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Equilíbrio e potência muscular em crianças com doença de Charcot-Marie-Tooth

Resumos

CONTEXTUALIZAÇÃO:

Em algumas doenças, limitações funcionais têm maior relação com a potência do que com a força muscular, porém, nas polineuropatias periféricas hereditárias, tal relação não foi relatada na literatura.

OBJETIVO:

Identificar, a partir da análise de variáveis quantitativas e funcionais, o impacto da força dos músculos dos membros inferiores e das amplitudes de movimento (ADM) sobre o equilíbrio estático/dinâmico e o salto horizontal de crianças com doença de Charcot-Marie-Tooth (CMT).

MÉTODO:

Foram incluídos 19 participantes de seis a 16 anos, de ambos os sexos, com diagnóstico clínico de CMT de subtipos variados. Foram obtidos, de forma padronizada, dados antropométricos, força muscular dos membros inferiores (Hand-Held Dynamometer), ADM de tornozelos e joelhos, equilíbrio (Escala de Equilíbrio Pediátrica) e distância de salto horizontal (Long Jump). Para a análise estatística, utilizaram-se os Coeficientes de Correlação de Pearson e Spearman.

RESULTADOS:

Houve forte correlação positiva entre equilíbrio e força muscular de flexores plantares direito (r=0,61) e dorsiflexores (r=0,59) e correlação moderada com inversores dos pés (r=0,41) e eversores do pé direito (r=0,44). Considerando o Long Jump e as ADM, houve fraca correlação positiva para ADM de flexão plantar direita (r=0,20), esquerda (r=0,12) e ângulo poplíteo esquerdo (r=0,25) e fraca correlação negativa para dorsiflexão esquerda (r=-0,15).

CONCLUSÕES:

Os dados dos pacientes analisados sugerem que a manutenção de força muscular distal favorece o desempenho em tarefas de equilíbrio. E as restrições nas ADM passivas de membros inferiores parecem não ter sido suficientes para influenciar a potência muscular no salto horizontal.

doença de Charcot-Marie-Tooth; força muscular; equilíbrio; amplitude de movimento; avaliação; fisioterapia


BACKGROUND:

In certain diseases, functional constraints establish a greater relationship with muscle power than muscle strength. However, in hereditary peripheral polyneuropathies, no such relationship was found in the literature.

OBJECTIVE:

In children with Charcot-Marie-Tooth (CMT), to identify the impact of muscle strength and range of movement on the static/dynamic balance and standing long jump based on quantitative and functional variables.

METHOD:

The study analyzed 19 participants aged between 6 and 16 years, of both genders and with clinical diagnoses of CMT of different subtypes. Anthropometric data, muscle strength of the lower limbs (hand-held dynamometer), ankle and knee range of movement, balance (Pediatric Balance Scale) and standing long jump distance were obtained by standardized procedures. For the statistical analysis, Pearson and Spearman correlation coefficients were used.

RESULTS:

There was a strong positive correlation between balance and the muscle strength of the right plantar flexors (r=0.61) and dorsiflexors (r=0.59) and a moderate correlation between balance and the muscle strength of inversion (r=0.41) and eversion of the right foot (r=0.44). For the long jump and range of movement, there was a weak positive correlation with right and left plantar flexion (r=0.20 and r=0.12, respectively) and left popliteal angle (r=0.25), and a poor negative correlation with left dorsiflexion (r=-0.15).

CONCLUSIONS:

The data on the patients analyzed suggests that the maintenance of distal muscle strength favors performance during balance tasks, while limitations in the range of movement of the legs seem not to be enough to influence the performance of the horizontal long jump.

Charcot-Marie-Tooth disease; strength; balance; range of movement; assessment; physical therapy


Introdução

A doença de Charcot-Marie-Tooth (CMT) consiste em uma polineuropatia de origem genética com vários subtipos. Como fenótipo comum, há o acometimento dos nervos periféricos motores e sensoriais por um processo degenerativo desmielinizante e axonal¹. A predominante fraqueza muscular distal pode determinar, em crianças e adultos, significativas disfunções motoras na deambulação, na participação em atividades de vida diária e socioculturais. Em destaque, a fraqueza da musculatura dorsiflexora do tornozelo cursa com associado encurtamento dos músculos flexores plantares e desenvolvimento de deformidades nos pés2Burns J, Crosbie J, Hunt A, Ouvrier R. The effects of pes cavus on foot pain and plantar pressure. Clin Biomech. 2005;20:877-82. PMid:15882916. http://dx.doi.org/10.1016/j.clinbiomech.2005.03.006
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.

