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“Questão social”, divisão sexual do trabalho e saúde mental na pandemia

“Social issue”, sexual division of labor and mental health in the pandemic

Resumo:

O presente trabalho analisa as repercussões do acirramento da “questão social” e da divisão sexual do trabalho na saúde mental das mulheres no contexto de pandemia (Covid-19) no município de Aracati-CE. A pesquisa, com abordagem qualitativa-quantitativa, ancorou-se na teoria social crítica de Marx e foi processada em três etapas: a etapa exploratória, a pesquisa bibliográfica e a pesquisa de campo. Esta última, realizada com doze mulheres usuárias do Caps II de Aracati através de entrevista semiestruturada, com suporte do uso de dados indiretos e diretos. Conclui-se que houve a ampliação da produção do sofrimento mental em virtude da agudização da “questão social” e da intensificação da divisão sexual do trabalho no contexto da pandemia.

Palavras-chave:
“Questão social”; Saúde Mental; Pandemia; Mulher; Divisão sexual do trabalho

Abstract:

This paper analyzes the implications of the intensification of the “social issue” and the sexual division of labor in the mental health of women in the context of a pandemic (COVID-19) in the municipality of Aracati-CE. The research is based on Marx's critical social theory and has a qualitative-quantitative approach comprising three stages: the exploratory stage, bibliographical research and field research. The study was carried out with twelve women through semi-structured interviews and showed that they experience a process of production of mental suffering due to the worsening of the “social issue” and the sexual division of labor in the current pandemic.

Keyword:
Social issues"; Mental health; Pandemic; Woman; Sexual division of labor

Introdução

A Organização Mundial de Saúde (OMS), desde 30 de janeiro de 2020, alertou para o surto de Covid-19, ocasionado pelo novo coronavírus (Sars-Cov-2), tornando-se uma emergência em saúde pública Internacional (OMS, 2020). Em menos de dois meses, essa doença foi caracterizada como uma pandemia1 1 Uma epidemia ganha forma quando há ocorrência excedente de casos de uma doença em determinados locais geográficos ou comunidades. Já a pandemia é a disseminação mundial de uma doença (epidemia). . Além de vacina, a medida mais eficaz de prevenção foi o isolamento social. Ao passo que essa alternativa diminuiu a capacidade de circulação do vírus, incidiu no aumento, antes já existente, do desemprego, de vínculos trabalhistas precários, insegurança social e violência, incluindo à doméstica2 2 Art. 5º Para os efeitos desta Lei configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial (BRASIL, 2006). , por exemplo, sendo as mulheres em sua maioria as mais atingidas.

Expansão do desemprego, diminuição de salários, sobrecarga e ampliação da precarização no trabalho, são situações sentidas na vida das mulheres, e é o que apontam os dados da pesquisa realizada pela Sempreviva Organização Feminista (SOF, 2020SOF. O trabalho e a vida de mulheres na pandemia. Relatório pesquisa Sem Parar. Gênero e Número e Sempreviva Organização Feminista (SOF), 2020.), que teve como objetivo perceber a realidade do trabalho e da vida de mulheres na pandemia no Brasil. A pesquisa informou que 50% das mulheres passaram a cuidar de alguém na pandemia; já 41% delas seguiram trabalhando com manutenção de salários, mas relataram trabalhar ainda mais na quarentena. Para 40% das mulheres, a pandemia e o isolamento social colocaram a sustentação da sua casa em risco. É válido destacar que a maioria dessas mulheres é negra e de baixa renda, e chega a 58% o índice de desemprego.

O cenário descrito acima expõe a complexificação da “questão social”3 3 Para tanto, é válido destacar que a “questão social” diz respeito ao conjunto das expressões das desigualdades sociais constituídas na sociedade capitalista madura, enfrentadas por intervenção Estatal. Tem origem no caráter coletivo da produção que em contraposição, se tem a posse privada das riquezas produzidas pela ação humana — o trabalho —, do que é necessário para a sua realização, como também do que é produzido. É nesse sentido que a “questão social” apresenta disparidades econômicas, políticas e culturais das classes sociais, através de relações de gênero, singularidades étnico-raciais e formações regionais [...] (IANNI, 1992 apud IAMAMOTO, 2001, p. 16-17). ,4 4 As aspas utilizadas na expressão “questão social” têm como objetivo chamar atenção e diferenciar-se das perspectivas conservadoras sobre esse fenômeno que é próprio da sociedade burguesa, tal como indica José Paulo Netto (2001). , mas também da divisão sexual e racial do trabalho. Essa divisão reservou às mulheres a esfera reprodutiva e aos homens a produtiva, produzindo relações desiguais e hierárquicas entre os sexos, fundadas na exploração e na opressão dos homens sobre as mulheres. Por isso, às mulheres são destinados os trabalhos domésticos, muitos deles não remunerados, enquanto aos homens, em maioria, os espaços de trabalho tidos como produtivos e de poder (HIRATA; KERGOAT, 2007HIRATA, H.; KERGOAT, D. Novas configurações para a divisão sexual do trabalho. Cadernos de Pesquisa, v. 37, n. 32, p. 595-609, 2007.).

