Resumos
O presente trabalho vislumbra um breve histórico dos planos de saúde no Brasil, examinando as interfaces entre o público e o privado. Realiza, ainda, uma análise da evolução e regulamentação da saúde suplementar, definindo as modalidades assistenciais de saúde, bem como enuncia as principais diferenças entre os planos e assistência médico-hospitalar e odontológico. Demonstra, em dados atuais, a cobertura exercida pelos planos de saúde suplementar e sua relação com a assistência pública de saúde. Por outro lado, enfoca a assistência, planos de saúde e o mercado de trabalho da odontologia, correlacionando, também com dados atuais, os desafios e as novas oportunidades do mercado de saúde suplementar, enfocado principalmente no setor odontológico. Ainda que o setor odontológico esteja em um momento extraordinário dentro do sistema privado de atenção à saúde, e que dados da ANS apontem para um crescimento desse setor de 210% nos últimos sete anos, a cobertura de serviços do setor suplementar de saúde está aquém das reais demandas, não contemplando, portanto, a assistência integral à saúde.
Planos privados de saúde; Regulamentação da saúde suplementar; Planos odontológicos
The present work presents a brief history of health plans in Brazil examining the interface between the public and the private sector. The evolution and regulation of the supplementary care system is analyzed, the different care modalities are defined and the main differences between health plans and dental care insurance are pointed out. The coverage provided by the supplementary care system and its relationship with the public health system is shown on the basis of current data. On the other hand, the study focuses on the care services, health plans and the labor market in the sector correlating, also on the basis of current data, the challenges and new opportunities of the supplementary care market, mainly in the dental sector. Although the dental sector is living an extraordinary moment within the private health care system and given that ANS data are pointing to a growth of this sector of 210% over last the 7 years, the service coverage of the supplementary care sector mainly directed to medical and inpatient care does not meet the real demand for integrated health care.
Private health plans; Regulation of the supplementary health sector; Dental plans
ARTIGO ARTICLE
Planos de assistência à saúde: interfaces entre o público e o privado no setor odontológico
Health care plans: interfaces between the public and private system in the dental sector
Louise Pietrobon; Cíntia Magali da Silva; Luciana Rodrigues Vieira Batista; João Carlos Caetano
Centro de Ciências da Saúde, Departamento de Estomatologia, Programa de Pós-Graduação em Odontologia, UFSC. Campus Universitário, Trindade. 88040-900. Florianópolis SC. isepietro@terra.com.br
RESUMO
O presente trabalho vislumbra um breve histórico dos planos de saúde no Brasil, examinando as interfaces entre o público e o privado. Realiza, ainda, uma análise da evolução e regulamentação da saúde suplementar, definindo as modalidades assistenciais de saúde, bem como enuncia as principais diferenças entre os planos e assistência médico-hospitalar e odontológico. Demonstra, em dados atuais, a cobertura exercida pelos planos de saúde suplementar e sua relação com a assistência pública de saúde. Por outro lado, enfoca a assistência, planos de saúde e o mercado de trabalho da odontologia, correlacionando, também com dados atuais, os desafios e as novas oportunidades do mercado de saúde suplementar, enfocado principalmente no setor odontológico. Ainda que o setor odontológico esteja em um momento extraordinário dentro do sistema privado de atenção à saúde, e que dados da ANS apontem para um crescimento desse setor de 210% nos últimos sete anos, a cobertura de serviços do setor suplementar de saúde está aquém das reais demandas, não contemplando, portanto, a assistência integral à saúde.
Palavras-chave: Planos privados de saúde, Regulamentação da saúde suplementar, Planos odontológicos
ABSTRACT
The present work presents a brief history of health plans in Brazil examining the interface between the public and the private sector. The evolution and regulation of the supplementary care system is analyzed, the different care modalities are defined and the main differences between health plans and dental care insurance are pointed out. The coverage provided by the supplementary care system and its relationship with the public health system is shown on the basis of current data. On the other hand, the study focuses on the care services, health plans and the labor market in the sector correlating, also on the basis of current data, the challenges and new opportunities of the supplementary care market, mainly in the dental sector. Although the dental sector is living an extraordinary moment within the private health care system and given that ANS data are pointing to a growth of this sector of 210% over last the 7 years, the service coverage of the supplementary care sector mainly directed to medical and inpatient care does not meet the real demand for integrated health care.
Key words: Private health plans, Regulation of the supplementary health sector, Dental plans
Introdução
Na década de 1980, houve uma intensa movimentação em torno da reforma do sistema público de saúde, caracterizando-se como uma grande prioridade político-social, com enorme envolvimento da sociedade brasileira e de seus diferentes órgãos representativos1.
Estudos recentes sobre os planos privados de saúde se contrapõem especificamente à noção da separação entre mercado e Estado, ao explorarem outros ângulos da assistência médica suplementar. Cohn e Dain2,3 cunharam as expressões "mercado artificialmente expandido" e "desmercadorização do mercado", para sublinhar a estrutural e extensa interface público-privado dos subsídios governamentais envolvidos com o financiamento dos planos privados de saúde.
O setor de saúde privado, no Brasil, não foi observado com cuidado, a princípio, pelas mais diversas razões, sendo que a mais provável é a de que o poder público tenha considerado que a fatia da sociedade brasileira com cobertura assistencial através de planos de saúde privados fosse composta de pessoas abastadas, e que poderiam dispensar a proteção do Estado. Entretanto, há que se considerar que, quanto maior fossem os recursos desse setor, financiados fundamentalmente pelas empresas e também diretamente pela própria sociedade, mais recursos sobrariam para a população carente e desassistida pelo setor público. Ou então, prevalecido e reservado a interpretação de quanto maior o crescimento do setor de saúde suplementar, menor a necessidade de recursos públicos para o segmento de saúde do Brasil1.