A principal hipótese clínica para o desenvolvimento das deformidades dos pés destaca a íntima relação entre o desequilíbrio de força da musculatura inversora e eversora dos pés e sobrecarga dos músculos flexores plantares em contraposição à fraqueza do grupo de dorsiflexores3Tachdjian MO. The neuromuscular system-deformities of the foot and ankle. In: Tachdjian MO. Pediatric orthopedics. 2nd ed. Philadelphia: WB Saunders; 1990. p. 1937-57.. Essa última é considerada a principal manifestação da doença e contribui para deformidade dos pés (pé cavo), contratura de tornozelo, função motora pobre e dificuldades na marcha em crianças e adultos afetados2Burns J, Crosbie J, Hunt A, Ouvrier R. The effects of pes cavus on foot pain and plantar pressure. Clin Biomech. 2005;20:877-82. PMid:15882916. http://dx.doi.org/10.1016/j.clinbiomech.2005.03.006
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.

Acredita-se que as perdas nas amplitudes de movimento (ADM) distais de pacientes com CMT comprometam a potência muscular à medida que prejudicam o ciclo alongamento-encurtamento. No caso do salto horizontal, Long Jump, 50% do desempenho muscular é atribuído ao tornozelo4Robertson DG, Fleming D. Kinetics of standing broad and vertical jumping. Can J Sport Sci. 1987;12(1):19-23. PMid:3594313.. Dessa forma, as ADM de membros inferiores podem correlacionar-se ao desempenho no teste Long Jump, utilizado para inferir a potência muscular.

Força muscular, ADM e diferentes exigências neuromusculares sobre a extremidade inferior são fatores que modificam os limites de estabilidade postural e podem influenciar o desempenho de uma tarefa funcional específica5Cote KP, Brunet ME, Gansneder BM, Shultz SJ. Effects of pronated and supinated foot postures on static and dynamic postural stability. J Athl Training. 2005;40(1):41-6. PMid:15902323 PMCid:PMC1088344.. Portanto, a seleção de condutas fisioterapêuticas na doença de CMT pode ser direcionada e assertiva se baseada na compreensão da real contribuição das variáveis envolvidas no equilíbrio estático e dinâmico.

É relevante direcionar pesquisas acerca da polineuropatia hereditária de CMT, uma vez que sua incidência é relativamente alta, atingindo um em cada 2.500 indivíduos2Burns J, Crosbie J, Hunt A, Ouvrier R. The effects of pes cavus on foot pain and plantar pressure. Clin Biomech. 2005;20:877-82. PMid:15882916. http://dx.doi.org/10.1016/j.clinbiomech.2005.03.006
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. Embora os sintomas iniciais da doença geralmente apareçam na primeira ou segunda década de vida, com progressão lenta ao longo das décadas consecutivas, a maioria dos estudos tem como população-alvo os adultos6Maggi G, Bragadin MM, Padua L, Fiorina E, Bellone E, Grandis M, et al. Outcome measures and a rehabilitation treatment in patients affected by Charcot-Marie-Tooth Neuropathy: a pilot study. Am J Phys Med Rehabil. 2011 Aug 8;90:628-637. PMid:21681064. http://dx.doi.org/10.1097/PHM.0b013e31821f6e32
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-8Sackley C, Disler PB, Turner-Stokes L, Wade DT, Brittle N, Hoppitt T. Rehabilitation interventions for foot drop in neuromuscular disease. Cochrane Database of Syst Rev. 2009;(2):CD003908. PMid:19588347..

Estudos intervencionistas envolvendo medicamentos ainda estão em curso, já que não existe uma terapia efetiva para a doença de CMT1Pareyson D, Marchesi C. Diagnosis, natural history, and management of Charcot-Marie-Tooth disease. Lancet Neurol. 2009;8:654-67. http://dx.doi.org/10.1016/S1474-4422(09)70110-3
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; e o uso de órteses apresenta resultados controversos8Sackley C, Disler PB, Turner-Stokes L, Wade DT, Brittle N, Hoppitt T. Rehabilitation interventions for foot drop in neuromuscular disease. Cochrane Database of Syst Rev. 2009;(2):CD003908. PMid:19588347.. Além disso, investigações focadas em esclarecer a contribuição dos principais déficits (musculoesqueléticos, neuromusculares, e biomecânicos) sobre o equilíbrio de crianças com CMT são escassas. Dessa forma, torna-se preemente investigar o comportamento de variáveis biomecânicas na fase inicial da doença, como um passo preliminar à proposição de intervenções fisioterapêuticas potencialmente auxiliares da reabilitação dessas crianças e adolescentes.

Em crianças e adultos, a tríade fraqueza muscular, hiper/hipomobilidade articular e desarranjos biomecânicos compensatórios podem determinar significativas disfunções motoras de predomínio distal-proximal, com prejuízo do equilíbrio, da deambulação e da participação em atividades de vida diária2Burns J, Crosbie J, Hunt A, Ouvrier R. The effects of pes cavus on foot pain and plantar pressure. Clin Biomech. 2005;20:877-82. PMid:15882916. http://dx.doi.org/10.1016/j.clinbiomech.2005.03.006
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. De modo similar, as relações entre ADM passiva com salto horizontal, medida no teste Long Jump, e o equilíbrio, avaliado com a Escala de Equilíbrio Pediátrica (EEP), foram testadas. Em suma, o objetivo do presente estudo foi avaliar a influência das ADM passivas e da força dos principais grupos musculares dos membros inferiores sobre o equilíbrio estático/dinâmico e a capacidade de salto horizontal de crianças com a doença de CMT.