Anteriormente à pandemia de Covid-19 e à necessidade de distanciamento social, as manifestações emocionais femininas estavam relacionadas tanto às modificações hormonais no período pré-menstrual, do pós-parto e da menopausa, quanto às desigualdades de gênero, que são responsáveis pelos fenômenos como sobrecargas no trabalho e a violência contra a mulher. Entretanto, as limitações sociais advindas da pandemia implicaram no crescimento dos índices de violência doméstica e gravidez indesejada, por conta da maior permanência do homem em casa, processos críticos para o aumento do sofrimento psíquico nas mulheres (SOUZA; SOUZA; PRACIANO, 2020). Embora já estivessem presentes na vida das mulheres, essas situações se intensificaram, produzindo impactos ainda mais severos no mundo do trabalho, na vida e, consequentemente, na saúde mental das mulheres.

Com base nesse horizonte, a pesquisa em questão teve como objetivo analisar as implicações do acirramento da “questão social” e da divisão sexual do trabalho na saúde mental das mulheres no contexto da pandemia de Covid-19 no município de Aracati-CE. O lócus de estudo foi o Centro de Atenção Psicossocial (CAPS II)5 5 Atendimento a todas as faixas etárias, para transtornos mentais graves e persistentes, inclusive pelo uso de substâncias psicoativas, atende cidades e ou regiões com pelo menos 70 mil habitantes (BRASIL, 2017). e o público as mulheres usuárias, já que foram elas quem mais buscaram o serviço no primeiro ano de pandemia. A condução dessa pesquisa foi empreendida em três etapas: a etapa exploratória, a de pesquisa bibliográfica e a pesquisa de campo. O estudo se ancorou na teoria social crítica de Marx e fez uso da abordagem qualitativa-quantitativa, através dos dados indiretos, presentes em plataformas on-line6 6 Tais como: Organização Mundial de Saúde, Sempreviva Organização Feminista, ONU Mulheres, Revista Azmina e Instituto Vita Alere. , e dados diretos disponíveis nos prontuários e nas entrevistas semiestruturadas realizadas com 12 usuárias do citado serviço, examinados pela técnica de análise de conteúdo. A pesquisa seguiu os princípios éticos da Resolução nº 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde (CNS) e foi submetida ao Comitê de Ética da Escola de Saúde Pública do Ceará (ESP/CE), tendo recebido o parecer favorável de nº 4.847.421.

Para melhor exposição dos resultados, estruturou-se o texto em dois itens. O primeiro, com uma breve contextualização da “questão social” e das relações de gênero na pandemia e seus reflexos na precarização da vida e da saúde mental das mulheres. Já o segundo, caracteriza a condição de vida e trabalho das mulheres acompanhadas pelo Centro de Atenção Psicossocial (CAPS II) de Aracati-CE na pandemia, bem como analisa as inferências dos processos vivenciados no período de isolamento social em sua carga mental, considerando, particularmente, a divisão sexual do trabalho e as violências.

“Questão social”, divisão sexual do trabalho, pandemia e saúde mental das mulheres

A pandemia da Covid-19 mudou substancialmente a vida de todos no globo. Um ano depois dos primeiros casos da doença, autorizou-se o uso emergencial de vacinas em alguns países, dentre eles o Brasil.

Apesar do avanço da vacinação no País, o cenário ainda exige cuidado, o que inclui o distanciamento social. Mas, sobretudo, respostas comprometidas e imperiosas às sequelas do acirramento da “questão social”. Processos que reverberam diretamente na saúde mental da população, principalmente, das mulheres, pois são elas que sentem na pele, de maneira singular, toda a sobrecarga física e mental que esse momento impõe. Inclusive, considerando-se a divisão sexual e racial do trabalho em que as mulheres negras ocupam, em maioria, as profissões do cuidado e a linha de frente no enfrentamento à pandemia, conforme indica a Diretora Executiva da ONU Mulheres, Phumzile Mlambo-Ngcuka (2020):

Olhe em volta e verá que as mulheres formam a maior parte das tropas da linha de frente na guerra contra a pandemia da Covid-19. Elas cuidam de pessoas doentes, idosas, famílias e crianças. Globalmente, as mulheres compõem 70% da equipe médica e de apoio e 85% das enfermeiras em hospitais, e metade dos médicos nos países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento do Comércio) são mulheres. [...] Além disso, 90% das atividades de assistência a longo prazo e até 10 vezes mais trabalho doméstico não remunerado são realizadas por mulheres em todo o mundo. Com o fechamento de escolas e creches, a crise da Covid-19 apenas ampliará a pressão dos cuidados não remunerados e do trabalho doméstico sobre as mulheres. No entanto, essas contribuições essenciais, muitas vezes, passam despercebidas e não são recompensadas, o que significa que as mulheres podem acabar sofrendo mais enquanto salvam o mundo (ONU MULHERES, 2020).

Historicamente, são as mulheres responsabilizadas pelo cuidado dos lares, dos filhos e por quem está ao seu redor. Por isso, agora vivenciam uma enorme sobrecarga amplificada na pandemia. Destaca-se que, junto a esses processos de responsabilização da mulher, somam-se as dificuldades decorrentes da insegurança financeira decorrente de

um aumento significativo no desemprego e subemprego globalmente. Muitas mulheres — 740 milhões das quais trabalham na economia informal com empregos que oferecem pouca ou nenhuma proteção social — agora enfrentam grave insegurança econômica e poucas opções (ONU MULHERES, 2020).

