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Pós-graduação em Serviço Social no Brasil: há uma pedra no caminho

Resumo

Este artigo discute os caminhos da pós-graduação brasileira por meio dos Planos Nacionais de Pós-Graduação (PNPGs). São cinco planos elaborados entre os anos de 1974 e 2011, este último válido até o ano de 2020. Apresenta uma reflexão acerca do desenvolvimento da pós-graduação no âmbito do Serviço Social, buscando compreender em que medida as transformações e exigências contemporâneas, de viés neoliberal e destacadas nos últimos PNPGs, afetam as suas atividades, especialmente no que diz respeito à busca contínua da qualidade, da excelência e da consolidação do projeto ético-político-profissional.

Palavras-chave:
Pós-graduação; Planos Nacionais de Pós-graduação; Serviço Social

Abstract

This paper discusses the Brazilian postgraduate background through the National Postgraduate Plans (PNPGs). They comprise five plans developed from 1974 to 2011, the latest one being in force until 2020. It presents a reflection about the development of postgraduate programs in Social Work aiming to understand how much the changes and present demands, of neoliberal approach and highlighted in the latest PNPGs, affect Social Work activities, especially concerning the continuous search for quality, excellence and consolidation of an ethical-political-professional project.

Keywords:
Postgraduate; National Postgraduate Plans; Social Work

Introdução

Este artigo trata da implantação e do desenvolvimento da Pós-Graduação em Serviço Social no Brasil, procurando compreender o seu desenvolvimento no contexto dos Planos Nacionais de Pós-Graduação (PNPGs). Neste sentido, observa-se que a pós-graduação brasileira cresceu muito em quantidade e qualidade, especialmente via Sistema Nacional de Pós-Graduação e agências de fomento que, articuladas, possibilitaram a formação, com qualidade, de docentes, pesquisadores e demais profissionais, tanto para as instituições de ensino superior como para as demais áreas. É neste contexto que a Pós-Graduação em Serviço Social se desenvolveu, instituindo conhecimentos novos articulados à sua prática e consolidando e qualificando seu projeto ético-político-profissional. Ademais, constitui-se em expressão dos avanços alcançados pela área, fruto do trabalho coletivo desenvolvido através das instituições organizativas da categoria: Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS), Conselho Federal de Serviço Social (CFESS), Executiva Nacional dos Estudantes de Serviço Social (ENESSO). Entretanto, a despeito de todos esses avanços, ameaças de descontinuidades, rondam as agências de fomento, como a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), decorrente do agravamento da crise econômica, social, cultural e ética em âmbito global. Os reduzidos recursos destinados à pesquisa no âmbito público passam a ser compartilhados com o setor privado, objetivando potencializar a inovação, o empreendedorismo e o aumento da competitividade e da produtividade das economias.

A política nacional de pós-graduação brasileira expressa nos planos para a pós-graduação

A pós-graduação brasileira veio preencher e ampliar o contexto do ensino universitário e da formação acadêmico-profissional, impulsionando as atividades de pesquisa, embora estas já existissem atreladas ao ensino e desenvolvidas em institutos. Assim, a pesquisa foi viabilizada por meio da estrutura formal e da logística e pela sua incorporação pelos programas de pós-graduação. Duas fortes tendências marcaram a história da pósgraduação brasileira: a europeia, cujos moldes foram adotados, em 1930, no curso de Direito da Universidade do Rio de Janeiro, na Faculdade Nacional de Filosofia e na Universidade de São Paulo; e a norte-americana, a partir da década de 1950, quando começaram a ser firmados acordos entre Estados Unidos e Brasil (SANTOS, 2003SANTOS, B. S. O papel da produção do conhecimento na transformação social. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL “O PAPEL DA SOCIEDADE CIVIL NAS NOVAS PAUTAS POLÍTICAS”, 2003. São Paulo. Anais... . São Paulo: ABONG, 2003.). Nesse período, havia interesse estatal para a formação de mão de obra especializada enquanto prerrogativa para o desenvolvimento do país e, neste contexto, foi criado o Estatuto das Universidades do Brasil, por meio do decreto 21.321, de 18 de junho de 1946. Este último apontava para a pós-graduação com finalidade específica de especialização profissional. Em princípio, sem nenhuma regulamentação externa, a pós-graduação brasileira pouco impactava na educação superior, pois, com forte subordinação cultural, eram reproduzidos modelos de ciência sem identidade nacional e sem confiabilidade internacional.

