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Uma personagem por sua roupa: o gibão como representação do bandeirante paulista1 1 Este artigo desenvolve aspectos da indumentária dos bandeirantes apontados ao público no módulo “Criando os heróis paulistas”, que integrou a exposição “Imagens recriam a história”, inaugurada no Museu Paulista em 2007, com financiamento da Caixa Econômica Federal. O artigo também se vincula ao projeto de pesquisa que desenvolvo, “Representações artísticas do passado nas coleções do Museu Paulista da USP”, realizado no âmbito do Projeto Temático “Coletar, identificar, processar, difundir: o ciclo curatorial e a produção do conhecimento”, coordenado pela professora Dra. Ana Gonçalves Magalhães e financiado pela Fapesp (processo n. 2017/07366-1), a quem agradeço.

A character represented by your clothing: the gibão as metaphor of the paulista bandeirante

Resumo:

O artigo focaliza o processo pelo qual a figuração do bandeirante paulista foi associada, durante o século XX, a um item específico de indumentária, o gibão de armas, espécie de colete caracterizado pela presença de costuras formando losangos. Essa vestimenta foi vinculada aos sertanistas pela primeira vez em uma pintura de Oscar Pereira da Silva, encomendada pelo Museu Paulista e baseada em uma gravura de Debret. A partir dessa obra o gibão passou a ser um dos identificadores dessa personagem histórica, juntamente com outros itens de sua indumentária, como chapéus e botas. Examina-se a propagação social dessa convenção visual, de modo a evidenciar os circuitos de sua difusão a partir do Museu, especialmente por meio dos brasões municipais realizados por Afonso Taunay e José Wasth Rodrigues, nos quais, por vezes, a figuração da personagem deixa mesmo de ser veiculada, sendo substituída metonimicamente por sua vestimenta característica.

Palavras-chave:
Bandeirantes; Gibão de armas; Museu Paulista

Abstract:

The article focuses on the process by which the bandeirante paulista figuration was associated, during the 20th century, with a specific item of clothing, the gibão de armas, a type of vest characterized by the presence of seams forming lozenges. First figured in a painting by Oscar Pereira da Silva, based on an engraving by Debret and commissioned for the Museu Paulista, the gibão became one of the identifiers of this character, along with other items of his clothing, such as hats and boots. It is also examined the social propagation of this visual convention, in order to show the circuits of its diffusion from its placement in the Museum. In that sense, the municipal coats made by Afonso Taunay and José Wasth Rodrigues are especialliy examined, in which sometimes the figuration of the character ceases to be conveyed, being replaced metonymically by his characteristic clothes.

Keywords:
Bandeirantes; Gibão de armas; Museu Paulista

A construção imagética dos tipos heroicos de identificação nacional constitui uma das grandes práticas iconográficas no Ocidente, desde a generalização do pensamento romântico na Europa durante o século XIX. A invenção dos tipos nacionais esteve muito associada à glorificação dos que combateram por territórios, pela defesa de populações, por aqueles que encarnavam os melhores atributos do povo, a ponto de poderem liderá-lo. Hugh Trevor-Roper (1997)TREVOR-ROPPER, Hugh. A invenção das tradições: a tradição das Terras Altas (Highlands) da Escócia. In: HOBSBAWM, Eric; RANGER, Terence. A invenção das tradições, 2ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997, p. 25-51. é autor de um trabalho clássico sobre a fixação das características iconográficas do valente combatente das Highlands escocesas, em que resta claro como roupas, instrumentos musicais e padrões têxteis foram definidos para a construção de um tipo que não existira exatamente dessa forma no passado. O guerreiro de tartan é uma síntese de citações esparsas de artefatos e comportamentos representados em antigas obras de arte, que foram descritas em documentos, permaneceram em velhas coleções ou foram retiradas de sítios arqueológicos. Sua eficácia foi garantida pela repetição exaustiva, e nunca questionadora, de um tipo que se julgava o representante da terra, da nação.

Percorrer os museus europeus de arte e história é também certificar-se da onipresença do tipo rígido do cavaleiro medieval heroicizado. Portando longas espadas, vestia ele cotas de malha e armaduras metálicas a lhe proteger o corpo, capacetes para o rosto, lanças, maças e alabardas como apetrechos para o combate. Ainda que o próprio Cervantes já tivesse pontuado o caráter ambíguo e mesmo irônico desse tipo idealizado desde o início do século XVII, a pintura de história e os monumentos escultóricos espalhados por toda a Europa oitocentista inverteram qualquer crítica, ironia ou humor, dando ao cavaleiro uma condição heroica sobre cujos valores, virtudes, violência e bravura se construíram as bases do tipo nacional pretérito. As pinturas dispostas na vasta Galeria das Batalhas e nas salas dedicadas às cruzadas do Palácio de Versalhes, para lá encomendadas ou transferidas visando-se à abertura do Museu de História da França em 1837, são povoadas desses heróis medievais metálicos, que se transmutaram em outros combatentes posteriores, vestidos de couraça,de gibões bordados e portando chapéus emplumados dos tempos bourbônicos.2 2 Para essas pinturas, ver Gaehtgens (1981), Bajou-Charpentreau (2018). Forjava-se assim uma síntese visual entre os heróis e suas vestimentas características, equação de grande duração que se manifestará, por exemplo, no cowboy americano. Esse herói mitificado metamorfoseou o herói medieval com outros atributos visuais, cristalizando a tipificação do valente norte-americano das planícies do Oeste, severo, heroico e representado sempre com a mesma indumentária. Imaginado recorrentemente tal qual um cavaleiro fidalgo, seria ele desprovido de um impulso bárbaro, matando apenas por coação, a despeito do caráter brutalmente invasivo de sua presença.3 3 “The classical cowboy hero - that is, as he existed before World War II - resorted to violence only when he was provoked or when some evil threatened a weaker person who could mount no adequate defense. He was strong and silent, not given even to rhetorical violence. If he had to fight, he used his fists. If someone shot him, he shot back, but only to wound. With the excepcion of several hundred nameless Indians, the classical cowboy hero never killed. The postwar cowboy killed regularly, but still only after provocation” (Savage, 1985, p. 33).

Este artigo explora como o tipo iconográfico do que se convencionou definir como um bandeirante paulista se integra a esse circuito de representações de tipos heroicizados identificáveis por meio de suas roupas. Essas personagens do passado brasileiro foram associadas a uma espécie local de armadura - o gibão de armas - que passou a ser um de seus maiores atributos na cultura visual generalizada ao longo do século XX. Nesse processo, as obras de arte encomendadas pelo Museu Paulista durante a gestão de Afonso d’Escragnolle Taunay (1917-1945) contribuíram decisivamente para cristalizar o gibão como um sinal de caracterização do bandeirante. Procura-se também, neste texto, compreender como a presença corpórea dos bandeirantes chegou mesmo a ser visualmente suprimida,tendo sido substituída metonimicamente por seu gibão, uma representação tão poderosa da personagem que permitiu dispensar seu usuário ao mesmo tempo que o qualificava.

Vestir o sertanista

O processo de figuração do bandeirante ao longo do século XX foi caracterizado pela disseminação de uma série de convenções visuais, construídas coletivamente a partir de propostas formuladas no Museu Paulista. As obras de arte encomendadas para essa instituição desde 1903 estabeleceram um conjunto de caracteres definidores dessa personagem, que foram sendo socialmente apropriados e, muitas vezes, reforçados pela própria instituição, por meio de novas encomendas que replicavam esses caracteres.

A primeira dessas obras de arte foi o retrato fictício de Domingos Jorge Velho e de seu imediato, o loco-tenente Antônio Fernandes de Abreu, realizado por Benedito Calixto e encomendado para a instituição em meio a um conjunto de outros retratos dedicados a próceres da história paulista. Nessa pintura, a figuração estabelece alguns itens que comporiam o cânone de representação dos bandeirantes ao longo das décadas seguintes, como a presença de barbas no protagonista, o chapéu de abas largas, as botas de cano alto e o porte de armas de fogo e brancas. Já foi ressaltado o quanto essa pintura foi fundamental para a positivação da imagem dos bandeirantes (Marins, 2007MARINS, Paulo César Garcez. Nas matas com pose de reis: a representação de bandeirantes e a tradição da retratística monárquica europeia. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros (São Paulo). n. 44, p. 77-104, 2007. DOI: https://doi.org/10.11606/issn.2316-901X.v0i44p77-104.
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), visto que a primeira obra de arte a figurar sertanistas paulistas, a pintura Os bandeirantes de Henrique Bernardelli, concluída em 1889, causticamente os representara bebendo água de um rio atirados ao chão, como animais, como frisou Maraliz Christo (2002CHRISTO, Maraliz de Castro Vieira. Bandeirantes ao chão. Estudos Históricos(Rio de Janeiro). n. 30, p. 33-55, 2002.). Para tal positivação, foi central o estabelecimento de uma solução imponente quanto à pose do corpo do bandeirante, inspirada naquela cristalizada pelos retratos de Hyacinthe Rigaud para Luís XIV e retomada por ­Jean-Baptiste Debret naquele que fez de dom João VI no Rio de Janeiro. Calixto representou Domingos Jorge Velho com seu corpo ereto, em meia torção, com o cotovelo esquerdo flexionado, enquanto o braço direito, estendido, apoia-se na arma, que substituía o cetro real. Também se evidenciou o quanto a questão da vestimenta do bandeirante foi um ponto polêmico entre os interlocutores de Calixto, que divergiam quanto à melhor opção para dar à visão do destruidor de Palmares a imponência e legitimidade condizentes com a pretensão de torná-lo um herói (Marins, 2007MARINS, Paulo César Garcez. Nas matas com pose de reis: a representação de bandeirantes e a tradição da retratística monárquica europeia. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros (São Paulo). n. 44, p. 77-104, 2007. DOI: https://doi.org/10.11606/issn.2316-901X.v0i44p77-104.
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).