A “questão social” e suas expressões, como a desigualdade de gênero e raça no mercado de trabalho, impõe às mulheres a condição de subalternidade, comparando-se aos homens, ocupam os espaços mais precários e com menores salários. Inúmeras mulheres vivem em situação de subemprego ou desemprego, submetidas ao trabalho doméstico não remunerado, condição socialmente construída como espaço “natural” e de responsabilidade feminina. É nessa direção que para Cisne (2018):

A divisão sexual do trabalho resulta de um sistema patriarcal capitalista que por meio da divisão hierárquica entre os sexos, confere às mulheres um baixo prestígio social e as submete aos trabalhos mais precarizados e desvalorizados. Há, portanto, uma determinação social e não natural, para a existência da divisão sexual do trabalho. (CISNE, 2018, p. 117-118).

Hirata e Kergoat (2007)HIRATA, H.; KERGOAT, D. Novas configurações para a divisão sexual do trabalho. Cadernos de Pesquisa, v. 37, n. 32, p. 595-609, 2007. nos explicam que a divisão sexual do trabalho é constituída de maneira histórica e social, caracterizada pela destinação dos homens para a esfera produtiva e as mulheres para a reprodutiva; consequentemente, posiciona-se os homens em lugares e atividades que possuem maior valor social.

Para Cisne (2015), aCISNE, M. Direitos humanos e violência contra as mulheres: uma luta contra a sociedade patriarcal-racista-capitalista. Serviço Social em Revista, v. 18, n. 1, 2015. Disponível em: http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/ssrevista/article/view/23588/17726. Acesso em: 08 mar. 2021.
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naturalização dos papéis ditos femininos serve de forma direta aos interesses do capital e seu objetivo de expansão dos lucros, pois diminui o custo da reprodução da força de trabalho, uma vez que as atividades de cuidado não são consideradas trabalho, mas dons de uma suposta natureza feminina. É nesse sentido que, mesmo com a inserção das mulheres no mercado de trabalho, elas continuam com as responsabilidades domésticas não remuneradas enfrentando extensa jornada de trabalho, com baixos salários e insuficiente proteção trabalhista.

Essa complexa contextura para as mulheres foi adensada pelo governo Bolsonaro com o contínuo desmonte e precarização das políticas sociais. Uma gestão autoritária, machista e misógina que trouxe (e ainda traz) impactos diretos na vida das mulheres, cada vez mais responsáveis pelo sustento de suas famílias. A Revista AzMina (2021)REVISTA AZMINA. Bolsonaro não usou um terço dos recursos aprovados para políticas para mulheres desde 2019. Disponível em: https://azmina.com.br/reportagens/bolsonaro-nao-usou-um-terco-dos-recursos-aprovados-para-politicas-para-mulheres-desde-2019/. Acesso em: 08 mar. 2021.
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apontou que Bolsonaro não aplicou um terço dos recursos aprovados para políticas para mulheres desde 2019; um valor que poderia pagar um ano inteiro de auxílio emergencial de R$ 375 para quase 84 mil mães chefes de família.

Essa negligência do governo Bolsonaro reverbera nas condições básicas de sobrevivência das mulheres no contexto de uma persistente crise política, sanitária e social. O sofrimento das mulheres se expressa das mais diversas formas, inclusive, na violação ao direito fundamental à alimentação, frequentemente visibilizada por registros na Internet como as longas filas de açougues para receber doação de ossos ou buscas de sobras de comidas em carros de coleta de lixo. Em ambas as situações, a maioria era de mulheres negras, expressão muito forte do racismo estrutural7 7 [...] o racismo é uma decorrência da própria estrutura social, ou seja, do modo “normal” com que se constituem as relações políticas, econômicas, jurídicas e até familiares, não sendo uma patologia social e nem um desarranjo institucional. O racismo é estrutural. Comportamentos individuais e processos institucionais são derivados de uma sociedade cujo racismo é regra e não exceção. O racismo é parte de um processo social que “ocorre pelas costas dos indivíduos e lhes parece legado pela tradição”. [...] o racismo, como processo histórico e político, cria as condições sociais para que, direta ou indiretamente, grupos racialmente identificados sejam discriminados de forma sistemática (ALMEIDA, 2018, p. 38-39). , demonstrando a cor/raça e o sexo das pessoas que mais sofrem neste País.

