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Recristalização do aço AISI 430 com estrutura colunar de grãos

Resumos

O recozimento de materiais com grãos grosseiros permite observar importantes efeitos de orientação na recristalização. Amostras do aço inoxidável ferrítico AISI 430 estabilizado ao nióbio e com estrutura colunar de grãos foram deformadas até reduções de 50 e 80% e recozidas em temperaturas variando de 300 a 1100°C para avaliação do amolecimento e da cinética de recristalização. As amostras compreendem a seção longitudinal de uma placa obtida via lingotamento contínuo. A laminação foi realizada a morno (<FONT FACE=Symbol>»</FONT> 480°C), numa configuração na qual os grãos colunares permaneceram alinhados com a direção normal (contornos de grão paralelos à DN). A caracterização microestrutural das amostras utilizou microscopia eletrônica de varredura (MEV) no modo de elétrons retroespalhados. Os resultados mostram que o tamanho de grão recristalizado varia localmente de região para região, indicando efeitos de orientação importantes.

Aço inoxidável ferrítico; recristalização; grãos colunares


Annealing of coarse-grained materials allows the observation of important orientation effects during recrystallization. Samples of the niobium-stabilized ferritic stainless steel 430 with columnar grain structure have been deformed up to reductions of 50% and 80% and annealed at temperatures ranging from 300°C up to 1100°C to evaluate its softening behavior and the recrystallization kinetics. Samples comprise the longitudinal section of a continuous-cast slab. Warm rolling has been performed (<FONT FACE=Symbol>»</FONT> 480°C) in such a configuration that the columnar grains are aligned with the normal direction (grain boundaries parallel to the ND). Microstructural characterization has been performed using scanning electron microscopy (SEM) in the backscattered electrons mode. Results show that the recrystallized grain size varies locally from one region to another indicating significant orientation effects.

Ferritic stainless steel; recrystallization; columnar grains


METALURGIA FÍSICA

Recristalização do aço AISI 430 com estrutura colunar de grãos

Rodrigo Pinto de SiqueiraI; Carlos Eduardo Monteiro RodriguesII; Hugo Ricardo Zschommler SandimIII; Carlos Alberto BaldanIV; Tarcísio Reis de OliveiraV

IDepartamento de Engenharia de Materiais - EEL - USP, Lorena, SP. E-mail: rodrigo@ppgem.eel.usp.br

IIDepartamento de Engenharia de Materiais - EEL - USP, Lorena, SP. E-mail: cemr82@gmail.com IIIDepartamento de Engenharia de Materiais - EEL - USP, Lorena, SP. E-mail: hsandim@demar.eel.usp.br

IVDepartamento de Engenharia de Materiais - EEL - USP, Lorena, SP. E-mail:cabaldan@demar.eel.usp.br

VACESITA S.A. - Timóteo, MG. E-mail: tarcisio.oliveira@acesita.com.br

RESUMO

O recozimento de materiais com grãos grosseiros permite observar importantes efeitos de orientação na recristalização. Amostras do aço inoxidável ferrítico AISI 430 estabilizado ao nióbio e com estrutura colunar de grãos foram deformadas até reduções de 50 e 80% e recozidas em temperaturas variando de 300 a 1100ºC para avaliação do amolecimento e da cinética de recristalização. As amostras compreendem a seção longitudinal de uma placa obtida via lingotamento contínuo. A laminação foi realizada a morno (» 480ºC), numa configuração na qual os grãos colunares permaneceram alinhados com a direção normal (contornos de grão paralelos à DN). A caracterização microestrutural das amostras utilizou microscopia eletrônica de varredura (MEV) no modo de elétrons retroespalhados. Os resultados mostram que o tamanho de grão recristalizado varia localmente de região para região, indicando efeitos de orientação importantes.

Palavras-chave: Aço inoxidável ferrítico, recristalização, grãos colunares.

ABSTRACT

Annealing of coarse-grained materials allows the observation of important orientation effects during recrystallization. Samples of the niobium-stabilized ferritic stainless steel 430 with columnar grain structure have been deformed up to reductions of 50% and 80% and annealed at temperatures ranging from 300ºC up to 1100ºC to evaluate its softening behavior and the recrystallization kinetics. Samples comprise the longitudinal section of a continuous-cast slab. Warm rolling has been performed (» 480ºC) in such a configuration that the columnar grains are aligned with the normal direction (grain boundaries parallel to the ND). Microstructural characterization has been performed using scanning electron microscopy (SEM) in the backscattered electrons mode. Results show that the recrystallized grain size varies locally from one region to another indicating significant orientation effects.

Keywords: Ferritic stainless steel, recrystallization, columnar grains.

