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Obesidade e hipertensão arterial em escolares de Santa Cruz do Sul - RS, Brasil

Resumos

OBJETIVO: Verificar a prevalência de obesidade e hipertensão arterial em escolares de Santa Cruz do Sul - RS, Brasil, nos períodos de 2005 e 2008. MÉTODO: Estudo com duas medidas transversais consecutivas, composto de amostra estratificada por conglomerados, totalizando 414 escolares, com idades entre 7 e 17 anos, 215 (51,9%) do sexo masculino, e 199 (48,1%) do sexo feminino. Foi avaliada a obesidade através do índice de massa corpórea (IMC) e percentual de gordura (%G). A hipertensão foi ponderada pelos valores de pressões arteriais, tanto sistólica (PAS) quanto diastólica (PAD). RESULTADOS: A avaliação do IMC evidenciou 18,6% e 22,3% de excesso de peso nos meninos (2005 e 2008, respectivamente), enquanto nas meninas estes índices foram de 22,6% e 14,6%. Em relação à obesidade, a prevalência foi de 4,7% em ambos os anos para os meninos, e redução de 12,6% para 9,0% nas meninas, quando comparados os dois anos. Quando analisada a diferença entre as avaliações, houve significância na classificação do IMC (p = 0,022) e %G (p = 0,017) somente no sexo feminino. Alterações estatisticamente significativas para a alteração da PAS foram encontradas somente no sexo masculino (p < 0,001). CONCLUSÃO: Os níveis de excesso de peso, obesidade e percentual de gordura em meninas, bem como o aumento dos níveis tensionais de pressão arterial sistólica em meninos, evidenciam a necessidade de intervenção precoce através de campanhas de saúde pública mais eficazes.

Obesidade; hipertensão; saúde pública; criança; adolescente


OBJECTIVE: To verify the prevalence of obesity and hypertension in schoolchildren from Santa Cruz do Sul - RS, Brazil, in 2005 and 2008. METHOD: The study was performed with two consecutive cross-sectional measurements, consisting of a stratified cluster sample, totaling 414 students, aged between 7 and 17 years, of which 215 (51.9%) were males and 199 (48.1%) were females. Obesity was assessed by body mass index (BMI) and percentage of body fat (%BF). Hypertension was measured by blood pressure values, both systolic (SBP) and diastolic (DBP). RESULTS: BMI assessment showed 18.6% and 22.3% of excess weight in males and 22.6% and 14.6% in females (in 2005 and 2008, respectively). Regarding obesity, the prevalence was 4.7% in both years for males and a reduction from 12.6% to 9.0% was observed in females. When analyzing the difference between assessments, there was significance in the BMI classification (p = 0.022) and %BF (p = 0.017) only in females. Statistically significant changes in SBP were found only in males (p < 0.001). CONCLUSION: The levels of excess weight, obesity, and %BF in females, as well as the increased levels of systolic blood pressure in males, demonstrate the need for early intervention through more effective public health campaigns.

Obesity; hypertension; public health; child; teenager


ARTIGO ORIGINAL

Obesidade e hipertensão arterial em escolares de Santa Cruz do Sul - RS, Brasil

Éboni Marília ReuterI; Cézane Priscila ReuterII; Leandro Tibiriçá BurgosIII; Miriam Beatris ReckziegelIV; Fúlvio Borges NedelV; Isabella Martins de AlbuquerqueVI; Hildegard Hedwig PohlVII; Miria Suzana BurgosVIII

IFisioterapeuta, Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC), Santa Cruz do Sul, RS, Brasil

IIFarmacêutica; Mestranda em Promoção da Saúde, UNISC, Santa Cruz do Sul, RS, Brasil

IIIMestre em Desenvolvimento Regional, Departamento de Educação Física e Saúde, UNISC, Santa Cruz do Sul, RS, Brasil

IVMestre em Ciência do Movimento Humano, Departamento de Educação Física e Saúde, UNISC, Santa Cruz do Sul, RS, Brasil

VDoutor em Epidemiologia, Departamento de Saúde Pública, Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Florianópolis, SC, Brasil

VIDoutora em Ciências Médicas, Departamento de Fisioterapia e Reabilitação, Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Santa Maria, RS, Brasil

VIIDoutora em Desenvolvimento Regional; Professora do Programa de Pós-graduação em Promoção da Saúde, UNISC, Santa Cruz do Sul, RS, Brasil

VIIIDoutora em Ciências da Motricidade Humana; Professora do Programa de Pós-graduação em Promoção da Saúde, UNISC, Santa Cruz do Sul, RS, Brasil

Correspondência para Correspondência para: Cézane Priscila Reuter Rua Ernesto Carlos Iserhard, 537 Santa Cruz do Sul - RS, Brasil CEP: 96825-040 Tel: +55 51 3713-1116 +55 51 9742-6331 +55 51 3717-76031 cpreuter@hotmail.com

RESUMO

OBJETIVO: Verificar a prevalência de obesidade e hipertensão arterial em escolares de Santa Cruz do Sul - RS, Brasil, nos períodos de 2005 e 2008.

