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Colusão ótima com monitoramento imperfeito: teste do modelo de Abreu-Pearce-Stachetti para os mercados brasileiros regionais de cimento

Resumos

O artigo considera a aplicação do teste não paramétrico proposto por Berry and Briggs (1988) para o modelo de colusão com monitoramento imperfeito de Abreu et al. (1986) no contexto de mercados regionais de cimento no Brasil durante o período de 1992 a 2003. O teste foca na implicação daquele modelo, segundo a qual os preços seguiriam um processo de Markov de primeira ordem. A evidência não indica prevalência de mecanismo de colusão ótima para aqueles mercados.

Teoria dos Jogos; Mercado de Cimento; Guerra de Preços


The paper considers the application of the non-parametric test proposed by StateBerry and Briggs (1988) for the model of collusion with imperfect monitoring by Abreu et al (1986) in the context of regional cement markets in Brazil during the 1992-2003 period. The test focuses on the implication of that model according to which the prices would follow a first-order Markov process. The evidence does not indicate the prevalence of optimal collusion in those markets.

Game Theory; Cement Market; PriceWar


ARTIGOS

Colusão ótima com monitoramento imperfeito: teste do modelo de Abreu-Pearce-Stachetti para os mercados brasileiros regionais de cimento

Rodrigo M. ZeidanI, Marcelo ResendeII

IIBMEC-RJ, email: rodrigo_zeidan@hotmail.com

IIInstituto de Economia, Universidade Federal do Rio de Janeiro, email: mresende@ie.ufrj.br

RESUMO

O artigo considera a aplicação do teste não paramétrico proposto por Berry and Briggs (1988) para o modelo de colusão com monitoramento imperfeito de Abreu et al. (1986) no contexto de mercados regionais de cimento no Brasil durante o período de 1992 a 2003. O teste foca na implicação daquele modelo, segundo a qual os preços seguiriam um processo de Markov de primeira ordem. A evidência não indica prevalência de mecanismo de colusão ótima para aqueles mercados.

Palavras-chave: Teoria dos Jogos, Mercado de Cimento, Guerra de Preços

ABSTRACT

The paper considers the application of the non-parametric test proposed by StateBerry and Briggs (1988) for the model of collusion with imperfect monitoring by Abreu et al (1986) in the context of regional cement markets in Brazil during the 1992-2003 period. The test focuses on the implication of that model according to which the prices would follow a first-order Markov process. The evidence does not indicate the prevalence of optimal collusion in those markets.

Keywords: Game Theory, Cement Market, PriceWar

JEL classification: L13, L22, L61

1 Introdução

A Teoria dos Jogos tem se revelado como o instrumental preferencial para a análise de situações de interdependência estratégica no contexto da Organização Industrial. Em particular, o estudo de mecanismos de colusão tácita tem recorrido de forma intensa a jogos infinitamente repetidos nos quais a relação entre o ganho de curto prazo com o desvio da cooperação e os custos esperados de longo prazo associados aquele comportamento são destacados (discussões relevantes aparecem em Jacquemin & Slade (1992) e Rees (1993). A natureza do equilíbrio depende em grande medida da estrutura informacional prevalecente e dos mecanismos de punição utilizados para desvios do cartel (ver, por exemplo, Slade (1990). A primeira geração de modelos surgiu com Friedman (1971), que mostrou que a colusão tácita poderia ser sustentada como equilíbrio (perfeito em subjogos) do jogo infinitamente repetido mediante a utilização de estratégias de gatilho caso se tenha um fator de desconto suficientemente grande. Tal modelo é bastante restritivo por considerar uma reversão permanente para o equilíbrio de Nash (não cooperativo) face a um desvio da cooperação.

Na segunda geração de modelos destacam-se Green & Porter (1984) e Rotemberg & Saloner (1986), que, respectivamente, consideram choques de demanda não observáveis e observáveis. Esses modelos mais complexos contemplam a possibilidade de guerras de preços emergirem como um fenômeno de equilíbrio. Nesses modelos, o setor oligopolista sujeito à possibilidade de colusão tácita alternaria entre períodos de cooperação em que prevaleceria um cartel e períodos de punição com duração finita.