A mesma falta de referências que recaía sobre a fisionomia dos bandeirantes - dos quais não se tinha nenhum retrato a eles contemporâneo em que os pintores de história pudessem se basear - era extensivo ao seu aparato material. Os inventários eram áridos no que toca a roupas formais de combate, motivo pelo qual Theodoro Sampaio e Washington Luís divergiam sobre se Domingos Jorge Velho, mestre de campo que era, deveria ser representado fardado à portuguesa ou com as roupas plausíveis a um sertanista. A opção pelo “realismo”dos sertões e não pelo “idealismo” de um retrato militar europeizante acabou prevalecendo na pintura de Calixto, o que acabou por desencadear uma outra forma de decoro, mais “nativa”, de representar os chefes militares paulistas (Marins, 2007MARINS, Paulo César Garcez. Nas matas com pose de reis: a representação de bandeirantes e a tradição da retratística monárquica europeia. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros (São Paulo). n. 44, p. 77-104, 2007. DOI: https://doi.org/10.11606/issn.2316-901X.v0i44p77-104.
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). A vestimenta rústica adotada pelo pintor iria se tornar, nas décadas seguintes, a convenção mais aceita e considerada a mais adequada para figurar heroicamente os sertanistas, motivo pelo qual os fardamentos e perucas de honra, portados por oficiais na metrópole ou nas vilas e cidades costeiras luso-brasileiras dos séculos XVII e XVIII, estão completamente ausentes nas pinturas e esculturas novecentistas que passariam a figurar bandeirantes.

A retomada de encomendas de obras de artepara o Museu Paulista a partir do início da gestão de Afonso Taunay (1917-1945TREVOR-ROPPER, Hugh. A invenção das tradições: a tradição das Terras Altas (Highlands) da Escócia. In: HOBSBAWM, Eric; RANGER, Terence. A invenção das tradições, 2ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997, p. 25-51.) foi decisiva para a aceleração do processo de definição de uma imagem canônica do bandeirante. A pose bourbônica reapareceu em pinturas de Bernardelli e em esculturas de Nicolla Rollo, Adrien van Emelen e Luigi Brizzolara, assim como as barbas espessas e as armas brancas e de fogo, em especial bacamartes (Marins, 2007MARINS, Paulo César Garcez. Nas matas com pose de reis: a representação de bandeirantes e a tradição da retratística monárquica europeia. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros (São Paulo). n. 44, p. 77-104, 2007. DOI: https://doi.org/10.11606/issn.2316-901X.v0i44p77-104.
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). Quanto à indumentária, houve mais variações, sem, no entanto, que se contrastasse a opção de Calixto de figurar-se o bandeirante com botas de cano alto, chapéus de aba larga e com vestes alheias ao fardamento militar oficial português. As variações de vestimentas encontráveis nas obras encomendadas por Taunay incluíam a presença de camisas, sobrevestes em tecido ou couro, fechadas por botões e com cinto afivelado. E em várias dessas encomendas de Taunay é visível aquela que foi a grande inovação em relação às roupas encontráveis nas pinturas pioneiras de Calixto e de Bernardelli: o chamado gibão de armas, atravessado por costuras, formando losangos.

Peça de indumentária constante nos inventários lavrados para partilha de bens do século XVII, os gibões de armas eram um importante artefato de defesa portado por sertanistas. Como muitos outros gibões, eles cobriam o corpo a partir do pescoço até a altura do quadril ou à meia coxa. Eram espessos, pois recheados densamente de fibras de algodão, de modo que pudessem bloquear as flechas lançadas por inimigos. Alcântara Machado, em seu trabalho clássico sobre os bandeirantes (1929MACHADO, Antônio Castilho de Alcântara. Vida e morte do bandeirante. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1929.), indica que a eficácia dos gibões paulistas levou mesmo a recomendação da exportação do artefato para Angola em 1684.4 4 “Basílio de Magalhães cita uma carta régia de 1684, em que se recomenda a Duarte Chaves, governador do Rio de Janeiro, que envie ao governador de Angola até sessenta dos gibões feitos na forma de que usam os sertanejos de S.Paulo” (Machado, 1929, p. 229; grifo no original). O uso costumeiro dessa peça de defesa se manifesta com clareza na documentação cartorial seiscentista arquivada na vila de São Paulo, como indicam as pesquisas recentes de Igor Renato Machado de Lima, de Luciana Silva e de José Carlos Vilardaga. No espólio de João Sutil de Oliveira, assassinado por índios Guarulhos em 1652, consta, por exemplo, um gibão de armas, bem como uma espada, três escopetas e três correntes de três braças com seus colares, típico aparato de um escravizador de índios (Vilardaga, 2016VILARDAGA, José Carlos. Terras, ouro e cativeiro: a ocupação do aldeamento dos Guarulhos nos séculos XVI e XVII. Revista do Museu de Arqueologia e Etnologia da USP (São Paulo). v.26, p. 42-61, 2016. DOI: https://doi.org/10.11606/issn.2448-1750.revmae.2016.119010.
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, p. 42). Os gibões aparecem em diversos inventários feitos no sertão ao longo da primeira metade do século XVII, como no de Braz Gonçalves, de 1603, cujo gibão de armas sem mangas foi arrematado a 5$000 réis por Luiz Hames; no de Pedro de Araújo, lavrado em 1617, cujo gibão, avaliado em 1$000 réis, foi vendido por 1$100; no de Antônio da Silveira, lavrado em 1638 (Lima, 2011LIMA, Igor Renato Machado de. “Habitus” no Sertão: gênero, economia e cultura indumentária na Vila de São Paulo (1554-c.1650). Tese (Doutorado em História Econômica), Universidade de São Paulo. São Paulo, 2011., p. 229, 234, 237) e, 10 anos depois, no de Afonso Dias, que declarou que “aqui em minha companhia tragos minhas armas, a saber, minha espingarda, o meu terçado e o meu gibão de armas” (Lima, 2011LIMA, Igor Renato Machado de. “Habitus” no Sertão: gênero, economia e cultura indumentária na Vila de São Paulo (1554-c.1650). Tese (Doutorado em História Econômica), Universidade de São Paulo. São Paulo, 2011., p. 295).

Não restou nenhum sobrevivente dessas peças de indumentária - tampouco das custosas couras de anta,5 5 Segundo Bluteau e Silva, a coura era “gibão de coiro com aramas, para resguardar o corpo na guerra” (p. 343); “Anta ou coura de anta. Couraça da pelle de anta” (Diccionario, 1793, p. 317). Luciana da Silva dá ideia do valor dessa espécie de armadura em São Paulo no século XVII: “No inventário de Luiza da Gama, casada com João Paes e falecida em 1615, constava uma coura de anta no valor de 5$000 (cinco mil réis), o dobro da avaliação da casa em que o casal morava, de dois lanços de taipa de mão e cobertura de palha”. Igor Renato Machado de Lima (2011, p. 160) indica que também foram mencionadas couras de anta nos inventários de Rafael de Oliveira (1654), Custódio Gomes (1639), Francisco Barreto (1607), Bento Pires Ribeiro (1669) e Domingos Luiz (1613). que igualmente serviam à proteção do corpo - mas seu uso recorrente em São Paulo vêm sendo assinalado por pesquisadores desde a primeira metade do século XX. O espólio de João Tenório, por exemplo, descrito em 1634, tinha tanto uma coura de anta (forrada de tafetá e ornada de fitas), quanto um gibão de armas, sinal da sua familiaridade e a da sua família com as entradas, visto que seu pai descobrira 14 minas nos sertões (Silva, 2013SILVA, Luciana da. Artefatos, sociabilidades e sensibilidades: cultura material em São Paulo (1580-1640). Dissertação (Mestrado em História), Universidade Estadual de Campinas. Campinas, 2013., p. 201).

