. 195-214, 1993.):

\[\frac{di}{dt}=\beta \left( \pi -{{\pi }^{*}} \right)+\alpha \left( b-{{b}^{*}} \right)+\mu \left( {{i}^{*}}-\bar{i} \right),~\beta >0;\alpha >0;\mu >0\] (5)

A sugestão da regra de política monetária descrita acima consiste em uma das principais contribuições deste artigo. Admitido que a regra de Taylor original não é a mais adequada para uma economia emergente, torna-se necessário incluir uma variável fiscal na regra de política monetária conduzida pelo Banco Central. Outra contribuição importante do trabalho será dada na seção 5, quando se identifica o canal pelo qual o risco soberano pode levar à instabilidade macroeconômica.

Uma vez que a equação (4) reflete a natureza exógena de curto prazo da taxa de juros num regime de metas de inflação, apresentando i* como a taxa de juros meta da política monetária, a equação (5) explicita uma regra de política monetária que irá balizar as decisões da autoridade monetária na fixação da taxa básica de juros ao longo de um determinado período. Algumas flutuações da taxa básica de juros podem ocorrer em períodos curtos de tempo, como definido em (4).

Em seguida, a equação (6) exibe a variação da dívida pública ao longo do tempo.

\[\dot{b}=ib+g-t\] (6)

Em que (g) denota os gastos do governo e (t) a sua receita. De tal modo, uma elevação dos juros nominais, i, teria um efeito incremental sobre a dívida, b, assim como déficits primários do setor público (g-t >0).

A taxa de inflação é, à priori, determinada por uma curva de Phillips com expectativas, acrescida do componente câmbio nominal:3 3 Apesar dos trabalhos originais a respeito da Curva de Phillips desprezarem o efeito do câmbio sobre a inflação, diversos trabalhos estimaram empiricamente tal efeito. Limitando-se à economia brasileira, temos: Goldfajn e Werlang (2000), Rigolon (2003) e Correa e Minella (2010).

\[\pi =\tau \left( y-\bar{y} \right)+{{\pi }^{e}}+\theta \left( E \right),~~\tau >0;\theta >0 \] (7)

Em que (y-y) representa o hiato do produto, πe a inflação esperada e E taxa de câmbio nominal.4 4 Para ser mais preciso, a inflação é função da taxa de desvalorização cambial. A equação (9), que denota a paridade da taxa de juros e câmbio também deve ser expressa em termos de desvalorização da taxa de câmbio, assumindo a forma . Porém, tal simplificação não impacta os resultados do modelo.

Aqui, além dos efeitos tradicionais sobre a inflação representados pela curva de Phillips, inclui-se o efeito do câmbio. O efeito de repasse da desvalorização cambial para a inflação, chamado de efeito pass-through, segundo testes empíricos realizados por Goldfajn e Werlang (2000GOLDFAJN, I.; WERLANG, W. The pass-through from depreciation to inflation: a panel study. Banco Central do Brasil working paper series, 2000.) e Correa e Minella (2010CORREA, A. S.; MINELLA, A. Nonlinear mechanisms of the exchange rate pass-through: A Phillips curve model with threshold for Brazil. Revista Brasileira de Economia, Graduate School of Economics, Getúlio Vargas Foundation (Brazil), vol. 64(3), p. 231-243, Sep. 2010.), são mais acentuados em situações em que: i) a economia está em um ciclo de expansão acelerado; ii) a volatilidade cambial é baixa; iii ) há um alto grau de abertura da economia; iv) a taxa inicial de inflação é elevada, principalmente, de acordo com o primeiro trabalho citado, nas economias emergentes; e v) quando o desalinhamento cambial é alto.

No entanto, o componente expectacional (πe) é determinado pelos desvios do produto esperado ye em relação ao produto potencial y, bem como pela diferença entre a taxa de câmbio nominal esperada5 5 Para mais detalhes, ver Gandolfo (1997). e seu nível de equilíbrio (Ee – E*), uma vez que a taxa de câmbio afeta o nível de preço, como citado anteriormente, principalmente quando se encontra acima de um valor de equilíbrio. Assim, tem-se:

\[{{\pi }^{e}}=\varnothing \left( {{y}^{e}}-\bar{y} \right)+\kappa \left( {{E}^{e}}-{{E}^{*}} \right),~\varnothing >0;\kappa >0 \] (8)

A ideia subjacente ao componente expectacional é a de que os agentes fazem suas previsões acerca da tendência da taxa de inflação observando o equilíbrio entre oferta e demanda agregada. Incorpora-se, ainda, nas suas expectativas, as previsões para a taxa de câmbio, uma importante variável na composição dos preços. Na hipótese de expectativas racionais, os agentes fazem uma previsão sobre o comportamento do produto, esperando que, na ausência de um choque exógeno, o produto observado seja igual ao potencial e o câmbio esperado seja igual ao de equilíbrio. Por conta disso, assumindo que ye = y e E=E* pode-se substituir (8) em (7) e chegar a uma curva de Phillips com o seguinte formato:

\[\pi =\tau \left( y-\bar{y} \right)+\theta \left( E \right)\] (7.1)

Na determinação da taxa de câmbio real, “e”, é assumido, por simplificação, equilíbrio entre os preços internos e externos (p=p*). Sendo assim, a taxa de câmbio é determinada pela paridade da taxa de juros, conforme a equação (9):

\[E={{E}^{*}}=e=\rho \left( {{i}^{*}}-\bar{i} \right),\rho <0\] (9)

A demanda agregada, por sua vez, é composta pela função consumo, pela função investimento, pelos gastos do governo e saldo da balança comercial, de acordo com a equação (10). Desse modo, tem-se uma curva IS para economia aberta como a seguir:

\[y=c\left( y \right)+I\left( i \right)+g+x\left( E \right),~{{c}_{y}}>0,{{I}_{i}}\left\langle 0,{{x}_{e}} \right\rangle 0\] (10)

2.2 Análise de curto prazo: um estudo de estática comparativa

Será feita a seguir uma análise de estática comparativa com o objetivo de inferir algumas relações de curto prazo entre as variáveis chaves para o modelo.

Substituindo (4) em (10), teremos:

\[y=\left( \frac{{{I}_{i}}}{1-{{c}_{y}}} \right){{i}^{*}}+\left( \frac{1}{1-{{c}_{y}}} \right)g+\left( \frac{{{X}_{e}}}{1-{{c}_{y}}} \right)E~\] (10.1)

Como a inflação é função da renda, substitui-se a equação (10.1), em (7.1), obtendo o seguinte comportamento para a inflação:

\[\pi =\left( \frac{\tau {{I}_{i}}}{1-{{c}_{y}}} \right){{i}^{*}}+\left( \frac{\tau }{1-{{c}_{y}}} \right)g+\left( \frac{\tau {{X}_{e}}}{1-{{c}_{y}}}+\theta \right)E-\tau \bar{Y} \] (7.2)

Inserindo as equações (1) e (4) em (3), o resultado em (7.2) e posteriormente inserindo (9) no resultado final, tem-se:

\[ \pi =\left( \frac{\left( \frac{\tau {{I}_{i}}}{1-{{c}_{y}}} \right)}{v}+\frac{\left( \theta +\frac{\tau {{X}_{e}}}{1-{{c}_{y}}} \right)}{v}\left( \rho \right) \right)R+\left( \frac{\left( \frac{\tau {{I}_{i}}}{1-{{c}_{y}}} \right)}{v}+\frac{\left( \theta +\frac{\tau {{X}_{e}}}{1-{{c}_{y}}} \right)}{v}\rho \right){{r}^{e}}-\frac{\left( \theta +\frac{\tau {{X}_{e}}}{1-{{c}_{y}}} \right)}{v}i\rho ++\frac{\left( \frac{\tau }{1-{{c}_{y}}} \right)}{v}g-\frac{\tau }{v}\bar{Y} \] (7.3)

Em que \[ \text{ }\!\!~\!\!\text{ }v=1-\left( \frac{\tau {{I}_{i}}}{1-c{{\text{ }\!\!~\!\!\text{ }}_{v}}} \right)+\left( \theta +\frac{\tau {{X}_{e}}}{1-{{c}_{v}}} \right)\rho >0 \].

