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Medo de Matemática e Trauma na Relação com o Aprender: uma leitura psicanalítica

Fear of Mathematics and Trauma in the Relationship with Learning: a psychoanalytical reading

Resumo

A Matemática, historicamente identificada no imaginário social como difícil e, portanto, feita para poucos, aparece no contexto escolar ora como fonte de prazer para alguns estudantes, ora como sofrimento para outros, que dela fogem sempre que possível. Destarte, neste trabalho, pretende-se compreender e analisar o trauma de estudantes com dificuldades de aprendizagem matemática sob a ótica psicanalítica, a partir de depoimentos de discentes universitários atendidos pelo Serviço de Apoio Pedagógico (SAP) da Universidade Federal do Oeste da Bahia (UFOB). Para tanto, recorreu-se à literatura psicanalítica freudiana sobre o trauma, num movimento que buscou entrelaçar as percepções teóricas e os testemunhos dos graduandos sobre seus desejos, medos e angústias no tocante à dialética saber/não-saber, partindo do pressuposto de que a sala de aula é um lugar de vida que oportuniza o encontro de histórias, desejos, subjetividades, prazeres e sofrimentos, onde professores e estudantes, muitas vezes já traumatizados nas relações com o saber, estão também envoltos pela dimensão do inconsciente que comparece à cena pedagógica. Dentre outras proposições, pensamos que a rejeição e o bloqueio mental em relação à Matemática escolar e a tudo o que dela se aproxime, ainda que inconscientemente, possa advir de possíveis relações traumáticas do sujeito com esse saber, tecidas ao longo de toda a constituição de sua história psíquica.

Palavras-chave:
Matemática; Trauma; Dificuldades de Aprendizagem; Sintoma; Psicanálise

Abstract

Mathematics, historically identified in the social imaginary as difficult and, therefore, made for a few, appears in the school context sometimes as a source of pleasure for some students, sometimes as suffering for others, who flee from it whenever possible. Thus, in this work, we intend to understand and analyze students’ trauma with mathematical learning difficulties from a psychoanalytic perspective, based on testimonials from university students attended by the Serviço de Apoio Pedagógico (SAP) of the Universidade Federal do Oeste da Bahia (UFOB). For this, Freudian psychoanalytic literature on trauma was used, in a movement that sought to intertwine the students’ theoretical perceptions and testimonies about their desires, fears, and anxieties regarding the dialectic of knowing/not-knowing, based on the assumption that the classroom is a place of life that allows the encounter of stories, desires, subjectivities, pleasures, and sufferings, where teachers and students, often traumatized in their relations with knowledge, are also involved by the dimension of the unconscious that appears in the pedagogical scene. Among other propositions, we think that the rejection and mental block in relation to school mathematics and everything that approaches it, even if unconsciously, may result from possible traumatic relationships of the subject with this knowledge, woven throughout the entire constitution of your psychic history.

Keywords:
Math; Trauma; Learning Difficulties; Symptoms; Psychoanalysis

1 Introdução

As reflexões tecidas neste texto sobre trauma de estudantes com dificuldades de aprendizagem nascem de vivências e inquietações relacionadas ao fazer profissional no contexto da Universidade Federal do Oeste da Bahia (UFOB), onde o pesquisador em questão atua como Técnico em Assuntos Educacionais (TAE) no âmbito do Centro das Ciências Exatas e das Tecnologias (CCET) e integra a equipe que compõe o Serviço de Apoio Pedagógico (SAP) do Programa de Acompanhamento Sociopsicopedagógico (PAS)1 1 O PAS, em vigência na ocasião das entrevistas realizadas com os estudantes, em 2019, atualmente corresponde ao Núcleo de Orientação Sociopsicopedagógica (NOS), criado por meio da Portaria UFOB n° 328, de 29 de setembro de 2021, vinculado à Coordenadoria de Políticas de Assistência Estudantil da Diretoria de Ações Afirmativas e Assuntos Estudantis. dessa instituição de Ensino Superior. O SAP, nesse contexto, assume como intencionalidade acolher estudantes de graduação – especialmente aqueles/aquelas que lidam com impasses no aprender – e orientá-los(las) em suas necessidades educacionais.

Destarte, este trabalho, ao nortear-se pela tentativa de interpretar o trauma de estudantes com dificuldades de aprendizagem nas Ciências Exatas sob a ótica psicanalítica, apresenta o caso de quatro estudantes que, embora possuam muitas especificidades no tocante à relação pedagógica que estabelecem com seus cursos e com a dialética saber/não-saber, compartilham um ponto em comum: o trauma com a Matemática. Portanto, pretende-se, aqui, a partir de apontamentos registrados no SAP, propor diálogos acerca de possíveis interfaces entre Psicanálise e Educação, ao entrelaçar percepções teóricas e depoimentos de estudantes sobre seus medos, angústias, sintomas e desejos em relação ao saber/não-saber matemático.

Os estudantes consentiram que suas falas fossem utilizadas para fins de escrita e publicação acadêmicas. Para preservar suas identidades, serão identificados como: estudante 1 (E1), estudante 2 (E2), estudante 3 (E3) e estudante 4 (E4). Posto isto, faz-se oportuno assinalar que a escolha desses discentes se justifica em virtude das possíveis convergências constatadas entre os testemunhos narrados e o recorte temático em pauta: a questão do trauma em Matemática. Os quatro estudantes manifestam problemas emocionais, os quais relacionam às frustrações acadêmicas, especialmente às dificuldades de aprendizagem matemática; três deles, inclusive, afirmam que, antes de se vincularem à universidade, não sofriam com ansiedade.

O estudante E1, na ocasião do acolhimento no SAP, estava há seis semestres no curso de Matemática, com aprovação em apenas um componente curricular. A estudante E2, que possui diagnóstico de dislexia e discalculia, enquanto estava vinculada ao Bacharelado Interdisciplinar em Ciência e Tecnologia (ela migrou para outro curso), cursou 58 disciplinas, com 18 reprovações (13 delas em disciplinas da área de Matemática, Física ou Química). A estudante E3, matriculada no 6º semestre do curso de Bacharelado Interdisciplinar em Ciência e Tecnologia, inscreveu-se em 24 disciplinas, alcançando aprovação e reprovação em 11 e 13 componentes curriculares, respectivamente. A estudante E4, por sua vez, vinculada ao 9º semestre do curso de Matemática, matriculou-se em 33 disciplinas, das quais obteve 11 aprovações e 19 reprovações (3 em curso na época).

O presente trabalho está estruturado em quatro seções: i) inicialmente, são apresentados alguns entendimentos sobre a noção de trauma, à luz da Psicanálise; ii) na sequência, a discussão acerca do trauma tem continuidade a partir de depoimentos de estudantes acolhidos pelo SAP sobre suas dificuldades de aprendizagem e os reflexos da relação com o aprender e não aprender na construção psíquica do sujeito; iii) outras problematizações sobre o gostar e o não-gostar de Matemática são construídas, partindo do pressuposto de que a sala de aula é um lugar de encontro de histórias, desejos e subjetividades, onde professores e estudantes, sempre-já traumatizados em sua relação com o saber, estão envoltos pelas dimensões inconscientes da relação pedagógica; e iv) por fim, retomamos o debate em torno das problemáticas “medo de Matemática” e “dificuldades de aprendizagem” a partir do conceito de “sintoma” na interface Psicanálise-Educação.

