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Avaliação da sensibilidade da função de distribuição de tamanho de partícula durante a floculação

Sensitivity analysis of particle size distribution function during flocculation

RESUMO

Neste artigo, buscou-se avaliar a sensibilidade da função contínua de distribuição de tamanho de partículas (DTP) diante da modificação decorrente da floculação. Para tal, foram investigadas seis configurações discretas, subdivididas em 3, 4, 5, 6, 7, 8, 10 e 15 classes de tamanho. As configurações investigadas diferem na frequência de partículas presentes por faixa de tamanho e no comportamento, sendo este monotônico ou unimodal. O ajuste da função contínua na forma linearizada aos dados discretos foi avaliado por meio do coeficiente de determinação (R2). O coeficiente de potência da função (β) e o centro de massa (C.M) da distribuição foram tomados como representativos da DTP para a análise de sensibilidade, realizada por meio do estudo da correlação múltipla entre as variáveis. Experimentos em escala de bancada foram conduzidos visando a avaliar a simulação. Os resultados demonstraram que os parâmetros β e C.M foram sensíveis às variações da DTP, todavia os ajustes das funções para distribuições unimodais carecem de aprimoramento.

Palavras-chave:
floculação; distribuição de tamanho de partículas; análise de sensibilidade

ABSTRACT

In this paper, the sensitivity of the continuous particle size distribution function (PSD) was evaluated, as flocculation occurs. To this end, six discrete configurations were investigated, subdivided into 3, 4, 5, 6, 7, 8, 10 and 15 classes. The distribution studied here differ in the particles presented by size range and behavior, whether monotonic or unimodal. The adjustment of the continuous function in linearized form to the discrete data was evaluated by means of R2. The power law coefficient (β) and the center of mass (C.M) were taken as representative of PSD during the sensitivity analysis, which was carried out by means of multiple correlation between the variables. Batch essays were performed in order to evaluate simulations. Results showed that β and C.M were both sensitive to PSD variations; however, the function adjustments for unimodal distributions need improvement.

Keywords:
flocculation; particle size distribution; sensitivity analysis

INTRODUÇÃO

As suspensões aquosas contêm partículas em todas as faixas de tamanho, coexistindo em todos os incrementos, independentemente da amplitude e das subdivisões. Muitos dos poluentes da água estão na forma de partículas, ou deverão ser convertidos em partículas antes de sua separação durante as etapas de tratamento (LAWLER, 1997LAWLER, D.F. (1997) Particle size distribution in treatment process: theory and practice. Water Science and Technology, v. 36, n. 4, p. 15-23. https://doi.org/10.1016/S0273-1223(97)00414-9
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).

É estreita a relação entre a tecnologia de tratamento e a distribuição de tamanho de partículas (DTP), tal como apresentado por Wiesner, O’Melia e Cohon (1987Wiesner, M.R.; O’Melia, C.R.; Cohon, J.L. (1987) Optimal water treatment plant design. Journal of Environmental Engineering, v. 113, n. 3, p. 567-584. https://doi.org/10.1061/(ASCE)0733-9372(1987)113:3(567)
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). Assim, o aprimoramento dos processos e das operações de tratamento de água depende fortemente do conhecimento sobre os fenômenos e suas escalas, as quais são intrinsecamente relacionadas ao tamanho das partículas.

Para Tchobanoglous (1995Tchobanoglous, G. (1995) Particle size characterization: the next frontier. Journal of Environmental Engineering, v. 121, n. 12, p. 844-845.), a avaliação direta das dimensões e estruturas das partículas constitui importante ferramenta para projeto e operação de sistemas de tratamento. Desse modo, a medição direta de uma propriedade da partícula, tal como sua dimensão característica, em substituição ou em complemento às análises indiretas, pode colaborar para o entendimento e aprimoramento das operações e dos processos envolvidos no tratamento de água (SANTOS et al., 2004Santos, H.R.; Prado, G.S.; Vidal, C.M.S.; Moruzzi, R.B.; Campos, J.R. (2004) Aplicabilidade das técnicas de determinação de tamanho de partículas em sistemas de tratamento de água e esgoto sanitário. Revista Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental, v. 9, n. 4, p. 291-300. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-41522004000400005
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), os quais são majoritariamente dependentes da etapa de floculação.