Por outro lado, segundo Mendes4, apesar dos serviços de saúde segmentados serem justificados dessa forma, as evidências mostram que esse suposto é falso e o que ocorre é o inverso. Ou seja, quando se segmenta para criar um sistema para os pobres, esse tende a ser subfinanciado e acaba por oferecer serviços de menor qualidade. Assim, ainda segundo o autor, os sistemas segmentados de saúde penalizam o pobre e/ou fazem os indivíduos gastarem duas vezes com a assistência à saúde.
Ainda assim, os planos privados de saúde representam precipuamente uma alternativa de transferência de riscos para instituições privadas e não somente uma opção individual/familiar de consumo. Ou, em outros termos, um processo de "externalização" dos custos sociais, consubstanciado em instituições, regras e normas de funcionamento, mediado necessariamente por unidades coletivas e legitimado por políticas públicas, sejam estas de regulamentação ou de renúncia à intervenção5.
Modalidades assistenciais
Em uma primeira instância, insuficiências do SUS são associadas à expansão da assistência médica suplementar, evocando os avanços das políticas de corte neoliberal. Essa equação, por sua vez, remete questões tanto às proposições reformistas universalistas quanto às políticas assistenciais seletivas. Por um lado, o crescimento das alternativas particulares, corporativas desafia a construção de um sistema de proteção social universal e redistributivo; por outro, evidencia perspectivas para a regulação de uma segmentação já consolidada5.
Na configuração política de saúde no Brasil, o tema da privatização é recorrente, principalmente após os anos sessenta, mas centrados, principalmente, nas relações entre hospitais privados e Previdência Social6. O conceito continua sendo aplicado amplamente a processos distintos mesmo após a ocorrência de muitas mudanças; entretanto, não impediu os esforços realizados na década de 1990 para melhor caracterizar descritivamente os segmentos do setor privado, como os hospitais privados7, planos e seguros de saúde6,8,9 e cooperativas médicas10.
O sistema de atenção médica supletiva (SAMS) é um sistema privado que, contudo, recebe subsídios diretos ou indiretos do Estado, sob forma de renúncias fiscais e contributivas. Segundo Mendes4, o SAMS está constituído por quatro modalidades assistenciais: a medicina de grupo, a autogestão, a cooperativa médica e o seguro-saúde. Essas modalidades apresentam racionalidades de estruturação distintas, clientelas diferenciadas e formas de financiamento diversas. Ademais, ofertam, no mercado, produtos segmentados por diferentes clientelas.
A medicina de grupo opera mediante empresas que administram planos de saúde sob a forma de pré-pagamento. A maior parte delas é contratadora de serviços de terceiros, mas 36% estruturam serviços próprios11. Mais de 70% das empresas são de tamanho pequeno e apenas 10% são de grande porte (mais de 300.000 vidas). A medicina de grupo é representada politicamente pela Associação Brasileira de Medicina de Grupo (ABRAMGE). A autogestão está configurada por empresas que, a partir de sistemas pós-pagamento, administram elas mesmas ou contratam terceiros para administrar planos de saúde para seus membros. A autogestão pode estruturar-se diversamente: com autogestão de compra de serviços, com produção própria de serviços, com serviços comuns para grupos de empresas ou com autoseguro de saúde. Seu maior segmento são empresas estatais, em torno de 60%, sendo as demais empresas privadas. Sua representação política faz-se por meio da Associação Brasileira dos Serviços Assistenciais de Saúde Próprios de Empresas (ABRASPE), com atuação mais marcada no segmento privado, e do Comitê de Integração das Entidades Fechadas de Assistência a Saúde (CIEFAS), que atua especialmente no segmento público.
As cooperativas médicas são formadas por cooperativas de médicos que ofertam planos sob a forma de pré-pagamento, à semelhança da medicina de grupo. Por constituírem-se como cooperativas, consideram-se, a si mesmas, como formas éticas, não-comerciais, de prestação de planos de saúde. Operam com a interveniência de 364 cooperativas regionais coordenadas por duas confederações: Aliança e a Brasil.
O seguro-saúde é constituído por empresas ligadas ao capital financeiro bancário. Esse sistema funciona, desde 1967, na lógica do seguro privado, razão pela qual, historicamente, até a criação da Agência Nacional de Saúde Suplementar, sempre esteve sob o controle da Superintendência de Seguros Privados (SUSEP). As seguradoras atuam por pré-pagamentos de prêmios feitos pelos assegurados e prestam serviços mediante contratação de terceiros; não podem ter prestação própria. Essa modalidade tem algumas características, como sensibilidade às variações da conjuntura econômica, tem preços médios mais elevados relativamente às outras modalidades e constitui um mercado de alta concentração. Sua representação política faz-se por meio da Federação Nacional das Empresas de Seguros Privados e de Capitalização (FENASEG).
Entretanto, segundo a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) de número 39 de 30 de outubro de 200012, que dispõe sobre a definição, a segmentação e a classificação das operadoras de planos de assistência à saúde, são sete as modalidades: administradora, autogestão (não patrocinada e patrocinada), cooperativa médica, cooperativa odontológica, filantropia, medicina de grupo e odontologia de grupo.
Segundo tal resolução, são consideradas como modalidade de administradora as empresas que administram planos ou serviços de assistência à saúde, sendo que, no caso de administração de planos, são financiados por operadora, não assumem o risco decorrente da operação desses planos e não possuem rede própria, credenciada ou referenciada de serviços médico-hospitalares ou odontológicos.
