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Radioterapia e reconstrução mamária após cirurgia para tratamento do câncer de mama

PONTO DE VISTA

ONCOLOGIA/RADIOTERAPIA

Radioterapia e reconstrução mamária após cirurgia para tratamento do câncer de mama

Gustavo Nader MartaI; Samir Abdallah HannaII; Eduardo MartellaIII; João Luis Fernandes da SilvaIV

IMédico-residente em radioterapia do Centro de Oncologia do Hospital Sírio-Libanês, São Paulo, SP

IIEspecialista em Radioterapia pelo Colégio Brasileiro de Radiologia/Associação Médica Brasileira e Sociedade Brasileira de Radioterapia; Assistente do Departamento de Radioterapia e Preceptor dos residentes do Hospital Sírio-Libânes, São Paulo, SP

IIIDoutorado em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - USP; Radioterapeuta do Hospital Sírio-Libanês, São Paulo, SP

IVEspecialização em Radioterapia pelo Colégio Brasileiro de Radiologia/Associação Médica Brasileira e Sociedade Brasileira de Radioterapia; Radioterapeuta e Coordenador do Departamento de Radioterapia do Hospital Sírio-Libanês, São Paulo, SP

Correspondência para Correspondência para: Gustavo Nader Marta Rua Dona Adma Jafet, 91 - Bela Cintra CEP: 01308-050 - São Paulo - SP gnmarta@uol.com.br

Devido aos benefícios psicossociais conseguidos com as reconstruções mamárias imediatas (RMI)1, este procedimento vem ganhando muito espaço no Brasil, muito espaço, principalmente no contexto cirúrgico imediato. As duas principais modalidades de RMI usadas são as que utilizam tecido autógeno ou aquelas que empregam implantes de próteses artificiais ou expansores.

Não há consenso no tempo ideal em que a RMI deva ser efetuada dentro do contexto multimodal do tratamento oncológico, principalmente quando há indicação de radioterapia (RT) após mastectomia - que depende da peça cirúrgica - e em função da ausência de estudos randomizados confrontando RT pré- e pós-plastia.

Há um racional seguido por muitos grandes centros americanos em optar pela RT antes da RMI por duas razões principais:

1. Após o procedimento, tecidos não pertencentes ao leito mamário (retalhos musculares, pele e próteses) seriam irradiados sem necessidade.

2. A RMI feita antes da RT pode levar a planejamentos inadequados, seja com irradiação demasiada dos órgãos adjacentes, seja com irradiação insuficiente do leito cirúrgico e/ou drenagens linfonodais.

Outros obstáculos enfrentados estão relacionados ao tamanho da reconstrução mamária realizada, que, muitas vezes, modifica a anatomia da paciente em função da volumosa plastia e a colocação de expansores com componentes metálicos dentro do campo de irradiação, podendo resultar em regiões de sub e superdosagens2, traduzindo-se clinicamente em maior chance de complicação após a RT. Além disso, mamas medializadas, simastia e tórax plano naturalmente prejudicam o planejamento radioterápico.

Em contrapartida, além do já mencionado ganho psicológico com a reconstrução imediata, outra argumentação dos partidários dessa técnica é que a RT pode comprometer a qualidade da pele e dos tecidos subjacentes, dificultando a plastia com consequente influência nos resultados cosméticos3.

Nesse contexto, complicações podem surgir após a RMI imediata seguida de RT. Estas guardam estreita relação com a técnica de cirurgia plástica empregada. Nos casos em que se utilizam próteses, há maior ocorrência de formação de fibrose na interface implante/tecido, contratura capsular e cicatrização inadequada da pele. Nas que usam tecidos autólogos, observa-se aumento das taxas de necrose, fibrose, atrofia e contratura do retalho.

Um recente estudo prospectivo, multicêntrico e não randomizado teve o objetivo de determinar os fatores responsáveis pela falha da reconstrução e da contratura capsular em pacientes mastectomizadas que foram submetidas à cirurgia plástica imediata com expansão e implante e posterior RT. Foram avaliadas 141 pacientes com média de seguimento de 37 meses. De acordo com a classificação de Baker, a contratura capsular grau 0, 1 ou 3 ocorreu em 67,5% dos casos; grau 3 ou 4, em 32,5%. Na análise univariada, os fatores associados ao grau 3 e 4 de Baker foram terapia adjuvante com hormonoterapia (p = 0,02), o mastologista (p = 0,04) e tabagismo (p = 0,05). O único fator significativo na análise multivariada foi o mastologista (p = 0,009). Três fatores foram associados à falha cirúrgica imediata na análise múltipla de regressão logística: tumor T3 e T4 (p = 0,0005), tabagismo (p = 0,001), linfonodo axilar positivo (p = 0,004). Pacientes com nenhum, 1, 2 ou 3 desses fatores têm a probabilidade estimada de falha igual a 7%, 15,7%, 48,3% e 100%, respectivamente. Os autores concluem que a reconstrução imediata (com expansão seguida de implante) pode ser considerada, e três fatores podem ser utilizados para selecionar as pacientes que melhor se beneficiem dessa técnica cirúrgica4.

Sem dúvida, a melhor maneira para o manejo dessa situação é o enfoque multidisciplinar com a participação ativa do radioterapeuta, mastologista, cirurgião plástico e oncologista clínico para a convergência das opiniões rumo ao tratamento individualizado e otimizado para cada caso.

Trabalho realizado no Departamento de radioterapia do Hospital Sírio-Libanes, São Paulo, SP

  • 1. Al-Ghazal SK, Fallowfield L, Blamey RW. Comparison of psychological aspects and patient satisfaction following breast conserving surgery, simple mastectomy and breast reconstruction. Eur J Cancer. 2000;36(15):1938-4.
  • 2. Chawla AK, Kachnic LA, Taghian AG, Niemierko A, Zapton DT, Powell SN. Radiotherapy and breast reconstruction: complications and cosmesis with TRAM versus tissue expander/implant. Int J Radiat Oncol Biol Phys. 2002;54(2):520-6.
  • 3. Spear SL, Onyewu C. Staged breast reconstruction with saline-filled implants in the irradiated breast: recent trends and therapeutic implications. Plast Reconstr Surg. 2000;105(3):930-42.
  • 4. Cowen D, Gross E, Rouannet P, Teissier E, Ellis S, Resbeut M et al. Immediate post-mastectomy breast reconstruction followed by radiotherapy: risk factors for complications. Breast Cancer Res Treat. 2010;121(3):627-34.
  • Correspondência para:
    Gustavo Nader Marta
    Rua Dona Adma Jafet, 91 - Bela Cintra
    CEP: 01308-050 - São Paulo - SP
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      30 Maio 2011
    • Data do Fascículo
      Abr 2011
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