Ademais, na pandemia da Covid-19, a violência doméstica foi intensificada no contexto de isolamento social. De acordo com a ONU Mulheres (2020), estima-se que diariamente 137 mulheres são mortas por alguém da sua própria família. Percebe-se, portanto, o quanto a violência está intrínseca à vida das mulheres numa sociedade machista8 8 O machismo é definido como um sistema ideológico de representações simbólicas, que mistifica as relações de exploração, de dominação, de sujeição entre o homem e a mulher (DRUMONT, 1980, p. 81). e patriarcal9 9 O patriarcado, embora atinja de forma estrutural a sociedade, dirige suas implicações centralmente às mulheres [...]. Assim, ainda que atinja outros sujeitos, a lógica que estrutura o patriarcado é de privilégio e dominação masculinos relacionados à subalternização e à invisibilização das mulheres e do que é associado ou considerado e identificado como feminino [...] permeia a construção social do sexo feminino, que se associa ao frágil, ao desvalorizado, ao subalterno e ao subserviente, enquanto o “modelo” patriarcal do homem é o da força, virilidade, poder e dominação (CISNE; SANTOS, 2018, p. 43). , em que o homem vê a mulher como sua propriedade. Para Saffioti (1987, pSAFFIOTI, H. I. B. O poder do macho. São Paulo: Moderna, 1987.. 79-80), “dada sua formação de macho, o homem julga-se no direito de espancar sua mulher. Esta, educada que foi para submeter-se aos desejos masculinos, toma este “destino” como natural.” Todo esse cenário mencionado acima reflete diretamente na saúde mental das mulheres.

A pesquisa realizada pelo Instituto Ipsos10 10 Instituto líder global em pesquisas de mercado do mundo. evidenciou que na pandemia, em nível mundial, as mulheres apresentaram as maiores taxas de ansiedade, depressão, esgotamento, medo do futuro e perda da autoconfiança. São elas, também, que tem pouco tempo para cuidar de si e se dedicar a sua saúde e não contam com a ajuda de outras pessoas. No Brasil, não é diferente. Dados da mesma pesquisa mostram que 33% dos homens sofrem de ansiedade enquanto 49% das mulheres vivenciam esse sofrimento. São as mulheres também quem mais possuem dificuldades para dormir; 19% dos homens em contraposição a 33% das mulheres, ou seja, quase o dobro. Quanto aos sintomas de depressão, 7% dos homens no Brasil apresentam em contraposição aos 14% de mulheres.

Através do exposto, identifica-se como a intensificação da divisão sexual do trabalho e do acirramento da “questão social”, em tempos de pandemia, mostra-se mais latente e vulnerabilizam a saúde mental das mulheres. Frente a esse cenário, buscou-se compreender esse fenômeno na particularidade do município de Aracati-CE, a partir das vivências das usuárias do Centro de Atenção Psicossocial (CAPS II), um serviço voltado para o cuidado em saúde mental.

Mulheres na pandemia: o que elas têm a nos dizer?

O contexto pandêmico adensou as expressões da “questão social” e das desigualdades de gênero, próprias da divisão sexual do trabalho, produzindo rebatimentos severos à saúde mental das mulheres, algo percebido na experiência da residência multiprofissional em saúde, na ênfase saúde mental coletiva, vivenciada no CAPS II de Aracati.

Ao adentrar nas histórias de vida de 12 mulheres que buscaram o serviço pela primeira vez no período da pandemia, identificamos que o cenário supracitado incidiu negativamente nas suas condições de vida e, consequentemente, na sua saúde mental. Logo, buscamos apreender: quem são essas mulheres? São mulheres cisgênero, de 24 a 61 anos, pretas e pardas, e heterossexuais. Quatro delas são solteiras, quatro casadas, três possuem união estável e uma é divorciada, sendo que nove possuem filhas/os.

Quanto à escolaridade e ocupação, quatro concluíram o ensino médio, seis delas não conseguiram alcançar essa formação, sendo que três, sequer, concluíram o ensino fundamental. Todas possuem profissões, as quais são: fisioterapeuta, diarista, marisqueira, manicure, vendedora de roupas e perfume, atendente, promotora financeira, agricultora, dona de casa, cabelereira, professora e agente comunitária de saúde.

Todas as mulheres foram encaminhadas para o CAPS por profissionais da rede de saúde após queixas de ansiedade e depressão, mas também por ideação suicida ou tentativas de suicídio. Os transtornos mentais mais comuns são: F32.1 - Episódio depressivo moderado; F32.2 - Episódio depressivo grave sem sintomas psicóticos; F33.2 - Transtorno depressivo recorrente, episódio atual grave sem sintomas psicóticos e F41.1 - Outros transtornos ansiosos.

Quando observadas as condições de vida e trabalho, um número significativo pontuou a extensiva e extenuante carga-horária de trabalho na pandemia como fator crítico à saúde mental, e por isso buscou o CAPS:

As tarefas aumentaram muito na pandemia, principalmente ao telefone, pelo Whatsapp. Às vezes cinco seis horas da manhã atendo o povo de camisola querendo saber de remédios, de receitas... Isso é muito negativo pra saúde mental, por eu já ter ansiedade e não conseguir separar o pessoal do profissional. Nem final de semana eu saio. Acaba que somos responsáveis por muitas famílias, muitas colegas adoeceram por isso. Essas campanhas de vacinações foram complicadas, jogaram muitas coisas pra agentes de saúde... Tudo isso vai juntando, sobrecarrega e ainda tem gente que pergunta por que adoeço. (Girassol).

A precarização da renda das mulheres é uma realidade evidente, pois sete vivem com renda familiar até um salário mínimo, duas com até dois salários, três entre dois e três salários. Inclusive, a metade delas recebe benefício de transferência de renda, majoritariamente, do Programa Bolsa Família, configurando-se como a única renda da casa.