No nível empírico, uma implicação genérica dos modelos supramencionados é de que se observaria múltiplos regimes de preços nos dados. Nesse sentido, o cartel explícito das ferrovias nos Estados Unidos (Joint Executive Committee-JEC), que precedeu a vigência do Sherman Act, foi estudado em diferentes trabalhos (ver, por exemplo, Porter (1983), Lee & Porter (1984), Hajivassiliou (1989) e Ellison (1994). Abreu et al. (1986), doravante APS, por sua vez, estendem o modelo de Green & Porter (1984) e consideram um modelo mais sofisticado que leva em conta um mecanismo de punição mais forte que a reversão para o equilíbrio de Nash ao impor o requisito de perfeição em subjogos. Uma implicação testável desse modelo é de que regimes de lucros elevados e lucros baixos obedecem a um processo de Markov de primeira ordem e, caso se tenha uma variável indicador que evidencie a prevalência ou não de guerra de preços, pode-se conceber um teste estatístico. De fato, Berry & Briggs (1988) e Briggs (1996) consideram um teste não-paramétrico com esse propósito no contexto do JEC e conseguem obter evidências consistentes com o modelo de APS.

No presente artigo, consideramos os mercados regionais de cimento no Brasil como cenário para o teste das implicações do modelo de APS. Com efeito, trata-se de um oligopólio homogêneo tradicional no qual tipicamente um poder de mercado não desprezível tende a prevalecer. Mais recentemente, Zeidan & Resende (2009) estudaram esses mercados regionais e constataram um significativo poder de mercado embora não consistente com um cartel. A presente investigação acerca do modelo de APS vem complementar àquela abordagem alternativa.

O artigo está organizado da seguinte forma. A segunda seção discute os aspectos essenciais do modelo de APS. A terceira seção discute a base de dados e o critério que foi utilizado para identificar guerra de preços. A quarta seção discute o teste não-paramétrico proposto por Berry & Briggs (1988) para o modelo de APS e apresenta os resultados empíricos correspondentes na nossa aplicação. A quinta seção traz alguns comentários finais.

2 Modelo de Abreu-Pearce-Sttachetti : Aspectos Básicos

O modelo de Abreu et al. (1986) estende em alguns aspectos a formulação de Green & Porter (1984). Do ponto de vista informacional também se supõe que os choques de demanda sejam independentes e identicamente distribuídos ao longo do tempo e não são observáveis. Assim, também emerge um problema de extração de sinal, já que quando a demanda pelo produto de uma firma é baixa, a firma não consegue distinguir se a situação reflete um movimento desfavorável da demanda ou comportamento oportunista do concorrente. Além da hipótese padrão de concavidade das funções objetivo das firmas, uma propriedade importante para esse modelo é que a distribuição do preço de mercado pt condicionado ao produto agregado Qt é tal que um preço menor é mais provável de estar associado a uma quantidade Qt de alta do que de baixa magnitude (ver, por exemplo, Tirole (1988) e Hajivassiliou (1989). Essas hipóteses permitem gerar comportamentos menos restritivos que no modelo de Green & Porter (1984), doravante GP. Nesse contexto, APS legitimam guerras de preço como um fenômeno de equilíbrio e existe um mecanismo de gatilho bem definido para determinar a alternância de fases de colusão e de punição. Nos períodos em que o cartel é bem sucedido as firmas produzirão q+ e obterão um payoff de V+ que se refere ao payoff associado ao melhor elemento do conjunto de equilíbrios simétricos perfeitos. Contudo, a observação de preço abaixo de um gatilho p+ desencadeia o início de uma fase de punição sem duração pré-determinada na qual as firmas operam com q–, ou seja, um nível de produção maior que leva a um payoff menor dado por V– que corresponde ao payoff associado ao pior elemento do conjunto de equilíbrios simétricos perfeitos.

Por outro lado, a permanência na fase de punição ou retorno para a cooperação dependerá de um segundo gatilho p– e se p > p– o jogo permanece na fase de punição ao passo que se que a cooperação em termos do cartel seria retomada se p < p–. Um aspecto importante da crítica de APS ao modelo de Green & Porter (1984) refere-se ao caráter estático desse último, dado que o preço de gatilho independe de qualquer informação passada sobre o mercado ou sobre o próprio preço.