É preciso reconhecer que a pós-graduação no Brasil se fortaleceu durante o período da ditadura militar, apesar de não exibir a pesquisa como tônica central. Em 1968 o governo, pressionado por movimentos sociais e estudantis impôs uma profunda reforma no ensino superior. Apoiado no padrão norte-americano, o modelo de cátedra1 1 “O modelo ou regime de cátedra (cadeira) relaciona-se ao cargo docente ocupado por um único indivíduo e especialmente relacionado a uma determinada área do conhecimento mais ou menos ampla, mas cada vez mais tendendo à especialização. O seu titular é o ‘lente catedrático’, cioso de sua posição única e prerrogativas, o ‘proprietário’ exclusivo da área de estudos para a qual foi nomeado (por concurso ou não)” (CHAMLIAN, 1984, p. 41). foi substituído pela organização departamental, sendo autorizada a contratação de professores em tempo integral, e substituídos os cursos sequenciais pelo sistema de créditos. Ademais, foram criados os níveis de mestrado e doutorado em semelhança à estrutura americana (BALBACHEVSKY, 2010BALBACHEVSKY, E. Processos decisórios em política científica, tecnológica e de inovação no Brasil: análise crítica. Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, São Paulo, p. 01-37, 2010.).

A criação das fundações do CNPq (17 de abril de 1951) e da CAPES (11 de julho de 1951) no terceiro mês do Governo Vargas identificam, como ponto estratégico de governo, a instauração dessas fundações, tornando-se fundamentais para o estabelecimento de um sistema institucional voltado ao desenvolvimento científico e tecnológico no país. No novo cenário, com o reconhecimento da titulação formal, observa-se uma nova ênfase na pesquisa e na expansão e consolidação da pós-graduação stricto sensu (mestrado e doutorado) no país, onde se desenvolveu um sistema de avaliação e qualificação dos cursos criados pela comunidade científica que provocaram, rapidamente, a proliferação dos programas de pós-graduação nas universidades brasileiras. Neste processo, o CNPq e a CAPES tornaram-se espaços de excelência para garantir o desenvolvimento tecnológico no país. Ao Conselho Nacional de Pós-Graduação, foi designada, em 1974, a responsabilidade de criação dos PNPGs (I, II, III, IV, V), que explicitam e definem diretrizes, estratégias e metas para os avanços da política de pós-graduação e pesquisa no Brasil.

O primeiro Plano Nacional de Pós-Graduação (PNPG) foi divulgado em dezembro de 1974. No entanto, sua implementação se daria de 1975 a 1979. O objeto do referido plano foi o conjunto de atividades desenvolvidas nas instituições de ensino superior e, também, nas instituições de pesquisa em nível de pós-graduação. Dentre as propostas de trabalho encontra-se a integração entre pesquisa e ensino, a formação de recursos humanos para os demais níveis de ensino e, também, para o conjunto da sociedade. A época contava com 158 áreas de concentração nos mestrados e 89 áreas de concentração nos doutorados, todos reconhecidos pelo Conselho Federal de Educação (BRASIL, 2016a). Alguns órgãos e agências financiadoras passaram, também, a tratar da formação do pessoal e, dentre estes, pode-se destacar o Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDE), o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e a Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP).

O I PNPG diagnosticou a pós-graduação brasileira em alguns pontos considerados mais sensíveis e que serviriam para embasar as diretrizes para a execução de suas políticas. O diagnóstico realizado apontou, especialmente, a necessidade de estabilização da pós-graduação, tanto do ponto de vista financeiro e institucional quanto administrativo e, dentre os objetivos e as diretrizes gerais da pós-graduação, destacou-se a formação profissional para o magistério no ensino superior e, também, a formação de pesquisadores para o desenvolvimento de núcleos e centros de pesquisa.

O II PNPG foi elaborado para implementação de 1982 a 1985 e, dentre seus objetivos, encontra-se a formação de recursos humanos qualificados para as atividades docentes, de pesquisa e técnicas para atendimento das demandas tanto dos setores públicos como privados, a exemplo dos objetivos já apontados no I PNPG. Assim, o foco deste II Plano foi o de minimizar os efeitos negativos das heterogeneidades institucionais e regionais, ou seja, buscar fortalecer as regiões consideradas mais pobres e que necessitavam de recursos humanos para enfrentar problemas fundamentais da realidade socioeconômica.

As fontes de financiamento são citadas no Plano como fundamentais à contribuição com a Política Nacional de Pós-Graduação, sendo indispensáveis para a complementação dos recursos orçamentários das instituições. Todavia, também se constituíam em fontes de instabilidade, vez que à medida que fomentavam e suplementavam, faziam-no de forma seletiva, por meio de critérios nem sempre reconhecidos na comunidade acadêmica. Ainda, a instabilidade também viria da lentidão no julgamento dos pedidos e na liberação dos recursos. Além da questão envolvendo os recursos, observa-se, por meio do Plano, que a pesquisa desenvolvida na pós-graduação estava crescendo em volume e em qualidade, e o discurso acerca de mecanismos que pudessem mensurar sua qualidade começava a ganhar corpo.