Particularmente, a floculação é uma operação que tem por finalidade modificar a distribuição de tamanho de partículas desestabilizadas, aumentando a fração de partículas de maior tamanho, por meio da dissipação de energia na massa líquida em condições controladas. Tal aumento favorece a remoção do material particulado em unidades de separação subsequentes. Tradicionalmente, o desempenho da floculação é avaliado indiretamente pela medida de turbidez, todavia sua análise deve ser realizada por meio de medida direta e independente, por meio da DTP.

A modificação da DTP durante a floculação pode ser acompanhada por uma função contínua, ajustada a partir das frações discretas medidas por faixa de tamanho (MORUZZI et al., 2016Moruzzi, R.B.; Oliveira, A.L; De Julio, M.; Dutra, R.H.A.; Silva, P.A.G. (2016) Floculação: considerações a partir da análise clássica e da avaliação direta da distribuição de tamanho de partículas. Engenharia Sanitária e Ambiental, v. 21, n. 4, p. 817-824. http://dx.doi.org/10.1590/s1413-41522016144959
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). A distribuição de frequência do número de partículas F(d p ) apresentada por Crittenden (2005Crittenden, J.C. (2005) Water Treatment: Principles and Design. 2. ed. Nova Jersey: Jon Wiley & Sons. 1.948 p.) pode ser expressa como a razão entre a variação incremental do número de partículas, dN, e a correspondente variação incremental no tamanho, d(dp), representada pela Equação 1.

F d p = d N d d p = A d p - β N d p (1)

Em que:

  • F(dp ) =  função que define a frequência de distribuição de partículas (d 1 , d2 , d3 ...);
  • dN =  variação incremental no número de partículas;
  • d(dp ) =  variação incremental no tamanho (diâmetro) das partículas;
  • A =  coeficiente de densidade da equação de potência;
  • (dp ) =  diâmetro da partícula;
  • β =  coeficiente de inclinação da equação de potência.

Os parâmetros A e β definem a forma da curva de distribuição dos tamanhos das partículas, uma vez que A varia com o número de partículas, transladando a curva de DTP na vertical, enquanto β varia conforme a frequência de partículas em cada faixa de tamanho da distribuição, mudando a inclinação nas classes. Na Figura 1, ilustra-se o efeito da variação dos parâmetros mencionados usando a Equação 1 na sua forma linearizada.

Figura 1 -
Exemplo do efeito dos parâmetros na função linearizada de distribuição de tamanho de partículas. (A) Predominância do efeito de translação para Log (A) de 3,28; 4,28 e 5,28; (B) predominância do efeito de inclinação para β de 0,81; 1,85 e 2,41.

Para dada distribuição de tamanho, valores elevados de β (da ordem de 4) indicam predominância de partículas nas menores faixas de tamanho, enquanto valores de β da ordem de 1 indicam partículas nas maiores faixas. Dessa forma, β pode ser empregado como parâmetro característico, permitindo acompanhar a alteração da DTP durante a floculação. Todavia, o número de classes de tamanho empregadas na classificação dos dados bem como a configuração da distribuição podem interferir no ajuste da função contínua e, consequentemente, no valor de β, sendo imprescindível verificar a sensibilidade desse parâmetro antes de empregá-lo como medida direta da DTP, visando à avaliação de desempenho da floculação.

Dessa forma, a presente nota técnica visa a apresentar resultados da avaliação da sensibilidade do parâmetro representativo da DTP para diferentes configurações de distribuições discretas medidas durante a floculação.