Ademais, nove mulheres não foram beneficiadas com o auxílio emergencial durante a pandemia. Das que receberam, havia uma manifesta preocupação com a sua finalização: “Esse é o último mês. Já estou preocupada com esse fim. Só a misericórdia. As faxinas tá difícil chamar, eles mesmo estão fazendo por conta própria por conta da pandemia e quando chamam querem pagar 30,00, 50,00 para trabalhar o dia todo, aí não dá.” (Tulipa).

Sobre isso, Pimenta (2020, pPIMENTA, D. Pandemia é coisa de mulher: Breve ensaio sobre o enfrentamento de uma doença a partir das vozes e silenciamentos femininos dentro das casas, hospitais e na produção acadêmica. Tessituras, Pelotas, v. 8, n. 1, 2020.. 16) destaca que a pandemia da Covid-19 “tem rosto de mulher”, não somente por ser a maioria das cuidadoras na área da saúde, mas também no âmbito doméstico, com responsabilidade de gerir a alimentação, a água e os auxílios emergenciais do Estado. E mesmo as que não se configuram como grupo de risco à doença, estão na linha de frente do trabalho doméstico e do cuidado, portanto, as que mais sofrem os impactos “tanto no que tange ao vírus, quanto por estarem, muitas vezes, desassistidas financeiramente, mesmo sendo chefes de família”.

Cada vez mais, as mulheres têm assumido o lugar de chefes de família (fenômeno expresso entre as entrevistadas). A maioria, (9), disse ser a provedora da casa, mesmo que algumas compartilhem dessa responsabilidade com outra pessoa. E também são elas as responsáveis diretas pelas atividades domésticas e de sustento da casa, tais como: fazer comida; lavar roupa; limpar casa; cuidar de filhas/os; ensinar atividades escolares, dentre outros. A maior parte das mulheres, (8), afirma realizar mais de cinco tarefas no dia, referindo amplificação das atividades domésticas na pandemia, por vezes até dividem as responsabilidades da casa com alguém, mas sempre são as responsáveis centrais.

De acordo com Santos e Silva (2020), a feminização da pobreza se intensificou na pandemia, repercutindo na saúde mental das mulheres. Essas situações estiveram presentes nas falas das nossas entrevistadas quando perguntadas sobre os impactos sentidos:

Impacto negativo, porque a gente não foi preparado pra isso, pra esse aumento, esse gasto, pelo contrário, os gastos com ensino remoto triplicaram na água, na energia, na internet e quando fiquei sem trabalhar fiquei em uma condição difícil sem acesso a auxílio-doença, não tinha como pagar as contas, o aluguel. Eu vivia de ajuda das pessoas, da paróquia, com cesta básica, com remédios, porque todos eram comprados e não recebemos auxílio emergencial. E esse ano continua ruim, não recebemos dinheiro pra ter mais internet em casa, o tempo todo foi tudo por nossa conta. (Margarida).

Todas as entrevistadas assumiram o cuidado de algum familiar no período, sendo perceptível o cansaço físico e mental, além da impossibilidade do cuidado pessoal, que é deixado de lado em detrimento de outros, como as atividades de lazer, cultura e esporte. Esse cenário se agravou mais ainda para as mulheres que possuíam filhas/os em estudo remoto, sendo recorrentes as falas sobre dificuldade neste processo:

Ele tava indo pro reforço, mas já tá com dois meses sem ele ir. Ele tá sem fazer as tarefas da escola, porque eu sou burrinha e não tenho mais dinheiro pra pagar aula particular. (Calêndula).

No meu caso tenho que fazer a atividade dela a noite porque trabalho e a noite ela não quer. Às vezes tenho outras prioridades e faço duas atividades em um dia só. (Violeta).

Infelizmente, a violência doméstica ainda é bastante presente na vida das mulheres, sendo adensada na pandemia, em que cinco delas disseram terem sido vitimadas. Uma realidade que preocupa, visto que o município não possui delegacia da mulher e nem centros especializados ao atendimento em situações de violência contra a mulher. Calêndula, por exemplo, foi vítima de violência moral e psicológica pelo atual companheiro: “Quando eu usava droga ele dizia que eu era prostituta e que eu me prostituía pra comprar droga. Por isso discutimos”. Já a Girassol sofreu violência física, psicológica, moral e sexual do ex-marido, trazendo prejuízos diretos para sua saúde mental, inclusive, com risco de suicídio, conforme expresso em sua fala:

Na pandemia eu sofri antes e durante. Só que na pandemia como fiquei direto em casa ai tive crises de ansiedade e depressão mais forte. Ele dizia que era frescura. Ele bebia muito. Eu tinha relação sexual, me sentia estuprada, na hora da relação ele me chamava de puta. Isso é estupro porque fui forçada e no outro dia ele pedia desculpa, fazia de conta que nada tinha acontecido e fazia tudo de novo na semana seguinte... Ele me deixava pra baixo dizendo que eu estava gorda, feia e se eu me arrumasse demais ele dizia que era pra outra pessoa, tudo isso era pressão psicológica... Até onde eu tive minha tentativa de suicídio. Ele me ameaçou de morte depois da separação. Ele disse que ia dar dez tiros na minha cabeça.