MÉTODO: Estudo com duas medidas transversais consecutivas, composto de amostra estratificada por conglomerados, totalizando 414 escolares, com idades entre 7 e 17 anos, 215 (51,9%) do sexo masculino, e 199 (48,1%) do sexo feminino. Foi avaliada a obesidade através do índice de massa corpórea (IMC) e percentual de gordura (%G). A hipertensão foi ponderada pelos valores de pressões arteriais, tanto sistólica (PAS) quanto diastólica (PAD).

RESULTADOS: A avaliação do IMC evidenciou 18,6% e 22,3% de excesso de peso nos meninos (2005 e 2008, respectivamente), enquanto nas meninas estes índices foram de 22,6% e 14,6%. Em relação à obesidade, a prevalência foi de 4,7% em ambos os anos para os meninos, e redução de 12,6% para 9,0% nas meninas, quando comparados os dois anos. Quando analisada a diferença entre as avaliações, houve significância na classificação do IMC (p = 0,022) e %G (p = 0,017) somente no sexo feminino. Alterações estatisticamente significativas para a alteração da PAS foram encontradas somente no sexo masculino (p < 0,001).

CONCLUSÃO: Os níveis de excesso de peso, obesidade e percentual de gordura em meninas, bem como o aumento dos níveis tensionais de pressão arterial sistólica em meninos, evidenciam a necessidade de intervenção precoce através de campanhas de saúde pública mais eficazes.

Unitermos: Obesidade; hipertensão; saúde pública; criança; adolescente.

INTRODUÇÃO

Mudanças no estilo de vida têm ocorrido de acordo com as preferências sociais ao longo da evolução do ser humano. As características da população mudam de igual forma. Neste sentido, nos últimos dois séculos, houve um fenômeno que a literatura denomina de transição epidemiológica, em que doenças crônicas não transmissíveis ganharam enfoque, enquanto doenças de cunho infeccioso e parasitário deixam de ser o principal agente de morbimortalidade1.

As doenças crônicas não transmissíveis são aquelas de etiologia múltipla, que possuem curso prolongado, advindas com comorbidades muitas vezes de longo tempo assintomáticas, e, principalmente, com fatores de risco modificáveis em sua gênese1. Destas, podemos destacar a obesidade, a qual gera alterações sistêmicas, principalmente com repercussões cardiovasculares e endócrinas2.

As doenças cardiovasculares estão em destaque, o que se justifica por serem a principal causa de morte e incapacidade em países desenvolvidos e em desenvolvimento3. Dentre a vasta gama de doenças desta ordem, uma das mais prevalentes na população é a hipertensão arterial sistêmica, que se caracteriza por níveis elevados e sustentados de pressão arterial4. Sabe-se que a hipertensão deixou de ser exclusividade de adultos. Estudos anteriores têm demonstrado que crianças e adolescentes obesos são indivíduos potenciais a desenvolverem esta alteração2,5.

Dentro deste contexto, o ambiente vivenciado durante a infância parece estar fortemente relacionado ao risco de doenças não transmissíveis na vida adulta. Um estímulo durante o desenvolvimento infantil provoca respostas permanentes de adaptação, que produzem mudanças de longo prazo na estrutura do tecido ou função6. Doenças cardiovasculares possuem estreita relação com a genética, e se associadas com fatores de risco gerados por um estilo de vida inadequado logo na infância, resultam em enfermidades mais tarde manifestadas no adulto7. Por fim, sabe-se que a intervenção precoce faz-se necessária, uma vez que somente ela é capaz de garantir um estilo de vida sadio para o sistema cardiovascular na fase adulta, e, desta forma, modificar os altos índices de morbimortalidade cardiovascular8.