As costuras em losangos com os quais os gibões de armas se tornaram conhecidos ao longo do século XX não são mencionadas nos inventários. Tal característica, essencial para sua identificação visual como uma peça da indumentária bandeirante, só foi fixada por meio de uma operação vastamente anacrônica empreendida por Afonso Taunay, que, como veremos, lhe permitiu superar as fragilidades iconográficas do período colonial em sua ambição de dar visualidade ao herói que pretendia fixar e enaltecer.

Um gibão oitocentista para um herói seiscentista

Diversos autores já se debruçaram sobre as encomendas de obras de arte realizadas por Taunay a partir de 1917, solicitadas tanto para a ornamentação de áreas de circulação do prédio do Museu Paulista, quanto para uso em salas da exposição histórica que começou nesse mesmo ano a preparar, com vistas às comemorações do Centenário da Independência em 1922. Quando os artistas não eram residentes em São Paulo, a documentação arquivada no Museu Paulista é rica em cartas entre contratante e contratado, que permitem compreender o quanto Taunay, por exemplo, interferia na composição das obras, de modo a submeter a criação artística a seus desígnios de caracterização visual de personagens ou eventos (Brefe, 2005BREFE, Ana Claudia Fonseca. O Museu Paulista: Affonso de Taunay e a memória nacional, 1917-1945. São Paulo: Editora Unesp; Museu Paulista, 2005.; Christo, jun. 2002CHRISTO, Maraliz de Castro Vieira. Bandeirantes na contramão da história: um estudo iconográfico. Projeto História (São Paulo). n. 24, p. 307-335, jun. 2002.). Tal não é o caso para as encomendas solicitadas ao artista fluminense Oscar Pereira da Silva, visto que residia desde o início do século XX em São Paulo. Nada, portanto, existe sobre as determinações de Taunay no processo de encomenda da pintura em que, pela primeira vez no acervo do Museu, Pereira da Silva figurou um gibão de armas (Figura 1).

Figura 1:
Oscar Pereira da Silva. Combate de milicianos de Mogi das Cruzes com botocudos, óleo sobre tela, 100x150cm, 1920 (Acervo do Museu Paulista da USP, São Paulo).

A obra em questão, assinada e datada de 1920, é mencionada por Taunay no Relatório desse mesmo ano (datado de 18 de janeiro de 1921), em que ele indica sua instalação na sala B-12, “consagrada á reprodução dos mais antigos iconográficos conhecidos, traduzindo aspectos da vida na Provincia de São Paulo há quase um seculo”. Nesse relatório ela é denominada de Combatte de milicianos de Mogy das Cruzes com botocudos do sertão de Curityba,6 6 Taunay (1922, p. 1304). Os relatórios são sempre redigidos no ano seguinte àquele ao qual se referem. Esse, portanto, foi concluído em 18 de janeiro de 1921 e publicado na Revista do Museu Paulista editada em 1922. nomenclatura que será corrigida por Taunay em outros documentos. Disso é exemplo o terceiro inventário institucional, de 1925, em que a tela é referida com a seguinte descrição: “1) Combate de botocudos e milicianos de Mogy das Cruzes, oleo do Prof. Oscar Pereira da Silva, A. 1,00 C1,49. Adquirido por 2 contos de réis (2:000$) em janeiro de 1921.”7 7 INV. AV. N. 3 - APMP/FMP - P. 215, p. 19. Agradeço a Mayra Tiemi Yonashiro Saito a indicação deste documento. No “Relatório” de 1921, a tela é mencionada apenas como “Combate de índios” (Taunay, 1926, p. 704). Tal retificação foi imprescindível em função da fonte iconográfica em que Oscar Pereira da Silva se baseou para realizar essa pintura.

Trata-se da gravura denominada Sauvages civilisés, soldats indiens de Mugi das Cruzas (Province de St. Paul) combattant des botocudos, litografia Charles Etienne Pierre Motte a partir de aquarela de Jean-Baptiste Debret, publicada no primeiro volume da obra Voyage pittoresque et historique auBrésil, editado em 1834 em Paris (Figura 2).

Figura 2:
Jean-Baptiste Debret (1834). Sauvages civilisés, soldats indiens de Mugi das Cruzas (Province de St. Paul) combattant des botocudos, litografia de Charles Etienne Pierre Motte.

Dada à inexistência de correspondência a respeito da encomenda feita por Afonso Taunay a Oscar Pereira da Silva, não é possível saber com absoluta precisão se foi Taunay que indicou essa gravura ao pintor. Sabemos, contudo, que Taunay conhecia bem os três volumes da Voyage, publicados entre 1834 e 1839, visto que tecera sobre eles diversos comentários em seu artigo “A missão artística de 1816”, publicado na Revista do IHGB, cerca de 5 anos antes de sua posse na direção do Museu Paulista (Taunay, 1911TAUNAY, Affonso d’Escragnolle. A missão artística de 1816. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (Rio de Janeiro), t. 74, n. 1, p. 3-202, 1911.). Taunay também certamente conhecia o artigo “Os botocudos do rio Doce”, de autoria de Hermann von Ihering, primeiro diretor do Museu Paulista, que o publicara em 1911IHERING, Hermann von. Os botocudos do rio Doce. Revista do Museu Paulista (São Paulo). v. 8, p. 37-51, 1911. na revista do Museu e no qual se atinha aos resultados da expedição de Walter Garbe em 1909 à bacia do rio situado entre o Espírito Santo e Minas Gerais (e não no Paraná, como expresso na já referida menção de Taunay a Curitiba, em que ele se equivocara, existente no “Relatório” de 1920). Garbe constatara inclusive que o uso de botoques nos lábios e orelhas, costume que Debret figurara e que se julgava extinto no início do século XX, ainda era mantido por grupos sobreviventes vistos pelo naturalista, que deles coletara algumas amostras desses artefatos, doadas ao Museu. Os adornos indígenas figurados por Oscar Pereira da Silva em sua pintura tinham, portanto, algum lastro documental confirmador ao tempo da encomenda de Taunay, ainda que os botoques depositados no Museu fossem anacrônicos ao momento em que Debret realizara sua composição, gravada e publicada em 1834.

No texto de Debret relativo a essa gravura, denominado “Soldats indiens de Mugi das Cruzas”, que fora publicado no mesmo volume de 1834, o pintor francês detinha-se também nos índios paulistas que, a serviço da Coroa, haviam sido mobilizados para o combate aos botocudos do rio Doce. Nele, Debret realiza uma descrição minuciosa do que então se reconhecia ser um gibão:

Dans chaque poste, on a le soin de tenir toujours en réserve un certain nombre de cuirasses, nommées gibao (gibaon). Ce sont des casaques de toile de coton, rembourrées et piquées; elles descendent jusqu’aux genoux, couvrent seulement le bras, et sont à l’épreuve de la flèche; mais leur poids les rend bien incommodes lors qu’il faut se battre pendant les grandes chaleurs. A Villa-Vittoria, on les fabriques en soie, et eles sont beaucoup plus légères (Debret, 1834DEBRET, Jean-Baptiste. Voyage pittoresque et historique au Brèsil , v. 1. Paris: Firmin Didot, 1834., p. 37).

Não se sabe se os gibões em uso em São Paulo durante o período sertanista (dos quais não restara nenhum exemplar ao tempo de Taunay) eram correlatos ao modelo relatado por Debret, já que as descrições dos inventários seiscentistas e setecentistas não se atêm a esse nível de minúcia. No entanto, o vínculo entre essa couraça oitocentista e os índios vindos de São Paulo foi certamente razão suficiente para que Taunay definisse a imagem de Debret como a referência central para sua figuração nas obras encomendadas para o Museu, o que incluiu mesmo uma tradução adulteradora, que lhe serviu para atribuir a Debret a relação que ele mesmo estabelecera. Em março de 1924, ao descrever a composição das telas “Ciclo da caça ao índio” e “Ciclo do gado”, que finalmente eram instalados no Museu, Taunay se referia à fonte que julgava privilegiada para a figuração de bandeirantes:

De todo o bandeirismo não existe um só desenho que lhe ilustre algum episodio. Da indumentária do bandeirante resta-nos um único documento e este mesmo já de nossos dias e precioso, insubstituível, por ser o único.

