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Livros

Simonelli, AP. Rodrigues, DS. Saúde e Trabalho em debate: velhas questões, novas perspectivas. 2013. Paralelo 15, Brasília (DF):

Saúde e trabalho em debate: velhas questões, novas perspectivas1Simonelli AP, Rodrigues DS, organizadores. Saúde e Trabalho em debate: velhas questões, novas perspectivas. Brasília: Paralelo 15; 2013. – recentemente lançado pela Editora Paralelo 15 – enfeixa um conjunto extenso e diverso de experiências, pesquisas e reflexões acerca da saúde do trabalhador no Brasil. Suas organizadoras reúnem um elenco de mais de quarenta autores – entre docentes, gestores de serviços, pesquisadores e técnicos de diversas instituições – para, com suas contribuições, avivarem o debate contemporâneo sobre o tema no país. A obra percorre vários temas fulcrais de um vasto campo de pesquisa e intervenção, aguçando seu olhar analítico tanto pela atualização da perspectiva teórica de algumas das disciplinas envolvidas em suas questões, quanto pela reflexão sobre as vivências profissionais adquiridas no cotidiano dos autores, em suas respectivas práticas. E é talvez por essa razão que o livro, conquanto desuniforme em seu todo, transparece um forte (e esperado) acento de experiências no âmbito do Sistema Único de Saúde. Pois, entre os responsáveis pelas contribuições compiladas, muitos provêm de atuação profissional junto aos CERESTs e aos serviços de vigilância em saúde do trabalhador, embora colaborem também outros que, no espaço de sua trajetória acadêmica, colocam-se de modo eletivo em nítida articulação com o SUS – quer por seus princípios ou por suas práticas.

Composta por quatro partes, “Contextos de saúde e trabalho”, “Modelos, métodos e técnicas”, “Terapia ocupacional e saúde do trabalhador” e “Experiências e pesquisas aplicadas”, a publicação enseja um profícuo diálogo interdisciplinar, interinstitucional e entre serviços de saúde e academia, e o faz de modo igualmente instigante, mesmo sob o risco de que o fio da meada se perca pela profusão de olhares. Um risco inerente à natureza complexa das questões abordadas e à multipolaridade da narrativa, como se observa ao longo dos textos. Os autores, por sua vez, enfrentam esse risco com a serenidade de quem conhece o(s) assunto(s) em profundidade e com a assertividade que a experiência acumulada confere.

Emblemático dessa experiência, o capítulo 17 (Mendes et al.) aborda uma série de estudos de casos sobre diferentes desfechos do programa de reabilitação profissional do CEREST Piracicaba. Revela-se ali uma interdisciplinaridade de cunho interinstitucional, que é produzida em resposta a demandas sociais concretas e que avança na defesa da saúde coletiva. Expressão desse fenômeno é o fato de que, à medida que os atores envolvidos ousam ampliar o escopo das ações para além do espaço habitualmente “transitado”, logra-se articulação efetiva com a equipe de reabilitação do INSS local. Pela conjugação de esforços com esse e outros atores institucionais, robustecem-se equipe e modelo de atenção, resultando uma gama de atividades com grau diferenciado de resolutividade e, por conseguinte, maior impacto social do que de praxe. O relevo do trabalho em rede – consubstanciado na experiência deste CEREST – também vem analisado, sob outra perspectiva, no capítulo 15 (Jackson-Filho e Barreira). Este aborda os diversos aspectos determinantes no êxito do modelo de atenção piracicabano, tornado referência no enfrentamento da morbidade por acidentes de trabalho e por LER/DORT – sobretudo – mas, também, no de outros agravos ocupacionais. Descreve o papel da capacitação e educação permanente da equipe, da participação ativa de sindicatos e da sistematização de dados estatísticos auferida pelo SIVAT – Sistema de Vigilância de Acidentes de Trabalho, criado em Piracicaba como ferramental de informação e de análise epidemiológica. A importância do SIVAT no CEREST Piracicaba também é discutida por Almeida, Vilela e Takahashi no capítulo 8, junto ao relato e à reflexão da experiência de concepção do MAPA – Modelo de Análise e Prevenção de Acidentes de Trabalho. Os autores indicam como e por que a construção social de intervenções preventivas supera dialeticamente a dimensão sociotécnica de análise dos fatores acidentogênicos e dos acidentes em si. A legitimidade conquistada junto à sociedade, a sustentabilidade e a real integralidade das ações do CEREST mostram o papel fundamental que cabe ao Estado desempenhar, na vigilância das condições de trabalho e da saúde dos trabalhadores, criando condições de suporte à emancipação social.