METODOLOGIA

Para o presente estudo foram investigadas distribuições sintéticas, ou seja, com variações incrementais geradas artificialmente, visando à simulação e à avaliação de sensibilidade, posteriormente verificadas por meio de distribuições obtidas em experimentos em laboratório.

O diâmetro utilizado para classificação das partículas nas faixas de tamanho foi o comprimento médio das cordas medidas em intervalos de 2º, que passam pelo centroide do floco. Investigou-se a amplitude de tamanho na faixa de 250 a 2.400 mm. Entretanto, é adequado admitir que a função contínua de DTP, e seu parâmetro característico (β), pode ser usada na avaliação de todo o conjunto de partículas menores que o limite inferior estipulado (250 mm), visto que a DTP é alterada a partir das partículas primárias. Assim, foi verificada também a sensibilidade desse parâmetro diante da variação percentual da primeira classe de tamanho da função discreta de distribuição de tamanho de partículas - FD DTP (1ª Classe (%)), diretamente sujeita às variações advindas da translação das partículas primárias para o limite inferior da primeira classe (fronteira à esquerda) da DTP. Foi verificada ainda a sensibilidade de β diante da variável definida pelo centro de massa da DTP, dada pela sigla C.M, pois a mudança de posição do valor de C.M é indicativa da translação entre as classes de tamanho da FD DTP.

Para os ensaios em escala de laboratório, a água de estudo foi preparada a partir de solução de caulinita, com base na metodologia proposta em Pádua (1994Pádua, V.L. (1994) Metodologia para determinação dos gradientes de velocidade médios em unidades de floculação de mistura completa com câmaras em série e escoamento contínuo a partir de reatores estáticos. 165f. Dissertação (Mestrado em Hidráulica e Saneamento) - Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, São Carlos.) e Yukselen & Gregory (2004Yukselen, M.A.; Gregory, J. (2004) The reversibility of flocs breakage. International Journal of Mineral Processing, v. 73, n. 2-4, p. 251-259. https://doi.org/10.1016/S0301-7516(03)00077-2
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). A água foi floculada, na melhor condição de coagulação, com gradientes médios de velocidade (G f ) entre 20 e 60 s-1 e tempos de floculação entre 2 e 180 minutos, conforme descrito em Oliveira et al. (2015bOLIVEIRA, A.L.; MORENO, P.; SILVA, P.A.G.; JULIO, M. de; MORUZZI, R.B. (2015b) Effects of the fractal structure and size distribution of flocs on the removal of particulate matter. Desalination and Water Treatment, v. 57, n. 36, p. 16721-16732. https://doi.org/10.1080/19443994.2015.1081833
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).

Durante a floculação foram coletadas imagens em frequência de amostragem de 10 Hz nos últimos 10 s do tempo de floculação (T f ), visando a acompanhar a evolução da DTP. A metodologia de aquisição e tratamento de imagens foi adaptada de Moruzzi e Reali (2007Moruzzi, R.B.; Reali, M.A.P. (2007) Método para determinação de distribuição de tamanho de microbolhas (DTMB) em sistemas flotação (FAD) para tratamento de águas utilizando a análise de imagem digital. Revista Engenharia Sanitária e Ambiental, v. 12, n. 3, p. 273-283. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-41522007000300007
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), tal como apresentado em Oliveira et al. (2015bOLIVEIRA, A.L.; MORENO, P.; SILVA, P.A.G.; JULIO, M. de; MORUZZI, R.B. (2015b) Effects of the fractal structure and size distribution of flocs on the removal of particulate matter. Desalination and Water Treatment, v. 57, n. 36, p. 16721-16732. https://doi.org/10.1080/19443994.2015.1081833
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) e Moruzzi et al. (2016Moruzzi, R.B.; Oliveira, A.L; De Julio, M.; Dutra, R.H.A.; Silva, P.A.G. (2016) Floculação: considerações a partir da análise clássica e da avaliação direta da distribuição de tamanho de partículas. Engenharia Sanitária e Ambiental, v. 21, n. 4, p. 817-824. http://dx.doi.org/10.1590/s1413-41522016144959
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).