Classificam-se na modalidade de autogestão as entidades de autogestão que operam serviços de assistência à saúde ou empresas que, por intermédio de seu departamento de recursos humanos ou órgão assemelhado, responsabilizam-se pelo plano privado de assistência à saúde destinado, exclusivamente, a oferecer cobertura aos empregados ativos, aposentados, pensionistas ou ex-empregados, bem como a seus respectivos grupos familiares definidos, limitado ao terceiro grau de parentesco consangüíneo ou afim, de uma ou mais empresas, ou ainda a participantes e dependentes de associações de pessoas físicas ou jurídicas, fundações, sindicatos, entidades de classes profissionais ou assemelhados.
Com relação à cooperativa médica, são as sociedades de pessoas sem fins lucrativos, constituídas conforme o disposto na Lei nº 5.764, de 16 de dezembro de 1971, que operam planos privados de assistência à saúde, bem como a modalidade de cooperativa odontológica.
Na modalidade de filantropia, estão presentes as entidades sem fins lucrativos que operam planos privados de assistência à saúde e tenham obtido certificado de entidade filantrópica junto ao Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) e declaração de utilidade pública federal junto ao Ministério da Justiça ou declaração de utilidade pública estadual ou municipal junto aos órgãos dos governos estaduais e municipais.
Classificam-se na modalidade de medicina de grupo as empresas ou entidades que operam planos privados de assistência à saúde, excetuando-se aquelas classificadas nas modalidades contidas nas Seções I, II, IV e VII da Resolução nº 39 RDC12.
Classificam-se na modalidade de odontologia de grupo as empresas ou entidades que operam exclusivamente planos odontológicos, excetuando-se aquelas classificadas na modalidade contida na Seção III desta Resolução.
E há ainda a seguradora especializada em saúde, que são as sociedades seguradoras autorizadas a operar planos de saúde, desde que estejam constituídas como seguradoras especializadas nesse seguro, devendo seu estatuto social vedar a atuação em quaisquer outros ramos ou modalidades.
Saúde suplementar
No âmbito da saúde suplementar, que atinge hoje 35 milhões de brasileiros, a gestão da atenção também entrou na agenda de debates. Com a redução importante das taxas de inflação a partir de 1994 e o fim da ciranda financeira, os planos de saúde buscaram implementar práticas de gestão de custos e de riscos. A "medicina preventiva" e outras estratégias de organização do cuidado, como caminho para redução de custos, passaram a fazer parte do vocabulário dos empresários da saúde. Além disso, a Agência Nacional de Saúde Suplementar desencadeou, a partir de 2004, o Programa de Qualificação da Saúde Suplementar, segundo o qual as operadoras são avaliadas também pela qualidade da atenção à saúde prestada a seus beneficiários. Novidade, pois a saúde suplementar, como setor econômico mobilizado pela busca do lucro, sempre teve a saúde financeira das empresas como fator primordial de avaliação13.
O sistema privado de planos e seguros de saúde cresceu e experimentou grande diversificação nas modalidades empresariais que o compõem entre os anos de 1987 e 1998, sem que estivessem submetidas à regulação pública. Apenas em 1998 foi aprovada legislação regulatória (Lei nº 9.656, de agosto de 1998), que estabeleceu regras para os contratos e coberturas, e em 2000 foi criada a Agência Nacional de Saúde Suplementar- ANS (Lei nº 9.961, de 28 de janeiro de 200014), responsável pelo controle dessa área15.
Apesar de diversos autores correlacionarem as dificuldades enfrentadas pelo SUS com a expansão da assistência suplementar, sugerindo um processo de compensação ou de substituição, os dados disponíveis sugerem uma correlação maior da cobertura por planos e seguros privados com a concentração de renda e de oferta de serviços. Assim, a região Sudeste apresenta maior cobertura de planos privados de saúde e é a mais expressiva na produção de serviços para o SUS, enquanto a região Norte figura como a mais desprovida em relação aos dois setores.
Como se vê, diferentes lógicas de acumulação de capital, de racionalização de custos e de humanização da atenção compõem as vertentes que operam em favor de uma reorganização da atenção à saúde, todas elas prevendo novos lugares e papéis para os hospitais dentro da rede de serviços de saúde.
Cobertura
O setor de saúde suplementar é extremamente concentrado no Brasil. Aproximadamente duzentas operadoras detêm 80% do mercado. E 95% dos consumidores de planos de saúde estão localizados na área urbana, sendo que cerca de 77% na região Sudeste do país, principalmente em São Paulo e Rio de Janeiro16,17.
Segundo Duarte e Di Giovanni10, o sistema de atenção médica suplementar cresceu a passos largos durante a década de 80, de tal modo que, em 1989, cobria 22% da população total do país. Somente no período 1987/89 incorporaram-se a esse subsistema 7.200.000 beneficiários. Atualmente, o número de usuários registrados na ANS é de aproximadamente 37 milhões17.
O setor de planos privados de assistência à saúde envolve mais de quarenta milhões de vínculos de beneficiários, dos quais aproximadamente 85% a planos de assistência médica com ou sem odontologia e 15% a planos exclusivamente odontológicos; duas mil empresas operadoras; e milhares de prestadores de serviços entre médicos, dentistas e outros profissionais de saúde - em hospitais, laboratórios, clínicas e consultórios15.
Isto exclui os clientes de esquemas particulares administrados diretamente pelas instituições públicas, como os institutos de previdência estaduais e municipais e pelas forças armadas. Em 1998, foram contabilizadas pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - PNAD/IBGE - 9.673.993 pessoas cobertas por planos categorizados como "instituição de assistência ao servidor público" e 29.003.607 de planos denominados "empresas privadas" 5.