Método

Participaram do estudo 19 crianças e adolescentes voluntários admitidos no Ambulatório de Doenças Neurogenéticas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (HCFMRP/USP), Ribeirão Preto, SP, Brasil, no período de 2011-2012, com diagnóstico da doença confirmado, de ambos os sexos, com idade entre cinco e 16 anos, marcha independente, sem doenças associadas à doença de CMT que acometam o sistema cardiorrespiratório.

Uma autorização foi obtida dos pais ou responsáveis mediante o preenchimento do termo de consentimento livre e esclarecido, previamente aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do HCFMRP/USP (Processo n. 4334/2011).

De forma padronizada, foram obtidos de todos os participantes os dados antropométricos, a goniometria, a força muscular (dinamômetro Hand-Held- Lafayette Instrument, Lafayette, UK), a potência de membros inferiores (teste Long Jump) e o equilíbrio estático/dinâmico (Escala de Equilíbrio Pediátrica).

A ADM passiva foi mensurada em joelhos (ângulo poplíteo) e tornozelos (flexão plantar e dorsiflexão), conforme método descrito por Marques9Marques AP. Ângulos articulares de membros inferiores. In: Marques AP. Manual de goniometria. 2ª. ed. São Paulo: Manole; 2003. p. 41-7. PMid:12591094.. As medidas foram realizadas com um goniômetro universal (CARCI - Indústria e Comércio de Aparelhos Cirúrgico e Ortopédicos Ltda.).

Um dinamômetro Hand-Held (Lafayette Instrument, Lafayette, UK) mensurou por três vezes as forças musculares (em quilograma-força) de extensores de quadril, extensores de joelho, dorsiflexores, flexores plantares, supinadores e pronadores do pé, alternando entre os membros inferiores direito e esquerdo, a fim de prevenir fadiga. O valor mais elevado foi considerado para análise. Durante as mensurações, para garantir que o dinamômetro se mantivesse perpendicular ao segmento testado e o mais distal possível, havia um assistente estabilizando o participante, e foram adotados os seguintes posicionamentos corporais: decúbito dorsal, membros inferiores em posição anatômica e pés para fora da maca para mensurar as forças musculares dos dorsiflexores, flexores plantares, supinadores e pronadores; decúbito ventral e joelho fletido a 90° para mensurar a força muscular de extensores de quadril; sedestação e joelho fletido a 90° para mensurar a força muscular dos extensores do joelho. O comando de voz "força" durante os testes foi usado enquanto o avaliador impedia qualquer arco de movimento para garantir uma contração isométrica de cinco segundos.

O teste Long Jump, também denominado de salto horizontal ou salto em distância, é de fácil aplicação, necessitando apenas de giz ou lápis para marcação em solo, fita métrica ou trena para mensurar a distância do salto. Os participantes foram posicionados atrás de uma linha marcada no solo, com os pés ligeiramente afastados e solicitou-se que saltassem horizontalmente a maior distância possível com a ajuda da flexão das pernas e o impulso transmitido pelo balanço dos braços10Wakai M, Linthorne NP. Optimum take-off angle in the standing Long Jump. Hum Mov Sci. 2005;24:81-96. PMid:15949583. http://dx.doi.org/10.1016/j.humov.2004.12.001
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. Assim, foi permitida tal estratégia para recuperar ou manter o equilíbrio por meio da transferência do movimento angular dos braços para o resto do corpo. Foram realizadas três tentativas, e o maior valor foi considerado para a análise. O resultado foi dado em centímetros, considerando a distância entre a linha de partida e a marca alcançada pelo calcâneo no solo.

A EEP foi utilizada como medida de equilíbrio funcional, pois segundo Franjoine et al.11Franjoine MR, Gunther JS, Taylor MJ. Pediatric Balance Scale: A Modified Version of the Berg Balance Scale for the School-Age Child with Mild to Moderate Motor Impairment. Pediatr Phys Ther. 2003;15(2):114-28. PMid:17057441. http://dx.doi.org/10.1097/01.PEP.0000068117.48023.18
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, é adequada para crianças com idade escolar com deficiência motora de leve a moderada. Sua administração tem duração aproximada de 15 minutos, não requer uso de equipamento especializado e fornece dados clínicos para a medição de tarefas de equilíbrio funcional. Utilizou-se para aplicação do teste a versão brasileira da EEP descrita por Ries et al.12Ries LGK, Michaelsen SM, Soares PSA, Monteiro VC, Allegretti KMG. Cross-cultural adaptation and reliability analysis of the Brazilian version of Pediatric Balance Scale (PBS). Rev Bras Fisioter. 2012;16(3):205-15. PMid:22699691. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-35552012005000026
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. Para sua aplicação, foram utilizados os seguintes materiais: cadeira com encosto, altura ajustável e descanso de braços, marcações para os pés, cronômetro, trena e degrau. Os participantes foram orientados, por meio de demonstrações, a fazer os testes. Uma tentativa preliminar de cada tarefa proposta foi permitida para cada item testado.