1. Introdução

Os aços inoxidáveis ferríticos vêm sendo desenvolvidos e amplamente utilizados em diversos setores industriais. São amplamente utilizados na confecção de baixelas, fogões, geladeiras, entre outros itens. Essas aplicações são possíveis devido à sua boa resistência mecânica (ductilidades) e elevada resistência à corrosão (1,3). Elementos como o nióbio e o titânio são adicionados com o propósito de estabilizar essa classe de aços. A estabilização consiste na formação de carbonetos de nióbio e titânio homogeneamente distribuído na matriz ferrítica, evitando, assim, a formação de carboneto de cromo, que empobrece, em especial, a região dos contornos de grão. Esse empobrecimento localizado favorece a corrosão intergranular (4,5). O aço inoxidável ferrítico utilizado, nesse trabalho, é o AISI 430, com adição de nióbio, o qual é um aço magnético, endurecível por conformação a frio e utilizado, basicamente, no estado recozido (3).

A presença de partículas grosseiras e ricas em nióbio (carbonetos e carbonitretos) pode influenciar o comportamento desse aço, durante os processos de recuperação e de recristalização. Partículas grosseiras, com tamanho médio superior a 1 µm, em geral, favorecem a nucleação da recristalização (nucleação estimulada por partículas) (6). O material, após o processo de deformação plástica, concentra grande quantidade de defeitos cristalinos próximos a essas partículas, aumentando, localmente, o potencial para a recristalização. Nessas regiões, a presença de subgrãos com grande diferença de orientação (y), em relação à matriz, é comumente evidenciada. Mediante ativação térmica, esses subgrãos podem aumentar sua desorientação e criar contornos com caráter de alto ângulo aptos a migrar durante o recozimento(6). Outras regiões também favoráveis para a nucleação da recristalização são as regiões próximas aos contornos de grão e as heterogeneidades de deformação. Exemplos típicos dessas heterogeneidades são as bandas de deformação e de cisalhamento. Essas regiões apresentam grande densidade de discordâncias que favorecem a formação de contornos de alto ângulo induzidos por deformação plástica e que apresentam grandes diferenças de orientação com a matriz deformada (7,8). A estrutura de grãos colunares e grosseira exibida por esse aço, após a etapa de lingotamento contínuo, favorece a formação de heterogeneidades de deformação no processo de deformação plástica (9).

O objetivo desse trabalho consiste em caracterizar a microestrutura do aço AISI 430, no estado encruado e após recozimento, investigando a influência das heterogeneidades de deformação e das partículas ricas em nióbio na nucleação da recristalização desse aço com estrutura tão grosseira.

2. Materiais e métodos

O aço inoxidável ferrítico AISI 430 produzido pelo processo de lingotamento contínuo (LC) foi cedido pela empresa ACESITA S.A. A composição química desse aço é de 16%Cr, 0,02 %C, 0,02 %N, 0,39% Nb, 0,19% Mn, 0,30% Si, 0,002% S, 0,03% P e 0,005% Al (% em peso). Placas com espessura de 20 mm foram laminadas a morno (encharcadas em 480ºC) em múltiplos passes até reduções de 50% e 80% na espessura. A direção de laminação (DL) foi fixada de modo a permitir que o eixo longitudinal dos grãos colunares presentes nas placas seja perpendicular à DL, como mostrado, esquematicamente, na Figura 1. Amostras foram retiradas das placas com as duas reduções mencionadas e, posteriormente, recozidas ao ar em temperaturas variando de 300 até 1100ºC por 15 min para determinação da curva de amolecimento isócrono. Já para a cinética de recristalização, as amostras foram recozidas ao ar em três temperaturas distintas com tempos variando de 1 até 60 min. Amostras, no estado encruado e recozidas, foram preparadas para análise metalográfica da seção longitudinal. Para a revelação da microestrutura, as amostras foram imersas em uma solução ácida (reagente Villela), mantida a 0ºC em banho de gelo e com tempos de imersão variando entre 10 e 30 s. Após cuidadosa preparação metalográfica, as amostras foram caracterizadas com o auxílio da microscopia eletrônica de varredura (MEV) num microscópio marca LEO, modelo 1450-VP, operando a 20 kV no modo de elétrons retroespalhados. Medidas de microdureza Vickers foram realizadas para o levantamento da curva de amolecimento isócrono e das curvas da cinética de recristalização. Um microdurômetro marca Buehler, modelo Micromet 2004, com uma carga de penetração de 50 g foi utilizado para as medidas de microdureza Vickers. Os resultados apresentados são a média de 10 medidas individuais por amostra.


3. Resultados e discussão

Amolecimento isócrono

A Figura 2 apresenta a curva de amolecimento isócrono (15 min) para as amostras do aço AISI 430 laminado a morno até reduções de 50% e 80% em múltiplos passes. A amostra mais deformada começa a amolecer (recristalização) por volta de 600ºC, enquanto que as amostras com redução de 50% começam a amolecer em temperaturas mais elevadas. Em ambas as condições, o amolecimento torna-se mais pronunciado a partir de 800ºC, sugerindo o aumento da fração recristalizada na microestrutura. A partir de 900ºC, tanto as amostras mais deformadas, como as menos deformadas não mostram mudança significativa na dureza, indicando que o processo de recristalização está completo. De acordo com o ajuste dos pontos experimentais, pode-se afirmar que as amostras deformadas a 80% tendem a recristalizar mais prontamente em temperaturas mais baixas que as amostras deformadas a 50%. Isto se deve à maior energia armazenada nas amostras mais deformadas, portanto ao maior potencial para a recristalização. A diferença não foi mais pronunciada provavelmente devido ao fato da laminação ter sido realizada a 480ºC, o que permitiu a ocorrência de significativa recuperação dinâmica. Essa afirmativa é corroborada pelo fato de esse aço com estrutura ferrítica apresentar elevada energia de defeito de empilhamento.