Por sua vez, o III PNPG (BRASIL, 2016b) foi idealizado para implementação de 1986 a 1989, já no governo de José Sarney. Como diagnóstico, apresenta que não havia, ainda, no país, número suficiente de cientistas que permitissem, em curto prazo, atingir a plena capacitação científica e tecnológica. Assim, um programa “agressivo” de formação de recursos humanos qualificados seria essencial, visando à independência econômica, científica e tecnológica. Dos objetivos comuns dos dois planos anteriores, quais sejam: a institucionalização da pós-graduação, a formação de recursos humanos de alto nível e a melhoria dos cursos de pós-graduação, somar-se-ão aqueles relacionados à ampliação da pesquisa nas universidades e a integração das pós-graduações ao Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia. Neste período, observa-se uma expansão acelerada dos cursos de pós-graduação: de 370 programas de mestrado cadastrados, e 89 de doutorado, chegar-se-á, rapidamente, a 787 de mestrado e 325 de doutorado (BRASIL, 2016b).

No que se refere à qualidade, tem-se as primeiras avaliações dos cursos de pós-graduação, via indicadores quantitativos e critérios qualitativos, que apontaram a necessidade de melhorias nos programas, na qualificação do corpo docente, a necessidade de revisão e implantação de novas estruturas curriculares, melhorias na própria definição e no desenvolvimento das atividades de pesquisa, aumento da produção científica docente e, ademais, melhoria na qualidade das dissertações e teses que vinham sendo desenvolvidas no âmbito dos diferentes programas. Cabe destacar a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), promulgada em 1996 (BRASIL, 2017), que estabeleceu a exigência de que as Universidades tivessem 1/3 de seu corpo docente formado por mestres ou doutores. Dessa forma, a LDB impulsionou a formação científica e tecnológica de professores e pesquisadores, assim como proporcionou o crescimento dos programas de pós-graduação tanto nas instituições públicas como privadas.

Ressalve-se que em meados dos anos 1990, juntamente com o advento da LDB, haverá a adoção pela CAPES do Modelo CAPES de Avaliação. Este modelo, conforme Bianchetti e Sguissardi (2009______. A Universidade Brasileira no século XXI: Desafios do presente. São Paulo: Cortez, 2009.), considera muito mais o que um docente-pesquisador produz do que a qualidade ou o benefício social, científico e público daquilo que é efetivamente produzido, gerando o chamado produtivismo acadêmico. Para os autores a adoção desse modelo de avaliação teria sua gênese concomitante ao Processo de Bolonha (1999) e a Declaração da Sorbonne (1998). Tais processos dizem respeito à competitividade do sistema europeu de ensino universitário e à disputa pelo mercado da educação superior. É assim que o produtivismo acadêmico ou científico, articulado aos processos de avaliação, ganhará especial importância, uma vez que o Brasil se destacava, naquele momento, entre os países emergentes e apoio dos países centrais em tempos de mundialização do capital financeiro. (SGUISSARDI, 2008SGUISSARDI, V. Regulação estatal versus cultura da avaliação institucional? Avaliação, Campinas, v. 13, n. 3, p. 857-862, 2008.). Desta maneira, o desenvolvimento da pós-graduação brasileira, especialmente em meados dos anos 1990, articula-se à reconfiguração do estado, implicando na redução dos financiamentos destinados à pesquisa, aliada a uma superprodução científica que não necessariamente traz em seu bojo qualidade ou alinhamento com as demandas sociais do país. Ainda, cabe ressaltar que a produção científica dos docentes tem sido fortemente estimuladas na direção da internacionalização (SILVA; SILVA; MOREIRA, 2014SILVA, J. V. P.; SILVA, L. L. C.; MOREIRA, W. M. Produtivismo na pós-graduação. Nada é tão ruim que não possa piorar. É chegada a vez dos orientandos. Movimento, Porto Alegre, n.4, p. 1423-1445, 2014.) com a valorização da publicação de artigos em revistas/periódicos indexados em bases internacionais. Assim, avançam para o campo acadêmico elementos como o fator de impacto de um determinado periódico e número de citações, por exemplo, ilustrando a lógica neoliberal da produção que se impõe ao conhecimento que, por sua vez, se torna mercadoria.

Depois de mais de uma década, o IV PNPG (de 2005 a 2010), já no Governo Lula, propõe a manutenção das conquistas do Sistema Nacional de Pós-Graduação (SNPG). (BRASIL, 2016c). O objetivo fundamental do IV PNPG centra-se na expansão do Sistema, assim como na ampliação do número de pós-graduandos. À CAPES caberia garantir a qualidade, via coordenação da política nacional de pós-graduação. Observa-se que de 1976 a 2004 o número de cursos stricto sensu recomendados pela CAPES subiu para 2.993 e o setor público continuou sendo o maior responsável pela oferta de mestrados e doutorados, com mais de 80% do total de ofertas. Os recursos para a pós-graduação também são discutidos neste Plano, no qual se afirma que, para além dos Fundos Setoriais, torna-se importante dispor de outros recursos que possam apoiar pesquisadores em regiões de “menor massa crítica”, e a expansão de grupos de pesquisa emergentes de maior competência e que necessitariam de apoio institucional.