De (7.3), pode-se extrair a derivada que indica o impacto de curto prazo do risco sobre a inflação:

\[ \frac{\partial \pi }{\partial R}=\frac{\left( \frac{\tau {{I}_{i}}}{1-{{c}_{y}}} \right)}{v}+\frac{\left( \theta +\frac{\tau {{X}_{e}}}{1-{{c}_{y}}} \right)}{v}\left( \rho \right)<0\] (7.3.1)

Conclui-se, pela derivada acima, que existe uma relação negativa no curto prazo entre a inflação e o risco. A variável de risco é um dos componentes da taxa de juros de curto prazo, conforme demonstrado em (1). Assim, uma vez que é observada uma elevação no risco soberano, tem-se uma pressão sobre a taxa de juros que comprime a demanda agregada e, por consequência, reduz a inflação. É importante ressaltar que o risco é uma variável que pode levar à macroeconômica, fazendo com que a autoridade monetária perca o controle sobre a meta de inflação.

A Figura 1, a seguir, ilustra o canal de transmissão do risco sobre a inflação. Uma vez que se tem o aumento no risco, há uma elevação da taxa de juros que remunera os títulos públicos para que se garanta a demanda por parte dos investidores internacionais. Como consequência, observa-se uma redução na demanda agregada e finalmente, uma redução da inflação.

Figura 1:
Fluxograma1 - Canal de transmissão do risco sobre a inflação

Para se estudar o efeito de mudanças no risco sobre a dívida pública, é necessário definir uma função para esta variável. Assim, insere-se (3) em (6), de tal forma que:

\[ g-t=\left( r+\pi \right)b\] (6.1)

E, posteriormente, substituindo (1) em (6.1), observa-se:

\[ g-t=\left( {{r}^{e}}+R+\pi \right)b\] (6.2)

Dado que o comportamento da inflação foi descrito em (7.3), se substituirmos esta em (6.2) e isolarmos b, encontramos o seguinte comportamento para a dívida pública:

\[b=\frac{g-t}{\left\{ \left( 1+\frac{\left( \frac{\tau {{I}_{i}}}{1-{{c}_{y}}} \right)}{v}+\frac{\left( \theta +\frac{\tau {{X}_{e}}}{1-{{c}_{y}}} \right)}{v}\rho \right)R+\left( 1+\frac{\left( \frac{\tau {{I}_{i}}}{1-{{c}_{y}}} \right)}{v}+\frac{\left( \theta +\frac{\tau {{X}_{e}}}{1-{{c}_{y}}} \right)}{v}\rho \right){{r}^{e}}+\frac{\left( \frac{\tau }{1-{{c}_{y}}} \right)}{v}g-\frac{\left( \theta +\frac{\tau {{X}_{e}}}{1-{{c}_{y}}} \right)}{v}i\rho -\frac{\tau }{v}\bar{Y} \right\}}\] (6.3)

Pelos resultados da estática comparativa, pode-se analisar o efeito de um aumento marginal no componente de risco sobre o comportamento da dívida pública. A seguir, tem-se a derivada da dívida pública em relação ao risco, seguida de algumas manipulações algébricas.

\[\frac{\partial b}{\partial R}=\frac{\left( g-t \right)\left( 1+\frac{\left( \frac{\tau {{I}_{i}}}{1-{{c}_{y}}} \right)}{v}+\frac{\left( \theta +\frac{\tau {{X}_{e}}}{1-{{c}_{y}}} \right)}{v}\left( \rho \right) \right)}{{{i}^{2}}}~\] (6.3.1)

,> 0 para g>t ou, < 0 para t>g;

Rearranjando algebricamente e considerando a propensão marginal a poupar como s = 1-cy, podemos reescrever a derivada acima como:

\[\frac{\partial b}{\partial R}=\frac{\left( g-t \right)\left( 1+\frac{\tau {{I}_{i}}}{\left( s-\tau {{I}_{i}} \right)}+\frac{\theta +\tau {{X}_{e}}}{\left( s-\tau {{I}_{i}} \right)}\left( \rho \right) \right)}{{{i}^{2}}}\] (6.3.2)

A Figura 2 abaixo ilustra o mecanismo de transmissão do risco sobre a dívida pública quando ocorre um superávit primário. Assim, um aumento do risco gera uma elevação da taxa de juros devido às exigências dos investidores, e, consequentemente, a um aumento da dívida pública.

Figura 2:
Fluxograma 2 - Canal de transmissão do risco sobre a dívida pública

O impacto da variável de risco sobre a dívida pública vai depender do resultado primário das contas do governo. Caso ocorra um superávit e, portanto, a receita do governo supere seus gastos, tem-se um efeito positivo do risco sobre o comportamento da dívida pública. Caso contrário, isto é, caso ocorra um déficit primário, o impacto do risco sobre a dívida pública será negativo.

Além das considerações acima, tem-se que a magnitude do impacto do risco sobre a dívida será menor quanto maior for a propensão marginal a poupar e quanto maior for a taxa de juros. Esses resultados são coerentes com a teoria macroeconômica.

Há, pelo canal de transmissão do superávit primário, uma relação ambígua entre risco e dívida pública que necessita ser explicitada com maiores detalhes: no caso de um superávit primário, um choque no risco é seguido por um aumento da taxa de juros nominal, como pode ser observado pelas equações (1) e (3). Consequentemente, como indicado pela equação (6), há uma elevação da dívida pública.

Por outro lado, se há um déficit primário, esse pressiona a inflação. Dado que a inflação foi elevada devido ao déficit, de acordo com a regra de política monetária (5) a taxa de juros se encontra em um patamar elevado. Sendo assim, um choque no risco teria um efeito menor sobre os juros e, consequentemente, sobre a dívida pública.

3 Equilíbrio de longo prazo e regra de política fiscal

Após ser exposta a estrutura básica do modelo e as relações de curto prazo por meio das derivadas parciais, será estudado o equilíbrio de longo prazo. Para isso, serão utilizadas as ferramentas e técnicas matemáticas adequadas para o estudo das condições que garantam a estabilidade assintótica do equilíbrio dinâmico de um sistema de equações diferenciais, como o que configura o modelo teórico apresentado. Essas relações estão de acordo com as esboçadas em Chiang e Wainwrigth (2006CHIANG, A. C.; WAINWRIGHT, K. Matemática para Economistas. Rio de Janeiro: Elsevier, 2006.), Gandolfo (1997GANDOLFO, G. Economic Dynamics. Nova York: Springer Study Edition, 1997.).

3.1 Comportamento de longo prazo para o modelo com regra de superávit primário

Com base nos resultados das estáticas comparativas de curto prazo, pode-se agora estabelecer como se configura a dinâmica de longo prazo do modelo. Na presente seção, busca-se obter uma regra de coordenação entre políticas macroeconômicas. O modelo apresenta, inicialmente, três equações diferenciais. São elas:

\[\dot{R}=\sigma \left( r-\bar{i} \right)~,~\sigma >0\] (2)

\[\frac{di}{dt}=\beta \left( \pi -{{\pi }^{*}} \right)+\alpha \left( b-{{b}^{*}} \right)+\mu \left( {{i}^{*}}-\bar{i} \right),~\beta >0;\alpha >0;\mu >0\] (5)

\[\dot{b}=ib+g-t\] (6)

Isolando r na equação (3) e substituindo o resultado em (2), pode-se observar a equação diferencial que dará a variação do risco soberano ao longo do tempo. Tem-se, portanto:

\[\dot{R}=\sigma \left( {{i}^{*}}-\pi -\bar{i} \right)\] (2.1)

O equilíbrio do modelo requer, a princípio, um sistema (3X3). No entanto, assume-se uma dinâmica de steady-state para a dívida pública, a qual permite tomar como nulo o movimento da dívida ao longo do tempo, isto é, a autoridade fiscal segue uma regra em que se comporta de maneira passiva, evitando incorrer em déficits fiscais. Assim, tem-se que:

\[ib=g-t=0\] (6*)

Em outras palavras, supõe-se uma regra de política fiscal em que exista um superávit primário suficiente para cobrir os encargos com o serviço da dívida pública, mantendo, portanto, a estabilidade intertemporal da dívida. Tal manobra permite que o modelo, outrora contendo três funções diferenciais, possa ser descrito como um sistema de duas equações dinâmicas.