Neste sentido, o presente estudo teve por objetivo verificar a prevalência de obesidade e de hipertensão arterial em escolares de Santa Cruz do Sul, Rio Grande do Sul, nos anos de 2005 e 2008.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo com duas medidas transversais consecutivas (antes e depois) com crianças e adolescentes matriculados em escolas do município de Santa Cruz do Sul - RS, Brasil. Esta pesquisa é uma subamostra dos Projetos "Perfil do estilo de vida, somatomotor e fatores de risco: um estudo com escolares de Santa Cruz do Sul e participantes de Projetos da UNISC" e "Saúde e estilo de vida na escola e na família: indicadores de saúde de escolares e sua relação com a saúde familiar, no meio urbano e rural de Santa Cruz do Sul", ambos da Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC).

A amostra estudada correspondeu aos 414 escolares avaliados em 2005 e que foram novamente encontrados na medição de 2008; construiu-se, portanto, para este estu do, uma coorte fechada. Os dados originalmente coletados durante o ano de 2005 e 2008 foram selecionados aleato riamente de uma amostra estratificada por conglomerados (centro e norte, sul, leste e oeste da periferia da zona urba na, e norte, sul, leste e oeste da zona rural), pertencentes a 18 escolas (municipais, estaduais e privadas), sendo 14 da zona urbana e quatro da zona rural.

Participaram deste estudo todos os escolares que es tavam matriculados na escola sorteada, com idades entre 7 e 17 anos e tendo o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido assinado por seu responsável, autorizando a participação nas avaliações e nos testes realizados. Foram excluídos do estudo todos os escolares portadores de algu ma patologia incapacitante à realização dos testes.

Neste estudo, as variáveis analisadas foram: índice de massa corporal (IMC), percentual de gordura (%G), pres são arterial sistólica (PAS) e diastólica (PAD), bem como as classificações destas variáveis, sendo o IMC na forma contínua e em três categorias (normal, excesso de peso e obesidade), e a presença de hipertensão (definida através das VI Diretrizes Brasileiras de Hipertensão, 2010)4. Para fins de discriminação, foram analisadas suas distribuições segundo sexo e ano da amostra.

O IMC foi calculado através da fórmula peso (kg) + es tatura (m)2, categorizado de acordo com as curvas de percentis para gênero e idade, segundo o protocolo de Conde e Monteiro9, e destinado à avaliação do estado nutricional de crianças e adolescentes brasileiros. Para a avaliação do somatório de dobras cutâneas (ZDC) e %G, foram utili zadas as medidas das dobras cutâneas tricipital e subescapular, obtidas por meio da medição com compasso de Lange (MultiMed, Skinfold Caliper, EUA). Para o cálculo do %G, utilizou-se a equação de Slaughter10, sendo pos teriormente classificado de acordo com os dados de Hey ward e Stolarczyk10.

A pressão arterial foi aferida com o aluno sentado, em repouso. Utilizaram-se esfigmomanômetro (B-D®, aneroi de, Alemanha) e estetoscópio (Premium, Rappaport, Chi na) no braço direito e manguito adequado para o períme tro braquial do aluno. A pressão foi classificada por meio dos percentis 90 e 95 para a faixa limítrofe e hipertensão, respectivamente, conforme parâmetros da Sociedade Bra sileira de Hipertensão4. Neste estudo não foi considerado o percentil 99 para a estratificação da hipertensão. Logo, os percentis 95 e 99 foram unificados, classificando os esco lares em ambas as faixas como "hipertensos". A equipe de avaliadores foi previamente capacitada.

Para a análise dos dados, foi utilizado o programa Statistical Package for Social Sciences for Windows (SPSS -versão 18.0). A estatística descritiva compreendeu medidas de tendência central e dispersão, frequência e percentual (%). Foi utilizado o teste de Kolmogorov-Smirnov, o qual demonstrou distribuição normal para todas as variáveis contínuas, o que permitiu a utilização dos testes paramétricos. Assim, a diferença entre os grupos (2005 e 2008) foram calculadas usando o Qui-quadrado para tendências nas variáveis categóricas e teste t de Student para variáveis numéricas. Com o propósito de analisar a relação entre as variáveis antropométricas e pressão arterial, fezse a correlação linear de Pearson. O nível de significância considerado foi de p < 0,05.

O projeto foi previamente encaminhado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da UNISC, sob o protocolo 2780/10, em conformidade com a Declaração de Helsinki. Os pais ou responsáveis assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido à entrada dos estudos prévios, autorizando a participação de seus filhos nas avaliações e nos testes realizados. Foram excluídas as crianças e adolescentes que não participaram das duas avaliações.