Para Brito et al. (2020), aBRITO, L. et al. Impactos sociais da Covid-19: uma perspectiva sensível às desigualdades de gênero. Observatório Covid-19, 2020. violência doméstica pode ser intensificada em momentos de emergência em saúde pública, como a pandemia da Covid-19, mesmo em mulheres que não tinham histórico de vítima de violência. Isto porque o confinamento traz maior suscetibilidade das mulheres às múltiplas formas de violência, pois os efeitos econômicos da pandemia e o isolamento social podem intensificar os riscos de violência.

A OMS (2015) destaca que a violência contra a mulher traz muitos danos para a saúde, como feminicídio, suicídio, infecção pelo HIV/AIDS e mortalidade materna. A saúde mental pode ter danos profundos, como a manifestação de transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), depressão, ansiedade e transtornos associados uso problemático de álcool e drogas. As mulheres que sofrem violência doméstica têm probabilidade duas vezes maior de ter depressão do que as demais, e duas vezes maior chance de desenvolver transtornos mentais associados ao álcool.

Muitas foram as adversidades, subjetivas e objetivas, vivenciadas pelas mulheres na pandemia como a tensão produzida pelo isolamento social, o medo de contrair a Covid-19 e a dificuldade de conciliar o trabalho doméstico com o trabalho remoto. Mas, ainda, os impedimentos relacionados às condições concretas de produção da vida material, como o desemprego e a precarização do trabalho, conforme declarou Íris:

Tá muito complicado porque falta coisa dentro de casa, falta coisa pro meu filho e eu não posso trabalhar porque tenho que cuidar dele e isso vai acumulando. Tenho que pagar aluguel, comprar medicação, pagar água, luz. O benefício dele é uma ajuda boa, mas não dá, né? É muita despesa pra pouca coisa. A noite ele tem que tomar o mingau e eu não tenho de onde tirar. Minha sorte esses dias foi a vizinha que deu.

O desemprego bateu à porta de muitas mulheres na pandemia, das nossas 12 entrevistadas, sete vivenciaram essa terrível experiência. Uma delas teve toda sua família desempregada no período, implicando diretamente no bem-estar psíquico.

Meu esposo trabalhava em uma obra de carteira assinada, tiraram ele. Meu irmão e eu trabalhava na barraca da praia de Majorlândia. Eu cozinhava, mas a pandemia acabou com a gente. (Calêndula).

Eu cuidava de uma idosa e tive que sair porque gripei, a senhora achava que era Covid e me colocou pra fora. Aí depois disso não consegui mais emprego, eu acho que devido à pandemia o pessoal não queria dar emprego. Tive mais crises de ansiedade e depressão, afetou mais. Nesse período pensei em tirar minha vida. (Íris).

Sem dúvidas o isolamento social implicou em sequelas à saúde mental das mulheres. Aliás, quase todas relataram alguma forma de sofrimento em sua fala, visto que não tinham vivenciado nada parecido antes. Chamou a atenção situações extremas, como a vivenciada por Tulipa: “Fiquei em pânico, em depressão, nem queria mais sair de casa, é tanto que eu procurei aqui, né? Não estava mais aguentando. Fiquei em um desespero horrível, cheguei até a pensar em tirar minha vida, mas pensei em meus filhos”.

Algumas dessas mulheres já vivenciavam expressões de sofrimento psíquico, mas com a experiência da pandemia agravou, particularmente, o risco de suicídio:

Antes eu já me sentia depressiva, mas tentei suicídio somente na pandemia. Eu queria me livrar daquela dor horrorosa, você não consegue pensar em ninguém. Parece que tá todo mundo contra ti. Dia vinte completa um ano que tentei tirar minha vida, um dia depois do meu aniversário. A depressão com a pandemia estourou tudo. (Dália).

Karl Marx em sua obra “Sobre o suicídio” analisa, no século XIX, esse fenômeno na sociedade capitalista com base nos documentos do Jacques Peuchet, um ex-arquivista policial francês. Neles contêm relatos de suicídio. Marx percebe que o fenômeno acomete mais as mulheres e que os fatores mais influenciadores são o machismo e o patriarcado no capitalismo, onde elas eram tratadas como propriedade e sofriam muito nesse contexto (LÖWY, 2006LÖWY, M. Um Marx insólito. In: Sobre o Suicídio. São Paulo: Boitempo, 2006.).

Uma realidade que não é diferente já no século XXI, conforme exposto nas supracitadas entrevistadas. De todas as entrevistadas, somente uma não apresentou risco de suicídio na vida, em oito mulheres esse risco surgiu na pandemia, uma delas com tentativas de morte mais de uma vez, conforme relatou Hortência: “Já quis me matar quatro vezes e não fui covarde, isso é problema de saúde que precisa de ajuda. Eu fui julgada pela vizinhança por isso”.

Outra experiência de sofrimento por essas mulheres, na pandemia, foi a perda de familiares para a Covid-19. Um luto não vivido ou a vivência de inúmeras mortes de pessoas próximas foram relatados por quatro entrevistadas, processos que produziram marcas profundas em sua subjetividade, como demonstra Dália:

Amigos próximos meus morreram e eu fiquei bem mal mesmo, bem pra baixo mesmo. Morreu um na quarta, um no domingo. Em questão de um mês perdi essas pessoas. Eu não dormia. Chorava muito. Regredi tudo o que eu tinha conseguido avançar, tá entendendo? Morreu um grande amigo, depois outro amigo e depois a esposa do meu pai e logo em seguida, cerca de nove dias, meu pai morreu. Daí procurei o CAPS. (Dália).