Na terceira parte, um dos capítulos apresenta uma roda de conversa entre terapeutas ocupacionais (TOs) que relatam suas trajetórias e atuações nos CERESTs, bem como a busca pela identidade profissional da TO na Saúde do Trabalhador. A descrição destas trajetórias é interessante ponto de partida para uma reflexão ainda mais profunda a respeito do processo de construção da identidade profissional desta categoria neste campo, desde a década de 1990 até os dias atuais, a despeito das desconstruções de políticas públicas desde então. No que tange à identidade profissional das TOs, pareceu muito pertinente a observação de Bregalda e Lopes (capítulo13) quanto ao motivo da sensação de perda de sua identidade profissional dentro do Programa de Reabilitação Profissional do INSS. As autoras consideram que tal sensação decorre, sobretudo, dos impedimentos institucionais para a mais importante de suas funções básicas: a de despertar o exercício da potência de ação dos segurados, no retorno ao trabalho. Lembram bem que estes impedimentos não se restringem ao INSS, mas antes, são informados por um conjunto de valores e crenças a respeito do trabalho na sociedade contemporânea, no qual o aproveitamento máximo da força de trabalho é o imperativo supremo, e onde parâmetros exclusivamente quantitativos são erigidos por uma cultura de suposta excelência. As autoras trazem evidências que corroboram estudo de Medeiros2Medeiros FM. Reabilitação profissional previdenciária sob a lógica reducionista: a desconstrução neoliberal [dissertação] [Internet]. Juiz de Fora: Faculdade de Serviço Social, Universidade Federal de Juiz de Fora; 2012 [acesso 22 Out 2014]. Excerto. Disponível em: http://www.fundacentro.gov.br/politica-publicas-em-sst/bibliografia
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, o qual mostra como a gestão pública focada em resultados numéricos, quando aplicada a trabalhos sociais complexos – como a reabilitação profissional – tende a empobrecer o trabalho, desvirtuar princípios e dificultar o vínculo de confiança e respeito entre os segurados e os profissionais de saúde.

O debate se desenvolve com fecundidade também no campo teórico (em sentido “mais estrito”), onde se busca compreender a relação entre os processos produtivos e o processo saúde-doença no trabalhador, na complexidade do cenário atual. Isso se faz pelo recurso crítico aos fundamentos epistemológicos da psicodinâmica do trabalho, da ergonomia e da teoria da atividade, situando o leitor nas coordenadas dos desafios contemporâneos e das novas perspectivas de investigação e intervenção sobre tais processos. Os capítulos 1, 2 e 4 – respectivamente: “Trabalho e subjetividade” (Lancman, Jardim e Barros), “Ergonomia e trabalho” (Camarotto, Simonelli e Rodrigues) e “Aprendizagem expansiva no trabalho” (Engeström) – se inserem claramente nessa linha. Também se apresentam propostas teórico-metodológicas nos capítulos 9 e 14.