Por fim, resta o V PNPG (de 2011 a 2020) que, em seu núcleo, busca dar continuidade aos planos anteriores e, neste sentido, pode-se dizer que seu foco é a expansão do SNPG, a criação de uma agenda nacional de pesquisa, o aperfeiçoamento da avaliação, a multi, inter e/ou transdisciplinaridade e o apoio aos diferentes níveis de ensino. Constitui-se esse Plano em instrumento de políticas públicas para fins de “ampliação, dinamização e adensamento do SNPG” (BRASIL, 2016d, p. 293). Tais objetivos são de suma importância, vez que é por meio do SNPG que se poderá intensificar a interação entre a universidade e a sociedade.

Evidencia, por outro lado, o aprofundamento de uma histórica política de fomento voltada a atender interesses do mercado por meio de estratégias direcionadas a formar recursos humanos para atender tais necessidades, como por exemplo, o incentivo de parcerias com o setor privado. Tal direcionamento se encontra versado em todos os planos, reafirmado e aprofundado pela Lei de Inovação Tecnológica, que visa garantir inovação por meio da articulação entre diversos setores e do incremento na interação entre universidade/ empresa. Isto significa colocar a universidade e seus pesquisadores na condição de gestores na captação de recursos no mercado em troca da oferta de serviços de inovação. Constitui-se, desta forma, na concretização do que Sguissardi (2009______. A Universidade Brasileira no século XXI: Desafios do presente. São Paulo: Cortez, 2009.) chamará de imediatismo empresarial no campo da ciência e da tecnologia, comprometendo a autonomia universitária e caracterizando a universidade contemporânea como subordinada à política industrial e aos interesses do setor produtivo. Assim, a indução estratégica, enquanto parte da Agenda Nacional de Pesquisa, se estruturará em torno do incentivo a algumas áreas temáticas, buscando a uniformidade no crescimento e, de certa forma, inibindo o diferente, o plural.

A política nacional de pós-graduação brasileira e o Serviço Social

Do até aqui exposto, pode-se apontar algumas questões relevantes, especialmente para a área das Ciências Humanas e Sociais, destacando-se, neste ínterim, o Serviço Social (AMARAL, 2012AMARAL, A. A política nacional de pós-graduação e suas relações com o Serviço Social. Revista Katálysis, Florianópolis, v. 15, n. 2, p. 230-238, jul./dez. 2012.). A maturidade acadêmica alcançada pelo Serviço Social encontra-se expressa pelo seu reconhecimento como área de conhecimento alcançado a partir de 1980, com a expansão da pós-graduação stricto sensu. Destaca-se que os avanços na formação profissional em nível de pós-graduação, desde os anos de 1980, chancelam essa maturidade acadêmica, via produção de bibliografia consistente, crítica, vasta, plural e contemporânea (ABEPSS, 2014). Esse processo teve início nos anos 1950 e 1960, passando por todas as etapas de construção e de consolidação do projeto ético-político, expresso na “direção social estratégica da profissão e no processo de renovação profissional” (NETTO, 1996NETTO, J. P. Transformações Societárias e Serviço Social. Notas para uma análise prospectiva da profissão no Brasil. Revista Serviço Social e Sociedade, São Paulo, n. 50, p. 87-132, abr. 1996., p. 109). Neste âmbito, situa-se, historicamente, a Pós-Graduação do Serviço Social. Seu papel foi fundamental na superação do viés positivista “que determinava a separação do pensar e do agir, do construir conhecimento e do intervir na realidade social” (YAZBEK; SILVA, 2005YAZBEK, M. C.; SILVA, M. O. S. Das origens à atualidade da profissão: a construção da Pós-Graduação em Serviço Social no Brasil. In: CARVALHO, D. C. B.; SILVA, M. O. S. (Orgs.). Serviço Social, Pós-Graduação e Produção do Conhecimento no Brasil. São Paulo: Cortez , 2005. p. 25-49., p. 42). A inserção de pesquisadores do Serviço Social nas agências de fomento brasileiras (CNPq e CAPES) ocorre na década de 1980. A avaliação realizada pela CAPES tem possibilitado o reconhecimento e a trajetória dos programas de Pós-graduação em Serviço Social, alcançando patamares de excelência e que se consolidaram nacional e internacionalmente. Ampliam-se as pesquisas e a produção do conhecimento, ganhando densidade e aferindo expertise à área.