A sensibilidade dos parâmetros β e do C.M da distribuição foi analisada por meio da correlação múltipla entre as variáveis. Valores do coeficiente de correlação de Pearson (CP) ≥ |0,7|, para CP Є [-1,1], são fortes indícios da representatividade das variações de tamanho de partículas por meio dos parâmetros da FD DTP. Em complemento à análise de correlação, os resultados foram dispostos em gráficos, para obtenção do coeficiente de determinação (R2) das relações produzidas. A qualidade do ajuste da função linearizada aos dados discretos também foi verificada por meio do valor de R2.

Para avaliação da resposta de β diante das perturbações geradas, foram simuladas 48 FDs DTP sintéticas com comportamento monotônico e unimodal para diferentes classes de tamanho, conservando o intervalo em cada classe e alterando a fração de partículas presentes por classe no sentido das menores para as maiores classes, tal como ocorre durante o processo de floculação. Foram investigadas correlações múltiplas para 3, 4, 5, 6, 7, 8, 10 e 15 classes de tamanho. Na Figura 2, apresentam-se, por exemplo, distribuições hipotéticas para sete classes de tamanho com comportamento monotônico (A e B), cuja característica é estritamente decrescente ao longo das classes, e unimodal (C, D e E), cuja característica é a presença de um pico em posição intermediária das classes.

Figura 2 -
Exemplo de configurações investigadas para sete classes de tamanho com (A e B) comportamento monotônico e (C, D e E) unimodal.

Por fim, o coeficiente de potência da Equação 1 foi adaptado a partir da proposta de Lawler (1997LAWLER, D.F. (1997) Particle size distribution in treatment process: theory and practice. Water Science and Technology, v. 36, n. 4, p. 15-23. https://doi.org/10.1016/S0273-1223(97)00414-9
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), visando avaliar seu efeito na evolução da DTP para distribuições unimodais. Para tal, β foi avaliado conforme Equação 2, usando k como parâmetro de ajuste não linear. O valor de k proposto por Lawler (1997) foi de 3,33.

β ( d p ) = k L o g 10 d p (2)

Em que:

  • k =  constante que depende da faixa de tamanho de partículas, representadas pelo número de classes e sua amplitude.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A título de exemplo, são apresentadas algumas das FDs DTP sintéticas geradas para avaliação da sensibilidade dos parâmetros da função contínua de DTP (Figura 3). O exemplo selecionado, referente à distribuição discretizada em sete faixas de tamanho, ilustra o comportamento observado em todas as classes investigadas. Verificou-se que o ajuste da função linearizada apresentou maiores coeficientes de explicação (R2) para as distribuições monotônicas, quando comparadas às distribuições unimodais. Tal resultado decorre da própria natureza da equação de potência usada para descrever o comportamento de tamanho de partículas, a qual apresenta comportamento decrescente, conforme discutido em Oliveira et al. (2015aOLIVEIRA, A.L.; MORENO, P.; DUTRA, R.H.A.; JULIO, M. de; MORUZZI, R.B. (2015a). Avaliação de Parâmetros Representativos da Distribuição de Tamanho de Partículas Presentes em Coleções Hídricas. Revista Brasileira de Recursos Hídricos, v. 20, n. 4, p. 2084-1092. http://dx.doi.org/10.21168/rbrh.v20n4.p1084-1092
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). Ademais, as definições do número de classes e da amplitude de suas faixas interferem na qualidade do ajuste da função linearizada, visto que determinam o comportamento do decaimento. O conjunto de dados dos ajustes para funções monotônicas e unimodais é apresentado na Tabela 1.

Figura 3 -
Exemplo de séries sintéticas de sete classes de tamanho geradas para avaliação da sensibilidade do parâmetro β de distribuição de tamanho de partículas. (A) Distribuição monotônica; (B) distribuição unimodal. Acima, as distribuições discretas; abaixo, a respectiva forma linearizada.