2 Apontamentos sobre a noção de trauma: uma leitura psicanalítica

Na metapsicologia freudiana, o trauma ocupa, desde o nascimento da Psicanálise, lugar de destaque: o modelo freudiano do trauma passa pela teoria da sedução em A etiologia da histeria (FREUD, 1896FREUD, S. A etiologia da histeria. Edição Standard Brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud, Vol. III. Rio de Janeiro: Imago, 1996. Originalmente publicado em 1896.), pelo caso conhecido como o Homem dos Lobos descrito no texto História de uma neurose infantil (FREUD, 1918FREUD, S. A etiologia da histeria. Edição Standard Brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud, Vol. III. Rio de Janeiro: Imago, 1996. Originalmente publicado em 1896.), pelo Além do princípio de prazer (FREUD, 1920FREUD, S. A etiologia da histeria. Edição Standard Brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud, Vol. III. Rio de Janeiro: Imago, 1996. Originalmente publicado em 1896.) e pelo ensaio Inibições, sintomas e angústia (FREUD, 1926FREUD, S. A etiologia da histeria. Edição Standard Brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud, Vol. III. Rio de Janeiro: Imago, 1996. Originalmente publicado em 1896.), dentre outros textos, como sublinham Castilho (2013CASTILHO, A. L. P. Revisitando o primeiro modelo freudiano do trauma: sua composição, crise e horizonte de persistência na teoria psicanalítica. Ágora: Estudos em Teoria Psicanalítica, Rio de Janeiro, v. 16, n. 2, p. 235-250, jul./dez. 2013. Disponível em: https://www.scielo.br/j/agora/a/DdMZmWqgBJNKRPJKmscmWMD/abstract/?lang=pt. Acesso em: 15 mar. 2022.
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) e Zavaroni e Viana (2015ZAVARONI, D.; VIANA, T. Trauma e infância: considerações sobre a vivência de situações potencialmente traumáticas. Psicologia: Teoria e Pesquisa, Brasília, v. 31, n. 3, p. 331-338, jul./set. 2015. Disponível em: https://www.scielo.br/j/ptp/a/ZSxxb85nzh4spnyZbQsGY7D/abstract/?lang=pt. Acesso em: 1 mar. 2022.
https://www.scielo.br/j/ptp/a/ZSxxb85nzh...
).

Etimologicamente, trauma é um vocábulo de origem grega, cujo significado, na língua materna, parece se aproximar do conceito de ferida. Segundo Marcos e D’Alessandro (2013MARCOS, C.; D’ALESSANDRO, C. Figuras psíquicas do trauma: uma leitura lacaniana. Revista aSEPHallus, Rio de Janeiro, v. 8, n. 15, online, nov./abr. 2013. Disponível em: http://www.isepol.com/asephallus/numero_15/artigo_02.html. Acesso em: 9 mar. 2022.
http://www.isepol.com/asephallus/numero_...
, p. 36), trauma se constitui como um conceito oriundo do saber médico e “[…] refere-se a uma lesão corporal séria ou crítica, advinda de um ferimento ou choque, usado, muitas vezes, como sinônimo de ruptura”. Historicamente, na medicina – e no tempo de Freud tal uso já se fazia –, emprega-se o termo “trauma” para caracterizar lesões corporais, geralmente externas ao organismo, provenientes de impactos ou violências externas; no sentido psíquico, diz-se, no senso comum, que trauma corresponde ao sofrimento emocional resultante de um evento traumático que muitas vezes é, em si mesmo, visto como algo negativo.

Nesta direção, o trauma é, para Seligmann-Silva (2000CARUTH, C. Modalidades do despertar traumático (Freud, Lacan e a ética da memória). In: NESTROVSKY, A.; SELIGMANN-SILVA, M. (org.). Catástrofe e representação. São Paulo: Editora Escuta, 2000. p. 111-136., p. 84), “[…] uma ferida na memória”, constituindo-se como um dos conceitos-chave da Psicanálise, de tal modo que “[…] o tratamento psicanalítico – simplificando – existe em função do trabalho de recomposição do evento traumático” (ibid., p. 84). Entretanto, importante salientar que, na Psicanálise, não se considera o evento traumático ruim ou bom em si mesmo, sendo, portanto, questionável a “[…] compreensão da existência de uma relação linear entre a experiência vivida e o trauma” (ZAVARONI; VIANA, 2015ZAVARONI, D.; VIANA, T. Trauma e infância: considerações sobre a vivência de situações potencialmente traumáticas. Psicologia: Teoria e Pesquisa, Brasília, v. 31, n. 3, p. 331-338, jul./set. 2015. Disponível em: https://www.scielo.br/j/ptp/a/ZSxxb85nzh4spnyZbQsGY7D/abstract/?lang=pt. Acesso em: 1 mar. 2022.
https://www.scielo.br/j/ptp/a/ZSxxb85nzh...
, p. 331).

Noutras palavras, o trauma pode não residir no evento em si, haja vista que cada indivíduo o interpreta à sua maneira. Destarte, um evento pode ser traumático para determinada pessoa, mas não necessariamente para outra submetida à mesma experiência; é assim também possível que a mesma pessoa afetada por esse evento vivencie estímulos semelhantes noutros momentos de sua vida e perceba-os sob outras perspectivas, sem que, necessariamente, tais experiências resultem novamente em trauma.

Na perspectiva freudiana, o trauma corresponde aos “estímulos grandes demais” vividos pelo sujeito, lembrados e interpretados à luz de singularidades que lhe são próprias: por isso, o mesmo acidente de carro, por exemplo, pode se constituir em evento traumático para um e não para outro, assim como a mesma experiência frustrante na realização de uma prova de Matemática ou de um seminário escolar pode se constituir em evento traumático para um e não necessariamente para outro.

Caruth (2000CARUTH, C. Modalidades do despertar traumático (Freud, Lacan e a ética da memória). In: NESTROVSKY, A.; SELIGMANN-SILVA, M. (org.). Catástrofe e representação. São Paulo: Editora Escuta, 2000. p. 111-136.) chama-nos a atenção exatamente sobre isso, quando sinaliza que, genericamente, o trauma pode ser “[…] descrito como a resposta a um evento ou eventos violentos inesperados ou arrebatadores, que não são inteiramente compreendidos quando acontecem, mas retornam mais tarde em flash-backs, pesadelos e outros fenômenos repetitivos” (CARUTH, 2000CARUTH, C. Modalidades do despertar traumático (Freud, Lacan e a ética da memória). In: NESTROVSKY, A.; SELIGMANN-SILVA, M. (org.). Catástrofe e representação. São Paulo: Editora Escuta, 2000. p. 111-136., p. 111). Em Freud, vê-se que o trauma está associado à incapacidade de elaboração dos estímulos motivados por eventos limites, ou seja, superiores à capacidade de assimilação do sujeito, que não consegue produzir representação e atribuir sentido para o acontecimento experienciado, levando-o a uma possível compulsão à repetição da cena traumática. Sobre isso, Moreno e Coelho Junior (2012MORENO, M. M. A.; COELHO JUNIOR, N. E. Trauma: o avesso da memória. Ágora, Rio de Janeiro, v. 15, n. 1, p. 47-61, jan./jun. 2012. Disponível em: https://www.scielo.br/j/agora/a/46GrdGzGrZmXxVTLdWB6Ytj/abstract/?lang=pt. Acesso em: 05 mar. 2022.
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, p. 48), ao discorrerem sobre o trauma e seus efeitos na função psíquica da memória, assim expressam: “São os sintomas do trauma, ou melhor, suas marcas que se apresentam repetidamente na cena analítica, deixando-nos vislumbrar as ressonâncias do pavor no psiquismo, que instigam um trabalho de inteligibilidade acerca dos efeitos do trauma na função psíquica da memória” (MORENO; COELHO JUNIOR, 2012MORENO, M. M. A.; COELHO JUNIOR, N. E. Trauma: o avesso da memória. Ágora, Rio de Janeiro, v. 15, n. 1, p. 47-61, jan./jun. 2012. Disponível em: https://www.scielo.br/j/agora/a/46GrdGzGrZmXxVTLdWB6Ytj/abstract/?lang=pt. Acesso em: 05 mar. 2022.
https://www.scielo.br/j/agora/a/46GrdGzG...
, p. 48).

À luz da concepção freudiana de trauma, Neslrovski e Seligmann-Silva (2000CARUTH, C. Modalidades do despertar traumático (Freud, Lacan e a ética da memória). In: NESTROVSKY, A.; SELIGMANN-SILVA, M. (org.). Catástrofe e representação. São Paulo: Editora Escuta, 2000. p. 111-136., p. 08) enfatizam que o trauma se constitui uma espécie de “[…] lembrança que o indivíduo não sabe que lembra, mas que se manifesta em atos obsessivos, sem ligação consciente com a atualidade”. Assim, segundo esses autores, “‘Trauma’ deriva de uma raiz indo-européia com dois sentidos: ‘friccionar, triturar, perfurar’; mas também ‘suplantar’, ‘passar através’. Nesta contradição – uma coisa que tritura, perfura, mas que, ao mesmo tempo, é o que nos faz suplantá-la […]” (ibid., p. 08).