E as expectativas para o pós-pandemia? Algumas não conseguem nem pensar no amanhã; já outras, querem aproveitar mais a família, um inverno bom para o roçado, que sejamos pessoas melhores, que a violência diminua. Mas o que a grande parte tem como anseio é a mudança da política do nosso país e a presença de empregos e de políticas sociais que propiciem a garantia dos direitos, da vida da população:

Arranjar um trabalho e fazer alguma coisa na vida. Quero que meu filho termine os estudos, arranje um emprego, porque seria uma preocupação a menos. (Tulipa).

Eu espero que com as vacinas com o término da pandemia, surjam mais empregos, em termos financeiros pra minha família, pra outras pessoas... E mude a política do nosso país que só pensa neles e não em quem tem necessidades. (Dália).

Que melhore a saúde, a alimentação, que diminuía o preço das coisas e saúde pra todos. (Íris).

Dificuldades para lidar internamente com o sofrimento, para romper as barreiras postas pelo preconceito, para manter-se no CAPS diante das necessidades objetivas que a vida impõe. Muitas não encontram tempo para cuidar de si ante as jornadas intensivas e extensivas de trabalho; outras residem distantes do serviço e não conseguem custear o seu translado. Essa é a dura vida das mulheres que vivem em constante sofrimento e que não contam com políticas de cuidado efetivas que considerem as suas particularidades/necessidades.

Em síntese, apreendemos pelos prontuários e pelas entrevistas realizadas com as mulheres, que buscaram o CAPS no período da pandemia, que elas estão em intenso sofrimento psíquico. Percebe-se, portanto, a necessidade urgente de políticas de cuidado pensadas para as mulheres, não só no presente momento, mas que seja um suporte para além, pois as mulheres são oprimidas pelo patriarcado e machismo muito antes do cenário vivido de pandemia e de retrocessos nos direitos, materializados pelo governo Bolsonaro.

Considerações finais

O acirramento da “questão social” somado à divisão sexual e racial do trabalho na pandemia enredaram inúmeras inferências, de forma particular, na saúde mental das mulheres. Nas entrevistas realizadas e pelos prontuários das usuárias do CAPS II apreendemos por meio de suas faces, palavras e choros, o peso desse cenário nas suas vidas.

Foram elas que cuidaram e cuidam da sociedade enquanto o Estado se omite, antes ou após a ocorrência da pandemia da Covid-19. Foram elas que cuidaram das/os filhas/os sozinhas enquanto as creches e escolas estavam fechadas. Foram elas, também, que cuidaram das casas de outras mulheres, brancas e com esse privilégio, arriscando se contaminar e aos seus familiares. Ou foram elas que perderam o emprego porque sua empregadora, seguindo as recomendações, determinou: fiquem em casa e sem salário! Foram elas violentadas por seus maridos em casa e isoladas de direitos e proteção. Foram elas que quando a comida acabou enfrentaram longas filas em busca de alguma doação. Que realidade dura, não? Ela existe e está no rosto de grande parte das mulheres desse país: mulheres negras, pobres e em sofrimento.

Mulheres que sofreram (e ainda sofrem) com o governo Bolsonaro que se caracterizou como ultraliberal, autoritário, negacionista e patriarcal, e violou as políticas sociais diariamente, como a saúde e a educação, por meio da Emenda Constitucional (EC) 95, na qual congelou os investimentos sociais por vinte anos. Mulheres que sofrem ao não receberem auxílio emergencial na pandemia, ou ao serem comunicadas que o benefício foi “cortado” e lhes restar apenas a incerteza do que pôr no prato no dia seguinte.

Mulheres que sofrem com a suspensão das aulas presenciais para as/os filhas/os e a ausência de qualquer suporte social. Que sofrem ao chegarem ao CAPS e não encontrem a equipe multiprofissional que era referência para elas, em razão das demissões com a justificativa de corte de gastos, ou quando não encontram as medicações necessárias para “conter” a sua dor. Dores que, portanto, são produzidas socialmente, e muitas intencionalmente. As mulheres vivem uma verdadeira insegurança social, por isso afirmamos que a cara da pobreza e do sofrimento mental tem rosto de mulher negra e pobre.

E nessa direção, pois, identificamos que a dura realidade enfrentada por essas mulheres faz parte de uma grande engenharia social, que está vinculada ao modo de vida neoliberal que individualiza e responsabilizada as pessoas em sofrimento pelas mazelas produzidas pelo capitalismo contemporâneo. Por isso, reafirmamos que não há saúde mental sem que haja condições de vida e trabalho dignas, sem que tenhamos igualdade de gênero e a superação do racismo estrutural que ainda fundamenta as relações sociais brasileiras. Sem que tenhamos gestores federais, estaduais e municipais com compromisso não apenas com uma reforma psiquiátrica antimanicomial, mas com um projeto de nação com justiça social e democracia plena para todas, até que todas nós sejamos livres e iguais!