De tal modo, em seguida, pode-se reescrever (2.1) e (5) da seguinte forma:

\[\dot{R}=\sigma \left( {{i}^{*}}-\bar{i}-\pi \left( R,i \right) \right)\] (2*)

\[\frac{di}{dt}=\beta \left( \pi \left( R,i \right)-\pi {{~}^{*}} \right)+\alpha \left( b\left( R,i \right)-{{b}^{*}} \right)+\mu \left( {{i}^{*}}\left( R,i \right)-\bar{i} \right)\] (5*)

Passa-se então a um sistema (2X2), em que o equilíbrio será extraído das equações (2.1) e (5). Assim sendo, em equilíbrio (stady-state), tem-se:

\[\dot{R}=0\Rightarrow \pi \left( R,i \right)={{i}^{*}}-\bar{i}~\]

\[\frac{\partial i}{\partial t}=0\Rightarrow \pi \left( R,i \right)=\pi {{~}^{*}}+\left( \frac{-\alpha \left( b\left( R,i \right)-{{b}^{*}} \right)+\mu \left( {{i}^{*}}\left( R,i \right)-\bar{i} \right)}{\beta } \right)\]

Linearizando o sistema por meio de uma expansão de Taylor, em torno da sua posição de equilíbrio, tem-se:

\[\frac{\partial R}{\partial t}=\sigma \left( -\frac{\partial \pi }{\partial R} \right)\left( {{R}_{*}}-{{R}_{0}} \right)+\sigma \left( {{i}_{*}}-{{i}_{0}} \right)\] (12)

\[ \frac{\partial i}{\partial t}=\left( \beta \frac{\partial \pi }{\partial R}+\alpha \frac{\partial b}{\partial R} \right)\left( {{R}_{*}}-{{R}_{0}} \right)+\mu \left( {{i}_{*}}-{{i}_{0}} \right)\] (13)

Escrevendo os resultados em notação matricial:

R t i t = σ ( - π R σ β π R + α b R μ ( R . - R 0 i . - i 0 (14)

A condição necessária e suficiente para que o equilíbrio de um sistema dinâmico com duas dimensões seja assintoticamente estável (os dois autovalores da solução do sistema tenham partes reais negativas) é que o traço e o determinante da Matriz Jacobiana sejam negativo e positivo, respectivamente.6 6 Para mais detalhes, ver Gandolfo (1997).

Assim, observa-se que:

\[Traco:\sigma \left( -\frac{\partial \pi }{\partial R} \right)+\mu =?\]

\[Det:\sigma \left( -\frac{\partial \pi }{\partial R} \right)\mu -\sigma \left( \beta \frac{\partial \pi }{\partial R}+\alpha \frac{\partial b}{\partial R} \right)\]

Para que as condições de estabilidade do equilíbrio sejam atendidas, será necessário que \[ \left| \mu \right|>\left| ~\sigma \left( -\frac{\partial \pi }{\partial R} \right) \right| \]. Então, o traço será negativo.

Em síntese, a primeira condição para a estabilidade indica que a sensibilidade da taxa de juros nominal em relação ao diferencial de juros deve ser maior do que o produto do impacto do risco sobre a inflação e da sensibilidade do risco em relação ao diferencial de juros, ambos em módulo. Tem-se, portanto, dois canais que atuam sobre a estabilidade macroeconômica: i) o canal da taxa de câmbio, que atua levando à estabilidade, representado por μ; e ii) o canal do risco, que atua levando a uma instabilidade, representado por \[ \sigma \left( -\frac{\partial \pi }{\partial R} \right) \].

Tal relação é esperada, haja vista que, por um lado, uma redução da taxa de juros externa valoriza a taxa de câmbio, contendo pressões inflacionárias dadas por esse canal, diminuindo, portanto, a necessidade de elevar a taxa de juros de curto prazo para que se atinja a meta de inflação estipulada pela autoridade monetária, de acordo com a equação (5). Por outro lado, a redução da taxa externa de juros tem impacto sobre o risco, medido por σ, de acordo com a equação (2). Por sua vez, caso este impacto seja elevado, irá exigir um significativo aumento da taxa de juros interna, como pode ser observado em (1), prejudicando a estabilidade da variável i.

Deve-se considerar ainda que se o impacto negativo do risco sobre a taxa de inflação (de acordo com o modelo, um aumento do risco seria acompanhado de um aumento da taxa de juros que remunera os títulos públicos para garantir a solvência da dívida, pressionando a redução da inflação) possuir magnitude muito elevada, poderia haver também um aumento significativo na taxa nominal de juros.

Para que o traço \[ \sigma \left( -\frac{\partial \pi }{\partial R} \right)+\mu \] seja negativo, é necessário que \[ \left| \mu \right|>\left| ~\sigma \left( -\frac{\partial \pi }{\partial R} \right) \right| \].

Outra forma de se pensar tal relação é admitindo-se a hipótese de que há uma relação direta entre a relação Dívida/PIB e o coeficiente σ, considerando que esse coeficiente mensura a desconfiança do credor em relação à capacidade de pagamento do governo.

Desse modo, um dos canais pelo qual um efeito explosivo sobre o risco poderia se propagar é o da dívida pública, uma vez que o aumento da taxa de juros eleva o serviço da dívida, aumentando a desconfiança do credor em relação à capacidade de pagamento do governo. Assim, uma política fiscal que levasse em conta a capacidade de solvência da dívida pública poderia auxiliar na estabilidade da economia.

Tendo que a política fiscal foi destacada como um possível instrumento para se alcançar a estabilidade do modelo, torna-se relevante analisar os possíveis canais de transmissão desta política em relação às variáveis em que a estabilidade está sendo estudada.

Uma política superavitária impede o aumento da dívida pública ao longo do tempo, estabilizando a probabilidade de default e, por consequência, a taxa de juros de longo prazo (fluxograma 3).

Figura 3:
Fluxograma 3 - Canal 1 de transmissão da política fiscal

Um segundo canal de transmissão da política fiscal é o de que uma contenção dos gastos públicos amortece impactos sobre a demanda agregada. Tal fator exerce um efeito de redução da inflação, o que possibilita uma diminuição da taxa de juros usada como instrumento de política monetária para guiar a inflação em direção à meta desejada, além de reduzir aumentos no serviço da dívida pública (fluxograma 4). Haveria, portanto, dois possíveis efeitos explicitados pelo fluxograma abaixo.

Figura 4:
Fluxograma 4 - Canal 2 de transmissão da política fiscal

O determinante, por sua vez, pode ser reescrito como se segue:

D e t : - σ π R μ + β + α b R

Sendo assim, uma vez que se assumiu a hipótese de superávit primário e se tem \[ \frac{\partial b}{\partial R}>0 \] pode-se deduzir que β>µ é uma condição necessária para a estabilidade do equilíbrio dinâmico do modelo.

Dado que tais coeficientes indicam a sensibilidade da taxa nominal de juros, respectivamente à variação da inflação e à variação do diferencial de juros, conforme expresso em (5), essa condição é condizente com o que se espera no modelo. Isto porque se considera em um regime de metas de inflação que o controle do nível de preços deve ser o objetivo mais importante na determinação dos instrumentos de política monetária.