De acordo com o PNAD/IBGE, em 200318, estimou-se em 43.202.545 de pessoas cobertas por pelo menos um plano de saúde. Destes, 34.198.206 de pessoas (79,2%) estavam vinculados a planos de saúde privado (individual ou coletivo); os restantes 9.004.339 de pessoas (20,8%) estavam cobertos por planos de instituição de assistência ao servidor público (municipal, estadual ou militar). Verificou-se um aumento da participação dos planos privados (79,2%) em relação ao observado em 1998 (75%); entretanto, esse aumento pode ter sido gerado pela exclusão dos servidores públicos federais dos planos de "instituição de assistência ao servidor público", pelo fato de que os planos voltados a estes servidores eram todos privados18.
Contudo, essa classificação, pressupondo uma dicotomia, entre os esquemas assistenciais de servidores públicos civis e militares da administração direta e aqueles voltados aos empregados de empresas estatais, privadas e compradores individuais, exprime apenas uma localização inicial das clientelas5.
Na realidade brasileira, parte dos servidores públicos da administração direta está vinculada ao segmento comercial do mercado de planos e seguros-saúde e, por outro lado, empresas privadas organizam planos próprios sem fins lucrativos. Ou seja, não há uma relação unívoca entre a natureza jurídico institucional da empresa empregadora e a das empresas que comercializam/ofertam planos/seguros saúde. Portanto, parte das pessoas classificadas pela PNAD como clientes de planos de servidor público integra o mercado privado de planos de saúde5.
Regulamentação da assistência
Durante mais de trinta anos, o setor de saúde suplementar operou sem controle do governo. Em período anterior a 1998, os consumidores passaram a ser mais protegidos com a adoção do Código de Defesa do Consumidor e com a atuação nos Procon estaduais e municipais. O acolhimento de demandas pelos Procon beneficiou os consumidores em seus conflitos com as operadoras de planos de saúde. No entanto, a atuação desses organismos estatais mostrou-se insuficiente para regular as relações entre consumidores e operadoras. Houve a necessidade de intervenção estatal, visando corrigir e atenuar as falhas do mercado e somente após a promulgação da Lei nº 9.656, em 1998, o setor de saúde suplementar ganhou a sustentação legal para que iniciassem as ações de regulamentação1.
O modelo de regulação do setor de saúde suplementar é diferenciado em relação à experiência internacional. Na maioria dos países, a regulação é feita a partir da atividade econômica em si, atuando sobre as empresas do setor, garantindo suas condições de solvência e a competitividade do mercado. No Brasil, a opção foi por regular também - e fortemente - o produto oferecido, ou seja, a assistência à saúde, com medidas inovadoras como a proibição da seleção de risco e do rompimento unilateral dos contratos. A regulamentação do setor de saúde suplementar, exigida pela Constituição de 1988, surge apenas em 1998, quando o SUS já apresentava, no mínimo, cinco importantes marcos em seu processo de construção: a Lei Orgânica da Saúde, nº 8.080/90, a extinção do INAMPS, a NOB - Norma Operacional Básica/93, a NOB/96 e a implantação do PAB - Piso da Atenção Básica em 199819.
Em 2000, através da Lei nº 9.961/2000, criou-se a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e definiu, também, a sua finalidade, estrutura, sua receita, a vinculação ao Ministério da Saúde e a sua natureza.
A Agência Nacional de Saúde Suplementar é uma autarquia sob regime especial vinculada ao Ministério da Saúde e responsável pela regulação, normatização, controle e fiscalização das atividades que garantam a assistência suplementar à saúde. A ANS tem por finalidade institucional promover a defesa do interesse público na assistência suplementar à saúde, regulando as operadoras setoriais, inclusive quanto às suas relações com prestadores e consumidores, contribuindo para o desenvolvimento das ações de saúde no País20.
Os objetivos básicos e as estratégias diferenciadas de implementação da regulamentação surgem claramente do marco regulatório e evoluem a partir da ampliação do conhecimento sobre o setor de saúde suplementar. Os objetivos da regulamentação podem ser resumidos em seis pontos: 1) assegurar aos consumidores de planos privados de assistência à saúde cobertura assistencial integral e regular as condições de acesso; 2) definir e controlar as condições de ingresso, operação e saída das empresas e entidades que operam no setor; 3) definir e implantar mecanismos de garantias assistenciais e financeiras que assegurem a continuidade da prestação de serviços de assistência à saúde contratados pelos consumidores; 4) dar transparência e garantir a integração do setor de saúde suplementar ao SUS e o ressarcimento dos gastos gerados por usuários de planos privados de assistência à saúde no sistema público; 5) estabelecer mecanismos de controle da abusividade de preços; 6) definir o sistema de regulamentação, normatização e fiscalização do setor de saúde suplementar19.
Diferenças entre a assistência e os planos médicos e odontológicos
Os planos médico-hospitalares possuem uma quantidade de estudos muito superior em relação aos planos odontológicos. Isso devido ao fato que uma grande parcela dos estudiosos considera a saúde bucal com características comuns às da saúde como um todo; entretanto, a odontologia possui diferenças marcantes da medicina e, portanto, também, são diferentes os seus planos e assistências, como por exemplo, nos aspectos operacionais.