Alguns aspectos específicos de inclusão profissional de pessoas com deficiência recebem uma atenção particular no livro. Este tema é analisado a partir de visões distintas e complementares, nos capítulos 3 (Toldrá), 5 (Simonelli, Rodrigues e Camarotto) e 6 (Guimarães). No terceiro, discutem-se as barreiras existentes à inclusão desses sujeitos no mercado de trabalho, traçando-se um panorama geral do problema no país e analisando-se duas perspectivas: a dos trabalhadores incluídos com deficiência física e a de profissionais atuantes em instituições que promovem a inclusão de indivíduos com deficiências mentais. No quinto, são colocados em foco os pressupostos, métodos e etapas da implementação de um modelo de inclusão que tem como referencial teórico a análise ergonômica do trabalho (AET) adotada pela escola francesa. Os autores recuperam proposta de um modelo que utiliza a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde como referência para avaliações de caráter biopsicossocial na classificação das potencialidades do trabalhador reabilitado, e a AET como abordagem para a adaptação dos locais de trabalho3Simonelli AP, Camarotto JA, Bravo ES, Vilela RAG. Proposta de articulação entre abordagens metodológicas para melhoria do processo de reabilitação profissional. Rev Bras Saude Ocup. 2010; 35(121):64-73. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0303-76572010000100008
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. No sexto capítulo, discorre-se sobre adaptação de postos de trabalho com o apoio da ergonomia física.

A dimensão psicossocial dos agravos à saúde do trabalhador merece consideração crescente no contexto de um mundo do trabalho que acelera e intensifica o ritmo de vida, o que cria grande potencial gerador de estresse, sofrimento psíquico e adoecimento dos corpos e mentes. Divisão (corpo/mente), aliás, arbitrária – conforme assinalam Mendes e Seligman-Silva na análise do desgaste mental relacionado ao trabalho, capítulo 14 – ilustrando-a com um estudo de caso. Assim como nos mostram, revisando evidências, Araújo, Bernardes e Jesus (capítulo 9): não só a sobrecarga de trabalho, mas também a pressão no tempo de execução de tarefas, o baixo controle sobre o trabalho, altas demandas psicológicas e o estresse podem estar associados a distúrbios musculoesqueléticos. Ou como nos aponta Alencar (capítulo 12), descrevendo o círculo vicioso de dor física e sofrimento mental dos acometidos por LER/DORT. Sabe-se que os trabalhadores que procuram tratamento para LER/DORT, frequentemente, identificam os mesmos aspectos da organização do processo de trabalho como responsáveis tanto pela doença osteomuscular quanto pelos problemas de ordem psíquica4Sato L, Bernardo MH. Saúde mental e trabalho: os problemas que persistem. Cienc Saude Colet. 2005; 10(4):869-78. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232005000400011
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. E ainda, que, frequentemente, os sintomas de ordem psíquica antecedem os osteomusculares, numa espécie de pródromo destes últimos. Fica claro o valor da compreensão dos determinantes do fenômeno, para a assistência ao trabalhador adoecido (como sujeito uno, não cindido em psique e soma) e na prevenção desses agravos.

À guisa de contextualização e abrindo parênteses na resenha, faz-se oportuna alguma informação adicional que destaque a dimensão psicossocial acima referida. Resultados do Inquérito de Força de Trabalho da União Europeia mostram que, aproximadamente, 28% dos respondentes (correspondendo a cerca de 55,6 milhões de pessoas) reportaram ter sido afetados em sua saúde mental por exposição a riscos psicossociais no período 1999–2007, e que, dentre aqueles com manifesto problema de saúde relacionado ao trabalho, 14% sofreram estresse, depressão ou ansiedade5Hassard J, Teoh K, Cox T, Dewe PD, Cosmar M, Grundler R, et al. Calculating the cost of workrelated stress and psychosocial risks [Internet]. Luxembourg: Publications Office of the European Union; 2014 [acesso 13 Out 2014]. Disponível em: https://osha.europa.eu/en/publications/literature_reviews/calculating-thecost-of-work-related-stress-and-psychosocial-risks
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. No Brasil, embora nos faltem dados mais precisos e abrangentes, o panorama não é menos preocupante. Segundo informativo do Ministério da Previdência Social, os transtornos mentais vêm ocupando o terceiro lugar em quantidade de concessões de auxílio-doença acidentária aos trabalhadores brasileiros segurados6Ministério da Previdência e Assistência Social. Cai número de acidentes de trabalho e aumenta afastamentos por transtornos mentais. Prev Quest [Internet]. 2012; [acesso 2014 Out 13]; (59). Disponível em: http://www.previdencia.gov.br/arquivos/office/4_120326-105114-231.pdf
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. A propósito e não por acaso, o tema se insere na Agenda Nacional de Prioridades de Pesquisa7Ministério da Saúde. Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos. Departamento de Ciência e Tecnologia. Agenda nacional de prioridades de pesquisa em saúde. 2a ed. Brasília (DF): Editora do Ministério da Saúde; 2008 [acesso 13 Out 2014]. Disponível em: http://livroaberto.ibict.br/handle/1/495
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, na pauta: “Desenvolvimento de Modelos, Metodologias e Sistemas de Informação em Saúde, Ambiente e Trabalho”(d (d) Vide seu item 23.2.4: “Estudos sobre agravos, incluindo-se os acidentes e doenças decorrentes da sobrecarga de trabalho, exposição a fatores de risco,transtornos neurocomportamentais, endócrinos, imunológicos, mentais, câncer, distúrbios decorrentes de fatores imateriais da organização da produção, dor crônica, [...]”– grifos nossos7. ). Logo, se as demandas reveladas na esfera psicossocial da saúde do trabalhador são de grande vulto, exigindo da sociedade respostas cada vez mais qualificadas, em contrapartida, a perspectiva de trabalho aberta é imensa e resta a ser explorada.