Em resumo, para que ocorra a estabilidade do equilíbrio dinâmico do modelo, quando há uma regra fiscal de superávit primário, tem-se que: i) a taxa básica de juros deve ser mais sensível à desvalorização da taxa de câmbio do que a um aumento do risco; ii) é desejável manter uma configuração fiscal que estabilize a confiança dos investidores externos em relação à capacidade de solvência da dívida pública, que é refletida por α e; iii) a autoridade monetária deve estar mais preocupada com possíveis desvios da inflação em relação à sua meta do que com a taxa de câmbio, quando operacionaliza a política monetária.

3.2. Estendendo o modelo: considerando uma política fiscal discricionária

Estendendo o modelo, abre-se mão da hipótese de steady-state para a dívida pública. Nesse caso, diferentemente do modelo anterior, a equação (6) faria parte da análise de equilíbrio dinâmico de longo prazo. Em outras palavras, o equilíbrio fiscal entre receitas e despesas do setor público não estaria assegurado no modelo.

Assim, para estudar o equilíbrio de longo prazo do sistema de equações diferenciais, é necessário voltar a atenção também para a estabilidade do equilíbrio dinâmico da dívida pública. Então, teríamos o seguinte conjunto de equações dinâmicas:

\[\dot{R}=\sigma \left( {{i}^{*}}-\pi -\bar{i} \right)\] (2.1)

\[\frac{di}{dt}=\beta \left( \pi -{{\pi }^{*}} \right)+\alpha \left( b-{{b}^{*}} \right)+\mu \left( {{i}^{*}}-\bar{i} \right),~\beta >0;\alpha >0;\mu >0\] (5)

\[ \dot{b}=ib+g-t\] (6)

Em seguida, pode-se reescrever o sistema (2.1), (5) e (6) da seguinte forma:

R ˙ = σ [ i . - i - - π R , i , b ]

d i d t = β π R , i , b - π + α b R , i , b - b + μ [ i R , i , b - i - ]

\[\dot{b}=ib\left( R,i,b \right)+g-t\]

Em equilíbrio, tem-se:

\[\dot{R}=0\Rightarrow \pi \left( R,i,b \right)={{i}^{*}}-\bar{i}\] (2**)

\[\frac{\partial i}{\partial t}=0\Rightarrow \pi \left( R,i,b \right)=\pi^{*}+\left( \frac{-\alpha \left[ b\left( R,i,b^* \right)-b^* \right]+\mu \left[i^* \left( R,i,b \right)-\bar{i} \right]}{\beta } \right) \] (5**)

\[\dot{b}=0\Rightarrow b\left( R,i,b \right)=\frac{g-t}{i} \] (6**)

Linearizando tal sistema em torno da sua posição de equilíbrio por meio de uma expansão de Taylor:

\[\frac{\partial R}{\partial t}=\sigma \left( -\frac{\partial \pi }{\partial R} \right)\left( {{R}_{*}}-{{R}_{0}} \right)+\sigma \left( {{i}_{*}}-{{i}_{0}} \right) \] (15)

i t = β π R ( R . - R 0 ) + α b i + μ ( i . - i 0 ) (16)

\[\frac{\partial b}{\partial t}=i\left( {{i}_{*}}-{{i}_{0}} \right)+b\left( {{b}_{*}}-b \right)\] (17)

No formato matricial, tem-se:

R ˙ i t b ˙ = σ - π R σ 0 β - π R π 0 0 b i ( R . - R 0 ( i . - i 0 ) ( b . - b 0 ) (18)

A equação característica associada ao sistema é representada por:

λ 3 + λ 2 σ - π R + ( μ + i ) - λ σ - π R μ + i + μ i - σ β π R + - σ π R μ i - σ π R μ β = 0 (19)

Utilizando o critério Routh-Hurwitz7 7 A respeito do o critério Routh-Hurwitz, ver Gandolfo(1997). para polinômios do terceiro grau no intuito de verificar a estabilidade do sistema, tem-se:

\[{{\lambda }^{3}}+{{\alpha }_{1}}{{\lambda }^{2}}+~{{\alpha }_{2}}\lambda +{{\alpha }_{3}}=0\text{ }\!\!~\!\!\text{ }\] (20)

Para que o sistema 15-17 seja estável, é necessário que as seguintes condições sejam atendidas:

\[{{\alpha }_{1}}>0\]

\[{{\alpha }_{1}}{{\alpha }_{2}}-{{\alpha }_{0}}{{\alpha }_{3}}>0\]

\[{{\alpha }_{3}}\left( {{\alpha }_{1}}{{\alpha }_{2}}-{{\alpha }_{0}}{{\alpha }_{3}} \right)>0\] (21)

Analisando as condições de estabilidade, tem-se que:

  1. Para α1 >0 , a seguinte condição deve ser satisfeita: \[ \sigma \left( -\frac{\partial \pi }{\partial R} \right)+i>\mu \] , lembrando que μ<0.

  2. Reescrevendo \[ {{\alpha }_{2}}=\left[ \mu i-\sigma \left( \frac{\partial \pi }{\partial R} \right)(i+\mu +\beta \right] \], para que o termo seja positivo, necessariamente, tem-se que (i+β>μ) , uma condição razoável de se esperar, uma vez que ao manipular a taxa nominal de juros, a autoridade monetária, em um regime de metas de inflação, deve se ater principalmente à variação da taxa de inflação em torno de sua meta. Sabe-se que no presente modelo essa resposta é mensurada pelo coeficiente β.

  3. Como feito anteriormente, pode-se reescrever \[ {{\alpha }_{3}}=-\sigma \frac{\partial \pi }{\partial R}i\left( \mu +\beta \right) \], que por sua vez será positivo se consideramos a condição de que β>µ, como dito anteriormente.

  4. Sendo aceitas as condições i, ii e iii e sabendo que α0 = -1, tem-se aceita a estabilidade do modelo.

As condições para que o modelo seja estável dependem de alguma forma do valor do parâmetro μ que, por seu turno, trata-se do coeficiente de sensibilidade da taxa de juros utilizada como regra para a política monetária em relação ao diferencial da taxa de juros, interna e externa.

Analisando a condição de estabilidade de i, diferentemente do caso anterior, em que há uma regra de política fiscal de déficit primário zero (e era necessário que \[ | \frac{\partial \pi }{\partial R}\sigma | \le | \mu | \]), no presente caso, em que há uma ausência de tal regra, admite-se a possibilidade de \[ \left| \frac{\partial \pi }{\partial R}\sigma +i \right|>\left| \mu \right| \]. Uma explicação plausível para tal fenômeno seria a de que com uma política fiscal discricionária um aumento do diferencial de juros não promoveria as condições necessárias para a apreciação da taxa de câmbio, devido à desconfiança dos investidores internacionais em relação à condição de solvência do governo.

Dessa forma, o coeficiente μ teria uma importância irrisória frente à necessidade de se elevar a taxa de juros para tornar atrativos os títulos da dívida pública e manter o equilíbrio estável. Em outras palavras, o coeficiente σ seria muito alto devido à falta de confiança dos investidores, havendo um impacto positivo sobre a taxa de juros em uma magnitude suficiente para que estes retenham os títulos em seus portfólios.

Em suma, nesse caso, ao contrário do que foi posto na seção anterior, para que se mantenha a estabilidade assintótica do equilíbrio dinâmico do modelo diante de um choque de risco, a autoridade, objetivando manter a estabilidade da economia, teria que elevar fortemente a taxa de juros até o ponto em que \[ \left| \frac{\partial \pi }{\partial R}\sigma +i \right|>\left| \mu \right| \].

Também é necessária a condição de que β>µ para garantir a estabilidade do sistema dinâmico. Ambos os parâmetros dizem respeito à regra de política monetária estabelecida na equação (5). Sendo mais preciso, β e µ representam, respectivamente, a preferência da autoridade monetária em relação a manter a inflação no nível da meta preestabelecida e a resposta dada às mudanças no diferencial de juros interno e externo.