A dinâmica do modelo de APS associada à descrição anterior tem, contudo, uma estrutura particular na qual para computar que quantidade produzir em um período t uma empresa precisa analisar somente o equilíbrio no período anterior e, assim, a sequência de níveis de produção de equilíbrio é um processo de Markov de primeira ordem. Uma das implicações do modelo de colusão ótima com monitoramento imperfeito de APS é a de que, se puder ser definida uma variável binária que represente períodos de altos e baixos lucros, essa variável segue um processo de Markov de primeira ordem, ou seja, a probabilidade que o cartel esteja em um estado de altos lucros no período t depende somente do estado do cartel em t – 1 (Briggs 1996). Assim, dada uma situação de colusão em um período t, existe uma probabilidade de que as empresas continuem produzindo a quantidade colusiva em t + 1 e, analogamente, se as empresas produzem a quantidade de punição em t a maior probabilidade é de que as empresas continuem produzindo a quantidade de punição em t + 1 e mudanças de regime dependem de uma probabilidade de transição. Na próxima seção, discutimos critérios para construir a variável indicador denotativa da prevalência de um cartel ou de uma guerra de preços.

3 Períodos de punição: guerra de preços

Como visto acima, o comportamento de equilíbrio de empresas atuando de forma colusiva sob informação imperfeita resulta em um processo de Markov. Contudo, a implicação de APS só pode ser testada se uma variável binária indicativa de períodos de punição e colusão puder ser criada. Empiricamente a melhor forma de caracterizar períodos de punição e, por conseguinte, períodos de colusão, é por meio da observação de guerras de preços. Uma guerra de preços – indicativa de um período no qual as empresas produzem quantidades não colusivas com resultados piores que Nash para APS – pode ser definida como um período no qual a indústria determina preços significativamente menores que os preços normais de mercado, geralmente implicando uma mudança de estratégia para um conjunto de oligopolistas (Busse 2002).

Guerras de preço normalmente são analisadas observando-se unicamente a variável preço de equilíbrio de mercado ao longo de uma série de tempo. O problema em definir empiricamente um período de guerra de preços está nas múltiplas causas de disparo de uma, como flutuações na demanda, capacidade produtiva, choques de custos e comportamento estratégico das empresas. De fato, como APS utilizam um modelo com ruído informacional, qualquer uma dessas razões pode aumentar a probabilidade de transição de fase, iniciando uma guerra de preços.

A definição precisa de uma guerra de preços, em termos de duração e características, depende das idiossincrasias do mercado analisado e da qualidade dos dados disponíveis. Morrison & Winston (1990) definem guerra de preços no mercado de aviação como a situação na qual os preços caem acima de 20% de um trimestre para outro. A guerra acaba quando os preços sobem – qualquer que seja o percentual de aumento. Ross (1997) utiliza um método de combinação de posto, com um teste estatístico para diferenciar a média de preços do trimestre atual com a do ano anterior. Busse (2002) utiliza um critério qualitativo, recorrendo a artigos de jornais e outras formas de relatórios que indiquem a existência de uma guerra de preços. Ellison (1994) e Baldwin utilizam os dados do cartel de ferrovia do século XIX, com os indicativos de guerras de preços desenvolvidos por Lee & Porter (1984). Borenstein & S. e Shepard (1996) analisam dados contábeis, argumentando que um indicador de guerra de preços no presente é revelado pelo preço das ações das empresas.