Segundo Fulgêncio (2004), Freud articula aspectos psicológicos e metapsicológicos para definir trauma, inicialmente usando a histeria como modelo: “Freud construiu sua noção empírica de trauma a partir do tratamento de seus pacientes neuróticos, em especial, do que ocorria com a histeria, observando que seus pacientes sofriam por causa de acontecimentos (reais ou fantasiados) ocorridos no passado” (FULGÊNCIO, 2004FULGÊNCIO, L. A noção de trauma em Freud e Winnicott. Natureza Humana, São Paulo, v. 6, n. 2, p. 255-270, jul./dez. 2004. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/nh/v6n2/v6n2a03.pdf. Acesso em: 14 mar. 2022.
http://pepsic.bvsalud.org/pdf/nh/v6n2/v6...
, p. 256). De acordo com esse autor:

[…] podemos caracterizar claramente a diferença entre o trauma pensado em termos empíricos (psicológicos) – referido a conflito entre idéias (conscientes e inconscientes), conflito entre o eu, enquanto um conjunto de representações fortes, e representações incompatíveis com o eu, conflito entre desejos (conscientes e inconscientes) – e o trauma pensado em termos metapsicológicos – referido a um quantum de afeto ou uma energia (a libido) que pode movimentar-se parcial ou totalmente em relação às idéias a elas conectadas, num aparelho psíquico impulsionado por pulsões (FULGÊNCIO, 2004FULGÊNCIO, L. A noção de trauma em Freud e Winnicott. Natureza Humana, São Paulo, v. 6, n. 2, p. 255-270, jul./dez. 2004. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/nh/v6n2/v6n2a03.pdf. Acesso em: 14 mar. 2022.
http://pepsic.bvsalud.org/pdf/nh/v6n2/v6...
, p. 258).

De outro modo, Seligmann-Silva (2000CARUTH, C. Modalidades do despertar traumático (Freud, Lacan e a ética da memória). In: NESTROVSKY, A.; SELIGMANN-SILVA, M. (org.). Catástrofe e representação. São Paulo: Editora Escuta, 2000. p. 111-136., p. 84, grifos do autor) enfatiza: “O trauma, para Freud, é caracterizado pela incapacidade de recepção de um evento transbordante […] trata-se […] da incapacidade de recepção de um evento que vai além dos “limites” da nossa percepção e torna-se, para nós, algo sem-forma”. E assim continua o autor supracitado: “O trauma, explica Freud, advém de uma quebra do Reizschuiz (pára-excitação), provocada por um susto (Schreck) que não foi amparado pela nossa Angstbereitschaft (estado de prevenção à angústia)” (ibid., p. 84).

Ao interfacear Psicanálise e Educação, Blanchard-Laville (2005BLANCHARD-LAVILLE, C. Os professores: entre o prazer e o sofrimento. Editora: Edições Loyola, 2005.) traz para o campo educacional algumas problematizações sobre trauma, docência e aprendizagem. A partir de estudos realizados no âmbito do que ela intitula de abordagem clínica de orientação psicanalítica em Ciências da Educação, a autora alega que os professores, no exercício cotidiano de sua prática pedagógica, estão imersos entre o prazer e o sofrimento, entendidos como dois polos oscilantes, entre os quais os estudantes também se percebem. Deste modo, Blanchard-Laville (2005BLANCHARD-LAVILLE, C. Os professores: entre o prazer e o sofrimento. Editora: Edições Loyola, 2005., p. 100) reflete que a relação com todo saber “[…] é tecida em todo o decorrer da história psíquica do sujeito” e que “[…] nenhum percurso de vida pode desenrolar-se sem encontro traumático” (ibid., p. 306). Para ela, “[…] a transmissão didática do professor não pode deixar de advir de sua relação traumática com o saber” (ibid., p. 305). E questiona: “quem de nós não tem uma relação traumática com o saber?” (ibid., p. 305).

Nas seções seguintes, em continuidade a essa discussão, serão apresentados depoimentos de estudantes cuja relação com a Matemática parece estar marcada pelo trauma: essa ferida na memória, sem-forma, transbordante, de difícil elaboração, que pode se manifestar em atos obsessivos e repetitivos (BLANCHARD-LAVILLE, 2005BLANCHARD-LAVILLE, C. Os professores: entre o prazer e o sofrimento. Editora: Edições Loyola, 2005.; CARUTH, 2000CARUTH, C. Modalidades do despertar traumático (Freud, Lacan e a ética da memória). In: NESTROVSKY, A.; SELIGMANN-SILVA, M. (org.). Catástrofe e representação. São Paulo: Editora Escuta, 2000. p. 111-136.; SELIGMANN-SILVA, 2000SELIGMANN-SILVA, M. A história como trauma. In: NESTROVSKI, A.; SELIGMANN-SILVA, M. (org.). Catástrofe e representação. São Paulo: Editora Escuta, 2000. p. 73-98.). Afinal, como interroga Sanches (2010SANCHES, R. Psicanálise e educação: questões do cotidiano. São Paulo: Escuta, 2010., p. 17), “por que o processo de aprendizagem é fonte de intenso prazer para alguns, enquanto para outros significa um sofrimento necessário ou algo do qual se foge, sempre que possível?”.

3 “… não consigo aprender”: quando estudar Matemática vira trauma

A Matemática ocupa lugar no imaginário social como uma das áreas do conhecimento mais complexas. No contexto da Educação brasileira, a rejeição à Matemática tem-se constituído em fenômeno frequentemente observável, tanto na Educação Básica como no Ensino Superior. Quando se fala em Matemática, comumente nos deparamos com declarações como: “não gosto de matemática”, “matemática é difícil”, “matemática é para poucos”, “é normal reprovar em matemática”, dentre outras. Com efeito, o uso habitual dessas expressões nos revela que, culturalmente, o discurso que concebe a Matemática como difícil e, portanto, “feita para poucos”, é legitimado e admitido como “verdade” nos diferentes espaços sociais, dentre os quais as instituições escolares.

Independentemente dos níveis, etapas ou modalidades de ensino, historicamente persiste no imaginário dos professores, como também dos estudantes, as marcas de um discurso que associa o bom desempenho em Matemática à genialidade, como se o saber matemático gozasse de prestígio em relação aos demais saberes e como se a suposta facilidade para a aprendizagem desse saber fizesse dos indivíduos que a possui sujeitos especiais, dotados de inteligência, de algum “dom extraordinário”; naqueles com dificuldades para se relacionar com a Matemática, por sua vez, esse “prestígio” do saber matemático pode provocar temores e aversões a essa área do conhecimento (MARKARIAN, 2004MARKARIAN, R. A matemática na escola: alguns problemas e suas causas. In: HELLMEISTER, A. C. P. (org.). Explorando o Ensino da Matemática. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2004. p. 273-281.).

Ao buscar na história da Matemática e na Psicanálise reflexões sobre as possíveis causas da rejeição à Matemática – causas estas que podem, inclusive, transitar de maneira inconsciente ou consciente entre gerações, Tatto e Scapin (2004TATTO, F.; SCAPIN, I. J. Matemática: por que o nível elevado de rejeição? Rev. Ciênc. Hum. Educ., Frederico Westphalen, RS, v. 5, n. 5, p. 1-14, 2004. Disponível em: http://revistas.fw.uri.br/index.php/revistadech/article/view/245. Acesso em: 10 mar. 2022.
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) destacam que, associada à ideia pré-concebida de que Matemática é difícil e que poucos a aprendem, “há um bloqueio inconsciente no uso do raciocínio mental e, conseqüentemente, com a Matemática, como ciência que exige raciocínio e reflexão” (TATTO; SCAPIN, 2004TATTO, F.; SCAPIN, I. J. Matemática: por que o nível elevado de rejeição? Rev. Ciênc. Hum. Educ., Frederico Westphalen, RS, v. 5, n. 5, p. 1-14, 2004. Disponível em: http://revistas.fw.uri.br/index.php/revistadech/article/view/245. Acesso em: 10 mar. 2022.
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, p. 2).