Tabela 1 -
Valores dos coeficientes de determinação (R2) decorrentes do ajuste da função contínua linearizada às distribuições discretas sintéticas para diferentes números de classes de tamanho em distribuições com comportamento monotônico e unimodal.

Analisando-se a Tabela 1, nota-se que, em geral, o ajuste da função contínua linearizada obteve melhor coeficiente de explicação para as condições em que a DTP apresentava comportamento monotônico, com expressiva predominância da primeira classe de tamanho, independentemente do número de classes. Ainda, entre os melhores ajustes, verificou-se que distribuições com decaimento gradual da frequência relativa apresentaram valores de R2 mais elevados, quando comparados a distribuições com decaimento abrupto entre classes de tamanho.

As distribuições para o caso de 3 e 4 classes apresentaram melhores ajustes em relação aos demais números de classes devido ao reduzido número de pontos empregados para avaliação de R2. Para os casos em que o número de classes de tamanho foi maior (15), também foi maior a quantidade de classes em que nenhuma partícula foi detectada, resultando em espalhamento dos dados e menores valores associados de R2.

Sob o ponto de vista restrito do ajuste da função contínua de DTP, as distribuições monotônicas com número de classes entre 7 e 10 apresentaram melhor conjunto de resultados. Para distribuições unimodais, o coeficiente de potência da Equação 1 na forma de β (dp), dado pela Equação 2, foi avaliado ao final do artigo.

Embora tenha havido, para muitos casos, grande dispersão dos dados em torno da reta ajustada, verificou-se, pelos dados da Tabela 2, que não houve prejuízo à sensibilidade do parâmetro β, mesmo para distribuições com comportamento unimodal. Ou seja, o coeficiente angular da reta ajustada ainda acompanha a modificação das frações em cada posição, mostrando-se, assim, sensível às oscilações, mesmo para os casos em que a reta ajustada apresentou baixa explicação.

Tabela 2 -
Correlações lineares múltiplas entre o parâmetro característico da distribuição de tamanho (β), o centro de massa da distribuição de tamanho de partículas e a primeira classe relativa à distribuição de tamanho de partículas (1ª Classe (%)). Distribuições sintéticas geradas para um total de 3, 4, 5, 6, 7, 8, 10 e 15 classes de tamanho.

Os dados apresentados na Tabela 2 evidenciam claramente a existência de fortes correlações entre o parâmetro característico β e as distribuições geradas sinteticamente (correlações ≥ |0,89|). Como esperado, as variações da 1ª Classe (%) respondem em razão inversamente proporcional ao β, enquanto as variações de C.M respondem em razão direta.

Na Figura 4 são apresentados os resultados das variações em valores absolutos de β e das variáveis da FD DTP. Nelas, podem-se notar as dependências descritas pela análise da correlação múltipla, bem como verificar que a variação encontra boa explicação no ajuste por regressão linear das variáveis, com valor de R2 ≥ 0,90. Em adição, a declividade das retas ajustadas é também indicativo de que a resposta, dada pelo parâmetro β nas amplitudes apresentadas, foi sensível às oscilações dos controles, dadas pelas variáveis C.M e 1ª Classe (%).

Figura 4 -
Avaliação da sensibilidade do parâmetro característico da distribuição de tamanho de partículas (β) diante dos controles, dados pelo centro de massa da distribuição de tamanho de partículas (C.M) e pela primeira classe relativa à distribuição de tamanho de partículas (1ª Classe (%)). Distribuições sintéticas geradas para um total de 3, 4, 5, 6, 7, 8, 10 e 15 classes de tamanho. Na primeira coluna de gráficos de cima para baixo, tem-se: (A) 3; (B) 4; (C) 5; (D), 6 classes. Na segunda coluna, de cima para baixo, tem-se: (E) 7; (F) 8; (G) 10; e (H), 15 classes.