Como é de se esperar, em um regime de metas de inflação, o objetivo principal da autoridade monetária deve ser manter a inflação estável a um valor preestabelecido (meta). Sendo assim, é razoável imaginar que o Banco Central, ao definir a taxa nominal de juros, estará dando peso maior para o desvio da inflação em relação à meta do que ao diferencial de juros.8 8 O impacto medido por μ sobre a definição da taxa de juros vai depender do quanto a taxa de inflação é sensível à taxa de câmbio. Dessa forma, quanto mais dependentes forem os índices de preços de produtos importados, maior será o parâmetro em questão.

Como vimos anteriormente, para que o modelo seja estável, tem-se que 0>μ>-1, por outro lado, baseando-se na regra de Taylor, tem-se que β>1. O valor desse parâmetro se dá pelo motivo de que quando o Banco Central busca elevar a taxa de juros com o objetivo de conter a inflação, ele deve focar na taxa real e não da nominal (apesar de controlar indiretamente a segunda), assim, dado a regra de Fisher, deve-se aumentar a taxa de juros nominal em um valor maior do que o desvio da inflação da meta.

É interessante chamar a atenção para o fato de que na ausência de uma regra fiscal, o diferencial de juros, que impacta o câmbio no longo prazo, como será visto a seguir, perde relevância na regra de política monetária. Trata-se também de uma condição plausível, considerando-se a expectativa do aumento do risco e a necessidade de atrair capitais para financiar a dívida.

4 Estendendo o modelo: a taxa nominal de câmbio sob efeitos do risco soberano

No modelo anterior, a taxa de câmbio foi apresentada como uma função do diferencial de juros. Porém, em uma economia emergente, o risco soberano é uma importante variável para a determinação do câmbio, existindo, portanto, um efeito indireto do risco sobre a inflação. Sendo assim, uma forma do Banco Central perder o controle da política monetária8 8 O impacto medido por μ sobre a definição da taxa de juros vai depender do quanto a taxa de inflação é sensível à taxa de câmbio. Dessa forma, quanto mais dependentes forem os índices de preços de produtos importados, maior será o parâmetro em questão. é dada pelo canal do câmbio, que, por sua vez, pode ser afetado pelo risco.

4.1 O comportamento de curto prazo do modelo com taxa de câmbio sob efeito do risco soberano: a análise da estática comparativa

Esta parte do trabalho será destinada a analisar o comportamento do equilíbrio intertemporal das funções dinâmicas do modelo econômico apresentado anteriormente, em uma situação em que o câmbio é influenciado pelo risco soberano. Para isso, a equação (9), que denota a taxa de câmbio, passa a ser representada da seguinte maneira:

\[E=\rho \left( {{i}^{*}}-\bar{i} \right)+\gamma R~~~~~~~~~\rho \left\langle 0;\gamma \right\rangle 0\] (9.1)

Onde ρ mede a sensibilidade da taxa de câmbio em relação à diferença entre a taxa de juros interna e externa e γ mede a elasticidade risco da taxa de câmbio. Este parâmetro, por sua vez, também pode ser considerado uma medida do grau de aversão ao risco por parte dos investidores internacionais, assim como σ, já que para um dado risco, quanto maior for γ menos dispostos estarão tais investidores a compor seus portfólios com títulos domésticos, decorrendo em uma menor oferta de divisas e maior depreciação cambial. Espera-se também, baseando-se em Blanchard (2004BLANCHARD, O. Fiscal dominance and inflation targeting: lessons from Brazil NBER Working Paper Series. Cambridge, MA: MIT Press, Working Paper 10389, 2004.), que γ responda positivamente a incrementos na relação Dívida/PIB.

Uma função semelhante à que foi exposta acima foi empiricamente estimada em Blanchard (2004BLANCHARD, O. Fiscal dominance and inflation targeting: lessons from Brazil NBER Working Paper Series. Cambridge, MA: MIT Press, Working Paper 10389, 2004.), apresentando um efeito esperado e de magnitude elevada do componente risco sobre a taxa de câmbio. Resultados semelhantes foram encontrados em Favero e Giavazzi (2003FAVERO, C.; GIAVAZZI, F. Targeting inflation when debt and risk premia are high: lessons from Brazil. IGIER, BocconiUniversity, May. Mimeo, 2003.).

Na sequência, considere-se a curva de Phillips apresentada da seguinte forma:

\[\pi =\tau \left( y-\bar{y}~ \right)+\theta \left( E \right)\] (7.1)

Substituindo a curva IS apresentada em (10.1) e em (7.1), e substituindo (1) e (4) em (3) - para obter, i* = (re +R) + π - e inserindo o resultado na curva de Phillips, juntamente com a função do câmbio (9.1), tem-se o seguinte comportamento para a inflação após se rearranjar a função:

π = τ I i 1 - c y v + θ + τ X e 1 - c y v ( ρ + γ ) R + τ I i 1 - c y v + θ + τ X e 1 - c y v ρ r e - θ + τ X e 1 - c y v i ρ + τ 1 - c y v g - τ v Y - (7.4)

Em que

v = 1 - τ I i 1 - c y + θ + τ X e 1 - c y ρ > 1

De onde se pode extrair a seguinte derivada parcial:

\[ \frac{\partial \pi }{\partial R}=\frac{\left( \frac{\tau {{I}_{i}}}{1-{{c}_{y}}} \right)}{v}+\frac{\left( \theta +\frac{\tau {{X}_{e}}}{1-{{c}_{y}}} \right)}{v}\left( \rho +\gamma \right)\] (7.3.2)

Há uma ambiguidade no sinal de tal derivada parcial, uma vez que ela deve ser negativa em condições normais ou positiva em casos extremos, em que γ - o parâmetro que representa elasticidade do risco sobre o comportamento da taxa de câmbio - apresenta valores demasiadamente elevados.

Em outras palavras, a derivada vai ter sinal oposto ao expresso anteriormente no modelo se tivermos γ>ρ. Isso pode ocorrer porque para uma alta aversão ao risco, um aumento da taxa de juros pode não ser suficiente para conter a inflação, uma vez que uma fuga de capital pode pressionar o nível de preços por meio do canal de transmissão do câmbio.

Analogamente, será inserido o efeito do câmbio, dado na função (9.1), sobre a restrição intertemporal do governo, representada pela função (6.3). Assim, considerando que a restrição orçamentária do governo é dada por:

\[ g-t=\left( {{r}^{e}}+R+\pi \right)b\] (6.3)

Inserindo (7.4) em (6.3) e resolvendo para o nível da dívida pública, tem-se:

b - g - t 1 + τ I i 1 - c y v + θ + τ X e 1 - c y v ρ + γ R + 1 + τ I i 1 - c y v + θ + τ X e 1 - c y v ρ r e + + 1 + τ 1 - c y v g - θ + τ X e 1 - c y v i ρ - τ v Y - ) (6.5)

Para se analisar o efeito de um aumento marginal no risco sobre o comportamento da dívida pública, extrai-se a seguinte derivada parcial:

b R = ( t - g ) 1 + τ I i 1 - c y v + θ + τ X e 1 - c y v ρ + γ i 2 (6.3.2)

> 0 para t>g e <0 para t<g

A derivada acima, que indica a elasticidade risco da dívida pública, será positiva caso haja um superávit primário e negativa no caso de um déficit, a exemplo do que ocorre na seção 3.2.

Pode-se notar, todavia, que quando se inclui o risco como variável que explica a taxa de câmbio, é admissível se esperar efeitos não previstos sob a configuração anterior do modelo. Ou seja, mais uma vez, se γ>ρ, a derivada pode ter seu sinal alterado em relação ao esperado.

4.2 Equilíbrio de longo prazo e estabilidade para o Modelo com taxa de câmbio sob efeitos do risco soberano

Seguindo o exemplo que foi efeito na seção 4.1, será estudada a estabilidade do equilíbrio de longo prazo para o modelo com regra fiscal de superávit primário, considerando, porém, a hipótese da taxa explicada pelo componente de risco. O equilíbrio, como anteriormente, é representado abaixo:

\[\dot{R}=0\Rightarrow \pi \left( R,i \right)={{i}^{*}}-\bar{i}\]

i t = 0 π R , i = π + - α b R , i - b + μ [ i R , i - i - β

Na forma matricial, temos novamente a matriz jacobiana encontrada na seção 4.1, porém, agora, com um câmbio influenciado pelo risco, podem ser apresentados resultados diferentes dos esperados.