Intelectuais como Setubal (1995SETUBAL, A. A. Pesquisa em Serviço Social: utopia e realidade. São Paulo: Cortez , 1995.), Faria (2003FARIA, S. Produção de conhecimento e agenda socioprofissional no Serviço Social Brasileiro. 2003. 224 f. Tese (Doutorado em Serviço Social) - Programa de Estudos Pós-graduados em Serviço Social, São Paulo, 2003.), Kameyama (2004KAMEYAMA, N. O papel da pós-graduação e da pesquisa na formação profissional. Temporalis, Brasília/DF, v. 8, p. 33-76, 2004. ), Silva e Carvalho (2005), Lara (2007LARA, R. Pesquisa e Serviço Social: da concepção burguesa de ciências sociais à perspectiva ontológica. Revista Katálysis, Florianópolis, n. 10, p. 73-82, 2007., 2008), Sposati (2007SPOSATI, A. Pesquisa e produção de conhecimento no campo do Serviço Social. Revista Katálysis, Florianópolis, v. 10, p. 15-25, 2007.), Bourguignon (2005BOURGUIGNON, J. A. A particularidade histórica da pesquisa no Serviço Social. 2005. 342 f. Tese (Doutorado em Serviço Social) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2005., 2007, 2008), dentre outros, apontam a relevância dos programas de pós-graduação na alavancagem da produção do conhecimento e da pesquisa no Serviço Social. A importância da pós-graduação sob inspiração crítica nessa área é destacada por Guerra (2011GUERRA, Y. A. D. A pós-graduação em Serviço Social no Brasil: um patrimônio a ser preservado. Temporalis, Brasília/DF, ano 11, n. 22, p. 125-158, jul./dez. 2011.), na medida em que deteria a hegemonia tanto na produção do conhecimento quanto na pesquisa, tornando o Serviço Social um interlocutor atual e reconhecido dentro do vasto campo que abrange as Ciências Sociais, “que hoje detém hegemonia na produção do conhecimento e da pesquisa, responsável pela renovação da imagem profissional e por tornar o Serviço Social contemporâneo de seu tempo, colocando-o como interlocutor reconhecido no campo das ciências sociais” (GUERRA, 2011GUERRA, Y. A. D. A pós-graduação em Serviço Social no Brasil: um patrimônio a ser preservado. Temporalis, Brasília/DF, ano 11, n. 22, p. 125-158, jul./dez. 2011., p. 126). Tal reconhecimento resta materializado na vasta produção de livros, artigos e capítulos de livros, além das teses e dissertações resultantes das pesquisas científicas desenvolvidas por docentes e discentes, potencializadas pelos grupos de pesquisa vinculados aos programas de pós-graduação stricto sensu na área do Serviço Social. Igualmente, constatam-se, no âmbito das Ciências Sociais Aplicadas, e em especial no Serviço Social, avanços referendados nos últimos relatórios da avaliação trianual e na significativa produção intelectual em consonância com o movimento da realidade (AMARAL, 2012AMARAL, A. A política nacional de pós-graduação e suas relações com o Serviço Social. Revista Katálysis, Florianópolis, v. 15, n. 2, p. 230-238, jul./dez. 2012.). Entretanto, tais análises também expõem os desafios enfrentados pelos docentes e discentes dos programas de pós-graduação.

Destarte, as discussões sobre a produção do conhecimento e sobre o papel deste conhecimento na sociedade em um contexto globalizado tornam-se centrais, especialmente em se considerando a integração econômica dos mercados, as possibilidades de comunicação científica e tecnológica e as relações que estruturam essa articulação entre economias. Assim, o conhecimento torna-se central neste processo (MENDES et al., 2005MENDES, J. M. R. et al. A pesquisa, a produção e a divulgação do conhecimento dos Programas de Pós-Graduação na área de Serviço Social. In: CARVALHO, D. B. B.; SILVA, M. O. S. (Orgs.). Serviço Social, pós-graduação e produção do conhecimento no Brasil. São Paulo: Cortez, 2005. p. 69-142.). Com essas bases, as inovações e os processos tecnológicos condicionam o desenvolvimento econômico e este, por sua vez, condiciona a produção do conhecimento em uma dinâmica intrinsecamente articulada e dependente. Ao Estado, compete buscar articulações que atendam a essas novas exigências e, de acordo com Mendes et al. (2005MENDES, J. M. R. et al. A pesquisa, a produção e a divulgação do conhecimento dos Programas de Pós-Graduação na área de Serviço Social. In: CARVALHO, D. B. B.; SILVA, M. O. S. (Orgs.). Serviço Social, pós-graduação e produção do conhecimento no Brasil. São Paulo: Cortez, 2005. p. 69-142.), o Estado passou a assumir novos papéis no que se refere ao alinhamento e, mesmo, à implementação das relações estabelecidas entre as empresas e as universidades. Esse alinhamento, por sua vez, implicou e implica, ainda, na regulamentação das relações e, também, no norte das pesquisas que são realizadas, cujo objetivo centra-se na tentativa de resolução de problemas sociais e econômicos. Essa estratégia de articulação entre o Estado, a universidade e as empresas, denominada tríplice hélice, impõe mudanças na gestão da pesquisa e na produção do conhecimento, que se encontram marcadas pela pressão empresarial. Transformações na produção do conhecimento que buscam resultados práticos alteram a condução histórica da prática científica e tecnológica adotadas pela universidade. Assim, as práticas científicas e tecnológicas decorrem e são pautadas por alianças para coprodução do conhecimento entre vários sujeitos, derivadas de projetos de pesquisa e extensão universitária, de inclusão de custos, de segurança e de relevância social. A nova articulação não raras vezes influencia e altera os critérios de qualidade tradicionais, impondo modificações e imensos desafios aos programas de pós-graduação, em face à refuncionalização do papel da universidade e do próprio conhecimento.

