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Contracepção hormonal oral e tromboembolismo?

GINECOLOGIA

Contracepção hormonal oral e tromboembolismo?

José M. Aldrighi

Recentemente, foi publicado no British Medical Journal (BMJ) uma carta do LAREB1 — Grupo de Farmacovigilância Holandês (Dutch Drug Safety Surveillance Group), relatando sobre a ocorrência de tromboembolismo venoso (TEV) em cinco mulheres usuárias de um novo contraceptivo oral combinado Yasmin® (drosperinona 3 mg + etinilestradiol 30 mcg).

Comentário

O uso rotineiro de contraceptivos orais combinados, contendo estrogênios e progestógenos, tem sido associado a benefícios como redução do risco de câncer endometrial, câncer de ovário, doença inflamatória pélvica e gravidez ectópica; por outro lado, podem promover riscos, como o tromboembolismo venoso (TEV).

Merece ser ressaltado que todos os contraceptivos orais combinados (COC) aumentam o risco de TEV de 3 a 4 vezes, quando comparado ao risco de mulheres não usuárias2. No entanto, o risco entre usuárias de COC é consideravelmente menor do que o risco de TEV associado à gravidez; de fato, a gestação aumenta em cerca de 15 vezes o risco, quando comparado a uma mulher não grávida2.

Infelizmente, a informação veiculada no BMJ e a cobertura da mídia que se seguiu à publicação podem ter induzido alguns leitores a acreditar que o risco aumentado de TEV poderia estar relacionado à associação drosperinona/etinilestradiol.

Torna-se, por isso, importante reconhecer que a carta publicada no BMJ não representa um estudo de casos, nem uma publicação cientificamente avaliada. Trata-se de um relato de ocorrência de poucos casos, onde aparentemente (pela escassez de informações), o fato comum era o uso da associação drosperinona/etinilestradiol. Assim, somente por essa informação não é possível afirmar que a referida associação pudesse ter promovido o evento tromboembólico. Inequivocamente, seria necessário um maior número de casos, bem como o controle de outras variáveis, que poderiam interferir no evento.

A experiência clínica atual com a associação drosperinona/etinilestradiol revela que o risco de TEV não difere de outros contraceptivos orais combinados, como comentam Shulman LP et al., em carta recentemente publicada no J. Reprod. Med.3.

Por isso, surpreende-me que num momento em que a comunidade de pesquisadores internacionais tem se preocupado em divulgar resultados de suas investigações baseados em nível de evidência 1 (dados derivados de estudos clínicos randomizados envolvendo grande número de sujeitos), informações como estas do LAREB, com nível de evidência 3 (dados derivados de relato ou série de casos), sejam publicadas em periódicos de alta credibilidade. Por outro lado, é de extrema importância e eticamente recomendado que sempre sejam relatados quaisquer eventos adversos decorrentes do uso de fármacos, porém sempre dentro de um rigor científico, que deve obrigatoriamente envolver dados completos da literatura, pois os incompletos certamente não contribuirão para o avanço do conhecimento científico.

Referências

1. Van Grootheest K, Vrieling T. Thromboembolism associated with the new contraceptive Yasmin®. BMJ 2003; 326: 257.

2. Maguire MG, Tonascia J, Sartwell PE, Stolley PD, Tockman MS. Increased risk of thrombosis due to oral contraceptives: a further report. Am J Epidemiol 1979; 110:188–95.

3. Shulman LP, Goldzieher JW, Mary Jane Minkin MJ, Sulak PJ, Thorneycnof I. Oral Contraceptives and Venous Thromboembolic Events. J Reprod Med 2003; 48: 306-7.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Jul 2003
  • Data do Fascículo
    Jun 2003
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