Nesse patamar da discussão, consideramos oportuno trazer alguns excertos de falas registradas em atendimentos pedagógicos realizados no âmbito do SAP na UFOB. Destacamos os depoimentos das estudantes E2 e E3, que evidenciam uma relação traumática com o saber, especialmente com as disciplinas de Cálculo Diferencial, Cálculo Integral, Lógica e Conjuntos, Geometria Analítica e Elementos de Matemática. Assim expressam: “números me deixam apavorada, meio perdida” (Entrevista com E2, 2019), “tenho medo de Matemática, não consigo aprender” (Entrevista com E3, 2019). Ambas relatam que, geralmente, durante a realização das provas, o medo da Matemática as bloqueia, dificultando a concentração e potencializando a ansiedade: “fico tão nervosa na prova, que troco números, esqueço as fórmulas e me perco” (Entrevista com E2, 2019), “sempre esqueço o que aprendi na hora da prova, dá um branco” (Entrevista com E3, 2019). Noutro momento, a discente E2 reitera: “me sinto burra, acho que isso não é pra mim” (Entrevista com E2, 2019). E a estudante E4, que diz gostar de Matemática, expõe suas decepções perante as dificuldades de aprendizagem: “tento, tento, tento e não entra; […]acho que o problema é comigo” (Entrevista com E4, 2019). Os testemunhos narrados sugerem que, ao conceberem a Matemática como difícil, como se fosse um “saber inacessível”, essas estudantes se ab-rogam do processo de ensino-aprendizagem, motivadas pelo sentimento de estranheza em relação ao saber matemático. Noutras palavras, ao incorporarem o discurso difundido no imaginário social que associa o bom desempenho em Matemática à genialidade, as estudantes, em presença das sucessivas frustrações acadêmicas, se veem incapazes para apre(e)ndê-la e, ao longo de seus cursos, parecem se distanciar cada vez mais dessa área do conhecimento.

Nesse percurso formativo, marcado pelas reprovações frequentes em componentes curriculares, intensifica-se, então, o medo de Matemática e sua rejeição. Em alguns casos, essa rejeição parece aproximar-se de uma fobia, como é o caso da estudante E2, que quando se vê diante de questões de Matemática, especialmente durante as provas, confessa emocionada: “chego a passar mal às vezes, suando frio, e uma sensação de comida presa na garganta; tento jogar pra fora, vomitar, mas não sai e entro em desespero” (Entrevista com E2, 2019).

À luz do exposto, poderíamos falar de “fobia à Matemática”? Papert (1988PAPERT, S. Logo: computadores e educação. São Paulo: Brasiliense S.A, 1988.) denomina de “matofobia” o medo ou aversão à Matemática e aos conteúdos matemáticos. Por “conteúdos matemáticos”, referimos, apoiado em Papert (1988PAPERT, S. Logo: computadores e educação. São Paulo: Brasiliense S.A, 1988.) e Felicetti (2007FELICETTI, V. L. Um estudo sobre o problema da matofobia como agente influenciador nos altos índices de reprovação na 1ª série do Ensino Médio. Dissertação (Mestrado em Educação em Ciências e Matemática) – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS, Porto Alegre, 2007.), aos saberes que extrapolam aqueles formalmente estudados no âmbito escolar, uma vez que a Matemática, enquanto conhecimento social e historicamente construído, se apresenta de múltiplas formas em nosso cotidiano, articulada direta ou indiretamente a outras áreas do conhecimento humano. Segundo Felicetti (2007FELICETTI, V. L. Um estudo sobre o problema da matofobia como agente influenciador nos altos índices de reprovação na 1ª série do Ensino Médio. Dissertação (Mestrado em Educação em Ciências e Matemática) – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS, Porto Alegre, 2007., p. 14), “[…] o não gostar e/ou ter medo/aversão de Matemática parece inibir o processo de aprendizagem na disciplina [e] pode também interferir no desenvolvimento de outros conteúdos curriculares”, tornando o processo de aprendizagem uma experiência dolorosa para o estudante. Para ela, esses “sentimento negativos” a respeito da Matemática podem ser motivados pelas experiências frustrantes na escola como também podem ser reflexo de aprendizagens extraescolares, haja vista que as crianças não são “tábulas rasas”, ou seja, não são “folhas de papéis em branco” para serem preenchidas pelos professores; antes de frequentarem os diferentes tempos-espaços escolares, incorporam percepções, sentimentos e aprendizagem sobre o mundo: “[…] muitas vezes este meio cria uma expectativa, um medo em relação à Matemática escolar […]. Inconscientemente, crianças, jovens, e adultos desenvolvem um bloqueio mental com relação a tudo que lhes parece Matemática” (FELICETTI, 2007FELICETTI, V. L. Um estudo sobre o problema da matofobia como agente influenciador nos altos índices de reprovação na 1ª série do Ensino Médio. Dissertação (Mestrado em Educação em Ciências e Matemática) – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS, Porto Alegre, 2007., p. 41).

Os estudantes atendidos pelo SAP confessam que, desde a infância, convivem com dificuldades em relação à aprendizagem matemática. Entretanto, somente no Ensino Superior é que a constatação dessas limitações se tornou realmente preocupante. Considerando os depoimentos desses estudantes, parece que a rejeição à Matemática seja influenciada por diversos fatores, como: i) as limitações relacionadas à alfabetização matemática, afetando o domínio de competências básicas (base matemática insuficiente, como se ouve com frequência na universidade); ii) as frustrações acadêmicas, como reprovações em componentes curriculares, intensificando a insegurança e a desmotivação; iii) as condicionantes socioculturais, como abordado anteriormente, que historicamente produzem estereótipos sobre a Matemática; iv) as dificuldades de adaptação às metodologias de ensino do professor, que, por sua vez, se vê desafiado pela contínua necessidade de repensar suas estratégias didático-pedagógicas; v) à maneira como lida com os estudos e o aprender; dentre outros.

Todavia, os estudantes atendidos pelo SAP, quase sempre, associam a sensação de mal-estar presente na relação com a Matemática à pressão por resultados, especialmente nos componentes curriculares reconhecidos entre eles como “disciplinas pesadas e reprovadoras”, dentre as quais se destacam: Cálculo Diferencial, Cálculo Integral, Lógica e Conjuntos, Geometria Analítica e Elementos de Matemática.

Os quatro estudantes atendidos pelo SAP mencionados neste trabalho manifestaram problemas emocionais, os quais relacionam às frustrações acadêmicas, especialmente às dificuldades de aprendizagem matemática: declaram que, na véspera de provas e/ou durante a realização de provas, sentem, com bastante frequência, falta de ar, tontura, tremores, tensão muscular, náusea, diarreia ou desconforto estomacal, suor excessivo, taquicardia, dentre outros sintomas físicos, e reclamam também de problemas relacionados à insônia, à concentração, à preocupação excessiva e incapacidade de controlar os pensamentos. Como evidenciam os depoimentos apresentados, acrescenta-se, ainda, a baixa autoestima desses estudantes (pensamentos autodepreciativos), inseguranças, medos e ausência de perspectiva em relação ao seu futuro acadêmico.

Em virtude dessas queixas – característicos da ansiedade, por exemplo –, os quatro discentes foram encaminhados pelo SAP ao Serviço de Psicologia da universidade. O Serviço de Psicologia, no âmbito da Política de Assistência Estudantil dessa universidade, configura-se como um espaço de acolhimento e escuta, cujas ações, desenvolvidas através de atendimentos individuais ou coletivos, visam a promoção da saúde e a elaboração de questões emocionais e contextuais que interferem na trajetória acadêmica dos discentes. Portanto, trata-se de um serviço que, em parceria com o SAP, busca contribuir com a qualidade de vida dos estudantes e sua permanência na universidade.