Em sinopse, a obra possui um caráter de mosaico de preocupações, argumentos, reflexões e análises de vários atores engajados na superação dos dilemas da conflituosa relação saúde e trabalho. Fica claro – desde o início – o compromisso com o caráter emancipador da práxis, assumido pelos autores. Quanto ao livro, como contributo de interdisciplinaridade voltada à transformação da realidade social e atestada pela fértil confluência de saberes e de práticas ali contidos, a indexação sob a epígrafe de Saúde do Trabalhador lhe é perfeitamente adequada. Neste sentido, vem se somar, e com brilho próprio, a outras publicações recentes do campo, resenhadas alhures8Augusto LGS. Saúde do trabalhador na sociedade brasileira contemporânea. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2011. Resenha de: Minayo Gomez C, Machado JMH, Pena PG, organizadores. Cad Saude Publica [Internet]. 2011 [acesso 13 Out 2014]; 27(10):2071-2. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0102-311X2011001000022&script=sci_arttext
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Correa RMC. Saúde do trabalhador na sociedade brasileira contemporânea. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2011. Resenha de: Minayo Gomez C, Machado JMH, Pena PG, organizadores. Cienc Saude Colet. 2013; 18(3):893-4. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232013000300035
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-1010 Lorenzi RL. Vigilância em Saúde do Trabalhador no Sistema Único de Saúde: teorias e práticas. Belo Horizonte: Coopmed; 2013. Resenha de: Moura-Corrêa MJ, Pinheiro TMM, Merlo ARC, organizadores. Rev Bras Saude Ocup. 2013; 38(128):315-7. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0303-76572013000200018
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.

A pluralidade expressa nos seus dezenove capítulos, por outro lado, cobra seu ônus à leitura. Ao idealizarmos essa resenha, deparamo-nos com a dificuldade em identificar um fio condutor único, ou uma urdidura clara entre os textos. Esse aspecto se mostrou relacionado não apenas à pluralidade de assuntos e seus diferentes enfoques, mas, também, à heterogeneidade das abordagens e ambiências da narrativa (se alguns capítulos possuem cunho, digamos, “didático”, outros se caracterizam por maior liberdade discursiva). À medida que se avança na leitura fica nítido que a dificuldade em rastrear os percursos discursivos não é meramente textual, mas contextual. São múltiplos os polos dos quais partem as contribuições, e igualmente tantos são os seus destinos. Certos autores buscam a ressignificação de suas práticas, traduzindo-a para o “esperanto” da Saúde do Trabalhador; outros trazem conteúdos mais identificados com seus “dialetos disciplinares” de origem, embora equivalentemente críticos. Gradualmente, uma tácita complacência para com o desigual vai se produzindo no espírito do leitor e a dificuldade inicial se atenua.