Revisitar os documentos que compõem os Planos de Pós-Graduação torna-se imprescindível para adentrarmos em sua retórica e premissas, nas bases que contribuíram efetivamente para a implantação, consolidação e expansão da Pós-Graduação Stricto Sensu brasileira. Ao situarmos o significado do IV PNPG na trajetória dos programas de pós-graduação, embora tratar-se de documento não oficializado como documento final, sua marca se constitui em marco significativo na implantação de várias recomendações e transformações realizadas pela Diretoria da CAPES, como a elevação dos padrões nacionais a padrões internacionais, expansão do sistema, diversificação do modelo de pós-graduação, mudanças no processo de avaliação e inserção internacional da pós-graduação. As metas propostas fundamentam-se em princípios de flexibilização, competitividade e elevação dos padrões de avaliação e visam: a expansão do sistema nacional de pós-graduação e a manutenção de sua qualidade acadêmica; diminuição das desigualdades regionais na oferta e no desempenho da pós-graduação; maior compromisso institucional da pós-graduação com a graduação, visando a melhoria e renovação deste nível de ensino (BRASIL, 2004). Somam-se a essas medidas as reformas educacionais, com repercussões significativas no modelo da Pós-Graduação brasileira como a regulamentação do mestrado profissionalizante e dos cursos de pós-graduação à distância (EAD), pontos polêmicos para a área do Serviço Social. Tais questões são reafirmadas no V PNPG (2011-2020) onde a indução estratégica é afiançada via organização de uma agenda nacional de pesquisa, que propõe temas considerados relevantes para o país (BRASIL, 2016d). Neste sentido, explicita-se a indução e o desenvolvimento de algumas áreas em detrimento de outras, neste caso as que compõem as Ciências Sociais Aplicadas e, mais especificamente, o Serviço Social. Uma das questões que se apresenta, então, é pensar o caminho dessa indução estratégica, do seu significado. Mendes e Almeida (2014MENDES, J. M. R.; ALMEIDA, B. L. F. de. As recentes tendências da pesquisa em Serviço Social. Serviço Social e Sociedade, São Paulo, n. 120, p. 640-661, out./dez. 2014.) apontam a tendência das pesquisas no Serviço Social via demandas realizadas no CNPq. Neste sentido, as autoras asseveram as dificuldades na inserção da área na divisão sociotécnica do saber. Isso implica dizer que o Serviço Social não se encontra inserido nas áreas prioritárias consideradas de ponta para o desenvolvimento. Expressões deste contexto podem ser encontradas no número reduzido de pesquisadores e de bolsistas, nos parcos recursos que são destacados aos programas de pós-graduação em Serviço Social para o desenvolvimento e incremento de pesquisas na área. Ademais, cabe ressaltar que ao docente, cada vez mais aprisionado pelas métricas e pelo produtivismo exacerbado, requerido para fins dos processos de avaliação, lhe é exigido, também, que assuma o papel de empreendedor, via articulação com o setor privado, buscando viabilidade para o financiamento de pesquisas. Esta questão traz rebatimentos em sua dedicação às atividades de pesquisa e à orientação de alunos no âmbito da pós-graduação o que, por sua vez, acarretará na redução da qualidade dos cursos que, em não estando adequados aos padrões de qualidade exigidos, perdem recursos. Assim, de pesquisador e gerador de novos conhecimentos que poderão servir às demandas sociais efetivas, como apontados nos Planos vistos, o pesquisador tem se tornado, cada vez mais, um captador de recursos, um prestador de serviços, um refém das empresas na perspectiva de alcançar uma remuneração complementar que atenda às suas necessidades, em face dos baixos salários.

Os rumos da produção do conhecimento: há uma pedra no meio do caminho

Neste contexto, não seria um erro considerar que, principalmente, o CNPq e a CAPES têm como missão implementar as ações de ciência e tecnologia no Brasil, pois, atrelados a eles, nasceram e prosperaram programas e projetos que fundaram a infraestrutura da pesquisa no país. Ademais, é preciso observar que eles guiaram e contribuíram para moldar o início do Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação que se tem hoje, e a criação do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), assentando, então, o CNPq junto à Esplanada dos Ministérios na representação da ciência-gênese do CNPq. Do mesmo modo como ocorreu com o CNPq, a FINEP também contribuiu com o Ministério da Ciência e Tecnologia e, desde a última década, tornou-se um dos principais agentes de estímulo e financiamento à inovação tecnológica no país. A estratégia de articulação entre o Estado, a universidade e as empresas, denominada tríplice hélice, impõe mudanças na gestão da pesquisa e na produção do conhecimento. Conforme visto anteriormente, no V PNPG (2011-2020), a indução estratégica, por meio da organização de uma agenda nacional de pesquisa, propondo temas considerados relevantes para o país (BRASIL, 2016d), traz, em seu bojo, a indução e o desenvolvimento de algumas áreas em detrimento de outras, neste caso as que compõem as Ciências Sociais Aplicadas e, mais especificamente, o Serviço Social. Esse fato perpetua as assimetrias não apenas regionais, mas também no âmbito da produção do conhecimento. Observe-se que o trabalho desenvolvido pelos docentes e alunos ocorre, geralmente, nas dependências da universidade, no espaço público e com o respaldo do Estado. Os discentes que recebem bolsas empresariais, e compõem este contexto denominado “parceria público/privado”, defendem interesses privados, devendo ser competitivos e, com isso, se situam na contramão dos propósitos da área.