R t i t = σ - π R σ β π R + α b R μ ( R . - R 0 ) ( i . - i 0 ) (14)

A estabilidade do modelo dependerá dos sinais do traço e do determinante da matriz.

\[Traco:\sigma \left( -\frac{\partial \pi }{\partial R} \right)+\mu =?\]

D e t : - σ π R π + β + α b R = ?

O que diferencia essa configuração do modelo da situação observada anteriormente é que agora a estabilidade sofrerá influência do efeito do risco sobre a taxa de câmbio. Mesmo ocorrendo um superávit primário, que possibilitaria o equilíbrio assintoticamente estável do modelo anterior, uma aversão ao risco muito elevada, medida pelo parâmetro γ, pode levar à instabilidade diante de um choque exógeno gerado pelo aumento do próprio risco.

Neste caso, determinante da matriz jacobiana pode ser negativo caso γ>ρ, uma vez que nessa situação as derivadas parciais que mensuram o impacto do risco sobre a inflação e sobre a dívida pública podem apresentar sinais diferentes do esperado. Como foi dito, para um nível muito alto de aversão ao risco, um choque no componente de risco pode levar a uma desvalorização cambial que pressionaria a taxa de inflação e levaria à instabilidade do modelo.

Realizando o mesmo exercício para um modelo sem regra de superávit primário, tem-se novamente uma matriz jacobiana 3x3, como segue:

R ˙ i t b ˙ = σ - π R σ 0 β π R μ 0 0 b i ( R . - R 0 ) ( i . - i 0 ) ( b . - b 0 ) (18)

Utilizando novamente o critério Routh-Hurwitz para verificar a estabilidade do sistema, como realizado na seção 4.2, uma vez que a derivada \[ \left( \frac{\partial \pi }{\partial R} \right) \] é determinante para o equilíbrio, fica claro que o efeito do risco sobre o câmbio desempenha o papel de um mecanismo que pode levar à instabilidade do sistema de equações representado no modelo.

Mais uma vez, o processo de transmissão é configurado por um ambiente em que uma alta aversão ao risco gera uma posição dos investidores em ativos externos, desvalorizando a taxa de câmbio e pressionando uma alta da inflação.

Pode-se deduzir, dos resultados acima extraídos pressupostos do modelo, que sob a configuração do modelo em que o risco afeta o comportamento da taxa nominal de câmbio, garantir um ambiente institucional de credibilidade acerca dos compromissos com os credores torna-se uma importante condição para a estabilidade da economia. Por sua vez, uma das formas mais eficazes de se construir tal ambiente de credibilidade é criando mecanismos que garantam a solvência da dívida pública a longo prazo, ou seja, é recomendável que a autoridade fiscal opere de forma passiva.

5 Um exercício de simulação fazendo uso do modelo para a economia brasileira e comparação com o plano plurianual 2016-2019

Anteriormente, a variação da dívida pública ao longo do tempo foi dada pela seguinte equação:

\[\dot{b}=ib+g-t~\] (6)

A restrição anterior pode ser apresentada na forma discreta, de modo que:

\[{{B}_{t}}-{{B}_{t-1}}={{r}_{t}}{{B}_{t-1}}+{{G}_{t}}-{{T}_{t}}\] (19)

Em que a equação anterior mostra que a variação da dívida depende do componente de pagamento de juros, (rtBt-1), e do saldo primário do governo, (Gt – Tt).

Em uma economia na qual o produto cresce ao longo do tempo, a restrição (19) pode ser reescrita como razão do produto. Assim, em (19), dividindo ambos os lados pelo produto real, Yt:

\[\frac{{{B}_{t}}}{{{Y}_{t}}}-\frac{{{B}_{t-1}}}{{{Y}_{t}}}={{r}_{t}}\frac{{{B}_{t-1}}}{{{Y}_{t}}}+\frac{{{G}_{t}}-{{T}_{t}}}{{{Y}_{t}}}\] (20)

A equação anterior pode ser reescrita no seguinte formato:

\[\frac{{{B}_{t}}}{{{Y}_{t}}}=\left( 1+{{r}_{t}} \right)\left( \frac{{{Y}_{t-1}}}{{{Y}_{t}}} \right)\frac{{{B}_{t-1}}}{{{Y}_{t-1}}}+\frac{{{G}_{t}}-{{T}_{t}}}{{{Y}_{t}}}\] (21)

Em (21), o termo \[ \left( \frac{{{Y}_{t-1}}}{{{Y}_{t}}} \right) \] pode ser reescrito como \[ \left( \frac{1}{1+g} \right) \], em que g representa a taxa real de crescimento econômico. Assim, de (21), temos:

\[\frac{{{B}_{t}}}{{{Y}_{t}}}=\left( 1+{{r}_{t}}-g \right)\frac{{{B}_{t-1}}}{{{Y}_{t-1}}}+\frac{{{G}_{t}}-{{T}_{t}}}{{{Y}_{t}}}\] (22)

De (38):

\[\frac{{{B}_{t}}}{{{Y}_{t}}}-\frac{{{B}_{t-1}}}{{{Y}_{t}}-1}=\left( {{r}_{t}}-g \right)\frac{{{B}_{t-1}}}{{{Y}_{t-1}}}+\frac{{{G}_{t}}-{{T}_{t}}}{{{Y}_{t}}}\] (23)

Sabe-se que a taxa de juros real é dada pela diferença entre a taxa de juros nominal e a taxa de inflação, rt = it - πt, logo:

\[\frac{{{B}_{t}}}{{{Y}_{t}}}-\frac{{{B}_{t-1}}}{{{Y}_{t-1}}}=\left( {{i}_{t}}-{{\pi }_{t}}-g \right)\frac{{{B}_{t-1}}}{{{Y}_{t-1}}}+\frac{{{G}_{t}}-{{T}_{t}}}{{{Y}_{t}}}\] (24)

Reescrevendo (24):

\[\frac{{{B}_{t}}}{{{Y}_{t}}}-\frac{{{B}_{t-1}}}{{{Y}_{t-1}}}=\left( {{i}_{t}}-g \right)\frac{{{B}_{t-1}}}{{{Y}_{t-1}}}+\frac{{{G}_{t}}-{{T}_{t}}}{{{Y}_{t}}}-{{\pi }_{t}}\frac{{{B}_{t-1}}}{{{Y}_{t-1}}}\] (25)

A equação (25) mostra que o resultado nominal (variação líquida da dívida, \[ \frac{{{B}_{t}}}{{{Y}_{t}}}-\frac{{{B}_{t-1}}}{{{Y}_{t-1}}} \]) depende de três componentes: pagamento de juros, \[ \left( {{i}_{t}}-g \right)\frac{{{B}_{t-1}}}{{{Y}_{t-1}}} \] , resultado primário do governo, \[ \frac{{{G}_{t}}-{{T}_{t}}}{{{Y}_{t}}} \] e atualização monetária, \[ {{\pi }_{t}}\frac{{{B}_{t-1}}}{{{Y}_{t-1}}} \].

Na seção 2, foi assumido que a função reação da autoridade monetária leva em consideração, além dos desvios da inflação em relação à meta de inflação, os desvios da dívida em relação a uma meta de dívida, bem como o diferencial de juros entre os juros interno e a taxas de juros internacional, na tentativa de monitorar a volatilidade cambial, ou seja, resgatando a equação (5):

\[\frac{di}{dt}=\beta \left( \pi -{{\pi }^{*}} \right)+\alpha \left( b-{{b}^{*}} \right)+\mu \left( {{i}^{*}}-\bar{i} \right), \beta >0,\alpha >0,\mu <0\] (5)

Foi incorporada no modelo analítico do capítulo anterior a relação entre diferencial de juros e taxa de câmbio nominal, ou seja, regatando (9):

\[e=\rho \left( {{i}^{*}}-\bar{i} \right),~~\rho <0\] (9)

Combinando (5) e (10):

\[\frac{di}{dt}=\beta \left( \pi -{{\pi }^{*}} \right)+\alpha \left( b-{{b}^{*}} \right)+\frac{\mu }{\rho }e\]

Apresentando a equação anterior no seguinte formato:

\[{{i}_{t}}={{i}_{t-1}}.ex{{p}^{\beta \left( \pi -{{\pi }^{*}} \right)+\alpha \left( b-{{b}^{*}} \right)+\frac{\mu }{\rho }e}}\] .