O que Papert (1988PAPERT, S. Logo: computadores e educação. São Paulo: Brasiliense S.A, 1988.) nomeia de matofobia, Tobias (1978TOBIAS, S. Overcoming math anxiety. New York: Norton, 1978.) denomina de ansiedade matemática, em substituição à expressão ansiedade a números utilizada por Dreger e Aiken (1957DREGER, R.; AIKEN JR., L. The identification of number anxiety in a college population. Journal of Educational Psychology, Washington, v. 48, n. 6, p. 344-351, 1957. Disponível em: https://content.apa.org/record/1959-02153-001. Acesso em: 15 mar. 2022.
https://content.apa.org/record/1959-0215...
). Segundo Carmo e Simionato (2012CARMO, J.; SIMIONATO, A. Reversão de ansiedade à matemática: alguns dados da literatura. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 17, n. 2, p. 317-327, abr./jun. 2012. Disponível em: https://www.scielo.br/j/pe/a/ZwGH7TK7NzdppftKyzW65Xh/?lang=pt. Acesso em: 10 mar. 2022.
https://www.scielo.br/j/pe/a/ZwGH7TK7Nzd...
), a expressão ansiedade matemática ganha destaque na literatura internacional após os estudos de Dreger e Aiken (1957DREGER, R.; AIKEN JR., L. The identification of number anxiety in a college population. Journal of Educational Psychology, Washington, v. 48, n. 6, p. 344-351, 1957. Disponível em: https://content.apa.org/record/1959-02153-001. Acesso em: 15 mar. 2022.
https://content.apa.org/record/1959-0215...
), que chamou de ansiedade a números o desconforto que estudantes universitários descreviam quando dispostos frente à resolução de problemas matemáticos. A esse respeito, Fassis, Mendes e Carmo (2014FASSIS, D.; MENDES, A. C.; CARMO, J. S. Diferentes graus de ansiedade à matemática e desempenho escolar no ensino fundamental. Psicologia da Educação, São Paulo, n. 39, p. 47-61, 2014. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?pid=S1414-69752014000200005&script=sci_abstract. Acesso em: 13 mar. 2022.
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?pid...
) ressaltam, entretanto, que a expressão ansiedade diante da Matemática é amplamente adotada com os estudos de Richardson e Suinn (1972RICHARDSON, F.; SUINN, R. The mathematics anxiety rating scale: psychometric data. Journal of Counseling Psychology, Washington, v. 19, n. 6, p. 551-554, 1972. Disponível em: https://psycnet.apa.org/record/1973-05788-001. Acesso em: 15 mar. 2022.
https://psycnet.apa.org/record/1973-0578...
) e após a publicação da clássica obra de Tobias (1978TOBIAS, S. Overcoming math anxiety. New York: Norton, 1978.), intitulada Over coming math anxiety. No âmbito internacional, é possível encontrar diversos pesquisadores que conduziram estudos sobre dificuldades de aprendizagem matemática, à luz de diferentes perspectivas; no caso do Brasil, os estudos que abordam o tema em pauta ainda são incipientes.

Interessante sublinhar que, dos quatro estudantes citados neste trabalho, três atestam que não sofriam com ansiedade antes das frustrações com a Matemática na universidade. Esses discentes relatam que no Ensino Fundamental e no Ensino Médio já sentiam dificuldades para aprender Matemática, mas que suas limitações não colocavam em risco a saúde mental. Entretanto, hoje, na universidade, sentem que desenvolveram uma espécie de fobia à Matemática.

Quando questionados sobre os “possíveis elementos causadores” desse trauma com a Matemática na universidade, os estudantes enfatizam o medo de não adquirirem aprovações nos componentes curriculares e, por consequência, desistirem do curso ou serem conduzidos ao jubilamento acadêmico, haja vista que estão prestes a ultrapassarem o prazo máximo de tempo permitido, institucionalmente, para a conclusão de seus cursos e, no entanto, ainda se veem distantes da integralização da carga horária curricular.

À essa altura da discussão, um questionamento vem à cena: a rejeição à Matemática emerge das dificuldades de sua aprendizagem ou é a rejeição a esse campo do conhecimento – difundido cultural e historicamente como difícil – que leva às dificuldades para aprender Matemática? Como possível reflexão, as palavras de Blanchard-Laville (2005BLANCHARD-LAVILLE, C. Os professores: entre o prazer e o sofrimento. Editora: Edições Loyola, 2005., p. 100) parecem novamente oportunas: “[…] a relação com a matemática é tecida em todo o decorrer da história psíquica do sujeito. O mesmo acontece com todo saber, e admitiremos desse modo que a questão da construção da relação com o saber de um sujeito não pode negligenciar toda a sua construção psíquica”.

4 O gostar e o não-gostar de Matemática: traumas, desejos e subjetividades na cena pedagógica

“Gosto de Matemática”, enfatiza o estudante E1 quando questionado sobre sua relação com a Matemática e com o curso de Matemática, na ocasião do primeiro encontro de orientação educacional agendado no âmbito do SAP. Segundo o discente, sua opção pelo curso advém de seu interesse desde criança pelas ditas Ciências Exatas ou Naturais, e destaca seu gosto pela Matemática, idealizada por ele como “uma área cheia de encantos, que está no nosso dia-a-dia, que faz parte de nós” (Entrevista com E1, 2019).

Na medida em que os encontros pedagógicos aconteciam, parecia cada vez mais evidente uma fusão de amor e ódio do estudante com a Matemática, expressa em sua relação com o saber e o não-saber, em que se entrelaça o desejo de aprender Matemática e as impossibilidades de satisfação desse desejo. É como se a Matemática, “que está no nosso dia-a-dia, que faz parte de nós” (Entrevista com E1, 2019), como diz o discente, lhe fosse, simultaneamente, estranha e familiar. Ou seja, em sua condição de sujeito-aprendiz, a Matemática, embora lhe seja familiar, parece assumir a posição de uma língua-estrangeira in-compreensível, de um código in-decifrável, de algo ao mesmo tempo próximo e distante de si, difícil de ser capturado pela natureza escorregadia que o faz escapar pelo vão dos dedos. O estudante E1, na busca pelo saber, se vê atravessado pelo estranhamento. Noutras palavras, o saber matemático é, à luz desse raciocínio, uma espécie de saber estranhado: está no estudante (ele sabe que sabe e que não sabe) e manifesta-se em seu cotidiano, mas não é apreendido, assimilado. No caso desse estudante, as tentativas para fugir das frustrações vividas no curso de Matemática são recorrentes. Em determinado momento, ao afirmar “minhas notas baixas nem sempre quer dizer que não aprendi” (Entrevista com E1, 2019), o discente traz à cena múltiplas possibilidades de interpretação, dentre as quais: i) que “notas boas” nem sempre são sinônimas de aprendizagem e, no caso em questão, o estudante se apega à suposta crença de colegas de curso “apenas decora[rem] fórmulas e conceitos” para responderem provas mecanicamente, sem, de fato, se apropriarem do conhecimento; e ii) que, ao negar o não-saber, o estudante tenta esquivar-se da possível vergonha de não conseguir atingir resultados acadêmicos satisfatórios, associada ao medo de ser rotulado como incapaz de aprender pelo outro (professores, colegas de curso, pais, orientadores pedagógicos). Deduz-se, portanto, que, na insistência da negação do não-saber matemático e nos temores relacionados ao julgamento do outro, jaz um sentimento autodepreciativo, talvez resultante de desapontamentos que podem ter sido experienciados pelo sujeito, desde a infância, no percurso escolar e extraescolar. Portanto, quando repetidamente submetidos a fracassos escolares, os estudantes, inconscientemente, parecem incorporar a crença de que não aprendem porque são incapazes, porque são “insuficientes” para saber Matemática (GOULART et al., 2018GOULART, A. T.; PUCCI, M. O.; GODOY, N. G.; BASTOS, S. R. S. Dificuldades no aprendizado de matemática: percepção de estudantes de duas escolas públicas de Anita Garibaldi. Revista Cientifico, Fortaleza, v. 18, n. 37, p. 47-73, jan./jun. 2018.). Os testemunhos expostos na seção anterior também evidenciam esse olhar sobre si: “me sinto burra” (Entrevista com E2, 2019); “tenho medo de matemática, não consigo aprender” (Entrevista com E3, 2019); “[…] tento e não entra; quando entra, esqueço depois… acho que o problema é comigo” (Entrevista com E4, 2019).

Os estudantes E1 e E4 insinuam que, por gostarem de Matemática, insistem no curso, mesmo sem aquisição de êxitos acadêmicos; entretanto, ambos confessam que já refletiram repetidas vezes sobre a possibilidade de desistência. É possível pensar que, abandonar o curso, para os quatro graduandos em questão, oportunizaria “dar fim” ao sofrimento de não aprender (será?), mas tal decisão legitimaria, ainda que inconscientemente, a crença de que são “insuficientes” para gozar do “prestígio” de saber Matemática, como salientam Markarian (2004MARKARIAN, R. A matemática na escola: alguns problemas e suas causas. In: HELLMEISTER, A. C. P. (org.). Explorando o Ensino da Matemática. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2004. p. 273-281.) e Goulart et al. (2018GOULART, A. T.; PUCCI, M. O.; GODOY, N. G.; BASTOS, S. R. S. Dificuldades no aprendizado de matemática: percepção de estudantes de duas escolas públicas de Anita Garibaldi. Revista Cientifico, Fortaleza, v. 18, n. 37, p. 47-73, jan./jun. 2018.).