O problema em utilizar as abordagens de Green & Porter (1984), Borenstein & S. e Shepard (1996) ou Busse (2002) está na qualidade dos dados para o mercado de cimento para este trabalho. As abordagens de Green & Porter (1984) e Borenstein & S. e Shepard (1996) requerem dados ao nível das empresas e, ainda, Porter (1983) utiliza dados semanais em uma análise probit e switching regression para determinar as variáveis significativas dos períodos de colusão e guerra de preços no mercado de ferrovias no século XIX. Informações qualitativas sobre guerra de preços em cimento também não existem para replicar Busse (2002). Dessa forma será utilizada a abordagem de Morrison & Winston (1990), com o reconhecimento de que uma metodologia baseada na análise de variações de preços pode apresentar o problema de erro de especificação e implicar um erro de diagnóstico. Para diminuir a probabilidade desse tipo de erro, a queda de preço será ajustada pelas variações de custos. Assim, se a queda de preços for acompanhada por queda de custos de produção esse evento não dispara uma guerra de preços. Dado que não há informação perfeita sobre custos marginais, estando disponíveis deslocadores de custo, a variação de custos considerada será uma média das variações dos deslocadores de custos regionais: calcáreo, areia e salário. Ou seja, os dados de custo envolvem aqueles dados para a produção do cimento, que é produzido a partir da mistura de calcáreo, argila e areia, que são levados posteriormente ao forno até a temperatura de fusão incipiente. O produto resultante é o clínquer, o qual, moído e misturado à pequena percentagem de gesso, resulta, como produto final, no cimento comum. Assim, os dados de custos levantados incluem séries de preços dos insumos básicos. As séries de areia, calcáreo, e salário do setor foram pesquisados junto à SIDRA, sistema de informação do IBGE, o qual também fornece o índice de atividade do setor de construção civil.

Preço do cimento se refere ao cimento mais comum, CP-32, saco de 50 kg. Salário é medido por hora de trabalho. Preço da areia se refere ao metro cúbico de areia para cimento, enquanto o do calcáreo é por quilograma. A série de consumo (em toneladas) é proveniente do Sindicato Nacional da Indústria de Cimento (SNIC). Todas essas séries são mensais e regionais, compreendendo o período de janeiro de 1992 a dezembro de 2003, sendo, portanto, 144 observações. Para essas séries, os dados regionais foram calculados como médias simples dos dados estaduais. O índice de atividade de construção civil também é mensal, mas foi utilizada uma proxy regional considerando-se que o índice somente existe para capitais. Todos os dados são dados de atacado, uma vez que são levantadas para a formatação do índice de construção civil do IBGE ou são coletados pelo SNIC. Todas as séries foram deflacionadas, utilizando-se o IGP-M do IBGE. Esse índice foi escolhido por ser de ampla aceitação e por apresentar dados no período escolhido. Também reflete variação de preços no atacado em vez de varejo, encaixando-se melhor no caso do cimento, insumo da construção civil.

Assim, uma guerra de preços é disparada se ΔP – Δc > –5%, em relação ao preço do período anterior. Enquanto os preços mantiverem-se em queda ou não crescerem acima de 0.5% do preço que iniciou a guerra, considera-se ainda período de guerra de preços. Nos outros casos, assume-se um período colusivo para efeito do teste.

O mercado brasileiro de cimento foi dividido regionalmente, pois a indústria de cimento apresenta, como barreira à entrada relevante no molde da configuração de mercado canais de distribuição. Dado que cimento é um produto que apresenta uma relação peso/valor econômico grande, não é viável economicamente o transporte do produto por longas distâncias, já que isso implicaria crescente participação de custos de transporte no total de custos do produto. Como observou Haguenauer (1996, p. 33)

a proximidade ao centro consumidor constitui importante fonte de poder de mercado, dada a relevância do custo de transporte no preço final de cimento. O mercado "natural", estimado pelos especialistas do setor, é o situado a uma distância máxima de 300 km da fábrica – ou cerca de 500 km em áreas de menor densidade populacional, como as regiões Norte e Nordeste.

Como outro exemplo, para os EUA, em 1977, 82,5% da distribuição de cimento concentrava-se num raio de 320 km, enquanto 94,5%em menos de 500 km (Rosembaum, 1986, apud Martin, 2001 ) – não há razão para que essa situação tenha mudado consideravelmente desde então.

A Figura 1 apresenta o gráfico dos preços para as regiões analisadas, enquanto a Figura 2 apresenta a variação dos custos em porcentagem.