Incorporando esse último resultado na equação (25):

\[\frac{{{B}_{t}}}{{{Y}_{t}}}-\frac{{{B}_{t-1}}}{{{Y}_{t-1}}}=\left( {{i}_{t-1}}.ex{{p}^{\beta \left( \pi -{{\pi }^{*}} \right)+\alpha \left( b-{{b}^{*}} \right)+\frac{\mu }{\rho }e}} \right)\frac{{{B}_{t-1}}}{{{Y}_{t-1}}}+\frac{{{G}_{t}}-{{T}_{t}}}{{{Y}_{t}}}-{{\pi }_{t}}\frac{{{B}_{t-1}}}{{{Y}_{t-1}}}\] (26)

Com base em (26) podemos agora mensurar o efeito dos choques cambiais no resultado nominal do governo. Na próxima subseção, a equação (26) será utilizada como referência para avaliar o impacto de choques na taxa de câmbio de possíveis riscos fiscais que não são incorporados no planejamento orçamentário.

5.1 Resultado das simulações

A tentativa de mensurar os efeitos da volatilidade cambial sobre a trajetória da DLSB se justifica pelo ambiente conservador apresentado nos PPAs em relação à trajetória da taxa de câmbio. Conforme os parâmetros macroeconômicos para a elaboração do PPA 2012-2015, foi definida uma trajetória relativamente constante para a taxa de câmbio ao longo dos quatro anos projetados, na qual a projeção estabeleceu uma taxa de câmbio de R$ 1,64, R$ 1,72, R$ 1,74 e R$ 1,77, respectivamente para os anos 2012, 2013, 2014 e 2015.

A leitura do PPA 2016-2019 mantém um ambiente conservador com relação ao comportamento da taxa de câmbio, de modo que as projeções estabelecem uma baixa volatilidade cambial, de R$ 3,39, R$ 3,47, R$ 3,48 e R$ 3,53, respectivamente para os anos 2016, 2017, 2018 e 2019.

Com relação ao período 2012-2015, houve uma intensa volatilidade cambial, e o fato do PPA ter assumido um ambiente conservador acerca do comportamento da taxa de câmbio possibilitou uma alta exposição do orçamento público aos riscos fiscais diante das incertezas do mercado de câmbio. Importante destacar que os valores verificados para a taxa de câmbio foram R$ 1,95, R$ 2,15, R$ 2,35 e R$ 3,33, respectivamente para os anos 2012, 2013, 2014 e 2015. O ponto desejável aqui é buscar mensurar o impacto das incertezas cambiais na trajetória da DLSP.

Na simulação da trajetória da DLSP em relação ao PIB, foram considerados valores dos parâmetros que compõem a equação (26). Foram considerados três possíveis cenários para a taxa de câmbio na tentativa de capturar seus efeitos sob a variável-alvo.

O Quadro 1 mostra os valores dos parâmetros utilizados para simular a trajetória da DLSP em relação ao PIB, de acordo com a equação (26).

Quadro 1:
Valores dos parâmetros usados nas simulações da dívida líquida do setor público

Ao incorporar os parâmetros definidos no Quadro 1, o passo seguinte foi projetar o comportamento da DLSP como proporção do PIB comparativamente aos valores definidos no PPA 2016-2019. A Tabela 1 traz os resultados das projeções para o período 2016-2019. São quatro projeções: a projeção 1 refere-se aos valores definidos no PPA 2016-2019, na projeção 2 utilizou-se os cenários macroeconômicos definidos no PPA 2016-2019 e aplicados na equação (26), a projeção 3 utiliza os parâmetros definidos no Quadro 1 assumindo uma desvalorização cambial de 3% ao ano, por fim, a projeção 4 assume os parâmetros do Quadro 1, porém assumindo uma valorização na taxa de câmbio de 3% ao ano.

Tabela 1:
Dívida líquida do setor público (%PIB): projeções 2016-2019

A projeção 2 foi realizada com o objetivo de verificar a robustez do modelo apresentado (equação 26). Perceba que ao compararmos as projeções 1 e 2, os resultados dos valores obtidos com base no modelo da equação (26) convergem com as projeções apresentadas pelo PPA 2016-2019. Essa comparação é necessária para gerar um grau de confiança no modelo apresentado e assim introduzir os possíveis riscos fiscais nas projeções da DLSP como proporção do PIB para o período 2016-2019.

Os resultados das projeções da Tabela 1 são apresentados no Gráfico 1 a seguir na tentativa de visualizar mais claramente os resultados obtidos.

Gráfico 1
Dívida líquida do setor público (%PIB): projeções 2016-2019

Pelo Gráfico 1, quando comparamos as projeções do PPA 2016-2019 com os valores do modelo com desvalorização cambial e valorização cambial, observamos que a tendência de tais projeções diverge dos valores projetados pelo PPA. Note que a primeira coluna em preto se mantém para os quatro anos de projeções níveis relativamente constantes para a DLSP como proporção do PIB, de modo que entre 2016 e 2019 projeta-se uma DLSP entre 39% e 40,2% em relação ao PIB. Quando consideramos uma desvalorização cambial anual da ordem de 3% ao ano, de acordo com a terceira coluna no Gráfico 1 (coluna cinza clara), há um aumento significativo na DLSP. Em 2016, de acordo com as projeções, a DLSP como proporção do PIB é de 39,52%, atingindo um percentual de 47,08% em 2019. Quando a hipótese é de uma valorização de 3% ao ano, em 2019 o valor projetado para DLSP como proporção do PIB é da ordem de 23,85% conforme a quarta coluna no Gráfico 1 (coluna branca).

O modelo analítico desenvolvido no presente artigo possibilitou identificar canais de transmissão entre as políticas fiscal e monetária, levando em conta uma economia emergente que faz uso do regime de metas de inflação. Um ponto central na visualização de uma política econômica estável levou em consideração a importância que representa a reação que a autoridade monetária estabelece na tentativa de monitorar os desvios das taxas de juros internacionais. Por todas as relações de causalidade investigadas no modelo analítico, a magnitude do parâmetroo µ ganhou destaque em função da sua importância para o estabelecimento das condições de estabilidade. Tendo em vista a importância do canal de transmissão ao identificar uma função-reação monetária que absorve os choques das taxas de juros internacionais, na tentativa de suavizar tais choques sobre a taxa de câmbio, a incorporação de tal efeito na restrição orçamentária do governo possibilitou visualizar significativos riscos fiscais na DLSP.

Com os resultados projetados, o que se quer chamar atenção é para as incertezas cambiais, muitas vezes ignoradas na elaboração dos PPAs. Os resultados apresentados mostram que sucessivos choques cambiais podem ter um impacto significativo no crescimento da DLSP.

6 Análise dos resultados e conclusões

O objetivo do trabalho foi o de analisar a coordenação entre políticas monetária e fiscal, em uma economia emergente com regime de metas de inflação em um contexto em que o risco soberano pode levar à existência de desequilíbrios macroeconômicos. Buscou-se compreender como a economia acomoda choques exógenos, no sentido de manter-se em um equilíbrio assintoticamente estável sob diferentes combinações de políticas.