Parece que, embora afirmem “gostar” de Matemática, também a rejeitam, inconscientemente, em razão das dificuldades para apre(e)ndê-la. Esses estudantes veem o acesso ao Ensino Superior como um sonho e um direito conquistados, entretanto, as dificuldades de acesso às aprendizagens lhes inviabilizam a vivência plena desse direito, transformando-os em “incluídos-excluídos”: uma vez excluídos do direito às aprendizagens, não se sentem incluídos no Ensino Superior. De origem latim (gustare), a palavra “gostar” possui significados diversos. Habitualmente, associamos a expressões como: achar gostoso ou apreciar o sabor, julgar bom, ter simpatia ou compatibilidade por algo ou alguém, agradar-se com, sentir prazer ou deleitar-se com, dentre outras. Em busca de uma interpretação psicanalítica para o gostar (ou não-gostar) de Matemática, Guizelini et al. (2005GUIZELINI, A.; ARRUDA, S. M.; CARVAHO, A. M. F. T.; LABURÚ, C. E. O “Gostar de Matemática”: em busca de uma interpretação psicanalítica. Boletim de Educação Matemática, Rio Claro, v. 18, n. 23, p. 1-18, mai. 2005. Disponível em: https://www.redalyc.org/articulo.oa?id=291223444002. Acesso em: 07 mar. 2022.
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) declaram que os sentidos e significados socialmente conhecidos e compartilhados pelo senso comum sobre gostar são limitantes para o entendimento da problemática já que “[…] parece-nos, de fato, que o significado desse “gostar” ultrapassa o que está posto na superfície, possuindo significações mais profundas do que aquelas que comumente utilizamos” (GUIZELINI, 2005GUIZELINI, A.; ARRUDA, S. M.; CARVAHO, A. M. F. T.; LABURÚ, C. E. O “Gostar de Matemática”: em busca de uma interpretação psicanalítica. Boletim de Educação Matemática, Rio Claro, v. 18, n. 23, p. 1-18, mai. 2005. Disponível em: https://www.redalyc.org/articulo.oa?id=291223444002. Acesso em: 07 mar. 2022.
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, p. 2), dada a existência de elementos que “[…] compõem, sustentam e interligam o ‘gostar de Matemática’ e o próprio desejo do sujeito” (ibid., p. 2), haja vista que as relações que estabelecemos com o curso e os processos de ensino-aprendizagem são atravessados pela dimensão da subjetividade. Ao sugerir que as experiências escolares de ensino-aprendizagens são marcadas pelo prazer e sofrimento, tanto por parte dos docentes quanto dos discentes, e que os vários sujeitos em situação de ensino estão envoltos pelas dimensões inconscientes da relação pedagógica, Blanchard-Laville (2005BLANCHARD-LAVILLE, C. Os professores: entre o prazer e o sofrimento. Editora: Edições Loyola, 2005., p. 196) sublinha que “Cada professor lida com alunos ‘sempre-já’ traumatizados em sua relação com o saber e para os quais se trata de tanto reparar, de restaurar essa relação como de fundá-la” e que ele, o professor, “[…] poderia dedicar-se a construir os alunos enquanto sujeitos. Sujeitos vivos, no sentido de sujeito do desejo, com o postulado latente de que, se há sujeito desejante, este apresenta melhores chances de aprender e de conhecer […]” (ibid., p. 262, grifos da autora).

Afinal, quem é esse sujeito que gosta (ou não gosta) de Matemática? Quais os porquês desse gostar ou não gostar? O que motiva esse gostar ou não gostar e o que ele significa para o sujeito? Quais as interinfluências desse gostar ou não gostar nas relações de ensino-aprendizagens desenvolvidas no âmbito do ensino, da pesquisa e da extensão? Quais os reflexos desse gostar ou não gostar na vida do sujeito, na constituição de sua subjetividade e em seu bem-estar físico, social e psicológico?

No processo de constituição da subjetividade, tanto do docente quanto do discente, parece ser fulcral admitir que, como seres inacabados, professores e estudantes “estão sendo”, “[…] em e com uma realidade que, sendo histórica, também é igualmente inacabada” (VERDE, 2012VERDE, R. L. Memória educativa: marcas da subjetividade discente. Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade de Brasília, Brasília: UnB, 2012., p. 31). Portanto, a relação entre educando-educador, seja na Educação Básica ou na Educação Superior, demanda reconhecimento de que essa relação é marcada pelo “[…] encontro de subjetividades, histórias e desejos […]” (ibid., p. 31).

Assim sendo, o ato de aprender é singular para cada sujeito: por isso não existe uma “maneira certa de ensinar”, nem “uma maneira certa de aprender”. Receitas didáticas tendem a não funcionar em Educação, uma vez que “[…] a operação ensino-aprendizagem envolve uma impossibilidade estrutural” (CARVALHO, 2004CARVALHO, A. M. F. T. A extimidade da demonstração. Tese (Doutorado em Educação Matemática) - Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, 2004., p. 194). Como alerta Blanchard-Laville (2005BLANCHARD-LAVILLE, C. Os professores: entre o prazer e o sofrimento. Editora: Edições Loyola, 2005.), o professor, na situação pedagógica, ao gozar da posição de sujeito-suposto-saber, presta-se ao jogo de “demandas de saber” e “demandas imaginárias”: ele deseja que os outros diante de si aprendam e pode até buscar estratégias na intenção de aproximar esses vários sujeitos dos saberes propostos, mas lhe escapa o controle sobre aquilo que ensina e sobre os estudantes, uma vez que ambos estão atravessados pelas dimensões da subjetividade, do inconsciente e dos mal-entendidos.

De acordo com a autora supracitada, na cena pedagógica – marcada pelas flutuações transferenciais e contratransferenciais –, o laço didático é tecido de mal-entendidos, “[…] inerentes a toda forma de vínculo, estando pois também na base do vínculo didático” (BLANCHARD-LAVILLE, 2005BLANCHARD-LAVILLE, C. Os professores: entre o prazer e o sofrimento. Editora: Edições Loyola, 2005., p. 177). Como aludido anteriormente, a sala de aula é um lugar de encontro de desejos, histórias e subjetividades, como também de traumas, prazeres e sofrimentos, onde Real, Simbólico e Imaginário se entrelaçam.

Neste sentido, o professor, na sala de aula, “[…] busca resposta a questões como ‘Por que ele (o aluno) não aprendeu?’, ‘O que é necessário para motivá-lo?’, ‘Como ensinar?’, ‘O que é a matemática?’, […] ‘O que é…?’” (CARVALHO, 2004CARVALHO, A. M. F. T. A extimidade da demonstração. Tese (Doutorado em Educação Matemática) - Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, 2004., p. 196). Atravessado por perguntas e incertezas, o docente “se sente perdido” e o estudante também. Essa é, como pressupõe a autora citada, a dimensão do real. A pergunta que fica, então, é: o que fazer com “Isso”?