Os contingenciamentos progressivos impostos às universidades e ao setor público brasileiro apontam para um período de intensas dificuldades. Os cortes nos recursos para as universidades atingem seu funcionamento por inteiro, pois abrange o custeio e os investimentos das instituições que dependem desses recursos para gerir sua capacidade instalada. Estima-se que os cortes no orçamento possam desencadear uma gravíssima crise na produção do conhecimento, na continuidade dos programas de pós-graduação, das pesquisas, e, ainda, na continuidade de programas de extensão e de assistência estudantil. Os pagamentos a trabalhadores terceirizados, aquisição de equipamentos, entre outras questões que compõem o cotidiano do mundo acadêmico também vivenciam este duro golpe. (LAMPERT; PINHEIRO, 2016LAMPERT, A.; PINHEIRO, M. Contingenciamento coloca em risco funcionamento das universidades. Adverso, Porto Alegre, n. 221, p. 49-54, jul./ago. 2016.). Além disso, destacam-se os rumos das mudanças estruturais indicadas em planos governamentais, que alteram a hierarquia de instituições imprescindíveis para os avanços tecnológicos. Como exemplo, cita-se aquela que envolve rebaixamento da autonomia do Ministério da Ciência e Tecnologia, CNPq, CAPES, FINEP, agências de fomento, principais agentes de estímulo e financiamento de pesquisa e inovação tecnológica no país.

O avanço de repasses públicos para o setor privado deixa clara a inversão dos investimentos de recursos públicos, sacramentados pelas mudanças na legislação brasileira e pelos ajustes fiscais que estimulam esse processo. O Fundo de Financiamento Estudantil (FIES), programa do Ministério da Educação (MEC) destinado à concessão de financiamento a estudantes matriculados em cursos superiores presenciais não gratuitos, é um exemplo da inversão protecionista ao setor privado. Em 2010, o percentual de alunos utilizando o FIES era de 6% e, em 2014, já ultrapassa os 40% (THOMAZ, 2015THOMAZ, J. Gil Vicente alerta para a privatização do ensino superior. Adverso, Porto Alegre, n. 217, p. 42-45, nov./dez. 2015.). Enfim, a título de epítome, pode-se referendar a importância dos PNPG (I, II, III, IV, V) como “chave de explicação da construção do projeto de pensar a universidade em uma perspectiva desenvolvimentista” (AMARAL, 2012AMARAL, A. A política nacional de pós-graduação e suas relações com o Serviço Social. Revista Katálysis, Florianópolis, v. 15, n. 2, p. 230-238, jul./dez. 2012., p. 232). Tal perspectiva, historicamente, vai direcionando um novo estilo para a produção do conhecimento, calcada na tríplice hélice (TRIGUEIRO, 1999), desenvolvido na articulação entre Estado, universidade e empresa. Aliado a isso, há o choque neoliberal consagrado pela criação das Propostas de Emenda Constitucional (PEC), cuja finalidade é garantir a atividade econômica que beneficie, irrestritamente, a consolidação e a espoliação do capital, em detrimento da exclusão e da restrição das garantias sociais, dos direitos sociais. Este contexto é marcado pela hegemonia do capital financeiro, cuja orientação ideológica é o neoliberalismo, dominante no cenário político mundial. Este é um ponto crucial para o Serviço Social, cujo “projeto de profissão é fruto e expressão de um amplo movimento de lutas pela democratização da sociedade e pela defesa intransigente dos direitos humanos” (IAMAMOTO, 2007IAMAMOTO, M. V. O Serviço Social em tempo de capital fetiche: capital financeiro, trabalho e questão social. São Paulo: Cortez, 2007., p. 226). Neste sentido, são inúmeros os desafios a serem enfrentados pela pós-graduação e pela produção do conhecimento no âmbito do Serviço Social e das Ciências Humanas e Sociais, que, segundo Simionatto (2005SIMIONATTO, I. Os desafios na pesquisa e na produção do conhecimento em Serviço Social. Temporalis, Recife, ano 5, n. 9, p. 07-21, jan./jun. 2005.), encontram-se amalgamados pelas graves dificuldades financeiras, incertezas, insegurança, enfraquecimento das lealdades e pelo empobrecimento da convivência.

Considerações finais

O desenvolvimento da pesquisa e da pós-graduação brasileira, de um modo geral, teve seus objetivos, metas e alcances delineados pelos Planos Nacionais de Pós-Graduação. Tais planos foram fundamentais para que se pudesse pensar em um norte para a pós-graduação brasileira, alicerçado na criação de um Sistema Nacional de Pós-Graduação que pudesse, ainda, articular crescimento e qualidade. No que tange ao Serviço Social, é também via programas de pós-graduação que a área encontra reconhecimento, coroando o processo de consolidação de seu projeto ético-político. Todavia, o que se observa hodiernamente é um direcionamento na produção do conhecimento, via pautas e agendas nacionais de pesquisa que determinam, em última instância, o que será objeto do conhecimento, normatizando-o.