É o de Debret, uma das pranchas da sua jamais assaz louvada Voyage pittoresque et historique au Brésil [ou] Séjour d’un artiste français au Brésil, obra para a qual continuamente se voltam todos os ilustradores em apuros dos nossos últimos anos coloniaes e primeiros tempos imperiais. Neste livro ocorre uma estampa sobremodo conhecida: “Combate de milicianos de Mogy das Cruzes com selvagens botocudos”. A scena é toda de imaginação, mas o desenho sobremodo preciso, porque Debret colocou no seu quadro soldados paulistas, vindos de Mogy das Cruzes, trazendo o equipamento dos antigos devassadores do sertão, como o artista nos conta. Assim, pôde reproduzir exatamente a feição destes caçadores de índios. Perguntará o leitor como poderia ter ele tido o ensejo de se avistar com estes soldados paulistas quando nunca sahiu do Rio de Janeiro e adjacências. É ainda ele que nos explica o caso:

Taunay opera então uma fundamental complementação à descrição de Debret que, embora apócrifa, é citada toda entre aspas, como se fora integralmente do pintor francês:

“Havia nas mattas do Corcovado um grande quilombo, que, durante annos e anos, não pudera ser extincto pelas batidas dos soldados da guarnição do Rio.

Recorrera o governo aos de São Paulo, especialistas em combater índios, e assim veiu de Mogy das Cruzes uma companhia de caçadores de bugres, petrechados, como os seus antecessores seculares, com o ‘gibao de armas’ ou ‘armas de algodão’, o casaco de couro, estofado de algodão, que servia aos bandeirantes de couraça contra as flechas dos índios.

Depois de Debret nenhum artista mais se ocupou de bandeirantes” (Taunay, 24 mar. 1924TAUNAY. Affonso d’Escragnolle. Quadros históricos. No Museu Paulista: duas grandes telas sobre assumptos bandeirantes. Correio Paulistano (São Paulo). 24 mar. 1924, p.2., p.2).

O texto original de Debret não faz nenhuma menção a “antecessores seculares”, nem mesmo a “bandeirantes de couraça”.8 8 “En 1829, on fit venir une douzaine de ces soldats indiens au quartier-général de Rio de Janeiro, pour combattre et s’emparer d’un certain nombre de nègres fugitifs, qui vivaient clandestinement retirés sur les hauteurs boisées qui couvrent le pied de la montagne du Corcovado, et d’ou ils descendaient la nuit afin de se procurer des subsistences en volant dans les maisons des faubourgs de Catète et Botafogo, qui se trouvent de ce coté. [...] on confia, dis-je, cette expédition militaire aux soldats indiens; et quatre jours de station permanente dans ces fôrets vierges leur suffirent pour détruire les retranchements ennemis, s’emparer du chef, tuer une partie des nègres, et ramener prisionniers quelques femmes et leurs enfants; le petit nombre qui échappa, toujours surveillé par ces Indiens et manquant de vivres, vint se rendre à discrétion le jour suivant. [...] les chasseurs indiens qui leur succédèrent remportèrent une victoire complete, sans perdre un seul homme de leur coté” (Debret, 1834, p. 37-38). A adulteração de Taunay expressa em 1924 era, portanto, coerente com o que demandara a Oscar Pereira da Silva. Não é, portanto, de se estranhar a demanda de um quadro a óleo que quase corresponde em exatidão à cena gravada em 1834. Salvo pequenos detalhes presentes na gravura e suprimidos na tela, como uma serpenteante raiz de escora de uma banana-de-macaco9 9 Trata-se do Philodendron bipinnatifidum, também conhecido como guaimbê, uma espécie do gênero das aráceas (Lorenzi, Souza, 2001, p. 208). agarrada no grande tronco à esquerda, essa pintura é um excelente exemplo das várias outras releituras que Oscar Pereira da Silva fez, a pedido de Taunay, de documentos oitocentistas relativos à rota monçoeira ou mesmo de obras de arte portuguesas e francesas, como bem demonstrou Carlos Rogério Lima Junior (2015LIMA JUNIOR, Carlos Rogério. Um artista às margens do Ipiranga: Oscar Pereira da Silva, o Museu Paulista e a reelaboração do passado nacional. Dissertação (Mestrado em Culturas e Identidades Brasileiras), Universidade de São Paulo. São Paulo, 2015.).

A pintura de Oscar Pereira da Silva tem dimensões modestas - 100 x150 cm - o que não tornava a tela capaz de protagonizar paredes nas salas de exposição do Museu Paulista. Em algumas imagens fotográficas arquivadas no Museu, a mesma tela aparece mobilizada em três situações diferentes, sempre em caráter acessório a outras obras principais ou de tamanho semelhante ao seu. No entanto, sabe-se que essa pintura foi a única obra de arte encomendada por Taunay em que havia efetivamente a figuração de um combate, o que deu a ela uma projeção simbólica oposta à sua pequena escala material (Marins, 2017MARINS, Paulo César Garcez. O museu da paz: sobre a pintura histórica no Museu Paulista durante a gestão Taunay. In: OLIVEIRA, Cecília Helena de Salles(org.). O Museu Paulista e a gestão de Afonso Taunay: escrita da história e historiografia, séculos XIX e XX. São Paulo: Museu Paulista da Universidade de São Paulo, 2017, p. 159-191. DOI: https://doi.org/10.11606/9788589364102.
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, p. 178-181).

A tela Combate de botocudos e milicianos de Mogy das Cruzes, pelo caráter belicoso, contrasta fortemente com um discurso visual corrente no Museu Paulista desde o século XIX, em que a paz e ordem são a tônica do passado e da história nacionais. Pode-se dizer que esse discurso tinha como ponto de partida a tela Independência ou morte (1888), de Pedro Américo, em que a ruptura política se dá por uma aclamação; atravessa as aquisições de grandes pinturas durante a gestão de von Ihering, em que o descobrimento do Brasil, a fundação de São Vicente e as monções são todos eventos ou processos sem conflitos; chegando até as demais encomendas de Taunay, em que os embates simplesmente não existiam ou eram efetuados apenas por palavras ríspidas - como no caso dos painéis Sessão das Cortes de Lisboa e O príncipe D. Pedro e Jorge de Avilez a bordo da Fragata União, ambas de Pereira da Silva (Marins, 2017MARINS, Paulo César Garcez. O museu da paz: sobre a pintura histórica no Museu Paulista durante a gestão Taunay. In: OLIVEIRA, Cecília Helena de Salles(org.). O Museu Paulista e a gestão de Afonso Taunay: escrita da história e historiografia, séculos XIX e XX. São Paulo: Museu Paulista da Universidade de São Paulo, 2017, p. 159-191. DOI: https://doi.org/10.11606/9788589364102.
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). Combate de botocudos e milicianos de Mogy das Cruzes é, portanto, uma exceção evidente nesse conjunto, na medida em que as armas de fogo são mesmo representadas em disparo.

O bacamarte da figura central amalgama-se à couraça, tornando-se, um e outro, sinais pelos quais o bandeirante foi tipificado como um guerreiro feroz, por meio de roupa e de armas que seriam, a partir dessa tela, tornados os seus mais característicos instrumentos de guerra. Metamorfose do combatente medieval em cotas de malha ou em armadura metálica,10 10 Associação que não escapou a Alcântara Machado (1929, p. 229): “Tanto basta para proteger o corpo, à maneira das cotas de malha, contra a penetração das setas inimigas”. o “bandeirante” seiscentista fixado nessa tela de 1920, que fora inspirada anacronicamente em uma gravura de 1834, terá no gibão descrito e figurado por Debret a sua peça de indumentária primordial, que será replicada inúmeras vezes a ponto de tornar-se o seu sinônimo, sua metonímia.

O Museu Paulista foi o formulador e também o irradiador dessa representação da indumentária bandeirante, na medida em que exibiu a citação do gibão representado por Oscar Pereira da Silva em outras obras de arte dispostas na decoração do edifício ou em salas expositivas. Um dos veículos mais importantes dessa repercussão foi a própria ornamentação da escadaria de honra do Museu, em que seis estátuas de bandeirantes encomendadas durante a gestão Taunay e inauguradas em setembro de 1922TAUNAY, Affonso d’Escragnolle. Relatório de 1920. Revista do Museu Paulista (São Paulo). t. XIII, 1922. 11 11 Taunay declarou no “Relatório” de 1922: “As principaes despesas com a decoração do Museu, já processadas, foram as seguintes: [...] as seis estátuas de bronze da escadaria, executadas pelos Prof. Rollo, Zani e Van Emelen, 88 contos de réis” (Taunay, 1926, p. 742). formam uma “guarda de honra” da escultura de dom Pedro I, representando os seis estados brasileiros desmembrados da capitania de São Vicente e da província de São Paulo (Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná). Taunay a elas se refere no “Relatório” de 1922TAUNAY, Affonso d’Escragnolle. Reabertura do Museu Paulista. Correio Paulistano (São Paulo). 3 set. 1922, p. 3.(Taunay, 1926TAUNAY, Affonso d’Escragnolle. Museu Paulista: inauguração dos escudos das principais cidades bandeirantes. Correio Paulistano (São Paulo). 5 maio 1926, p. 4., p. 731), com menção explícita à peça de indumentária que considerava mais característica dos bandeirantes:

Estas seis estátuas foram executadas pelos Professores Amadeo Zani, Nicola Rollo e H. van Emelen e estão caracterizadas pela indumentária do bandeirante. Duas delas mesmo revestem-se do famoso gibão de armas ou “armas de algodão”, o escupil [sic] dos hespanhóes (Taunay, 3 set. 1922TAUNAY, Affonso d’Escragnolle. Relatório de 1920. Revista do Museu Paulista (São Paulo). t. XIII, 1922.).