Esse conjunto de resultados, explicitados pelas correlações entre as variáveis e suas relações em termos absolutos, permitiu inferir sobre o potencial de representação das oscilações da FD DTP, presentes durante o processo de floculação, por meio do parâmetro característico β da função contínua de DTP para uma faixa ampla de classes de tamanho (de 3 a 15 classes), mantendo-se o intervalo em cada classe. Assim, foram realizados experimentos de floculação visando à verificação das condições observadas nas simulações.

Como exemplo dos experimentos realizados, na Figura 5 são apresentadas fotografias representativas, extraídas durante os ensaios de floculação para gradientes médios de velocidade (G f ) de 20, 30, 40 e 60 s-1 em tempos de floculação (T f ) de 60, 40, 30 e 20 minutos, nessa ordem, de modo que o produto dado por G f x T f (número de Camp) foi mantido constante em 7.200. Para cada ensaio foram capturadas 100 imagens, conforme procedimento descrito em Oliveira et al. (2015bOLIVEIRA, A.L.; MORENO, P.; SILVA, P.A.G.; JULIO, M. de; MORUZZI, R.B. (2015b) Effects of the fractal structure and size distribution of flocs on the removal of particulate matter. Desalination and Water Treatment, v. 57, n. 36, p. 16721-16732. https://doi.org/10.1080/19443994.2015.1081833
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). Analisando-se a Figura 5, podem-se observar agregados de maior tamanho para G f = 20 s-1, quando comparados aos demais casos. O valor do parâmetro β para 20 s-1 (β 20 ) foi de 2,2, inferior em módulo, se comparado com os valores obtidos para os demais gradientes (β 30 de 5,13; β 40 de 4,9; β 60 de 4,8). Na Figura 6, apresentam-se as distribuições medidas e seus respectivos ajustes à função contínua linearizada para valores de G f de 20 s-1 em T f de 60 minutos e G f de 60 s-1 em T f de 20 minutos.

Figura 5 -
Imagens binarizadas dos flocos formados em diferentes pares de valores de G f e T f . (A) Tf = 3.600 s e Gf = 20 s-1; (B) Tf = 2.400 s e Gf = 30 s-1; (C) Tf = 1.800 s e Gf = 40 s-1; (D) Tf = 1.200 s e Gf = 60 s-1.

Figura 6 -
Distribuição de tamanho de partícula discreta e ajustada para a função contínua linearizada a partir dos dados experimentais de floculação. (A) G f de 20 s-1 e T f de 60 minutos; (B) G f de 60 s-1 e T f de 20 minutos.

Os resultados experimentais mostrados na Figura 5 permitem constatar as observações feitas quando do estudo das distribuições sintéticas. Ressalta-se que os ajustes obtidos, os quais apresentaram valores de R2 de 0,78 e de 0,93 para G f de 20 e 60 s-1, respectivamente, são melhores quando comparados às distribuições sintéticas. Tal fato deve-se à característica das distribuições obtidas nos ensaios de floculação, as quais resultam em condições favoráveis à representação do seu comportamento por meio da função de decaimento de potência.

Na Figura 7 são apresentados os resultados do ajuste não linear da constante k da correlação do coeficiente de potência em função de d p , isto é, β=β (d p ), conforme Equação 2. A faixa de tamanho estudada contemplou valores de 20 a 2.000 mm, e k foi ajustado de modo que β variasse no intervalo [1,4], conforme apontado por Lawler (1997LAWLER, D.F. (1997) Particle size distribution in treatment process: theory and practice. Water Science and Technology, v. 36, n. 4, p. 15-23. https://doi.org/10.1016/S0273-1223(97)00414-9
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), sendo tais valores representados no gráfico pelas retas tangentes aos extremos da faixa de tamanho (Figura 7A). O valor de A da Equação 1 foi mantido constante igual a 1, visto que sua variação resulta em translação da função nas ordenadas, sem alterar seu comportamento. Embora a adoção de β (d p ) tenha potencial para melhor ajuste à FD DTP quando da distribuição unimodal (Figura 7B), sua adoção dificulta a avaliação da evolução da DTP por meio restrito de β, sendo entrave ao acompanhamento direto da floculação por meio desse parâmetro. Na Figura 8, apresentam-se os resultados dos ensaios com G f de 60 s-1 e T f de 20 minutos, ajustados por meio da Equação 1, com coeficiente de potência modificado, conforme Equação 2, na forma de β (d p ).