5 Sobre o medo de Matemática e as dificuldades de aprendizagem como sintomas: algumas possibilidades de leitura

Se no campo médico os sintomas são atravessados por “[…] uma concepção objetivista de linguagem científica […] basicamente vinculada à noção de verdade em termos de correspondência com a realidade […]” (SILVA; RUDGE, 2017SILVA, A. C.; RUDGE, A. M. Construindo a noção de sintoma: articulações entre psicanálise e pragmática. Psicol. USP, São Paulo, v. 28, n. 2, p. 224-229, 2017. Disponível em: https://www.scielo.br/j/pusp/a/LQGbppDTsBYZKgmzR8YKNSm/?lang=pt. Acesso em: 1 abr. 2022.
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, p. 226, apudCOUTINHO, 1996COUTINHO, A. R. Cientificidade e relevância social I: controvérsias sobre a cientificidade da psicologia e das ciências sociais. Psicologia: Teoria e Pesquisa, Brasília, v. 12, n. 1, p. 23-37, 1996., p. 25), em Freud, por outro lado, o sintoma traz consigo mensagens inconscientes e é, como lembra Pereira (2017CECCARELLI, P. R. Sintoma e educação: breves reflexões sobre esta formação de compromisso. In: PEREIRA, M. R. (org.). Os sintomas na educação de hoje: o que fazer com “isso”? Belo Horizonte: Scriptum, 2017. p. 226-232.), uma expressão subjetiva disfarçada do desejo: para a Psicanálise, o sintoma não é sinal de alguma enfermidade, “[…] como por hábito se pensa a partir da ordem médica e psicopedagógica, e passa a ser um fenômeno subjetivo constituído pela realização deformada do desejo” (PEREIRA, 2017PEREIRA, M. R. Psicanálise, educação e sintoma: uma introdução. In: PEREIRA, M. R. (org.). Os sintomas na educação hoje: o que fazemos com “isso”? Belo Horizonte: Scriptum, 2017. p. 7-11., p. 7). Segundo esse autor, os sintomas na Educação escolar transbordam, manifestando-se indisfarçadamente em diversos problemas, dentre eles as dificuldades de aprendizagem e o fracasso escolar:

Os sintomas são indisfarçáveis, entre tantos, nas crianças com problemas de escolarização e de aprendizagem em instituições que desconhecem singularidades; nos efeitos danosos da inclusão de pessoas com deficiência ou com estigmas sociais numa sociedade que não efetiva tal processo plenamente; no acolhimento de sujeitos autistas e com transtornos globais do desenvolvimento cujo manejo em regra é sempre delicado; nos problemas de atenção e hiperatividade numa cultura superexcitada e ultraconectada; no cotidiano de adolescentes com reações agressivas, violentas, escarnecidas, chegando ao cometimento de atos infracionais e criminais; nas formas de exílio e de embaraço sexual e identificatório por parte dos jovens; em intervenções contra as maneiras destrutivas de laço social de sujeitos em condição de fracasso escolar, de evasão, de desistência e de conduta associal; bem como nas novas formas de mal-estar e padecimento psíquico por parte dos educadores, como as disposições depressivas e melancólicas, a inibição em ensinar, as angústias difusas, os fenômenos de pânico de sala de aula, as desordens da oralidade e da audição; e demais manifestações fronteiriças e borderlines do sintoma psíquico, que concorrem com formas clínicas já conhecidas (PEREIRA, 2017PEREIRA, M. R. Psicanálise, educação e sintoma: uma introdução. In: PEREIRA, M. R. (org.). Os sintomas na educação hoje: o que fazemos com “isso”? Belo Horizonte: Scriptum, 2017. p. 7-11., p. 08).

Compreende-se, sob a ótica da Psicanálise, que se os sintomas são produzidos no interior do laço social, podem ser interpretados simultaneamente como “condição do social” e como “[…] o modo particular de inscrição do sujeito no discurso, ou seja, no laço social” (VANIER, 2002VANIER, A. O sintoma social. Ágora, Rio de Janeiro, v. 5, n. 2, p. 205-217, 2002. Disponível em: https://www.scielo.br/j/agora/a/4Yjp3rzy9vWd3KCLpSY3dDN/?lang=pt. Acesso em: 1 abr. 2022.
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, p. 216), pois a instituição Escola é um tempo-espaço político e sociocultural marcado pela circulação e reprodução de formações sintomáticas ligadas a diferentes demandas educativas/curriculares, como aquelas relacionadas às (in)certezas e tensionamentos pedagógicos em torno do binómio “como se ensina/como se aprende”.

Lacan (1953/1998, p. 282) sugere que o sintoma pode ser entendido como “[…] o significante de um significado recalcado da consciência do sujeito” e diz da verdade do sujeito, haja vista que é através do seu sintoma que ele se expressa (SILVA; RUDGE, 2017SILVA, A. C.; RUDGE, A. M. Construindo a noção de sintoma: articulações entre psicanálise e pragmática. Psicol. USP, São Paulo, v. 28, n. 2, p. 224-229, 2017. Disponível em: https://www.scielo.br/j/pusp/a/LQGbppDTsBYZKgmzR8YKNSm/?lang=pt. Acesso em: 1 abr. 2022.
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, grifos nossos), revelando, no caso dos impasses no ensinar e aprender, aquilo que há de mais real e que não anda bem, que lhe causa sofrimento, como pontua Pereira (2017CECCARELLI, P. R. Sintoma e educação: breves reflexões sobre esta formação de compromisso. In: PEREIRA, M. R. (org.). Os sintomas na educação de hoje: o que fazer com “isso”? Belo Horizonte: Scriptum, 2017. p. 226-232., p. 11): o sintoma no âmbito educativo é, pois, “[…] aquilo que, de saída e sem disfarce, é apresentado pelo sujeito na cena pedagógica”.

Nesta perspectiva, Ceccarelli (2017CECCARELLI, P. R. Sintoma e educação: breves reflexões sobre esta formação de compromisso. In: PEREIRA, M. R. (org.). Os sintomas na educação de hoje: o que fazer com “isso”? Belo Horizonte: Scriptum, 2017. p. 226-232., p. 228), referenciando-se nos textos freudianos, vê o sintoma como “uma forma de compromisso, cuja origem é o conflito entre a representação pulsional recalcada e as instâncias psíquicas defensivas”. Segundo ele: “Ampliando essa definição, podemos dizer que cada subjetividade, cada um de nós, é um sintoma, pois nossa subjetividade é uma formação de compromisso entre, de um lado, as pulsões em busca de satisfação e, de outro, os limites impostos pelo processo civilizatório” (ibid., p. 228-229).

Noutras palavras, somos resultados dos caminhos identificatórios que nos constituíram, das experiências, das aprendizagens e comunicações conscientes ou inconscientes emergidas na e a partir da relação com o outro e o Outro. Assim, “não há sujeito fora de um arranjo sintomático, pois o sintoma se constrói na relação de significação, assim como o sujeito se constitui na linguagem, no campo do Outro” (SILVA; RUDGE, 2017SILVA, A. C.; RUDGE, A. M. Construindo a noção de sintoma: articulações entre psicanálise e pragmática. Psicol. USP, São Paulo, v. 28, n. 2, p. 224-229, 2017. Disponível em: https://www.scielo.br/j/pusp/a/LQGbppDTsBYZKgmzR8YKNSm/?lang=pt. Acesso em: 1 abr. 2022.
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, p. 227). Neste sentido, uma pergunta desponta: que lugar a Matemática ocupa no campo do Outro e quais seus possíveis efeitos na relação que os sujeitos (professores e estudantes) estabelecem com o ensinar e o aprender?

Importante assinalar que o grande Outro, numa perspectiva lacaniana, refere-se ao campo da linguagem, da cultura e do simbólico. Assim, podemos associá-lo ao campo das representações sociais e aos discursos ditos e não ditos que podem ser transmitidos consciente e/ou inconscientemente nos diferentes tempos-espaços educativos. Neste sentido, é possível que muitos impasses no ensinar e aprender possam ser interpretados como produções sintomáticas do sujeito ligadas a ditos e não-ditos que circulam no imaginário social e educativo, especialmente no campo das Ciências Exatas, em que discursos pré-construídos sobre o não aprender não cessam de (não) se repetir, trazendo implicações na relação que os sujeitos estabelecem com o conhecimento.

Historicamente, as Ciências Exatas é uma área do conhecimento que reúne disciplinas marcadas por estereótipos, estigmas, crenças, reprovações e evasões escolares, medos, angústias, mal-estares, sintomas. Estudos diversos, realizados sob diferentes perspectivas teóricas e metodológicas, evidenciam que problemas como a retenção e a evasão escolar nas Ciências Exatas têm-se apresentado como inquietante problemática em muitas instituições de ensino brasileiras, sejam universidades ou escolas da Educação Básica, públicas ou privadas, respeitadas suas especificidades.