Segundo Covre e Alves21, as principais diferenças entre as assistências médicas e odontológicas são:
1) as principais doenças bucais são apenas duas; já na medicina são inúmeras;
2) a previsibilidade de acontecimento de doenças bucais é alta, enquanto na medicina a previsibilidade de ocorrência de doenças ainda é baixa;
3) o número de especialidades: na odontologia existem dezessete, enquanto na medicina, 66;
4) o custo do diagnóstico na odontologia (geralmente exige apenas radiografias) é menor que na medicina (diversos exames);
5) maior possibilidade de escolha dentre os procedimentos existentes para um mesmo tratamento odontológico (por exemplo, diversos tipos de materiais para a confecção de uma prótese unitária implica em diferentes preços). Já na medicina, normalmente não existem muitas alternativas, o que pode justificar a maior sensibilidade dos indivíduos às mudanças de preços dos serviços odontológicos, bem como uma maior possibilidade de poder de mercado por parte das empresas médicas.
6) na odontologia, existem formas de se prevenir o surgimento de doenças bucais e a resposta à prevenção é mensurável (doenças bucais não são tão imprevisíveis);
7) com exceção de acidentes ou dores de dente, a necessidade de tratamento odontológico raramente pode ser considerada uma emergência e, relativamente às doenças médicas, raramente há risco de vida nos casos de doenças bucais. Por conseguinte, os indivíduos podem se planejar "livremente" em relação a quando realizar um tratamento odontológico (comum o adiamento do tratamento mesmo na presença de doenças bucais);
8) a característica acima possibilita maior liberdade na escolha do profissional - mais um motivo que o torna mais sensível às alterações nos preços dos procedimentos odontológicos. Na presença de uma doença, o indivíduo tende a ficar disposto a pagar qualquer quantia para a realização do seu tratamento.
9) doenças bucais são crônicas e não comunicáveis. Isto é, apesar de a doença cárie ser infecto-contagiosa, ela não é capaz de provocar epidemias.
10) na odontologia, após a primeira consulta, o paciente normalmente fica sabendo quanto tempo será necessário para finalizar o tratamento indicado. Já na medicina, o término do tratamento tende a não poder ser estabelecido.
Também segundo Covre e Alves21, as diferenças entre os planos médico-hospitalares e odontológicos são:
1) quando um indivíduo adquire um plano médico-hospitalar, seu objetivo é se proteger financeiramente contra perdas em sua renda decorrentes do risco de adoecimento. No caso da odontologia, este risco é razoavelmente conhecido, pode ser prevenido e o gasto esperado é menor comparativamente aos gastos médicos. Esta primeira diferença já implica distinções na abordagem de estruturação dos planos odontológicos;
2) em função das peculiaridades da odontologia, o gerenciamento dos riscos e dos custos tendem a ser mais acurado que nos planos médico-hospitalares;
3) a maioria dos planos médico-hospitalares trabalha com uma alta sinistralidade, porém com uma baixa freqüência (enquanto a maioria dos beneficiários não se encontra hospitalizada, aqueles que estão hospitalizados incorrem em altos custos). No caso dos planos odontológicos, ocorre o contrário: há uma alta freqüência de eventos de baixo custo (a maioria da população possui algum tipo de doença bucal a ser tratada e a maioria das doenças bucais tratáveis a custos menores que as doenças médicas);
4) muitos procedimentos odontológicos podem ser repetidos e, caso não sejam bem feitos, podem ser corrigidos. Tal fato não ocorre na medicina: muitos erros médicos ou procedimentos realizados com baixa qualidade, uma vez realizados, são irreversíveis;
5) a freqüência de utilização nos planos odontológicos coletivos se comporta de forma diferenciada dos planos médico-hospitalares. Naqueles, após um pico de utilização inicial, existe uma tendência de estabilização, reduzindo os custos e a sinistralidade ao longo do tempo;
6) as operadoras de planos odontológicos tendem a criar mecanismos que incentivem os beneficiários a freqüentarem o dentista regularmente, uma vez que seus custos aumentam quando o tratamento é adiado, e este adiamento é uma prática freqüente entre os usuários;
7) procedimentos odontológicos são altamente rastreáveis, ou seja, podem ser averiguados radiograficamente e podem auxiliar na avaliação de sua qualidade. As auditorias radiológicas são relativamente fáceis e resultam em uma relação custo/benefício positiva. Geralmente, cinco ou mais dólares são economizados para cada um dólar investido em auditoria odontológica;
8) estruturas de relacionamento entre os agentes: o setor de operadoras de planos médicos possui uma rede de contratos muito mais abrangente (hospitais, clínicas, laboratórios, medicamentos) que o setor de operadoras de planos exclusivamente odontológicos;
9) nos planos odontológicos, não há uma relação direta entre o aumento da idade do usuário e seu nível de utilização.
Entretanto, alguns desses pontos geram discordâncias entre médicos e cirurgiões-dentistas. Um dos pontos controversos é o fato de que erros em procedimentos odontológicos podem ser corrigidos. Por um lado, há o ciclo restaurador repetitivo, em que se refaz o trabalho várias vezes desgastando as restaurações, mas, também, tecido dentário sadio. Por outro lado, há ainda o fato de que alguns procedimentos quando mal realizados podem causar a perda do elemento dental, considerado uma amputação. Essa discordância deve-se, principalmente, à não valorização ou não consideração da perda dentária como um problema grave.
Assistência, planos odontológicos e mercado de trabalho na odontologia
O segmento operador de planos odontológicos vive, atualmente, um momento extraordinário dentro do sistema privado de atenção à saúde. A trajetória ascendente evidencia que, cada vez mais, a população está contratando os serviços destas operadoras, sejam eles planos coletivos ou individuais.