RESULTADOS

Foram avaliados no ano de 2005 414 escolares, sendo reavaliados, no ano de 2008, estudantes de escolas das redes de ensino pública e privada de Santa Cruz do Sul, Rio Grande do Sul, Brasil. A média geral de idade foi de 9,8 (DP 1,8 anos) e de 14,0 (DP 1,8 anos), respectivamente no ano de 2005 e 2008. Em relação ao sexo, 215 (51,9%) são do sexo masculino, e 199, do sexo feminino (48,1%).

De acordo com a Tabela 1, podemos analisar a média total, bem como as médias diferenciadas por sexo para o IMC e %G, sendo que, em ambas as variáveis, houve acréscimo em seus valores. Deve-se destacar que a média global do IMC aumentou significativamente (p < 0,001) de 17,88 (DP 3,26) kg/m2 para 20,15 (DP 3,74) kg/m2 nos meninos, e de 18,29 (DP 3,47) kg/m2 para 20,73 (DP 4,09) kg/m2 nas meninas (p < 0,001).

Na Tabela 2, podemos observar que houve resultados distintos em relação ao sexo. Para os meninos, não houve alterações estatisticamente significantes entre os dois anos no que tange tanto à classificação do IMC, quanto do %G. Nas meninas, houve diferença estatisticamente significante para o IMC (p = 0,022) e %G (p = 0,017). No sexo feminino, ainda pode-se perceber que houve redução da classificação do IMC, porém um acréscimo do %G.

A Tabela 2 demonstra que houve alterações estatisticamente significantes para a classificação da PAS somente no sexo masculino (p < 0,001), quando avaliada a diferença entre os dois anos. Para a faixa de normalidade na PAS, houve um decréscimo em ambos os sexos (de 21% e 10% respectivamente para o sexo masculino e feminino), enquanto na faixa limítrofe, houve um acréscimo superior a 10%, em ambos os sexos.

Apesar de na classificação da PAD não haver significância estatística, podemos observar uma diminuição do número de escolares na faixa de normalidade e um aumento nas faixas limítrofe e hipertensão para meninos e meninas.

Para a avaliação de possíveis relações entre variáveis dependentes (PAS e PAD) e independentes (IMC e %G), observou-se uma correlação significativa em todas elas (p < 0,05). Para PAS, houve correlação fraca com IMC em ambos os anos e com %G apenas em 2005. Já para PAD, encontrou-se uma correlação fraca somente com o IMC, em ambos os anos (Tabela 3).

DISCUSSÃO

Nosso estudo demonstrou um aumento da prevalência de níveis limítrofe e de hipertensão para a pressão arterial sistêmica em escolares de Santa Cruz do Sul, com idades entre 7-17 anos em um período de três anos -2005 a 2008, com diferença estatisticamente significante para meninos.

Outro achado importante foi um aumento significativo das médias do IMC, PAS e PAD em ambos os sexos, e %G somente para as meninas. Em relação à classificação, observou-se diminuição estatisticamente significante do IMC e aumento do %G para o sexo feminino.

A definição de sobrepeso e obesidade, bem como sua classificação em crianças e adolescentes, apresenta muita variabilidade em relação aos métodos classificatórios, o que dificulta a comparação dos resultados com estudos prévios11.

Em relação ao IMC, nossos resultados demonstram que houve um aumento das médias, quando comparado ao ano, em ambos os sexos. Gupta et al.12 encontraram resultados semelhantes na Índia, evidenciando um aumento da média do IMC em meninos (p = 0,006), também comparando com uma diferença de três anos.

Em relação à classificação do IMC, nossos escolares apresentaram um índice de sobrepeso de 18,6% e 22,3% em meninos (2005 e 2008, respectivamente), enquanto para meninas, 22,6% em 2005 e 14,6% em 2008. Costa, Cintra e Fisberg11, em um estudo na cidade de Santos - SP, observaram índices menores de sobrepeso, porém maiores em relação à obesidade, tanto para o sexo masculino quanto para o feminino. De forma complementar, os autores encontraram uma maior significância em relação à prevalência de sobrepeso em meninas, enquanto na obesidade foram os meninos, resultados estes que divergem dos nossos.