As Ciências Exatas, de maneira geral, e especialmente a Matemática, a Física e a Química, ainda são estigmatizadas como disciplinas “duras” e “frias” no imaginário escolar e extraescolar, como se seus conteúdos fossem uma espécie de linguagem impossível de ser assimilada, aplicada e/ou contextualizada no “mundo da vida”. Frequentemente se ouve nas escolas, por exemplo, sobre o medo de Ciências Exatas – uma rejeição quase coletiva –, algo da ordem de uma fobia desvelada em relação às dificuldades de aprender nessas/essas disciplinas. O saber científico “das” Ciências Exatas, muitas vezes, é inferido como um saber estranho, produzido por gênios, enfim, uma espécie de saber intocável, algo para ser contemplado à distância; e o cientista, por sua vez, é recorrentemente concebido como uma espécie de “ser iluminado”, uma “figura de outro mundo”.

As raízes dessa aversão à Matemática e dificuldades de apre(e)ndê-la parece remontar à própria história das Ciências e à dicotomia historicamente estabelecida entre Ciências Exatas e Ciências Humanas. Os conteúdos latentes e manifestos presentes nos discursos proferidos social e culturalmente sobre as Ciências a partir dessa dicotomia demarcam uma suposta superioridade das Ciências Exatas em relação às Ciências Humano-sociais: aquelas, sustentadas na objetividade, ainda são tradicionalmente vistas como as verdadeiras ciências, as Hard Sciences (ciências duras), e estas, mais subjetivas, as Soft Sciences (ciências leves, suaves), com implicações que impactam direta e indiretamente o ensinar e aprender Matemática nas escolas e também nas universidades, pois, dentre outros possíveis efeitos, esses e outros ditos e não-ditos que circulam consciente e/ou inconscientemente no imaginário social e educativo em torno das Ciências Exatas podem colaborar com a reprodução da concepção de que a Matemática é uma ciência difícil e, portanto, para poucos.

Retomando a noção de sintoma, Cecarelli (2017, p. 229) afirma:

Cada sujeito é uma “solução” no sentido matemático do termo: tal como um sistema vetorial de forças, que comporta diferentes variáveis cada uma com um quantum de energia diferente, o sujeito representa a resultante desse sistema, uma solução frente aos conflitos e às incompatibilidades entre o constitucional, o adquirido, as experiências infantis, as demandas pulsionais e os limites a elas impostas, e as comunicações conscientes, mas sobretudo inconscientes.

Assim, reconhecemos como Pereira (2017CECCARELLI, P. R. Sintoma e educação: breves reflexões sobre esta formação de compromisso. In: PEREIRA, M. R. (org.). Os sintomas na educação de hoje: o que fazer com “isso”? Belo Horizonte: Scriptum, 2017. p. 226-232., p. 10) que professores e alunos, em suas tentativas de ensinar e aprender, estão envoltos pelas “[…] vicissitudes do ‘isso’, do desejo, da pulsão, do mal-estar e do sintoma no âmbito educativo”. Nesta direção, aprender evoca a singularidade do sujeito, o saber-fazer com o sinthoma, e é tocado pela questão do estilo, que para Kupfer (2013KUPFER, M. C. M. Educação para o futuro: psicanálise e educação. São Paulo: Escuta, 2013., p. 129) pode ser entendido como “[…] um modo próprio, único, de escrever, de falar, de se posicionar”, ou seja, diz-se do modo peculiar do sujeito estabelecer relações com o objeto de conhecimento.

Dessa forma, se o sintoma possui similaridades com a subjetividade e história do sujeito, sendo, pois, construído no interior do laço social, o medo de Matemática ou o não aprender como sintomas podem estar relacionados a conflitos intrapsíquicos construídos nas relações intersubjetivas com o outro e o Outro, pois no transcurso da história de vida e de formação escolar as vivências escolares e extraescolares deixam marcas no sujeito, constitutivas de sua subjetividade/identidade, com possíveis reflexos nas relações que estabelecerá com o conhecimento/saber.

Como pontuam Almeida e Rodrigues (1998ALMEIDA, I. M. M. Z. P.; RODRIGUES, M. A. M. Módulo Comum: imersão no processo educativo das Ciências e da Matemática. Programa de Aperfeiçoamento de Professores de Ensino Médio (Pró-Ciências). Brasília: Universidade Aberta do Distrito Federal, 1998., p. 10), muitas crenças que os professores e alunos alimentam acerca do sucesso e do fracasso na aprendizagem, de como ensinar e aprender Matemática ou qualquer outro saber, são frutos das experiências vividas por eles ao longo de suas trajetórias de vida e de formação escolar, pois a partir das relações que estabelecemos com o conhecimento matemático nos diferentes contextos de vida e na instituição escola, com a qual nossas interações são mais ou menos longas, reatualizamos “[…] vivências que, pela frequência com que foram experimentadas, [as interiorizamos] como sendo ‘naturais’ e, consequentemente, [tendemos] a reproduzir […]”, consciente e/ou inconscientemente, no espaço da sala de aula. Assim, a forma como a Matemática fora apresentada ao sujeito na infância, nos primeiros anos de escola ou até mesmo antes da escola, ou durante sua trajetória escolar, pode refletir no gostar ou odiar esse campo do saber, repercutindo, inclusive, no estilo de ensinar ou de aprender Matemática.

6 Para (não) finalizar

As reflexões tecidas neste texto foram norteadas pela tentativa de interpretar o trauma de estudantes universitários com dificuldades de aprendizagem matemática sob a ótica psicanalítica, num movimento que buscou entrelaçar percepções teóricas e depoimentos de discentes sobre seus medos, angústias, sintomas e desejos em relação ao saber/não-saber, ao aprender/não-aprender. Oportuno assinalar que, neste artigo, não se pretendeu apresentar pressupostos teórico-conceituais sobre as dificuldades de aprendizagem. Geralmente, quando se fala em dificuldades de aprendizagem, somos imediatamente induzidos a fazer associações ao Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade, à discalculia, dislexia, dislalia, disgrafia, disortografia, dentre outros.

A intencionalidade inscreveu-se em uma leitura inspirada na interface Psicanálise e educação sobre o ato de aprender e suas dificuldades, partindo da suspeita de que, como pontua Blanchard-Laville (2005BLANCHARD-LAVILLE, C. Os professores: entre o prazer e o sofrimento. Editora: Edições Loyola, 2005., p. 306, grifos da autora), “[…] a relação com o saber em sua constituição psíquica pré-histórica e histórica comporta inevitavelmente elementos traumáticos singulares”. Assim, parece oportuno lembrar que: “O saber, na medida em que se constitui um objeto transmissível, depende tanto da intersubjetividade como de determinantes cognitivos, e a esse título é suscetível de ser submetido a um tratamento psíquico vinculado ao registro libidinal” (ibid., p. 303).

Logo, ao problematizar sobre o trauma na aprendizagem matemática a partir de estudos psicanalíticos no campo da Educação, a dialética saber/não-saber ou aprender/não-aprender pode ser mais complexa do que costumeiramente suposto. Logo, a dimensão inconsciente coloca-nos perante a necessidade de rever todas as nossas certezas e, nesta direção, talvez a Psicanálise nos auxilie a “olhar para além do que os olhos podem ver”, para “ler nas entrelinhas” o que parece estar “obviamente” posto.

Sobre o ensinar e o aprender, seja na Matemática ou noutros campos do saber em suas relações, há muito “o que ser lido” para além das prescrições didáticas e do supostamente óbvio. Em especial sobre o tema abordado, há muito ainda o que ser estudado, debatido e problematizado, sob diferentes perspectivas e/ou referenciais teóricos. À luz da própria Psicanálise, outras leituras podem ser feitas, para além das apresentadas. Portanto, pretende-se que as reflexões aqui propostas suscitem novos questionamentos, incômodos e olhares sobre as vicissitudes que permeiam o ensinar e o aprender.

  • 1
    O PAS, em vigência na ocasião das entrevistas realizadas com os estudantes, em 2019, atualmente corresponde ao Núcleo de Orientação Sociopsicopedagógica (NOS), criado por meio da Portaria UFOB n° 328, de 29 de setembro de 2021, vinculado à Coordenadoria de Políticas de Assistência Estudantil da Diretoria de Ações Afirmativas e Assuntos Estudantis.

Agradecimentos

Agradecemos a Universidade Federal do Oeste da Bahia (UFOB) e o Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade de Brasília (PPGE/UnB).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2022

Histórico

  • Recebido
    06 Maio 2022
  • Aceito
    20 Jun 2022
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