Cinética de recristalização

A Figura 3 apresenta as curvas da cinética de recristalização das amostras do aço AISI 430 com 50% de redução. As curvas foram levantadas em três temperaturas distintas (850, 900 e 950ºC) com tempos variando de 1 min até 60 min. Para as amostras recozidas a 900 e 950ºC, o amolecimento ocorre, pronunciadamente, após cerca de 3 min, enquanto que, para as amostras recozidas a 850ºC, o amolecimento mais pronunciado ocorre após cerca de 10 min.


A Figura 4 apresenta as curvas da cinética de recristalização das amostras mais deformadas do aço AISI 430 (80% de redução). As curvas foram levantadas em três temperaturas distintas (700, 800 e 900ºC) com tempos variando de 1 min até 60 min. Para as amostras recozidas a 800 e 900ºC, o amolecimento mais pronunciado ocorre, também, por volta de 3 min. Para as amostras recozidas a 700ºC, em tempos mais longos, a dureza permanece ainda elevada, indicando que o processo de recristalização não se completou para o tempo de 1 h.


Caracterização microestrutural

As amostras no estado encruado foram caracterizadas com o auxílio de microscopia eletrônica de varredura no modo de elétrons retroespalhados. Essa técnica permite observar, em detalhes, regiões adjacentes, onde a diferença de orientação (y) é maior que pelo menos 1º (tons de cinza). A presença de heterogeneidades de deformação é evidente na microestrutura do material deformado, tais como a presença de bandas (Figura 5). Observe que regiões com grande diferença de orientação são visíveis na microestrutura. Para a micrografia da amostra com redução de 50% e recozida a 800ºC por 15 min (Figura 6), nota-se a presença de novos grãos recristalizados, preferencialmente, nos contornos de grão. Esses contornos possuem uma fração volumétrica elevada de partículas ricas em nióbio. Observa-se, também, que, tanto as partículas presentes nos contornos de grão, como as distribuídas no interior dos grãos são regiões preferenciais para a recristalização. Para as amostras do aço AISI 430 com redução de 80% e recozidas a 800ºC por 15 min, a nucleação da recristalização ocorre, preferencialmente, nas bandas de cisalhamento. Essas bandas tendem a formar ângulos de cerca de 35º com relação à direção de laminação, como pode ser visto na Figura 7. Nessa figura, é possível observar a nucleação preferencial dos novos grãos ao longo das bandas de cisalhamento.




A Figura 8 mostra a microestrutura de uma amostra totalmente recristalizada (80% de redução e recozida a 900ºC por 15 min). A nucleação preferencial da recristalização nas bandas de cisalhamento e nas regiões adjacentes às partículas ricas em nióbio é evidente e indica que estes são os sítios de nucleação nesse material. Outro aspecto microestrutural interessante observado nessa figura é a presença, ainda que discreta, de regiões onde o tamanho de grão varia localmente. Essa heterogeneidade, quanto ao tamanho de grão, pode ser relacionada a efeitos de orientação provenientes da estrutura inicial grosseira. Medidas de microtextura via difração de elétrons retroespalhados (EBSD) estão em andamento para elucidar esse ponto.


4. Conclusões

As curvas de amolecimento do aço inoxidável ferrítico AISI 430 foram levantadas para duas reduções distintas (50% e 80%). A laminação a morno (temperatura de encharque de 480ºC) permitiu a ocorrência significativa de recuperação dinâmica. De um modo geral, o amolecimento, durante o recozimento isotérmico, torna-se mais pronunciado a partir de 700ºC, evidenciando o início da recristalização nesse aço. O processo de recristalização é concluído por volta de 900ºC para as duas reduções investigadas.

Heterogeneidades de deformação, tais como as bandas de cisalhamento, são evidenciadas nas amostras com 80% de redução. Partículas grosseiras e bandas de cisalhamento são sítios preferenciais para a nucleação da recristalização nesse aço.

Efeitos de orientação importantes, advindos da estrutura de grãos colunares grosseiros, podem ser observados, em especial a ocorrência de regiões vizinhas onde a distribuição do tamanho de grão varia localmente.

5. Agradecimentos

Os autores agradecem à FAPESP pela concessão da bolsa de Doutorado a Rodrigo Pinto de Siqueira (Processo nº 05/60131-5).

6. Referências bibliográficas

Artigo recebido em 30/07/2006 e aprovado em 05/10/2006.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Maio 2007
  • Data do Fascículo
    Mar 2007

Histórico

  • Aceito
    05 Out 2006
  • Recebido
    30 Jul 2006
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