Sim, grosso modo, é forçoso reconhecer que o debate proposto é amplíssimo e que reflete a crise por qual passam aparelho de Estado, ciência funcionalista e práticas de saúde distanciadas das necessidades sociais. Decerto poucos discordam disso. Menos óbvio é como desmontar fronteiras disciplinares anacrônicas e vencer o corporativismo inercial, seu patrono; enfim, como operar, na prática, a transdisciplinaridade almejada. Tais questionamentos recaem, implicitamente e com maior peso, sobre as experiências e pesquisas aplicadas reunidas na 4ª parte do livro (nunca é fácil para quem se coloca em campo de batalha!). De todo modo, assevere-se, a riqueza de resultados não se furta a comparecer, mesmo se lhes custem o abandono de determinadas certezas que uma zona de conforto costuma prover. Assim sendo, justiça seja feita ao caráter heterogêneo do livro: por que não saudá-lo por tal ousadia? As experiências relatadas servem, sem sombra de dúvida, como exemplo de atuação interdisciplinar e interinstitucional. Refere-se aqui a uma abordagem interdisciplinar que figure como uma estratégia para compreensão, interpretação e explicação de um problema, como proposto por Minayo1111 Minayo MCS. Da inteligência parcial ao pensamento complexo: desafios da ciência e da sociedade contemporânea. Pol Soc [Internet]. 2011 [acesso 13 Out 2014]; 10(19):41-56. Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/politica/article/download/2175-7984.2011v10n19p41/19592
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. Subentenda-se a dualidade conhecimento versus prática posta em jogo, no qual o principal sujeito – o trabalhador – deve participar. E constate-se: essa participação ainda é incipiente ou inexiste em larga escala, no país.

O prefácio da professora Lea Soares previne o leitor sobre o teor multifacetado da obra; todavia, ressente-se da falta de um introito, um exame adicional do conteúdo apresentado, que recuperasse o histórico do empreendimento. Este talvez coubesse aos organizadores da obra, propiciando o argumento de origem da iniciativa editorial, não informado nesta edição (embora ela seja evidentemente louvável). Especialmente porque o público-alvo não é discriminado a priori – sem qualquer demérito para organizadores e debatedores, certamente imbuídos das melhores intenções. Isso reforça nossa convicção de que caberia outra nota prefacial, em adendo à primeira. Fica a sugestão para a próxima edição.

De qualquer modo, são muitos os motivos para que se recomende a leitura do livro, evitando-se aqui uma enfadonha citação, por redundância ao já exposto. Atemo-nos apenas a um, o da necessidade de se ampliar o entendimento habitualmente restrito que se faz de promoção de ambientes de trabalho seguros e saudáveis. Pois é fato que, omitindo-se o papel que os fatores imateriais da organização da produção cumprem no processo saúde-doença, não só se subestima a carga da doença/agravo à saúde do trabalhador (pela visão reducionista do nexo causal), como, também, abre-se o caminho da culpabilização da vítima e desumanização da atenção à saúde. O livro reúne evidências empíricas para se dirigir em sentido oposto. E não tergiversa em questões éticas: opõe-se radicalmente à ideologia do ato inseguro e se posta com firmeza contra a banalização e naturalização dos riscos (que toma aqueles evitáveis por naturais). Logo, sua leitura é atualíssima e fundamental para aqueles que tenham como objetivo compreender e avaliar a nocividade do trabalho para tomar decisões, tais como gestores de serviços, auditores-fiscais, peritos do INSS e peritos judiciários, além de poder servir de inspiração a novas práticas para os profissionais que atuam em CERESTs, INSS etc.