Partindo de um modelo com a proposta de arcabouço operacional para política monetária que leva em consideração não só o desvio da inflação em relação à sua meta, (π-π*), mas também, o desvio da dívida pública em relação a uma meta desejada, (b-b*),e o diferencial entre as taxas de juros no mercado interno e externo, \[ ({{i}^{*}}-\bar{i}) \], foram identificadas as relações de estabilidade do equilíbrio do modelo apresentadas no parágrafo seguinte. O método utilizado foi o de um modelo de equações simultâneas diferenciais de primeira ordem, em que se analisou o equilíbrio intertemporal e sua estabilidade.

  1. Para um modelo com a taxa de câmbio definida pela paridade das taxas de juros e em que há uma regra de superávit primário, a estabilidade requer que: a) o peso do desvio da inflação em relação à meta seja maior na função de reação da política monetária do que o peso dado ao diferencial de juros, além de que; b) o efeito de mudanças no diferencial de juros sobre a política monetária deve ser maior do que a necessidade da taxa de juros de curto prazo em acomodar choques do componente de risco. Tais condições possibilitam deduzir que no regime de metas de inflação o controle do nível de preços deve ser a preocupação primordial da política monetária, sendo mais importante do que a necessidade de acomodar choques advindos de mudanças na taxa de juros externa. Além disso, um controle fiscal é desejado para que a economia não seja muito vulnerável a choques de risco soberano.

  2. Em uma configuração em que não há regra fiscal, tem-se que: a) continua válida a condição de que o peso do desvio da inflação em relação à meta seja maior do que o peso do diferencial da taxa de juros, no que tange à definição da taxa básica de juros por parte da regra de política monetária. Porém, b) nesse caso, pode ser necessário que a autoridade monetária tenha que acomodar, por meio de aumentos na taxa básica de juros, os efeitos de um aumento do risco provocado pela desconfiança do investidor. Provavelmente, se teria uma taxa de juros de equilíbrio maior sob essa configuração, em relação ao que se teria sob a anterior.

  3. Observa-se uma coordenação de políticas em que o câmbio nominal é definido pelo diferencial de juros e pelo fator de risco - tanto no caso em que há ou não regra de superávit. Trata-se de uma configuração, portanto, mais aderente à realidade de uma economia de mercado emergente. Esse caso se diferencia da situação i e ii, pelo fato de que o impacto sobre a taxa nominal de câmbio de uma aversão ao risco muito elevada, medida por γ, poderia levar à instabilidade do modelo, uma vez que um aumento dos juros poderia ser interpretado como uma maior probabilidade de default. Consequentemente, ocorreria uma desvalorização cambial e uma possível perda do controle da inflação por parte da política monetária. Assim, em termos de política econômica, recomenda-se uma política de austeridade fiscal. As demais conclusões anteriores permanecem válidas sob essa configuração.

Por último, foi realizado um exercício de simulação que busca capturar os efeitos de choques cambiais na relação DLSP-PIB, utilizando os canais identificados pelo modelo analítico de coordenação entre as políticas monetárias e fiscais em uma economia emergente sob o regime monetário de metas de inflação. Mais especificamente, o trabalho de simulação teve como objetivo avaliar o impacto de choques cambiais (que podem ser observados em um ambiente de maior incerteza em relação à solvência da dívida pública) nas previsões orçamentárias. Os resultados expõem uma relativa fragilidade dos instrumentos de planejamento orçamentário no Brasil.

A leitura dos Planos Plurianuais, sobretudo em relação aos cenários macroeconômicos mostrou um ambiente conservador com relação ao comportamento da taxa de câmbio. Vale destacar que a literatura chama a atenção para os possíveis canais de transmissão de política econômica em uma economia suscetível a absorver choques no risco soberano que se transmite na taxa de câmbio e na Dívida Pública.

Ainda em relação ao exercício de simulação, os resultados mostraram o impacto dos choques cambiais sobre a trajetória da Dívida Líquida do Setor Público como proporção do PIB. Diante das incertezas que se transmite numa economia emergente, os instrumentos de planejamento orçamentário no Brasil, ao desenharem cenários conservadores em relação à volatilidade cambial, amplificam os riscos fiscais ao não mensurar os impactos da volatilidade cambial na trajetória da DLSP. Dessa forma, os resultados sugerem um arcabouço operacional de planejamento orçamentário de médio e longo prazo que leve em consideração os riscos fiscais envolvidos numa economia que apresenta incertezas cambiais causadas pelo risco de default.

Embora os instrumentos de planejamento orçamentário levem em conta a visualização dos riscos fiscais quando da construção da Lei de Diretrizes Orçamentária (LDO), a rigidez orçamentária característica no Brasil dificulta o ajuste de curto prazo do orçamento frente aos eventuais distúrbios na taxa de câmbio e aos possíveis impactos que tais choques exercem sobre o nível de endividamento público.

De modo geral, o trabalho sugere que o controle da inflação deve ser o objetivo principal da autoridade monetária em um regime de metas de inflação. Concomitantemente, é desejado que a autoridade fiscal trabalhe de maneira passiva, gerando superávits que estabilizem a dívida pública e garantam sua solvência intertemporal, o que por sua vez estabilizaria o risco soberano e evitaria o risco de uma dominância fiscal.

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  • WOODFORD, M. Fiscal requirements for price stability. Journal of Money, Credit and Banking, v. 33, n. 3, p. 669-728, 2001.
  • 1
    Os trabalhos de Svensson (2000SVENSSON, L. Open-economy inflation targeting. Journal of International Economics, 50, p. 155-83, 2000.) e Ball (1999BALL, L. Policy rules for open economies. In: Taylor, J. Monetary Policy Rules, London: The University of Chicago Press, 1999. p. 127-144.) supõem que nos países industrializados o prêmio de risco se comporta como um passeio aleatório, não afetando a condução da política monetária; no caso dos países em desenvolvimento, há uma forte relação entre a percepção de risco na determinação dos fluxos de capitais, gerando efeitos na taxa de câmbio e na inflação. Tal argumento é complementar à definição de economia emergente elaborada anteriormente.
  • 2
    Em geral, consideram-se títulos livres de riscos para investidores internacionais os T-Bonds emitidos pelo tesouro norte-americano.
  • 3
    Apesar dos trabalhos originais a respeito da Curva de Phillips desprezarem o efeito do câmbio sobre a inflação, diversos trabalhos estimaram empiricamente tal efeito. Limitando-se à economia brasileira, temos: Goldfajn e Werlang (2000GOLDFAJN, I.; WERLANG, W. The pass-through from depreciation to inflation: a panel study. Banco Central do Brasil working paper series, 2000.), Rigolon (2003RIGOLON, F. J. Z. Regras de política monetária ótimas em pequenas economias abertas. Concursos de monografias. BACEN, 2003.) e Correa e Minella (2010CORREA, A. S.; MINELLA, A. Nonlinear mechanisms of the exchange rate pass-through: A Phillips curve model with threshold for Brazil. Revista Brasileira de Economia, Graduate School of Economics, Getúlio Vargas Foundation (Brazil), vol. 64(3), p. 231-243, Sep. 2010.).
  • 4
    Para ser mais preciso, a inflação é função da taxa de desvalorização cambial. A equação (9), que denota a paridade da taxa de juros e câmbio também deve ser expressa em termos de desvalorização da taxa de câmbio, assumindo a forma
    . Porém, tal simplificação não impacta os resultados do modelo.
  • 5
    Para mais detalhes, ver Gandolfo (1997GANDOLFO, G. Economic Dynamics. Nova York: Springer Study Edition, 1997.).
  • 6
    Para mais detalhes, ver Gandolfo (1997GANDOLFO, G. Economic Dynamics. Nova York: Springer Study Edition, 1997.).
  • 7
    A respeito do o critério Routh-Hurwitz, ver Gandolfo(1997).
  • 8
    O impacto medido por μ sobre a definição da taxa de juros vai depender do quanto a taxa de inflação é sensível à taxa de câmbio. Dessa forma, quanto mais dependentes forem os índices de preços de produtos importados, maior será o parâmetro em questão.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Aug 2018

Histórico

  • Recebido
    10 Ago 2016
  • Aceito
    19 Jan 2017
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