A EEP é composta por 14 itens que requerem da criança tarefas que exigem equilíbrio estático e dinâmico. Cada item pode ser pontuado de 0 a 4, sendo 4 a pontuação que corresponde à melhor habilidade para a realização da tarefa exigida. Soma-se a pontuação de cada uma das 14 tarefas e, a partir desse número, determina-se a pontuação final, cujo valor máximo é de 56. Quanto maior a pontuação, maior a habilidade para a realização da tarefa exigida e, portanto, melhor o equilíbrio da criança. A partir de sete anos de idade, a pontuação máxima de 56 deve ser alcançada, não havendo na literatura menção às classificações de escores menores11Franjoine MR, Gunther JS, Taylor MJ. Pediatric Balance Scale: A Modified Version of the Berg Balance Scale for the School-Age Child with Mild to Moderate Motor Impairment. Pediatr Phys Ther. 2003;15(2):114-28. PMid:17057441. http://dx.doi.org/10.1097/01.PEP.0000068117.48023.18
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.

Para atender ao objetivo do estudo, que foi correlacionar os dados de dinamometria de membros inferiores com equilíbrio e da amplitude de movimento de membros inferiores com impulsão horizontal mensurada pelo teste Long Jump, foi proposto o Coeficiente de Correlação de Pearson (r) e o Coeficiente de Correlação de Spearman, que quantificam a associação entre duas variáveis quantitativas. Tais coeficientes variam entre os valores -1 e 1. O valor 0 (zero) significa que não há relação linear, o valor 1 indica uma relação linear perfeita, e o valor -1 também indica uma relação linear perfeita, mas inversa, ou seja, quando uma das variáveis aumenta, a outra diminui. Quanto mais próximo estiver de 1 ou -1, mais forte é a associação linear entre as duas variáveis. A classificação dos Coeficientes de Correlação de Spearman foi feita a partir do estudo descrito por Hulley et al.13Hulley SB, Cummings SR, Browner WS, Grady D, Hearst N, Newman TB. Delineando a pesquisa clínica: uma abordagem epidemiológica. 2ª. ed. Porto Alegre: Editora Artmed; 2003., e a classificação dos Coeficientes de Correlação de Pearson foi feita a partir do estudo descrito por Pagano e Gauvreau14Pagano M, Gauvreau K. Princípios de bioestatística. 2ª. ed. São Paulo: Editora Thomson; 2004.. Foram realizados os testes das seguintes correlações: força muscular × equilíbrio e Long Jump × ADM.

Resultados

Os dados antropométricos e a classificação dos participantes são mostrados na Tabela 1. Dos 19 pacientes que compuseram o estudo, nove eram do sexo masculino e dez do sexo feminino, a idade média foi de 10,11 anos (desvio padrão de 2,64), o peso médio foi de 40,59 kg (desvio padrão de 15,37) e a altura de 1,43 m (desvio padrão de 0,18). Considerando valores normativos disponibilizados pela OMS15World Health Organization - WHO [homepage Internet]. Geneva: WHO; 2006-2013 [cited 2013 July 18]. Available from: http://apps.who.int/bmi/index.jsp?introPage=intro_3.html.
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, nove participantes apresentaram IMC (índice de massa corporal) adequados para suas idades, enquanto quatro apresentaram subnutrição, duas sobrepeso e quatro obesidade.

Tabela 1
Dados antropométricos e classificação dos participantes conforme o tipo de CMT.

As forças musculares dos membros inferiores, as ADM passivas, o teste Long Jump e as pontuações da EEP obtidas estão contidos na Tabela 2.

Tabela 2
Força muscular de membros inferiores, amplitude de movimento - Goniometria de membros inferiores, Long Jump e pontuação da Escala de Equilíbrio Pediátrica dos participantes.

Os valores de força muscular isométrica não acompanharam a ordem crescente de idade dos participantes. Os grupos musculares dorsiflexores, inversores e eversores apresentaram os menores valores de força muscular isométrica, sendo que a força de dorsiflexão foi nula nos participantes C e K.

Em relação ao equilíbrio, verificado a partir da EEP, os dados obtidos mostraram pontuação alta para os participantes com CMT (entre 51 e 56), indicando bom desempenho geral. Porém, considerando os itens isolados da EEP, foram identificadas as tarefas mais desafiadoras: em pé com os olhos fechados, em pé com um dos pés à frente, apoio unipodal, apanhar objeto do chão e alcance anterior.

Os dados de ADM evidenciaram preservação da mobilidade articular de tornozelo bilateralmente, salvo três casos em que houve restrição (participantes H, N e R), com dorsiflexão menor que 10 graus, e três casos de ausência da mobilidade (participantes K, M e O), com dorsiflexão igual ou menor que zero. O ângulo poplíteo bilateral da maioria dos participantes estava preservado (exceção para valores menores que 140°) (Tabela 2).