As figuras mostram que, mesmo transformando as variáveis em termos reais, o período pré-real apresenta variações mensais consideráveis, à exceção de preços e custos para o nordeste durante os anos de 1997 e 1998, que permanecem com intensa variação. Contudo, essas variações são bem-vindas, pois os dados de preços do período pós-real, para a maioria das regiões, são razoavelmente estáveis, tornando difícil a identificação de guerra de preços. Dessa forma, o critério acima apresentado revela maiores valores de guerra de preços para o período pré-real mas, em ambos os casos, mesmo assumindo que possam ser chamados de guerras de preços, esses períodos são de curta duração. De fato, a análise qualitativa dos dados revela uma dificuldade em identificar períodos de colusão e guerra de preços explícita, dado que os intervalos de variações de preços são pequenas. No caso dos dados utilizados por Berry & Briggs (1988) e Briggs (1996), os períodos de colusão e guerra de preços são muito explícitos, com períodos de guerra médios de 11 semanas e períodos de colusão de 20 ou mais semanas. De novo, no presente caso a percepção derivada da análise qualitativa dos dados é a de que esses períodos são pouco claros e que, provavelmente, a estrutura do mercado de cimento não deve se encaixar em colusão sob informação imperfeita e dificilmente parece ser possível construir um indicador de guerra e de colusão que permita mais períodos de colusão e de guerra de preços do que o acima apresentado. Para verificar essa percepção, contudo, foi concluído o teste abaixo.

4 O teste de Berry e Briggs para APS.

4.1 Aspectos básicos

Berry & Briggs (1988) e Briggs (1996) mostram como testar a hipótese nula de que a série de tempo de períodos de altos e baixos lucros apresenta processo de Markov. A ideia é a de que como o modelo de APS somente apresenta dois estados possíveis para a decisão das empresas: ou colusão ótima ou guerra de preços, se a situação de um mercado que puder ser classificado nesses dois estados apresentar um processo de Markov de primeira ordem, esse mercado encaixa-se no tipo de jogo e modelo proposto por APS. O ponto de partida do teste não-paramétrico de Berry & Briggs (1988), BB, considera uma série binária que representa o estado do cartel em um período t, com It = 1 sendo o estado de colusão e It = 0 o de guerra de preços. A hipótese nula do teste refere-se a um processo de Markov de ordem K para tal série contra a hipótese alternativa de um processo de Markov de ordem M > K. Uma apresentação sintética do teste se ampara em Briggs (1996). Para implementar o teste a série deve ser dividida em dois conjuntos , com i = 0,1, tal que se It = 0 ∈ e se It = 1 ∈ . A ideia é analisar a probabilidade das observações posteriores a It = 0 ou It = 1 terem valores 0 ou 1. Na presente aplicação consideraremos a hipótese nula de um processo de Markov de primeira ordem (K = 1) contra a hipótese alternativa de um processo de segunda ordem (M = 2). Nesse caso, a divisão da série considera as 2M = 4 histórias possíveis em (t–1, t–2) dadas por (0,0), (0,1), (1,0) e (1,1). Um processo de Markov de primeira ordem significa que os estado da variável indicador no período t só depende do estado prevalecente em t – 1 mas não em t – 2. Assim, o condicionamento na informação referente a t – 2 não deveria ser relevante no caso de um processo de Markov de primeira ordem. Assim, condicionado à histórias HM que incluam a mesma história para K períodos, deve-se ter P(It = ) = P(It = ) sob a hipótese nula.

A variável It pode ser pensada em termos de ensaios independentes quando se condiciona a uma dada história. Assim sendo, pode-se legitimar uma distribuição binomial legitimada a partir de uma distribuição de Bernoulli em cada período e utilizar estimador consistente baseado no método dos momentos. Considere µi = ΣItC