Em Pelotas -RS13, os autores encontraram valores semelhantes em relação a sobrepeso e obesidade para meninos (21,3% e 5,1%, respectivamente). Para meninas, 20,5% de sobrepeso e 4,8% de obesidade, sendo este último menor do que os resultados encontrados no presente estudo. Em Maceió, a prevalência total de sobrepeso foi de 9,3%, e, para obesidade, 4,5%, índices comparativamente menores em relação aos nossos14.

Ainda sobre a classificação do IMC, observamos no sexo masculino um decréscimo para faixa de normalidade, acréscimo para o excesso de peso e manutenção na obesidade. Já no sexo feminino, acréscimo na faixa normal, redução tanto do excesso de peso quanto da obesidade. Um estudo realizado em Delhi (Índia), que avaliou escolares em dois períodos (2006 e 2009), demonstrou um significante aumento da prevalência do sobrepeso (23,2% para 25,9%; p = 0,023) e obesidade (8,9% para 11,5%; p = 0,002) em meninos. Nas meninas, a prevalência de sobrepeso diminuiu (25,9% para 24,0%; p = 0,227), corroborando nossos achados12.

Em relação ao %G, os principais resultados envolvendo acréscimo em níveis não desejados foram no sexo feminino, com significância estatística tanto para média (p < 0,001) quanto para classificação (p = 0,017). Achados estes confirmados por Kolle et al.15, Morales et al.16, Bergmann et al.17 e Alvarez et al.18. McCarthy19 relata que há diferenças conhecidas no desenvolvimento de adiposidade entre meninos e meninas. Os valores são semelhantes por sexo até a puberdade, divergindo acentuadamente a partir deste período, sendo que os meninos diminuem o %G corporal proporcionalmente em relação às meninas.

O fato de as meninas terem apresentado um decréscimo para o excesso de peso e obesidade, quanto ao IMC, bem como um acréscimo para as classes indesejáveis, com relação ao %G, pode ser explicado pela transição hormonal que ocorre durante a puberdade, em que há a estimulação do desenvolvimento da gordura corporal pelo estrogênio, aumentando o acúmulo de gordura corporal e diminuindo a proporção da massa muscular. O maior conteúdo deste tecido se dá tanto pelo maior número, quanto pelo maior tamanho dos adipócitos20. Além disso, o IMC é um índice que não reflete composição corporal21.

Kaplowitz22 relata que vários estudos recentes mostram que as meninas que têm índices de massa corporal relativamente mais altos são mais propensas a ter a menstruação mais cedo, sugerindo uma relação entre o estado hormonal e a composição corporal.

Em outro cenário, Rivera et al.23 encontraram, na cidade de Maceió, uma prevalência de sedentarismo em 93,5% das crianças e adolescentes examinados, sendo mais frequente em adolescentes do sexo feminino. Neste estudo, foram considerados sedentários aqueles que não praticam atividade física com intensidade moderada a alta ao longo da semana.

Ao que concerne à pressão arterial, encontramos valores significantes em relação à classificação da pressão arterial sistólica em meninos (p < 0,001). Apesar disto, percebemos uma redução do número de crianças e adolescentes na faixa de normalidade, e acréscimo nas faixas limítrofe e hipertensão, para PAS e PAD no sexo masculino, e PAD no feminino. Para PAS, houve um decréscimo na faixa hipertensão entre as meninas, no último corte estudado. Este fato pode estar relacionado aos fatores hormonais da puberdade, citados anteriormente, pois o estrogênio apresenta efeito cardioprotetor, incluindo efeitos na parede arterial24,25, o que hipoteticamente pode justificar a diminuição dos níveis de hipertensão sistólica nas meninas. Além dos fatores hormonais, a prática de atividade física, a qual não foi avaliada no presente estudo, pode influenciar no decréscimo da pressão arterial26.

Para médias, obtivemos um acréscimo significativo (p < 0,001) de PAS e PAD entre os anos, para ambos os sexos. Contudo, este aumento é esperado, uma vez que o estudo considerou os mesmos escolares, sendo que estes cresceram durante este período. Neste sentido, vale salientar a estreita relação entre a estatura corporal e a pressão arterial.

Steinthorsdottir et al.27, em seu estudo com crianças islandesas com idades entre 9-10 anos, encontraram uma prevalência de pressão arterial maior em meninos (13,9% versus 12,3%). Os mesmos achados de aumento pressórico foram encontrados por Bancalari et al.28 no Chile, Salvadori et al.2 no Canadá, Sorof et al.29 e Morrison et al.30 nos Estados Unidos, Aguirre et al.31 na Espanha, Benmohammed et al.32 na Argélia, Gomes e Alves33 e Araújo et al.34 no Brasil.