Quanto ao teste Long Jump, não houve aumento do desempenho conforme a idade, e os valores de sete dos 19 participantes (A, H, I, K, L, O, Q) apresentaram-se inferiores aos descritos como normativos16Condon C, Cremin K. Static Balance Norms in Children. Physiother Res Int. 2014 Mar;19(1):1-7. http://dx.doi.org/10.1002/pri.1549
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(Tabela 2).

Correlações entre EEP e força muscular de membros inferiores

Os resultados do teste de Spearman indicaram forte correlação positiva entre o equilíbrio e a força dos seguintes grupos musculares: flexores plantares direito (r=0,61; p=0,01), dorsiflexores direito (r=0,59; p=0,01) e dorsiflexores esquerdo (r=0,59; p=0,01), e correlação moderada entre o equilíbrio e a força muscular dos seguintes grupos musculares: inversores direito (r=0,44; p=0,06), inversores esquerdo (r=0,41; p=0,08) e eversores direito (r=0,44; p=0,06) - Tabela 3.

Tabela 3
Valores do Coeficiente de Correlação de Spearman e valor p da força muscular de membros inferiores e a Escala de Equilíbrio Pediátrica (EEP).

Correlações entre o teste Long Jump e as ADM passivas de membros inferiores

Os valores obtidos pela correlação do teste Long Jump com as ADM dos membros inferiores indicaram uma fraca correlação positiva entre as ADM de flexão plantar direita (r=0,20; p=0,41), flexão plantar esquerda (r=0,12; p=0,61) e ângulo poplíteo esquerdo (r=0,25; p=0,31). Houve fraca correlação negativa para dorsiflexão esquerda (r=-0,15; p=0,54) e nenhuma correlação foi encontrada para dorsiflexão direita (r=0,09; p=0,69) e ângulo poplíteo direito (r=0,00; p=1,00), conforme Tabela 4. Portanto, os dados obtidos indicaram não haver correlação entre a ADM articular de tornozelo e joelho com a potência muscular desenvolvida por meio do teste Long Jump.

Tabela 4
Valores do Coeficiente de Correlação de Pearson (r) para as amplitudes de movimento passivas de membros inferiores e o teste Long Jump.

Discussão

O presente estudo identificou que os participantes com CMT apresentaram fraqueza muscular dos seguintes grupos: eversores, inversores, dorsiflexores e flexores plantares. As ADM estavam preservadas, com exceções para dorsiflexão. De modo geral, o equilíbrio estava preservado, porém houve déficit em itens específicos da EEP. O teste Long Jump indicou que a potência muscular se manteve preservada na maioria dos participantes, com algumas exceções.

Apesar de, por definição, o comprometimento sensório-motor ter caráter simétrico na doença de Charcot-Marie-Tooth, variações na força muscular e flexibilidade e até mesmo coordenação motora podem ser encontradas. Desse modo, alguns resultados das correlações foram encontrados apenas para a força e ADM do lado direito ou esquerdo. As correlações obtidas sugerem que a força preservada de dorsiflexores e flexores plantares influenciou de forma positiva o desempenho em tarefas que demandavam equilíbrio. As ADM obtidas parecem não ter afetado a potência muscular.

Força muscular e equilíbrio

O equilíbrio é um fator essencial para a coordenação de respostas motoras, movimentos e ajustes posturais. Para que ele seja efetivo é necessário que diversos fatores, como sistema vestibular, informações proprioceptivas, percepção visual, força muscular e flexibilidade articular, atuem de forma eficiente e harmônica sobre o corpo17De Weerdt W, Spaepen A. Equilíbrio. In: Durward BR, Baer GD, Rowe J. Movimento Funcional Humano. São Paulo: Manole; 2001. p. 204.. Os músculos que envolvem o tornozelo são essenciais para a manutenção do equilíbrio, pois fornecem informações proprioceptivas e corrigem pequenas oscilações posturais, além de, através do torque muscular, corrigir possíveis desestabilizações, regulando assim o centro de gravidade e mantendo o centro de massa localizado entre os pés18Kuo AD, Zajac FE. A biomechanical analysis of muscle strength as limiting factor in standing posture. J Biomech. 1993;(26):137-50. http://dx.doi.org/10.1016/0021-9290(93)90085-S
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. Tipicamente, a história natural de vários subtipos de CMT envolve, entre outras manifestações, a progressiva redução da força muscular distal, podendo prejudicar a manutenção do centro de massa na base de apoio tanto dinâmica quanto estaticamente2Burns J, Crosbie J, Hunt A, Ouvrier R. The effects of pes cavus on foot pain and plantar pressure. Clin Biomech. 2005;20:877-82. PMid:15882916. http://dx.doi.org/10.1016/j.clinbiomech.2005.03.006
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.