A escultura de Francisco Dias Velho, que representa Santa Catarina, visto que o homenageado é tido como o fundador da vila do Desterro (atual Florianópolis), foi realizada por Nicola Rollo e figura o bandeirante com longas barbas, botas, bacamarte em cuja boca repousa as duas mãos, bem como com o gibão de armas (Figura 3). A outra escultura que porta essa vestimenta é a que homenageia o bandeirante Manoel Preto, que representa o Paraná, estado em cujo território se encontravam as missões jesuíticas espanholas do Guairá devastadas por esse sertanista. Sua escultura, realizada por Adrien Van Emelen,12 12 Sobre este escultor, ver: Storms (2018). repete os indicativos iconográficos dos bandeirantes presentes na escultura de Dias Velho, acrescida de um chapéu de abas largas (Figura 4).

Figura 3:
Nicola Rollo. Francisco Dias Velho, bronze, 1922 (Acervo do Museu Paulista da USP, São Paulo; fotografia de José Rosael e Helio Nobre)

Figura 4:
Adrien von Emelen. Manoel Preto, bronze, 1922 (Acervo do Museu Paulistada USP, São Paulo; fotografia de José Rosael e Helio Nobre).

Essas esculturas, assim como as demais que compõem o conjunto, ainda estavam passíveis de aprovação de orçamento em julho de 1921 e ao final desse ano apenas duas das seis previstas estavam concluídas,13 13 No “Relatório” de 1921, Taunay declarou: “São estátuas de grandes Bandeirantes e já estão na fundição, uma do Prof. Zani e outra do Prof. Van Emelen, que estuda agora a segunda de sua encomenda. O Prof. Rollo nada me disse a respeito do andamento de seu trabalho” (Taunay, 1926, p. 691). o que faz com que sejam necessariamente posteriores à pintura de Oscar Pereira da Silva. Taunay, como já apontaram Ana Claudia Brefe (2005BREFE, Ana Claudia Fonseca. O Museu Paulista: Affonso de Taunay e a memória nacional, 1917-1945. São Paulo: Editora Unesp; Museu Paulista, 2005.) e Maraliz Christo (jun. 2002CHRISTO, Maraliz de Castro Vieira. Bandeirantes ao chão. Estudos Históricos(Rio de Janeiro). n. 30, p. 33-55, 2002.), pautava enfaticamente os artistas que contratava, sugerindo formas de representação e exigindo alterações quando a solução apresentada pelos artistas lhe desagradava. Nesse sentido, é muito possível que o diretor tenha também encaminhado a eles a gravura de Debret ou lhes mostrado a releitura de Oscar Pereira da Silva já concluída para que se inspirassem, embora não haja correspondência arquivada entre os escultores e Taunay que esclareça isso, visto que também eles moravam em São Paulo e tinham diálogos presenciais com o diretor do Museu Paulista.

A presença do gibão de armas também é detectável em outra escultura em bronze realizada no mesmo período, mas fora dos limites do Museu Paulista. Trata-se da figuração de Fernão Dias Pais Leme e seu imediato (Figura 5), concebida pelo escultor sueco William Zadig para integrar o conjunto escultórico do Monumento a Olavo Bilac, inaugurado em 7 de setembro de 1922.14 14 Cf. Waldman (2017, p. 223 ss). Esse monumento foi posicionado no belvedere situado no final da avenida Paulista, esquina com a rua Minas Gerais, e foi encomendado pela Liga Nacionalista de São Paulo, entidade formada por alunos e ex-alunos da Faculdade de Direito do largo de São Francisco. A escultura foi denominada de O caçador de esmeraldas, e aludia ao poema homônimo publicado por Bilac, em 1902, dedicado a Fernão Dias.

Figura 5:
O caçador de esmeraldas, de William Zadig. bronze, 1922 (detalhe). A escultura está posicionada no Monumento a Olavo Bilac, na avenida Paulista (Acervo do Museu Paulista da USP, São Paulo. Fotógrafo não identificado).

Embora inaugurado em 1922, o monumento teve sua maquete apresentada em julho de 1919,15 15 A Cigarra (n. 116, 15 jul 1919). Agradeço a Douglas Nascimento a indicação dessa notícia. A pedra fundamental foi colocada em 25 de abril de 1920. O Estado de S. Paulo (25 abr. 1920, p. 3; 26 abr. 1920, p. 2). quando foi também divulgado que ele seria erigido na avenida Paulista,16 16 “O Monumento a Bilac”. Correio Paulistano (11 jul. 1919, p. 1). e não mais no pátio interno da Faculdade de Direito, o primeiro endereço cogitado.17 17 Cf. Correio Paulistano (21 mar. 1919, p. 2; 22 mar. 1919, p. 2; 24 mar. 1919, p. 2). A escolha do belvedere certamente propiciou que o monumento fosse concebido em escala muito maior, o que permitiu a figuração de diversas poesias de Bilac, entre elas aquela que homenageara Fernão Dias.

Os bandeirantes constantes na maquete de Zadig foram, portanto, concebidos cerca de 2 anos antes dos seis bandeirantes em bronze que adornam a escadaria do Museu Paulista, incluindo os que foram figurados com gibão de armas, que, como se viu, ainda estavam em aprovação orçamentária em julho de 1921. Já com relação à tela de Oscar Pereira da Silva, sua anterioridade é incerta. Tanto a pintura quanto a fundição da escultura de Zadig foram realizadas em 1920.18 18 As esculturas do grupo foram concebidas no ateliê do escultor em Malmö (Suécia) e fundidas em Copenhagen (Dinamarca). O Estado de S. Paulo (10 nov. 1920, p. 3). De qualquer maneira, é muito provável que Taunay, da mesma maneira que deve ter sugerido a gravura de Debret a Pereira da Silva, também tenha atuado como consultor dessa maquete de Zadig, visto que sua teia de relações na cidade era extensíssima e sua condição de diretor do Museu, desde 1917, o habilitava plenamente para tal função. De todo modo, as fotografias existentes da divulgação da maquete não permitem perceber com precisão se nesta versão, de 1919, o gibão já era apresentado com os losangos característicos daquele de armas; é certo, contudo, que o grupo de Fernão Dias já tinha suas duas personagens com essa vestimenta no momento de sua inauguração em 1922. O gibão de armas, que se replicaria no Museu Paulista nesse mesmo ano nas figuras de Francisco Dias Velho e Manoel Preto, ganhava, portanto, um reforço visual na principal avenida residencial da cidade.

A generalização do gibão como vestimenta do bandeirante, convenção que fora estabelecida por lugares de memória instituídos ou chancelados pelo Estado, ganhou força e consagração muito maior por meio das artes gráficas, com amplo uso no mercado editorial em função da generalização de publicações ilustradas que se processou a partir da década de 1910. Benedito Carneiro Bastos Barreto, o Belmonte, foi um dos artistas gráficos responsáveis pela difusão do gibão como a “armadura” que caracterizava os sertanistas, especialmente por meio de sua obra No tempo dos bandeirantes, publicada em 1939 e reeditada quatro vezes até 1948. Nela, Belmonte figura o bandeirante com a iconografia fixada pelas obras do Museu Paulista e pelo monumento de Zadig, em que o gibão de armas aparece juntamente com os bacamartes, chapéus de abas largas e botas, além das couras de anta (Figuras 6 e 7).

Figura 6:
Belmonte. Dois bandeirantes. In: Belmonte (1939, p. 177).

Numa das ilustrações presentes já na edição de 1939BELMONTE(Benedito Carneiro Bastos Barreto). No tempo dos bandeirantes, a vila de São Paulo no século XVII. São Paulo: Prefeitura de São Paulo, 1939. (Col. Departamento de Cultura, 24)., Belmonte figura o gibão sem seu usuário (Figura 8), procedimento que também utiliza para ilustrar uma coura de anta. Se ambas as vestimentas ganham esse destaque, seria, entretanto, o gibão aquele se tornou a metonímia do bandeirante. Síntese da própria personagem, e capaz de substituí-la, o gibão ganhara essa autonomia mais uma vez pela ação do diretor do Museu Paulista que, associada ao desenho de José Wasth Rodrigues, faria dessa roupa uma marca dos bandeirantes no fértil campo dos brasões municipais disseminados a partir da década de 1920.