Assim, por meio da indução estratégica há, em verdade, uma seletividade programada da produção do conhecimento, cujo fundamento se encontra na tripla hélice, via pressão empresarial, esmaecimento do Estado e, ademais, referendada pelas denominadas Propostas de Emenda à Constituição que, de maneira geral, instituem a legalização do retrocesso e da retirada de direitos sociais. Destarte, as mudanças estruturais e institucionais na coordenação das áreas de ensino, pesquisa e pós-graduação coloca imensos desafios à ciência e à produção do conhecimento que, diante desse contexto, situam-se entre o desastre e a falência da pós-graduação brasileira. Privilegiar a formação sólida, não aceitar passivamente a mercantilização, o aligeiramento e a banalização da formação profissional: será possível? Como priorizar, neste cenário carregado de normas, direcionamentos e políticas, uma produção com relevância social que, de fato, responda às necessidades e interesses da sociedade e que esteja a serviço da classe trabalhadora, dos movimentos sociais e de suas lutas? A ABEPSS, associação científica, vem contribuindo para tornar a Pós-Graduação mais orgânica nesta relação, apoiando iniciativas que contemplam a solidariedade entre os programas, com o propósito de alavancar aqueles que se encontram mais fragilizados diante desta perversa lógica. Os desafios na atualidade são grandes, dentre eles os impactos da contra reforma universitária brasileira no contexto da reestruturação capitalista.

No âmbito das pesquisas, compete valorizar indicadores de medida do impacto social do conhecimento produzido nos cursos de pós-graduação e a sua função social, questionar a relevância das pesquisas, como estão conectadas com os interesses da sociedade? É preciso refletir sobre a veiculação e a socialização da produção científica no campo do Serviço Social, no sentido de possibilitar visibilidade junto aos sujeitos sociais individuais e coletivos, muitas vezes sujeitos das próprias investigações realizadas. Como medida de internacionalização, enfatiza-se a interlocução privilegiada estabelecida do Serviço Social brasileiro com o Serviço Social Latino-Americano na construção de um Serviço Social Crítico, estreitando laços com os países desses territórios, em relações cooperativas. Ademais, cabe manter as táticas e estratégias de enfrentamento às tendências de aligeiramento do conhecimento, dentre elas a do Mestrado Profissional, demanda que tem sido colocada pela CAPES para a área desde os anos 2000 e, à época, corajosamente enfrentada pelos programas de pós-graduação em Serviço Social, por considerarem que a mesma, além de favorecer a mercantilização do ensino no âmbito da pós-graduação, empobrece e fragiliza a área diante das demais, tendendo para a extinção dos cursos de mestrado acadêmico. Além disso, uma questão fundamental diz respeito ao conhecimento produzido na formulação, gestão, implementação e avaliação das políticas sociais e no enfrentamento do binômio crescimento-desigualdade (GUERRA, 2011GUERRA, Y. A. D. A pós-graduação em Serviço Social no Brasil: um patrimônio a ser preservado. Temporalis, Brasília/DF, ano 11, n. 22, p. 125-158, jul./dez. 2011.). Entretanto, faz-se imperativo romper com as barreiras burocráticas impostas pelas agências de fomento, regidas e sustentadas por sistemas tecnológicos intocáveis e que mantém um sistema de registros que não expressa os avanços do Serviço Social. Por derradeiro, cabe referir à forma de organização e localização do Serviço Social no CNPq, situado junto ao comitê de Psicologia, o que contribui para o esgarçamento dos já escassos recursos para a área. Soma-se a estas dificuldades aqueles decorrentes das transformações impostas já no IV PNPG, embasada na flexibilização, competitividade, padrões de avaliação essencialmente quantitativos e centrados no produtivismo. Para o Serviço Social, significa reconhecer que “há uma pedra no meio do caminho”, exposta na imediaticidade da vida social, permeada e orientada pela voracidade de uma nova ofensiva do mercado financeiro exigindo, da área, reafirmar e garantir os princípios e a direção social do conhecimento, cuja centralidade é a essência na construção dos destinos da humanidade e da emancipação humana.

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Nota

  • 1
    “O modelo ou regime de cátedra (cadeira) relaciona-se ao cargo docente ocupado por um único indivíduo e especialmente relacionado a uma determinada área do conhecimento mais ou menos ampla, mas cada vez mais tendendo à especialização. O seu titular é o ‘lente catedrático’, cioso de sua posição única e prerrogativas, o ‘proprietário’ exclusivo da área de estudos para a qual foi nomeado (por concurso ou não)” (CHAMLIAN, 1984, p. 41).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Aug 2017

Histórico

  • Recebido
    15 Nov 2016
  • Aceito
    29 Jan 2017
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