Segundo os dados reunidos pela ANS publicados no Caderno de Informações da Saúde Suplementar15,17, o segmento odontológico saltou de pouco mais de três milhões de beneficiários, em 2001, para 7.448.151 em 2006 e para 8.590.076 em 2007. Um crescimento, nos últimos sete anos, de cerca de 210%. Também a receita das operadoras exclusivamente odontológicas, no período de 2001 a 2005, aumentou em, aproximadamente, 112%. Dados que confirmam a expansão do setor e seu potencial ambiente de contínuo crescimento dos próximos anos em todo o território brasileiro enfatizado pela previsão do caderno de informações da ANS de dezembro de 200717.
Entre 2005 e 2006, embora o crescimento tenha se verificado em todas as modalidades de operadoras de planos odontológicos, é na odontologia de grupo que os números ficam mais evidentes: um acréscimo de 764 mil novos beneficiários, totalizando uma carteira de mais de 4.600 milhões de vidas que representam 62,87% de todo o segmento odontológico. No segundo lugar, as cooperativas odontológicas, com 21,47% do mercado, seguidas de medicinas de grupo com planos odontológicos (7,59%); seguradoras (7,05%); autogestões (0,46%); cooperativas médicas com planos odontológicos (0,41%); e filantropias (0,15%). Segundo Serra e Henriques22, essa divisão é devido aos cirurgiões-dentistas pensarem que a odontologia de grupo é um bom sistema para aumentar a sua renda, bem como sua clientela no momento atual do mercado da odontologia.
Ao acompanhar a lógica da distribuição geográfica da população brasileira e das operadoras de planos odontológicos nas cinco regiões do país, temos o Sudeste e o Nordeste com, respectivamente, 64,93 e 17,42% do total de beneficiários; e as regiões Sul, Centro-Oeste e Norte, 17,65%.
Essas concentrações acompanham, além das distribuições populacionais do país, as distribuições de concentrações de capitais financeiros e as distribuições de assistência pública à saúde, principalmente a odontológica.
A população brasileira está distribuída de forma desigual pelo território brasileiro, havendo concentração maior, segundo o IBGE23, nas áreas de maior desenvolvimento econômico, ou seja, na região Sudeste, região Sul e região Centro-Oeste e as regiões menos povoadas são a Nordeste e a Norte, acompanhados de maneira significativa pela expansão das operadoras de planos odontológicos.
O PIB - Produto Interno Bruto - dos municípios revela a concentração das riquezas do país, o ranking se mantém desde 2002, segundo o IBGE23, e registra os maiores PIBs entre as capitais brasileiras em Vitória (ES), Brasília (DF), Manaus (AM), São Paulo (SP), Rio de Janeiro (RJ), Porto Alegre (RS) e Florianópolis (SC). E não há nenhuma capital do Nordeste com PIB acima do nacional.
A distribuição da assistência pública à saúde obedece às mesmas distribuições populacionais e econômicas descritas anteriormente. Está concentrada nos grandes centros urbanos, primordialmente, na região Sudoeste e Sul, e, de maneira mais isolada nas regiões Nordeste, Centro-Oeste e Norte.
Ao analisarmos somente a região Sul, observa-se, em dezembro de 200615, 622.940 novos beneficiários de planos exclusivamente odontológicos, sendo destes 545.641 coletivos e 77.299 de tipo individual. Estes, somados aos 165.614 beneficiários anteriores, totalizam 788.554 usuários na região Sul. A taxa percentual de cobertura dos planos exclusivamente odontológicos é variável de 2,1% a 3% na região Sul.
Os mesmos dados de dezembro de 200717 mostram uma população na região Sul de 27.308.919; existem 834.843 beneficiários de planos de saúde exclusivamente odontológicos, perfazendo um percentual de 3% da população, mantendo-se estável em relação ao ano de 2006.
Em relação ao total de 559 operadoras de planos de saúde odontológicos, na região Sul, 60 delas detêm 80% do total de beneficiários, números, esses, que se têm mantido estáveis no último ano, enfatizando a grande concentração de mercado por parte destas operadoras odontológicas.
A expansão pode ser atribuída, também, ao aumento da expectativa de vida da população brasileira. Conforme dados do IBGE23, houve um considerável incremento da população idosa, acima de 70 anos, e um decréscimo de crianças e adolescentes, de 0 a 14 anos; entretanto, a proporção de indivíduos economicamente ativos passou de 39% em 1995 para 50% em 2005, correspondendo a um crescimento dessa população na ordem dos 130%, estando em franca ascensão, dados que comprovam um aumento da população com possibilidades de uso de planos de saúde.
Embora este segmento esteja expandindo seus números, o espaço para crescimento dos planos odontológicos é bastante grande, tendo em vista que os atuais beneficiários atendidos por estas operadoras representam apenas 4% de toda a população brasileira. Isto mostra que há, ainda pela frente, uma demanda a ser suprida e um longo caminho a ser percorrido para que os planos odontológicos cheguem a um número maior de pessoas, já que as políticas públicas de promoção e atenção da saúde bucal à população são deficientes.
Regulamentação e desafios
Desde que o sistema privado de atenção à saúde foi regulamentado, em 1988, com a publicação da Lei nº 9.656/98 e suas sucessivas alterações, além da implantação da ANS, as empresas operadoras, sejam elas de quais segmentos forem, têm procurado se ajustar e enquadrar-se aos padrões e normas estabelecidas - que não são poucas - visando um equilíbrio financeiro interno e a satisfação de seus usuários e a dos prestadores de serviços. E essa tarefa não tem sido fácil perante os desafios e exigências impostas pela agência reguladora.