Desta forma, estudos nacionais e internacionais demonstram a maior prevalência de hipertensão em meninos. Apesar disto, não encontramos na literatura uma explicação sobre a diferença entre gêneros na alteração da pressão arterial sistólica2,28-35.

Apesar de ainda não se conhecer por quais mecanismos a PAS ocorre mais em meninos, destaca-se a importância de identificar a hipertensão na infância e adolescência, para ambos os sexos, pois, como relatam Liang e Mi36, cinquenta por cento das crianças com hipertensão tornaramse adultos hipertensos, sendo que, dos pré-púberes hipertensos, 34,3% apresentaram esta alteração quando adultos.

Para a correlação de variáveis de pressão arterial, tanto sistólica quanto diastólica, com as variáveis antropométricas avaliadas neste estudo, encontramos uma correlação fraca entre as seguintes variáveis: PAS e IMC (em 2005 e 2008), PAS e %G (apenas em 2005) e PAD e IMC (nos anos de 2005 e 2008). Para todas as variáveis analisadas nesta correlação, obtivemos um de p < 0,001. Steinthorsdottir et al.27 encontraram correlação significativa entre IMC e PAS (r = 0,038; p < 0,001). Apesar de no presente estudo não ter sido avaliada a circunferência da cintura, os dados já foram analisados por nosso grupo em outro trabalho, evidenciando correlação moderada entre esta variável e a pressão arterial sistólica (r = 0,498 e p < 0,001)37.

Acreditamos que há fatores que não foram objetos do presente estudo que influenciam nos resultados, como: os hábitos diários de permanecer em frente ao computador, assistir televisão ou passar muitas horas em jogos, como vídeogames38,39; quantidade de medições da pressão arterial40; âmbito escolar41; hábitos alimentares; e classe socioeconômica38. Em relação aos níveis pressóricos, devemos considerar que as diferenças de prevalência em relação a outros estudos podem ser atribuídas às diferenças de etnia, à economia local e aos parâmetros utilizados para estabelecê-los40. Em Belo Horizonte, estudo realizado por Garcia et al.42 identificou que PAS e PAD estiveram associadas a crianças de cor branca e com alto índice de qualidade de vida urbana (IQVU), que representa a origem social do indivíduo, avaliado através de vários indicadores, como renda familiar, condições de saúde, assistência social, educação e condição habitacional.

O presente estudo apresenta algumas limitações: não analisou o nível socioeconómico, o tempo despendido com exercícios físicos bem como quais as atividades praticadas, ou mesmo o nível de sedentarismo. Podem ser acrescidas nestas limitações a falta de dados nutricionais, história familiar e a circunferência da cintura, sendo este último um dado antropométrico importante como indicador da saúde cardiovascular. Por isto, sugerimos que novos estudos sejam realizados, a fim de se obter um panorama mais completo.

CONCLUSÃO

Os achados do presente estudo demonstram que os níveis de prevalência de excesso de peso, obesidade e %G encontram-se elevados nos escolares, principalmente do sexo feminino. Adicionalmente, o aumento dos níveis tensionais de pressão arterial sistólica em meninos evidencia a necessidade de intervenção precoce através de campanhas de saúde pública mais eficazes. Estes dados são preocupantes, uma vez que crianças e adolescentes com estas alterações possuem riscos aumentados de desenvolverem doenças crónicas não transmissíveis quando adultas.

A redução dos percentuais nos níveis de normalidade na pressão arterial, tanto sistólica quanto diastólica, apesar de não ter apresentado significância estatística, ainda é relevante, pois demonstra uma regressão no perfil do grupo estudado.

Sendo assim, salienta-se a importância de diagnosticar a obesidade e/ou hipertensão arterial sistêmica nessa faixa etária, a fim de identificar os indivíduos com alterações ou, ainda, aqueles que possuem fatores de risco para potenciais alterações futuras.

Artigo recebido: 10/01/2012

Aceito para publicação: 23/08/2012

Conflito de interesse: Não há.

Trabalho realizado na Universidade de Santa Cruz do Sul, Santa Cruz do Sul, RS, Brasil

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Dez 2012
    • Data do Fascículo
      Dez 2012

    Histórico

    • Recebido
      10 Jan 2012
    • Aceito
      23 Ago 2012
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