Para a manutenção do equilíbrio, a mais utilizada é a estratégia do tornozelo, na qual é necessária a preservação de força da musculatura flexora plantar, dorsiflexora, eversora e inversora19Horak FB, Shupert CL, Mirka A. Components of postural dyscontrol in the elderly: a review. Neurobiol Aging. 1989;10:727-38. http://dx.doi.org/10.1016/0197-4580(89)90010-9
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. Essa estratégia é mais eficaz quando as perturbações do equilíbrio são lentas e pequenas, e a superfície de apoio é firme, ou seja, durante o equilíbrio estático19Horak FB, Shupert CL, Mirka A. Components of postural dyscontrol in the elderly: a review. Neurobiol Aging. 1989;10:727-38. http://dx.doi.org/10.1016/0197-4580(89)90010-9
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. A dorsiflexão do tornozelo produzida durante a estratégia do tornozelo é determinante para que a manutenção do equilíbrio seja obtida após uma desestabilização, isso porque, ao levantar o antepé, cria-se uma força contramovimento que ajuda a reequilibrar o corpo20Wolfson LI, Whipple R, Amerman P, Kleinberg A. Stressing the postural response: a quantitative method for testing balance. J Am Geriatr Soc. 1986;34:845-50. PMid:3782696.. Desse modo, a diminuição da força da musculatura dorsiflexora observada nos participantes avaliados pode justificar o déficit encontrado na manutenção do equilíbrio estático.

No presente estudo, os participantes avaliados apresentaram dados condizentes com os descritos na literatura2Burns J, Crosbie J, Hunt A, Ouvrier R. The effects of pes cavus on foot pain and plantar pressure. Clin Biomech. 2005;20:877-82. PMid:15882916. http://dx.doi.org/10.1016/j.clinbiomech.2005.03.006
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,3Tachdjian MO. The neuromuscular system-deformities of the foot and ankle. In: Tachdjian MO. Pediatric orthopedics. 2nd ed. Philadelphia: WB Saunders; 1990. p. 1937-57.,5Cote KP, Brunet ME, Gansneder BM, Shultz SJ. Effects of pronated and supinated foot postures on static and dynamic postural stability. J Athl Training. 2005;40(1):41-6. PMid:15902323 PMCid:PMC1088344., tais como força muscular reduzida, principalmente dos músculos eversores e dorsiflexores, e encurtamento dos músculos flexores plantares. Em um estudo realizado por Nyström et al.21Nyström EM, Kroksmark A-K, Beckung E. Isometric muscle torque in children 5 to 15 years of age: normative data. Arch Phys Med Rehabil. 2006;87:1091-9. PMid:16876555. http://dx.doi.org/10.1016/j.apmr.2006.05.012
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, foram estabelecidos valores de referência para força muscular isométrica do membro inferior em relação à idade e peso corporal de participantes saudáveis. Comparamos então os dados do presente estudo com os valores de referência obtidos por Nyström et al.21Nyström EM, Kroksmark A-K, Beckung E. Isometric muscle torque in children 5 to 15 years of age: normative data. Arch Phys Med Rehabil. 2006;87:1091-9. PMid:16876555. http://dx.doi.org/10.1016/j.apmr.2006.05.012
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, utilizando o peso e a altura dos participantes, já que os valores de referência através da idade podem conduzir a erros de interpretação. Observou-se que a maioria dos participantes com CMT apresenta força muscular isométrica compatível com seu peso corporal e altura. Exceções foram encontradas para os músculos dorsiflexores dos participantes C, E e N. Para os músculos inversores e eversores dos pés, não foram encontrados dados normativos para comparação, bem como para os músculos flexores plantares. Porém, vale ressaltar que, em nove dos 19 participantes, a força muscular dos inversores e eversores foi inferior a 5 KgF, sugerindo um déficit de força nesses grupos musculares.

Para os participantes do presente estudo, cuja força muscular distal está diminuída, tarefas envolvendo equilíbrio estático estão afetadas em maior proporção que aquelas de caráter dinâmico, pois posturas estáticas exigem maior ADM e maior torque da musculatura do tornozelo22Robinovitch SN, Heller B, Lui A, Cortez J. Effect of strength and speed of torque development on balance recovery with the ankle strategy. J Neurophysiol. 2002;88:613-20. PMid:12163514..