Figura 7:
Belmonte. Bandeirante com gualteira de couro de anta, gibão de armas, rodela, espada, arcabuz e forquilha. In: Belmonte (1939, p. 241).

Figura 8:
Belmonte. Gibão de armas In: Belmonte (1939, p. 236).

A dispersão de uma metonímia visual

A consagração do gibão de armas como convenção primordial para a definição da indumentária bandeirante está estreitamente associada à longa parceria entre Afonso Taunay e o artista José Wasth Rodrigues, estabelecida desde a década de 1910. Esse pintor foi um dos muitos mobilizados por Taunay para a realização de pinturas a óleo representando vistas da cidade a partir das fotografias de Militão Augusto de Azevedo, tendo se incumbido de sete telas, datadas de 1917 a 1922 (Lima e Carvalho, 1993LIMA, Solange Ferraz de; CARVALHO, Vânia Carneiro. São Paulo Antigo, uma encomenda da modernidade: as fotografias de Militão nas pinturas do Museu Paulista. Anais do Museu Paulista: História e Cultura Material(São Paulo). v.1, n. 1, p. 147-178, 1993.). No início da década de 1930, foi também ele o responsável pelos retratos de Pedro III de Portugal, Martim Afonso de Souza, João Ramalho e Tibiriçá na entrada do Museu Paulista, encomendados por Taunay para concluir a ornamentação do peristilo do Museu.

Além dessas pinturas históricas, Wasth Rodrigues foi o artista que deu forma plástica aos numerosos brasões municipais encomendados por cidades paulistas a Afonso Taunay a partir da década de 1920. Wasth Rodrigues já tinha notoriedade no âmbito da heráldica, pois ele e Guilherme de Almeida haviam vencido, em 1917, o concurso público para o brasão municipal da cidade de São Paulo, célebre por seu lema latino Non Ducor Duco (Não sou conduzido, conduzo). Essa láurea tornava-o um parceiro ideal para Taunay, e juntos produziram mais de 15 brasões, em que, como se verá, a figuração do bandeirante é recorrente.

O próprio Museu serviu novamente como suporte de consagração para essa forma de expressão visual, configurando-se como uma vitrina que passaria a estimular novas encomendas de brasões por municípios paulistas. Em maio de 1926, as paredes da escadaria de honra do edifício passaram a ostentar nove telas a óleo de Wasth Rodrigues com brasões municipais dos mais antigos municípios paulistas. Três dos brasões por eles pintados em tela haviam sido concebidos por Benedito Calixto (Santos, São Vicente, Itanhaém), sendo os de Sorocaba, Itu, Parnaíba, Porto Feliz e Taubaté por Taunay. O da capital, como vimos, fora concebido com Guilherme de Almeida (Taunay, 5 maio 1926TAUNAY, Affonso d’Escragnolle. Relatórios de 1921, 1922 e 1923. Revista do Museu Paulista (São Paulo). t. XIV, 1926., p. 4).

Todos esses cinco brasões de Taunay e de Wasth Rodrigues apresentam a figuração do bandeirante, aspecto que vai se reapresentar em vários dos outros que a dupla criaria para cidades paulistas e brasileiras. Os sertanistas foram por eles representados de duas maneiras. A forma mais recorrente foi a de figurá-los na forma de “tenentes”, em que são representados de corpo inteiro ao lado do escudo, amparando-o. A quase totalidade desses bandeirantes como tenentes porta, sobre o tronco, o gibão de armas, sendo uma exceção o de Jundiaí, vestido com a coura de anta acinturada.

Esse primeiro tipo de figuração do bandeirante com gibão de armas foi inserido nas mencionadas armas dos municípios paulistas de Santana de Parnaíba,19 19 Tornado oficial pela lei municipal n. 1, de 2 de maio de 1925. Porto Feliz20 20 Tornado oficial em 1925. e Taubaté21 21 Tornado oficial pela lei municipal n. 247, de 18 de março de 1926. (Figuras 9 a 11), bem como nos brasões criados pela dupla para Santo Amaro,22 22 Tornado oficial pela lei municipal n. 62, de 13 de fevereiro de 1928. Lorena, Jundiaí, São Sebastião (Figuras 12;13;14;15) e naquele que se tornaria nacionalmente conhecido por sua presença nos carros fabricados pela Volkswagen nas décadas de 1960 e 1970, o da cidade de São Bernardo do Campo23 23 Tornado oficial pela lei municipal n. 251, de 20 de dezembro de 1926. (Figura 16). Além desses municípios paulistas, os bandeirantes em gibão de armas também foram representados por Taunay e Wasth Rodrigues nos brasões catarinenses de São Francisco do Sul24 24 Tornado oficial pela lei municipal n. 288, de 24 de novembro de 1928. e Laguna25 25 Tornado oficial pela resolução n. 44, de 14 de maio de 1932. (Figuras 17 e 18). A mesma figuração aparecia ainda no projeto para o brasão proposto para São Vicente,26 26 Ver Taunay (1936). cidade que, no entanto, preferiu a manter a composição anterior de Calixto.

Figura 9:
Afonso Taunay (concepção), José Wasth Rodrigues (desenho). Brasão de Santana de Parnaíba, s.d.Tinta guache e aquarela sobre papel, 44 x 37,5 cm (Acervo do Museu Paulista da USP, São Paulo; fotografia de José Rosael e Helio Nobre)

Figura 10:
Afonso Taunay (concepção), José Wasth Rodrigues (desenho). Brasão de Porto Feliz, s.d. Tinta guache e aquarela sobre papel, 39 x 35 cm (Acervo do Museu Paulista da USP, São Paulo; fotografia de José Rosael e Helio Nobre).

Figura 11:
Afonso Taunay (concepção), José Wasth Rodrigues (desenho). Brasão de Taubaté, s.d. Tinta guache e aquarela sobre papel, 41x33 cm (Acervo do Museu Paulista da USP, São Paulo; fotografia de José Rosael e Helio Nobre)

Figura 12:
Afonso Taunay (concepção), José Wasth Rodrigues (desenho). Brasão de Santo Amaro, s.d. Tinta guache e aquarela sobre papel, 30,5 x 31 cm (Acervo do Museu Paulista da USP, São Paulo; fotografia de José Rosael e Helio Nobre).

Figura 13:
Afonso Taunay (concepção), José Wasth Rodrigues (desenho). Brasão de Lorena, s.d. Tinta guache e aquarela sobre papel, 47,5 x 41,7 cm (Acervo do Museu Paulista da USP, São Paulo; fotografia de José Rosael e Helio Nobre)

Figura 14:
Afonso Taunay (concepção), José Wasth Rodrigues (desenho). Brasão de Jundiaí, s.d. Tinta guache e aquarela sobre papel, 31 x 30,5 cm (Acervo do Museu Paulista da USP, São Paulo; fotografia de José Rosael e Helio Nobre)

Figura 15:
Afonso Taunay (concepção), José Wasth Rodrigues (desenho). Brasão de São Sebastião, s.d. Tinta guache e aquarela sobre papel, 49,5 x 34,5 cm (Acervo do Museu Paulista da USP, São Paulo; fotografia de José Rosael e Helio Nobre)

Figura 16:
Afonso Taunay (concepção), José Wasth Rodrigues (desenho). Brasão de São Bernardo do Campo, s.d. Tinta guache e aquarela sobre papel, 32 x 25 cm (Acervo do Museu Paulista da USP, São Paulo; fotografia de José Rosael e Helio Nobre)

Figura 17:
Afonso Taunay (concepção), José Wasth Rodrigues (desenho). Brasão de São Francisco do Sul, s.d. Tinta guache e aquarela sobre papel, 37 x 35 cm(Acervo do Museu Paulista da USP, São Paulo; fotografia de José Rosael e Helio Nobre).

Figura 18:
Afonso Taunay (concepção), José Wasth Rodrigues (desenho). Brasão de Laguna, s.d. Tinta guache e aquarela sobre papel, 44 x 37,5 cm (Acervo do Museu Paulista da USP, São Paulo; fotog

Além dessas figuras in corpore, destaca-se ainda na produção de brasões realizada por Taunay e Wasth Rodrigues uma segunda tipologia, em que a representação do gibão de armas se dá “ao natural”, sem seu usuário. A vestimenta assumia, portanto, a própria função de representar e identificar o bandeirante, que, de tal maneira associado a essa peça de indumentária, já podia estar presente mesmo desencarnado.