It/Ni dada pela proporção de It = 1 dado It e no qual Ni é o número de observações em assim são quatro as amostras de dados para o teste. Tem-se um estimador consistente da média populacional µ0. De forma semelhante, vi = µi (1 – µi) é um estimador consistente da variância populacional v0, com convergindo para uma distribuição normal padronizada. Ainda para o caso de um teste para um processo de Markov de grau zero, deve-se impor uma restrição de que as médias são iguais para as M-história contendo a mesma k-história, com R sendo uma matriz com dimensão 2K(2M–K – 1) × 2M, tal que Rµ0 = 0, sendo µ0 o vetor de médias. Assim, sob a hipótese nula Rµ é distribuído normalmente com média 0 e variância RVRT, na qual V = diag{v1/N1, ... v4/N4} é a matriz de variância de µ e (Rµ)T(RV R')–1(Rµ) segue uma distribuição χ2 com parâmetro dado pelo número de restrições. No caso de interesse deste artigo, temos K = 1 e M = 2 e, portanto, a matriz de restrição R tem duas linhas dadas respectivamente por [1 – 100] e [001 – 1], que impõem a condição de que se que para uma mesma história em t – 1 independente da história em t – 2 deve-se ter médias iguais para

4.2 Resultados empíricos

A Tabela 1 apresenta as médias e variâncias para as 4 histórias relevantes em (t – 1, t – 2). Os resultados favorecem a rejeição da hipótese nula de um processo de Markov de primeira ordem para It nos diferentes mercados regionais. Tal resultado não afasta a possibilidade de prevalência de poder de mercado que já fora detectada em Zeidan & Resende (2009), mas não é consistente com uma implicação testável do modelo de colusão ótima com monitoramento imperfeito de APS.

5 Considerações Finais

O presente trabalho teve como principal objetivo uma investigação alternativa que complementa a literatura sobre o mercado brasileiro de cimento, especificamente um teste, baseado em Berry & Briggs (1988) sobre a possibilidade de uma atuação de conluio implícito seguindo o modelo de Abreu et al. (1986). O comportamento de equilíbrio de empresas atuando de forma colusiva sob informação imperfeita resulta em um processo de Markov, testado no presente artigo para o mercado brasileiro de cimento, que foi dividido em cinco regiões.

Kamerschen (2004) condiciona a existência de colusão à existência de 6 fatores: concentração, situações idiossincráticas de mercado como procedimentos de leilão, ganhos de adicionais de receita, facilidade de comunicação entre empresas, barreiras á entrada e semelhança em termos de características produtivas e organizacionais. Nesse sentido, testar o modelo de Abreu et al. (1986) é relevante para verificar se o mercado de cimento brasileiro segue essa estrutura particular, dado que esse mercado, regionalmente, é caracterizado por concentração e barreiras á entrada, embora características idiossincráticas do mercado passaram ao largo desse trabalho. Röller (2006) verificam uma colusão do tipo divisão de mercado na Noruega. Contudo, tal estrutura provavelmente não permeia o mercado brasileiro, dado o tamanho e as características regionais do mercado.

Os dados da tabela 1 mostram que deve-se aceitar a hipótese nula de que as séries de indicadores construídas para indicar períodos de colusão e guerra de preços não parecem implicar processos de Markov de grau maior ou igual a 1. Isso indica que não se pode concluir que as empresas de cimento apresentam conduta de colusão sob informação imperfeita, o que implicaria um processo de Markov de primeiro grau. A intuição indica um nível de cooperação dependente do número de empresas, mas os resultados do teste para Abreu et al. (1986) rejeitam colusão explícita para qualquer região do mercado brasileiro. Briggs (1996) tenta controlar o teste APS para o número de firmas e um resultado parecido estava implicitamente sendo tentado no teste para o mercado brasileiro de cimento, i.e., poderia ser esperado um resultado mais colusivo para regiões com menores números de empresas. Mas, mais uma vez, para todas as regiões o comportamento seguindo APS foi rejeitado.

O resultado mais importante, contudo, é o fato de que o teste se mostra robusto para testar o comportamento estratégico de empresas em situações reais de mercado. Nesse ponto, é importante destacar que maiores pesquisas na área podem levar a melhorias e possibilidades de identificar interações estratégicas derivadas de análises de teoria dos jogos.

Nota: a significância em termos do p-valor é apresentada entre parênteses

Recebido em 5 de novembro de 2008.

Aceito em 5 de fevereiro de 2009.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Maio 2010
  • Data do Fascículo
    Mar 2010

Histórico

  • Recebido
    05 Nov 2008
  • Aceito
    05 Fev 2009
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