Os déficits de equilíbrio encontrados nos participantes do presente estudo não eram incapacitantes, já que a pontuação na EEP foi próxima ao máximo (de 51 a 56). Como vários fatores afetam o equilíbrio positiva ou negativamente17De Weerdt W, Spaepen A. Equilíbrio. In: Durward BR, Baer GD, Rowe J. Movimento Funcional Humano. São Paulo: Manole; 2001. p. 204., é possível que compensações aos déficits de força muscular distal tenham sido empregadas, por exemplo, com o uso da estratégia do quadril e auxílio de membros superiores. Além disso, a propriocepção e os mecanismos de estabilização, tais como a rigidez muscular, são fatores determinantes no estabelecimento do equilíbrio23Van der Linden MH, Van der Linden SC, Hendricks HT, Van Engelen BGM, Geurts ACH. Postural instability in Charcot-Marie-Tooth type 1A patients is strongly associated with reduced somatosensation. Gait Posture. 2010;31:483-8. PMid:20226674. http://dx.doi.org/10.1016/j.gaitpost.2010.02.005
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. Outro fator que pode ter sido acionado pelos pacientes é o controle antecipatório e, a partir dele, pode ser obtido o controle estático e dinâmico do equilíbrio22Robinovitch SN, Heller B, Lui A, Cortez J. Effect of strength and speed of torque development on balance recovery with the ankle strategy. J Neurophysiol. 2002;88:613-20. PMid:12163514.,23Van der Linden MH, Van der Linden SC, Hendricks HT, Van Engelen BGM, Geurts ACH. Postural instability in Charcot-Marie-Tooth type 1A patients is strongly associated with reduced somatosensation. Gait Posture. 2010;31:483-8. PMid:20226674. http://dx.doi.org/10.1016/j.gaitpost.2010.02.005
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.

A correlação positiva observada entre a força muscular isométrica de dorsiflexores, flexores plantares, eversores e inversores com o equilíbrio sugere que a manutenção da força muscular desses grupos pode afetar positivamente o equilíbrio. Ribeiro et al.24Ribeiro F, Teixeira F, Brochado G, Oliveira J. Impact of low cost strength training of dorsi- and plantar flexors on balance and functional mobility in institutionalized elderly people. Geriatr Gerontol Int. 2009;9:75-80. PMid:19260983. http://dx.doi.org/10.1111/j.1447-0594.2008.00500.x
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relacionaram a força da musculatura do tornozelo com o equilíbrio em idosos e, assim como Sundermier et al.25Sundermier L, Woollacott M, Roncesvalles N, Jensen J. The development of balance control in children: comparisons of EMG and kinetic variables and chronological and developmental groupings. Exp Brain Res. 2001;136:340-50. http://dx.doi.org/10.1007/s002210000579
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, que avaliaram crianças, corroboram o presente estudo, concluindo que a força de flexores plantares e dorsiflexores está associada positivamente ao equilíbrio.

ADM e Long Jump

A ADM disponível para uma articulação pode ser também definida como flexibilidade, sendo um elemento importante da aptidão física26Melo SIL, Guth VJ, Sousa ACS, Sacomori C, Martins ACV, Lucca L. Estudo comparativo de amplitudes de movimentos articulares em crianças diferentes gêneros entre os 7 e os 12 anos de idade. Motricidade. 2011;7(1):13-20. http://dx.doi.org/10.6063/motricidade.7(1).116
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. Ela pode ser atingida pela contração muscular ativa, referenciada como flexibilidade dinâmica, ou pelo movimento passivo causado por uma força externa à articulação. Gênero, medidas antropométricas, composição corporal, características genéticas e patológicas, além do processo de crescimento e desenvolvimento26Melo SIL, Guth VJ, Sousa ACS, Sacomori C, Martins ACV, Lucca L. Estudo comparativo de amplitudes de movimentos articulares em crianças diferentes gêneros entre os 7 e os 12 anos de idade. Motricidade. 2011;7(1):13-20. http://dx.doi.org/10.6063/motricidade.7(1).116
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, influenciam a capacidade de flexibilidade. Nos participantes com CMT do presente estudo, houve uma ADM articular com relativa flexibilidade e arco de movimento preservado, o que estabeleceu fraca correlação com o desempenho no teste Long Jump.

Os resultados do Long Jump dos participantes foram comparados aos dados normativos descritos por Condon e Cremin16Condon C, Cremin K. Static Balance Norms in Children. Physiother Res Int. 2014 Mar;19(1):1-7. http://dx.doi.org/10.1002/pri.1549
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, os quais estudaram essa variável em 534 crianças na faixa de quatro a 15 anos. A comparação realizada, considerando as idades compatíveis com os participantes de nosso estudo, mostrou que sete (A, H, I, K, L, O, Q) dos 19 participantes apresentaram valores inferiores aos descritos como normativos.