Os brasões de Itu27 27 O brasão já estava instalado na Câmara Municipal em 1924. A Federação (Itu, 31 maio 1924, p. 2). Agradeço essa informação a José Renato Galvão. e de Sorocaba28 28 Tornado oficial pela lei n. 189, de 23 de março de 1925. são expressões exemplares dessa metonímia, em que o gibão substitui eficazmente seu portador. O gibão de armas reina absoluto no centro dos escudos, ressaltando a vinculação das cidades com o sertanismo, ambas tendo sido fundadas por bandeirantes da família Fernandes (Figuras 19 e 20). Nos brasões que Taunay e Wasth Rodrigues realizaram para as cidades paulistas de Jaú, São Carlos, Franca (Figura 21)29 29 Tornado oficial pela lei municipal de 14 de abril de 1930. e Mogi das Cruzes30 30 Tornado oficial pelo ato n. 48, de 1º de julho de 1931. (Figura 22) ocorre a mesma simbologia desencarnada.

Figura 19:
Afonso Taunay (concepção), José Wasth Rodrigues (desenho). Brasão de Itu, s.d. Tinta guache e aquarela sobre papel, 40 x 39 cm (Acervo do Museu Paulista da USP, São Paulo; fotografia de José Rosael e Helio Nobre)

Figura 20:
Afonso Taunay (concepção), José Wasth Rodrigues (desenho). Brasão de Sorocaba, s.d. Tinta guache e aquarela sobre papel, 44,3 x 42,2 cm (Acervo do Museu Paulista da USP, São Paulo; fotografia de José Rosael e Helio Nobre)

Figura 21:
Afonso Taunay (concepção), José Wasth Rodrigues (desenho). Brasão de Franca, s.d. Tinta guache e aquarela sobre papel, 32,5 x 42,5 cm (Acervo do Museu Paulista da USP, São Paulo; fotografia de José Rosael e Helio Nobre)

Figura 22:
Afonso Taunay (concepção), José Wasth Rodrigues (desenho). Brasão de Mogi das Cruzes, s.d. Tinta guache e aquarela sobre papel, 27,3 x 38,2 cm (Acervo do Museu Paulista da USP, São Paulo; fotografia de José Rosael e Helio Nobre)

Na justificativa que publicou sobre essa figuração do brasão mogiano, Taunay renovava a evocação da gravura do qual retirara sua inspiração para a consagração do gibão: “figura, como peça principal do escudo, um ‘gibão de armas’ frechado, tal qual occorre na composição de Debret [...] representado ao natural”. Tal associação dava-lhe autoridade para sugerir tal brasão àquela municipalidade, cidade que, por sua vez, ao assumi-lo em sua heráldica municipal, validava e consagrava-se como um lócus central da narrativa visual bandeirante na qual o gibão tornava-se essencial: “pertence á tradição mogyana o unico documento da iconographia bandeirante até hoje divulgado, a celebre estampa de Debret: Combate de índios botocudos com soldados milicianos de Mogy das Cruzes, graças á qual podemos fazer idéa dos famosos gibões de armas dos bandeirantes paulistas” (Taunay, 10 abr. 1932TAUNAY, Affonso d’Escragnolle. Heráldica municipal brasileira. Jornal do Commercio (Rio de Janeiro). 10 abr1932, p. 3.).

Ao conceber o brasão de Mogi, isolando o gibão flechado, Taunay mais uma vez operava a associação anacrônica das vestimentas sertanistas com o desenho de Debret. Por certo, o historiador estava ciente de seu anacronismo, pois, afinal, os soldados de Mogi não eram bandeirantes. Mas o gibão, que ganhava autonomia heráldica, tinha para o historiador a transcendência temporal de vestir homens com o mesmo destino belicoso. Fora essa couraça que vestira os bandeirantes que combatiam índios e quilombolas nos tempos coloniais, era ela que vestia seus sucessores, a combater outros negros revoltados, em plena urbe carioca. Nesta mesma justificativa do brasão de Mogy, publicada em 1932, retoma Taunay a explicação descabida que construíra em 1924, já aqui mencionada, e que nesta versão amplia menções a Debret absolutamente ausentes do texto publicado em Voyage pitoresque et historique au Brésil:

Circunstancia interessante a se lembrar é a seguinte: a estampa de Debret, a que aludimos, foi desenhada do natural pelo famoso membro da missão artística de 1816, fundadora da nossa Academia Nacional de Bellas Artes.

Vejamos como:

Havia nas matas do Corcovado um grande quilombo cujos outlaw faziam mil tropelias em diversos bairros da capital brasileira.

Debalde pretendeu a policia carioca extinguir o reducto dos quilombolas. Afinal recorreu a especialistas no assumpto, fazendo vir de Mogy das Cruzes celebre companhia de bugreiros. Chegando ele ao Rio de Janeiro, grande impressão de curiosidade causou o seu aspecto, pois revestiam-se os seus soldados da velha cota de malhas, da armadura bandeirante, o “gibão de armas” de seus maiores, couraça não metallica e sim de couro estofado de algodão.

Deu-se pressa Debret em retratar estes milicianos de aspecto ancestral (Taunay, 10 abr. 1932TAUNAY, Affonso d’Escragnolle. Heráldica municipal brasileira. Jornal do Commercio (Rio de Janeiro). 10 abr1932, p. 3.).

O uso autônomo do gibão de armas replicou-se em vários outros brasões municipais tais como os de Mogi Guaçu, Itapetininga, Boituva, Juiz de Fora, Ouro Branco e Formiga.

Essa difusão do gibão “ao natural” como metonímia do bandeirante, que marcara a produção heráldica municipal desde a década de 1920, ganhou mais um veículo para sua consagração, desta feita de abrangência e alcance nacional. O gibão foi incluído na série de moedas comemorativas ao quarto centenário da fundação de São Vicente, cunhadas em 1932. Essa série, que fazia alusão às pinturas de Wasth Rodrigues realizadas para o peristilo do Museu Paulista, figurou o gibão de armas no verso da moeda de 500 réis, em que a face é dedicada a João Ramalho (Figura 23). Tal inserção no meio circulante oficial brasileiro certamente foi um dos fatores decisivos para a generalização nacional dessa metonímia.

Figura 23:
Moeda de 500 réis, da séria comemorativa ao Quarto Centenário da Fundação de São Vicente, 1932, bronze-alumínio, 22,5 mm (Acervo do Museu Paulista da USP, São Paulo; fotografia de Helio Nobre)

O gibão metonímico foi ainda publicado na capa de um dos livros de Afonso Taunay, História das bandeiras paulistas (Figura 24), síntese de sua obra maior, História geral das bandeiras paulistas. Associado ao bacamarte e ao martelo, exatamente como figurara no brasão de Sorocaba, pode-se dizer que ali o gibão cumpria seu percurso final de simbolização da personagem bandeirante na própria obra de seu criador, visto ter sido Taunay não apenas o impulsionador do gibão de armas como parte da iconografia do sertanista, mas, em sua produção heráldica com José Wasth Rodrigues, também o promotor de sua radicalização metonímica.

Figura 24:
Belmonte. Capa de História das bandeiras paulistas, de Afonso Taunay (Acervo da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin/USP)

Considerações finais

O processo de difusão acima descrito concentrou-se especialmente nos suportes institucionais governamentais de sua performance social. A grandeza de sua eficácia dependeu necessariamente de sua difusão tanto no ambiente museal quanto de sua ampla apropriação e recriação por diferentes segmentos e agentes da sociedade, num circuito ramificado e criativo daquilo que seria o afterlife de obras de arte e imagens praticadas como representação (Gaskell, 2000GASKELL, Ivan. Vermeer’s wager: speculations on art history, theory, and art museums. Londres: Reaktion Books, 2000.; Chartier, 1991CHARTIER, Roger. O mundo como representação. Estudos Avançados (São Paulo). v. 5, n. 11, p. 173-191, 1991.). Nesse sentido, estudos voltados à recepção podem demonstrar adaptações positivantes ou mesmo contestadoras, irônicas, adversativas a uma proposta de construção simbólica comandada enfaticamente pelo Estado, por órgãos públicos, por lideranças intelectuais e por artistas.

As recentes manifestações que ocorreram na cidade de São Paulo, ao longo da década de 2010 (Waldman, 2017WALDMAN, Thaís Chang. Entre batismos e degolas: (des)caminhos bandeirantes em São Paulo. Tese (Doutorado em Antropologia), Universidade de São Paulo. São Paulo, 2017.), com intervenções artísticas ou mesmo atos de vandalismo em monumentos públicos, sinalizam que a iconografia bandeirante permanece agindo na sociedade. A hipertrofia do caráter militar que o gibão de armas atribui ao bandeirante coloca-o novamente em discussão. De cota de algodão que substituía as metálicas medievais, e que deram aos sertanistas paulistas a condição de bellatori vicentinos, são eles também que ajudam a caracterizar a entidade a ser contestada.

O gibão de armas, assim como a pose monárquica criada por Benedito Calixto, os vastos chapéus de abas largas e os bacamartes, que sintetizaram as características que um dia positivaram os sertanistas paulistas, começam hoje a cumprir outro papel - de serem o suporte para seu questionamento - indicando que sua metonímia segue ativa, com outros papeis definidos pelas novas tensões da contemporaneidade.