Figura 7 -
(A) Curva de β (dp) para dp contido no intervalo de [20-2.000 mm]. Valor de k ajustado de 1,212. As retas representam valores constantes de β no intervalo [1,4]; (B) distribuição contínua da função dada pela Equação 1 com coeficiente de potência β (dp) para as mesmas condições de (A). Fixo A = 1.

Embora o ajuste para a ampla faixa de tamanho (1 ≤ dp ≤ 2.000 mm) apresentada na Figura 7 demonstre adaptação de β ao comportamento unimodal da distribuição, o uso β (dp) para os dados experimentais apresentados (180 ≤ dp ≤ 1.000 mm) na Figura 8A produziu pouco efeito sobre o ajuste. Tal fato pode ser facilmente observado por meio da distribuição dos resíduos apresentados na Figura 8B. Dessa forma, a finalidade da função contínua deve ser avaliada em cada caso, a depender da aplicação requerida.

Figura 8 -
(A) Ajuste dos dados experimentais para G f de 60 s-1 e T f de 20 minutos usando β constante e a função β (dp) como coeficiente de potência para dp contido no intervalo de [180-1.000 mm]; (B) distribuição dos resíduos para os dois ajustes.

A verificação de diferentes funções de distribuição e seus ajustes não foi o escopo principal desta nota técnica, o qual envolveu a avaliação restrita de sensibilidade do parâmetro representativo β. Todavia, a necessidade de avaliação preliminar acerca desse assunto foi necessária, tendo em vista a constatação a respeito dos ajustes da função contínua linearizada para distribuições discretas de tamanho com comportamento unimodal. Trabalhos futuros deverão avaliar de forma dedicada o ajuste de diferentes funções contínuas para distribuições discretas diversas.

CONCLUSÕES

Nesta nota técnica a sensibilidade do parâmetro característico da função contínua de DTP, bem como do C.M da DTP, foi avaliada por meio de regressão linear múltipla. O ajuste da função contínua aos dados discretos também foi verificado de forma complementar.

A importância da análise decorre da possibilidade de avaliação da floculação por meio do acompanhamento de um único parâmetro representativo da DTP.

Verificou-se que o parâmetro β da função contínua de DTP é sensível às variações da distribuição discreta de tamanho e dependente do número de classes. A análise de correlação resultou em valores acima de 0,89, quando o C.M da função de distribuição e as variações na primeira classe de tamanho foram empregados na análise.

Resultados experimentais confirmaram as observações feitas a partir das distribuições sintéticas, geradas para simulação.

Por fim, constatou-se que, embora a sensibilidade tenha sido verificada para todas as situações investigadas, a função de potência da DTP apresenta melhores ajustes para distribuições monotônicas, sendo necessário aprimoramento da função, visando a descrever o comportamento de distribuições unimodais.

AGRADECIMENTOS

Rodrigo B. Moruzzi agradece à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) 2010/50694-0 pelo apoio financeiro e ao CNPq pela bolsa 301882/2015-0 e 301210/2018-7.

REFERÊNCIAS

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  • LAWLER, D.F. (1997) Particle size distribution in treatment process: theory and practice. Water Science and Technology, v. 36, n. 4, p. 15-23. https://doi.org/10.1016/S0273-1223(97)00414-9
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    Reg. ABES: 169648

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Mar 2020
  • Data do Fascículo
    Jan-Feb 2020

Histórico

  • Recebido
    22 Set 2016
  • Aceito
    27 Set 2018
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