No ano de 2007, todas as empresas operadoras deverão implementar o novo plano de contas estabelecido pela ANS, além de ajustar suas reservas técnicas. Ainda, a implantação da Troca de Informações de Saúde Suplementar - TISS, que padronizará as guias preenchidas nos diversos prestadores de serviços médicos e odontológicos, e a instituição do Programa de Qualificação, cujo principal interesse é a produção da saúde, com a realização de ações de promoção à saúde e prevenção de doenças, são parte de um investimento humano e tecnológico que cada empresa deverá dispor a curto prazo24.
Para atender a estas necessidades e às atreladas a uma redução de custos administrativos associada à economia de escala, algumas empresas, principalmente as localizadas nos grandes centros urbanos, estão se fundindo, sendo incorporadas ou até mesmo abrindo o seu capital, lançando ações na Bolsa de Valores, para uma rápida capitalização. Já as operadoras de pequenas localidades, onde operam isoladamente e não têm o risco da eminente concorrência, deverão unir forças, por meio de suas entidades representativas, a fim de garantir o acesso às informações e à troca de experiências.
O Sinog (Sindicato Nacional das Empresas de Odontologia de Grupo), por exemplo, vem orientando suas associadas, seja de qual porte for, nestes quesitos que demandam maior atenção, criando grupos técnicos que as instruam e subsidiem de informações.
Também neste cenário de desafios, não se pode esquecer que se torna imprescindível capacitar as empresas operadoras com a adoção de práticas de boa governança, a correta gestão de seus negócios, além da otimização da organização e dos métodos gerenciais aplicados ao quadro de colaboradores, capacitando-os para suas tarefas a fim de atender o objetivo da empresa.
Enfim, prestadores de serviços, gerentes de contas, supervisores, pessoal de apoio e, inclusive, corretores deverão fazer parte desta estratégia de crescimento da empresa e no conseqüente aumento da participação de mercado.
Novas oportunidades
Para o caso dos planos odontológicos, que se encontram em plena expansão, sejam eles coletivos, aqueles contratados pelas empresas como benefício a seus funcionários, ou os individuais, advindos da contratação por pessoas físicas, vislumbram-se várias oportunidades e desafios para a sua consolidação.
Do total de beneficiários dos planos odontológicos em 2006, 82,25% enquadram-se na modalidade coletiva. A discrepância deste número em relação aos planos individuais está em considerar que, em geral, o benefício que as empresas concedem a seus colaboradores, como forma de atender às reivindicações sociais nos dissídios e convenções coletivas, é de baixo impacto financeiro e de intensa capacidade de gerar melhoria na auto-estima do trabalhador, uma vez que o sorriso bonito e a dentição sadia melhoram sua qualidade de vida.
Segundo a ANS15, mesmo os planos individuais, que representam hoje a menor porcentagem de participação no segmento odontológico, têm um mercado promissor a ser desbravado se novas possibilidades de atuação forem exploradas. Mas é óbvio também saber que o crescimento de qualquer setor, como é o esperado para o odontológico, depende diretamente do desempenho da economia do país.
Como se vê atualmente, o Brasil passa por uma boa fase de investimentos externos, risco-país em baixa, reservas internacionais elevadas, um congresso recém-empossado e um pretendido plano de aceleração do crescimento (PAC) implantado pelo governo com medidas para reduzir impostos de alguns setores e permitir investimentos em infra-estrutura. Cabe ao empresário, neste momento, ter a iniciativa concreta de sair de seu patamar para crescer com solidez e segurança15,17.
Segundo dados do IBGE18, em 2005, o estado de Santa Catarina contava com o contingente populacional de 5.866.568 habitantes. O número de cirurgiões dentistas em atividade, em abril de 2007, era 7.149, que resulta numa relação aproximada de 820,61 habitantes por profissional devidamente inscrito25.
Na década de 1990, as características do mercado de trabalho na área odontológica sofreram mudanças significativas. Alterações no contexto mundial como a abertura comercial e o fenômeno da globalização acabaram por ampliar a competitividade no setor privado e, por conseguinte, na ocupação e rendimento dos indivíduos26. Tais mudanças são sentidas na odontologia e no setor saúde de um modo geral.
Nos últimos anos, os convênios odontológicos tornaram-se cada vez mais presentes na realidade da população, sendo que a adesão aos sistemas de convênio e de credenciamento torna propícia maior participação de grupos econômicos de médio e grande porte26.
Também é importante frisar que a crise do modelo liberal da profissão, representada até poucos anos essencialmente por consultórios privados, exige dos profissionais uma reavaliação na forma de organização e de atendimento. As mudanças no mercado de trabalho devem levar em conta a participação das empresas de odontologia de grupo e administradoras de convênios27. A literatura ainda demonstra que devem ser levados em conta não somente os interesses das empresas, mas, também, as reivindicações dos profissionais responsáveis pelo atendimento. Desse modo, pode ser concretizada a realização das necessidades dos usuários, as quais são viabilizadas pelo sistema de pré-pagamento ou de convênio27. Os mesmos autores puderam evidenciar que a modalidade de atendimento representada pelos planos odontológicos é reconhecida pelos cirurgiões-dentistas, possivelmente em virtude da crise no mercado liberal, demonstrada pelo interesse que os profissionais apresentam em firmar convênio com as empresas.