Na realização do teste Long Jump, deve-se considerar que o impulso adicional transmitido para o salto pela oscilação dos braços pode aumentar a distância saltada e a velocidade de decolagem27Ashbya BM, Heegaard JH. Role of arm motion in the standing long jump. J Biomech. 2002;35:1631-7. http://dx.doi.org/10.1016/S0021-9290(02)00239-7
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. No caso do presente estudo, todos os participantes eram instruídos a realizar o movimento do teste com a técnica de impulsionar-se com os braços. Ashbya e Heegaard27Ashbya BM, Heegaard JH. Role of arm motion in the standing long jump. J Biomech. 2002;35:1631-7. http://dx.doi.org/10.1016/S0021-9290(02)00239-7
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indicaram que o balanço do braço aumenta a capacidade de produzir força dos músculos extensores das extremidades inferiores, diminuindo a velocidade de contração em momentos-chave no salto. Para manter o equilíbrio durante todo o salto, pode haver a adoção de medidas de controle antecipatório ou até mesmo o emprego de mecanismos contraproducentes que reduzem a distância do salto com movimento de braço livre27Ashbya BM, Heegaard JH. Role of arm motion in the standing long jump. J Biomech. 2002;35:1631-7. http://dx.doi.org/10.1016/S0021-9290(02)00239-7
https://doi.org/10.1016/S0021-9290(02)00...
. Considerando que crianças com CMT são conscientes de seus déficits de equilíbrio, é possível que tenham adotado medidas de controle antecipatório com o braço livre. Assim, o restrito uso dos braços pelos participantes talvez explique, em parte, o menor desempenho no salto dos participantes A, H, I, K, L, O e Q, que se apresentaram expressivamente menores que a média dos saltos considerados.

O teste Long Jump, enquanto tarefa ou habilidade motora, é um padrão motor complexo que requer o desempenho coordenado de todas segmentos corporais, sendo que o impulso e a aterrissagem devem ser feitos com os dois pés. O salto horizontal mede a força explosiva, tem alta correlação com medidas isocinéticas de força de membros inferiores e é indicado como um bom preditor de desempenho do salto em distância10Wakai M, Linthorne NP. Optimum take-off angle in the standing Long Jump. Hum Mov Sci. 2005;24:81-96. PMid:15949583. http://dx.doi.org/10.1016/j.humov.2004.12.001
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.

A inexistência ou até mesmo a fraca correlação encontrada entre a ADM e o teste Long Jump pode ser atribuída ao fato de que a maioria dos participantes do presente estudo apresentava as ADM distais relativamente preservadas. Para verificar a influência das ADM passivas sobre o Long Jump, seria necessário avaliar um grupo de participantes acometidos cujas ADM não estivessem preservadas, e isso constitui uma limitação do estudo.

O tamanho da amostra, a heterogeneidade dos subtipos de CMT, diferentes níveis de maturação motora e características antropométricas variadas constituem limitações comuns a estudos desta natureza. Com base nos dados antropométricos, foi possível identificar participantes de todas as categorias de classificação de IMC, com 21% de obesos, o que poderia influenciar os resultados obtidos. O IMC parece não ter efeito negativo sobre a flexibilidade, diferente dos testes de propulsão28Dumith SC, Ramires VV, Souza MA, Moraes DS, Petry FG, Oliveira ES, et al. Overweight/obesity and physical fitness among children and adolescents. J Phys Act Health. 2010;7(5):641-8. PMid:20864760.. Obesos ficam em desvantagem em atividades de maior desafio ao equilíbrio, como o apoio unipodal29Goulding A, Jones IE, Taylor RW, Piggot JM, Taylor D. Dynamic and static tests of balance and postural sway in boys: effects of previous wrist bone fractures and high adiposity. Gait Posture. 2003;17:136-41. http://dx.doi.org/10.1016/S0966-6362(02)00161-3
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. Quanto à força muscular, uma recente revisão30Maffiuletti NA, Ratel S, Sartorio A, Martin V. The impact of obesity on in vivo human skeletal muscle function. Curr Obes Rep. 2013;2:251-60. http://dx.doi.org/10.1007/s13679-013-0066-7
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aponta que, embora obesos apresentem maiores valores absolutos comparados a seus pares eutróficos, a obesidade não tem impacto sobre as propriedades intrínsecas do músculo para a geração de força. Assim, consideramos mínima a interferência do IMC sobre nossos dados.

Contudo, os resultados deste estudo podem auxiliar o fisioterapeuta na tomada de decisões durante a prática clínica, pois sugerem que a força muscular preservada de dorsiflexores e de flexores plantares cursa com melhor desempenho de equilíbrio estático e dinâmico. De maneira similar, a manutenção e/ou ganho da mobilidade articular, principalmente de dorsiflexão, por meio de alongamentos, cursa com bom desempenho funcional e potência muscular demonstrada no teste Long Jump. Dessa maneira, no tratamento de crianças e adolescentes com doença de CMT, deve-se priorizar a manutenção e/ou ganho de força e flexibilidade dos músculos dorsiflexores e flexores plantares.

Conclusão

A manutenção de força muscular distal em crianças com CMT contribui para o desempenho em tarefas de equilíbrio. As perdas encontradas nas ADM passivas de membros inferiores parecem não ter sido suficientes para influenciar a potência muscular do salto horizontal.

Agradecimentos

À Elisangela Aparecida da Silva Lizzi, responsável pela análise estatística; aos pacientes e seus responsáveis e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP, n° processo 2012/15521-3 e 2012/15522-0), Brasil, pelo apoio no desenvolvimento desta pesquisa.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Jul 2014
  • Data do Fascículo
    Ago 2014

Histórico

  • Recebido
    08 Nov 2013
  • Revisado
    18 Dez 2013
  • Aceito
    17 Fev 2014
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