Referências

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    » https://doi.org/10.11606/issn.2448-1750.revmae.2016.119010
  • WALDMAN, Thaís Chang. Entre batismos e degolas: (des)caminhos bandeirantes em São Paulo Tese (Doutorado em Antropologia), Universidade de São Paulo. São Paulo, 2017.
  • 1
    Este artigo desenvolve aspectos da indumentária dos bandeirantes apontados ao público no módulo “Criando os heróis paulistas”, que integrou a exposição “Imagens recriam a história”, inaugurada no Museu Paulista em 2007, com financiamento da Caixa Econômica Federal. O artigo também se vincula ao projeto de pesquisa que desenvolvo, “Representações artísticas do passado nas coleções do Museu Paulista da USP”, realizado no âmbito do Projeto Temático “Coletar, identificar, processar, difundir: o ciclo curatorial e a produção do conhecimento”, coordenado pela professora Dra. Ana Gonçalves Magalhães e financiado pela Fapesp (processo n. 2017/07366-1), a quem agradeço.
  • 2
    Para essas pinturas, ver Gaehtgens (1981GAEHTGENS, Thomas W. Versailles: de la résidence royale au musée historique: la Galerie des batailles dans le Musée historique de Louis-Philippe. Paris: Albin Michel, 1981.), Bajou-Charpentreau (2018)BAJOU-CHARPENTREAU, Valérie. Louis-Philippe et Versailles. Versailles: Château de Versailles; Paris: Somogy, 2018..
  • 3
    “The classical cowboy hero - that is, as he existed before World War II - resorted to violence only when he was provoked or when some evil threatened a weaker person who could mount no adequate defense. He was strong and silent, not given even to rhetorical violence. If he had to fight, he used his fists. If someone shot him, he shot back, but only to wound. With the excepcion of several hundred nameless Indians, the classical cowboy hero never killed. The postwar cowboy killed regularly, but still only after provocation” (Savage, 1985SAVAGE, William W. The cowboy hero: his image in American history and culture. Norman: University of Oklahoma Press, 1985., p. 33).
  • 4
    “Basílio de Magalhães cita uma carta régia de 1684, em que se recomenda a Duarte Chaves, governador do Rio de Janeiro, que envie ao governador de Angola até sessenta dos gibões feitos na forma de que usam os sertanejos de S.Paulo” (Machado, 1929, p. 229; grifo no original).
  • 5
    Segundo Bluteau e Silva, a coura era “gibão de coiro com aramas, para resguardar o corpo na guerra” (p. 343); “Anta ou coura de anta. Couraça da pelle de anta” (Diccionario, 1793DICCIONARIODICCIONARIO da lingoa portugueza. Lisboa: Academia Real das Ciências, 1793., p. 317). Luciana da Silva dá ideia do valor dessa espécie de armadura em São Paulo no século XVII: “No inventário de Luiza da Gama, casada com João Paes e falecida em 1615, constava uma coura de anta no valor de 5$000 (cinco mil réis), o dobro da avaliação da casa em que o casal morava, de dois lanços de taipa de mão e cobertura de palha”. Igor Renato Machado de Lima (2011, p. 160) indica que também foram mencionadas couras de anta nos inventários de Rafael de Oliveira (1654), Custódio Gomes (1639), Francisco Barreto (1607), Bento Pires Ribeiro (1669) e Domingos Luiz (1613).
  • 6
    Taunay (1922, p. 1304). Os relatórios são sempre redigidos no ano seguinte àquele ao qual se referem. Esse, portanto, foi concluído em 18 de janeiro de 1921 e publicado na Revista do Museu Paulista editada em 1922.
  • 7
    INV. AV. N. 3 - APMP/FMP - P. 215, p. 19. Agradeço a Mayra Tiemi Yonashiro Saito a indicação deste documento. No “Relatório” de 1921, a tela é mencionada apenas como “Combate de índios” (Taunay, 1926, p. 704).
  • 8
    “En 1829, on fit venir une douzaine de ces soldats indiens au quartier-général de Rio de Janeiro, pour combattre et s’emparer d’un certain nombre de nègres fugitifs, qui vivaient clandestinement retirés sur les hauteurs boisées qui couvrent le pied de la montagne du Corcovado, et d’ou ils descendaient la nuit afin de se procurer des subsistences en volant dans les maisons des faubourgs de Catète et Botafogo, qui se trouvent de ce coté. [...] on confia, dis-je, cette expédition militaire aux soldats indiens; et quatre jours de station permanente dans ces fôrets vierges leur suffirent pour détruire les retranchements ennemis, s’emparer du chef, tuer une partie des nègres, et ramener prisionniers quelques femmes et leurs enfants; le petit nombre qui échappa, toujours surveillé par ces Indiens et manquant de vivres, vint se rendre à discrétion le jour suivant. [...] les chasseurs indiens qui leur succédèrent remportèrent une victoire complete, sans perdre un seul homme de leur coté” (Debret, 1834, p. 37-38).
  • 9
    Trata-se do Philodendron bipinnatifidum, também conhecido como guaimbê, uma espécie do gênero das aráceas (Lorenzi, Souza, 2001LORENZI, Harri; SOUZA, Hermes Moreira de. Plantas ornamentais no Brasil, 3ª ed. Nova Odessa: Instituto Plantarum, 2001., p. 208).
  • 10
    Associação que não escapou a Alcântara Machado (1929, p. 229): “Tanto basta para proteger o corpo, à maneira das cotas de malha, contra a penetração das setas inimigas”.
  • 11
    Taunay declarou no “Relatório” de 1922: “As principaes despesas com a decoração do Museu, já processadas, foram as seguintes: [...] as seis estátuas de bronze da escadaria, executadas pelos Prof. Rollo, Zani e Van Emelen, 88 contos de réis” (Taunay, 1926, p. 742).
  • 12
    Sobre este escultor, ver: Storms (2018STORMS, Marc. Ad. H. van Emelen: a trajetória de um artista belga em São Paulo. São Paulo: Editora do autor, 2018.).
  • 13
    No “Relatório” de 1921, Taunay declarou: “São estátuas de grandes Bandeirantes e já estão na fundição, uma do Prof. Zani e outra do Prof. Van Emelen, que estuda agora a segunda de sua encomenda. O Prof. Rollo nada me disse a respeito do andamento de seu trabalho” (Taunay, 1926, p. 691).
  • 14
    Cf. Waldman (2017, p. 223 ss).
  • 15
    A Cigarra (n. 116, 15 jul 1919). Agradeço a Douglas Nascimento a indicação dessa notícia. A pedra fundamental foi colocada em 25 de abril de 1920. O Estado de S. Paulo (25 abr. 1920, p. 3; 26 abr. 1920, p. 2).
  • 16
    “O Monumento a Bilac”. Correio Paulistano (11 jul. 1919, p. 1).
  • 17
    Cf. Correio Paulistano (21 mar. 1919, p. 2; 22 mar. 1919, p. 2; 24 mar. 1919, p. 2).
  • 18
    As esculturas do grupo foram concebidas no ateliê do escultor em Malmö (Suécia) e fundidas em Copenhagen (Dinamarca). O Estado de S. Paulo (10 nov. 1920, p. 3).
  • 19
    Tornado oficial pela lei municipal n. 1, de 2 de maio de 1925.
  • 20
    Tornado oficial em 1925.
  • 21
    Tornado oficial pela lei municipal n. 247, de 18 de março de 1926.
  • 22
    Tornado oficial pela lei municipal n. 62, de 13 de fevereiro de 1928.
  • 23
    Tornado oficial pela lei municipal n. 251, de 20 de dezembro de 1926.
  • 24
    Tornado oficial pela lei municipal n. 288, de 24 de novembro de 1928.
  • 25
    Tornado oficial pela resolução n. 44, de 14 de maio de 1932.
  • 26
    Ver Taunay (1936)TAUNAY, Affonso d’Escragnolle. Crítica ao brazão actual de São Vicente: proposta de novo escudo. Anais do Museu Paulista (São Paulo). v. 7, p. 508-518, 1936..
  • 27
    O brasão já estava instalado na Câmara Municipal em 1924. A Federação (Itu, 31 maio 1924, p. 2). Agradeço essa informação a José Renato Galvão.
  • 28
    Tornado oficial pela lei n. 189, de 23 de março de 1925.
  • 29
    Tornado oficial pela lei municipal de 14 de abril de 1930.
  • 30
    Tornado oficial pelo ato n. 48, de 1º de julho de 1931.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Jul 2020
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2020

Histórico

  • Recebido
    24 Jan 2019
  • Aceito
    13 Jul 2019
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