A odontologia de grupo tem contribuído para a expansão da odontologia, atingindo uma maior parte da população. Uma outra vantagem da emergência deste ramo é que os profissionais acreditam ser uma possibilidade de aumento da sua renda e clientela22. Serra et al.22 observaram que grande parte de profissionais trabalha com algum tipo de odontologia de grupo, por meio de contratos, realizando o atendimento em seus próprios consultórios, mais comumente através do sistema de cooperativas. Os autores salientam ainda que a maior parte dos cirurgiões-dentistas relatam estarem insatisfeitos com relação a sua participação no sistema de odontologia de grupo. No entanto, apesar da insatisfação, somente uma pequena parte dos profissionais participantes do estudo pretendem se desligar do sistema de odontologia de grupo.
Um aspecto importante com relação aos planos de sistema de saúde e de seguros odontológicos diz respeito aos critérios usados para a seleção dos profissionais participantes. Tal fato é relacionado diretamente também com a qualidade da prestação dos serviços. O processo de credenciamento é uma importante etapa para obtenção da eficiência, para a qualidade e a satisfação dos usuários. Apesar da importância destes aspectos, nem sempre os mesmos são levados em conta, como demonstra o estudo realizado por Sekulic et al.28, no qual os autores, avaliando empresas do ramo, puderam perceber que a preocupação com a formação, a habilidade e a competência do profissional são inexpressivas no momento do credenciamento. Os autores enfatizam ainda que a adoção de critérios adequados para seleção e credenciamento de cirurgiões-dentistas poderia garantir a qualidade do produto oferecido aos usuários, pois os prestadores de serviço são, em grande parte, responsáveis pela manutenção da boa imagem do plano.
Considerações finais
Refletindo sobre as constatações realizadas, ressalta-se a necessidade do investimento social no sentido de melhorar e adaptar o SUS e a assistência privada à saúde às constantes transformações da sociedade brasileira. Reforça-se que o modelo mais desejável é aquele que responda com dignidade, eficácia e eficiência de forma acessível a todos os que dele necessitem.
Constatou-se que a cobertura de serviços do setor suplementar de saúde está aquém das reais demandas por abrangerem apenas os serviços médico-hospitalares, não contemplando, portanto, a assistência integral à saúde.
Na odontologia, essa cobertura está se ampliando, o crescimento do setor de saúde suplementar odontológico cresceu 210% nos últimos anos. Ainda se está aquém da supressão das necessidades sentidas pela população e pelos indivíduos que obtêm acesso ao sistema de saúde suplementar; entretanto, há a possibilidade de uma ampliação do acesso.
Enfim, sugere-se a necessidade de ampliar a agenda de debates e pesquisas sobre o mosaico público-privado que estrutura o sistema de saúde brasileiro.
Colaboradores
CM Silva, L Pietrobon, LRV Batista realizaram a pesquisa bibliográfica e elaboração da primeira versão do artigo. JC Caetano contribuiu com a revisão crítica do artigo.
Artigo apresentado em 28/06/2007
Aprovado em 14/02/2007
Versão final apresentada em 31/03/2007
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12Agência Nacional de Saúde Suplementar. Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) nº 39 de 30 de outubro de 2000. Dispõe sobre a definição, a segmentação e a classificação das operadoras de planos de assistência à saúde. [acessado 2007 Abr 27]. Disponível em: http://www.ans.gov.br/portal/site/ legislacao/legislacao_integra.asp?id=159&id_ original=0
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13Agência Nacional de Saúde Suplementar. Programa de qualificação da saúde suplementar. Rio de Janeiro: ANS; 2005.
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14Lei nº 9.961 de 28 de janeiro de 2000. Cria a Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS e dá outras providências. Diário Oficial da União 2000; 28 jan.
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15Agência Nacional de Saúde Suplementar. Caderno de Informações da Saúde Suplementar: beneficiários, operadoras e planos Rio de Janeiro: ANS; 2007.
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16Brasil. Ministério do Trabalho e Emprego. Normas Regulamentadoras de Segurança e Saúde do Trabalhador. (março 2007). Brasília: Ministério do Trabalho e Emprego; 2003.
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17Agência Nacional de Saúde Suplementar. Caderno de Informações da Saúde Suplementar: beneficiários, operadoras e planos. (dezembro 2007) Rio de Janeiro: ANS; 2007.
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18Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios: Acesso e utilização dos serviços de saúde 2003. Rio de Janeiro: IBGE; 2005.
- 19. Brasil. Conselho Nacional de Secretários de Saúde. Saúde Suplementar. Brasília: CONASS; 2007.
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20Resoluções CONSU nº 01/2000. Sanções aplicáveis aos procedimentos e atividades lesivas à assistência de saúde suplementar. Delega competência à ANS para os atos mencionados. Rio de Janeiro: ANS; 2000.
- 21. Covre E, Alves SL. Planos odontológicos: uma abordagem econômica no contexto regulatório Rio de Janeiro: ANS; 2002.
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23Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Síntese dos Indicadores Sociais 2006 Rio de Janeiro: IBGE; 2006.
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24Agência Nacional de Saúde Suplementar. Integração do setor de saúde suplementar ao sistema de saúde brasileiro - Ministério da Saúde, Agência Nacional de Saúde Rio de Janeiro: ANS; 2001.
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25CRO/SC. [acessado 2007 Abr 24]. Disponível em: http://www.crosc.org.br/index_1024x768.htm
» link - 26. Junqueira CR, Ramos DLP, Rode SM. Considerações sobre o mercado de trabalho em odontologia. Revista Paulista de Odontologia 2005, 27(4):24-27.
- 27. Silveira JLGC, Oliveira V. Experiências e expectativas dos cirurgiões-dentistas com os planos odontológicos. Pesq Bras Odontoped Clin Integr 2002; 2(1):30-34.
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
21 Ago 2008 -
Data do Fascículo
Out 2008
Histórico
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Recebido
28 Jun 2007 -
Aceito
14 Fev 2007