Enfrentar os efeitos perniciosos da reestruturação produtiva e da flexibilização do trabalho sobre a saúde dos trabalhadores requer a decisiva participação do Estado, quer seja diretamente (mediante políticas públicas trabalhistas, sanitárias e previdenciárias bem informadas e efetivadas), quer de modo indireto, cuidando para que as ciências aplicadas e seus agentes (universidades e institutos de pesquisa) perenizem o interesse em ofertar informação relevante nesse campo. Essa visada não suprime, mas antes, convoca responsabilidades de um numeroso rol de atores para a missão de promover a saúde no nível local, nos ambientes de trabalho. A despeito das desigualdades que se observam entre países (ou regiões) pobres e ricos(as), parece haver um razoável repertório de estratégias de promoção da saúde do trabalhador ao alcance da sociedade organizada, em, pelo menos, boa parte do mundo, inclusive o Brasil. A publicação nos convida a pensá-las, para balizar nossa atuação. Boa leitura!

Referências

  • 1
    Simonelli AP, Rodrigues DS, organizadores. Saúde e Trabalho em debate: velhas questões, novas perspectivas. Brasília: Paralelo 15; 2013.
  • 2
    Medeiros FM. Reabilitação profissional previdenciária sob a lógica reducionista: a desconstrução neoliberal [dissertação] [Internet]. Juiz de Fora: Faculdade de Serviço Social, Universidade Federal de Juiz de Fora; 2012 [acesso 22 Out 2014]. Excerto. Disponível em: http://www.fundacentro.gov.br/politica-publicas-em-sst/bibliografia
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  • 3
    Simonelli AP, Camarotto JA, Bravo ES, Vilela RAG. Proposta de articulação entre abordagens metodológicas para melhoria do processo de reabilitação profissional. Rev Bras Saude Ocup. 2010; 35(121):64-73. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0303-76572010000100008
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  • 4
    Sato L, Bernardo MH. Saúde mental e trabalho: os problemas que persistem. Cienc Saude Colet. 2005; 10(4):869-78. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232005000400011
    » https://doi.org/10.1590/S1413-81232005000400011
  • 5
    Hassard J, Teoh K, Cox T, Dewe PD, Cosmar M, Grundler R, et al. Calculating the cost of workrelated stress and psychosocial risks [Internet]. Luxembourg: Publications Office of the European Union; 2014 [acesso 13 Out 2014]. Disponível em: https://osha.europa.eu/en/publications/literature_reviews/calculating-thecost-of-work-related-stress-and-psychosocial-risks
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  • 6
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  • 7
    Ministério da Saúde. Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos. Departamento de Ciência e Tecnologia. Agenda nacional de prioridades de pesquisa em saúde. 2a ed. Brasília (DF): Editora do Ministério da Saúde; 2008 [acesso 13 Out 2014]. Disponível em: http://livroaberto.ibict.br/handle/1/495
    » http://livroaberto.ibict.br/handle/1/495
  • 8
    Augusto LGS. Saúde do trabalhador na sociedade brasileira contemporânea. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2011. Resenha de: Minayo Gomez C, Machado JMH, Pena PG, organizadores. Cad Saude Publica [Internet]. 2011 [acesso 13 Out 2014]; 27(10):2071-2. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0102-311X2011001000022&script=sci_arttext
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  • 9
    Correa RMC. Saúde do trabalhador na sociedade brasileira contemporânea. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2011. Resenha de: Minayo Gomez C, Machado JMH, Pena PG, organizadores. Cienc Saude Colet. 2013; 18(3):893-4. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232013000300035
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  • 10
    Lorenzi RL. Vigilância em Saúde do Trabalhador no Sistema Único de Saúde: teorias e práticas. Belo Horizonte: Coopmed; 2013. Resenha de: Moura-Corrêa MJ, Pinheiro TMM, Merlo ARC, organizadores. Rev Bras Saude Ocup. 2013; 38(128):315-7. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0303-76572013000200018
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    Minayo MCS. Da inteligência parcial ao pensamento complexo: desafios da ciência e da sociedade contemporânea. Pol Soc [Internet]. 2011 [acesso 13 Out 2014]; 10(19):41-56. Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/politica/article/download/2175-7984.2011v10n19p41/19592
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Set 2015

Histórico

  • Recebido
    05 Nov 2014
  • Aceito
    23 Abr 2015
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