Agradecimentos

À Escola de Saúde Pública (ESP/CE) pela qualificação profissional ofertada e por fomentar a importância da pesquisa. Ao Ministério da Saúde e da Educação por dar suporte direto nesse processo. Às pesquisadoras Adriana Alves e Evelyne Medeiros pelas contribuições importantes nesse trabalho. À Luta Feminista e Antimanicomial por atuarem diariamente na busca por uma sociedade justa, igualitária e livre. A todas as entrevistadas por relatarem suas histórias de luta e nos permitir fazer reflexões mais aprofundadas das suas vivências no atual cenário.

  • 1
    Uma epidemia ganha forma quando há ocorrência excedente de casos de uma doença em determinados locais geográficos ou comunidades. Já a pandemia é a disseminação mundial de uma doença (epidemia).
  • 2
    Art. 5º Para os efeitos desta Lei configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial (BRASIL, 2006).
  • 3
    Para tanto, é válido destacar que a “questão social” diz respeito ao conjunto das expressões das desigualdades sociais constituídas na sociedade capitalista madura, enfrentadas por intervenção Estatal. Tem origem no caráter coletivo da produção que em contraposição, se tem a posse privada das riquezas produzidas pela ação humana — o trabalho —, do que é necessário para a sua realização, como também do que é produzido. É nesse sentido que a “questão social” apresenta disparidades econômicas, políticas e culturais das classes sociais, através de relações de gênero, singularidades étnico-raciais e formações regionais [...] (IANNI, 1992 apud IAMAMOTO, 2001, pIAMAMOTO, M. V. A questão social no capitalismo. Temporalis, Brasília, ano II, n. 3, 2001. Disponível em: https://www.abepss.org.br/arquivos/anexos/temporalis_n_3_questao_social-201804131245276705850.pdf. Acesso em: 08 mar. 2021.
    https://www.abepss.org.br/arquivos/anexo...
    . 16-17).
  • 4
    As aspas utilizadas na expressão “questão social” têm como objetivo chamar atenção e diferenciar-se das perspectivas conservadoras sobre esse fenômeno que é próprio da sociedade burguesa, tal como indica José Paulo Netto (2001)PAULO NETTO, J. Cinco notas a propósito da “questão social”. Temporalis, Brasília, ano 2, n. 3, 2001. Disponível em: https://www.abepss.org.br/arquivos/anexos/temporalis_n_3_questao_social-201804131245276705850.pdf. Acesso em: 08 mar. 2021.
    https://www.abepss.org.br/arquivos/anexo...
    .
  • 5
    Atendimento a todas as faixas etárias, para transtornos mentais graves e persistentes, inclusive pelo uso de substâncias psicoativas, atende cidades e ou regiões com pelo menos 70 mil habitantes (BRASIL, 2017).
  • 6
    Tais como: Organização Mundial de Saúde, Sempreviva Organização Feminista, ONU Mulheres, Revista Azmina e Instituto Vita Alere.
  • 7
    [...] o racismo é uma decorrência da própria estrutura social, ou seja, do modo “normal” com que se constituem as relações políticas, econômicas, jurídicas e até familiares, não sendo uma patologia social e nem um desarranjo institucional. O racismo é estrutural. Comportamentos individuais e processos institucionais são derivados de uma sociedade cujo racismo é regra e não exceção. O racismo é parte de um processo social que “ocorre pelas costas dos indivíduos e lhes parece legado pela tradição”. [...] o racismo, como processo histórico e político, cria as condições sociais para que, direta ou indiretamente, grupos racialmente identificados sejam discriminados de forma sistemática (ALMEIDA, 2018, pALMEIDA, S. L. de. O que é racismo estrutural? Belo Horizonte (MG): Letramento, 2018.. 38-39).
  • 8
    O machismo é definido como um sistema ideológico de representações simbólicas, que mistifica as relações de exploração, de dominação, de sujeição entre o homem e a mulher (DRUMONT, 1980, pDRUMONT, M. P. Elementos para uma análise do machismo. Perspectivas, São Paulo, v. 3, 1980. p. 81-85.. 81).
  • 9
    O patriarcado, embora atinja de forma estrutural a sociedade, dirige suas implicações centralmente às mulheres [...]. Assim, ainda que atinja outros sujeitos, a lógica que estrutura o patriarcado é de privilégio e dominação masculinos relacionados à subalternização e à invisibilização das mulheres e do que é associado ou considerado e identificado como feminino [...] permeia a construção social do sexo feminino, que se associa ao frágil, ao desvalorizado, ao subalterno e ao subserviente, enquanto o “modelo” patriarcal do homem é o da força, virilidade, poder e dominação (CISNE; SANTOS, 2018, pCISNE, M.; SANTOS, S. M. M. dos. Feminismo, diversidade sexual e serviço social. São Paulo: Cortez, 2018.. 43).
  • 10
    Instituto líder global em pesquisas de mercado do mundo.
  • Agência financiadoraNão se aplica.
  • Aprovação por Comitê de Ética e consentimento para participaçãoA pesquisa foi submetida ao Comitê de Ética da Escola de Saúde Pública do Ceará (ESP/CE), tendo recebido o parecer favorável de nº 4.847.421. Para consentimento da participação, fizemos uso do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).
    Consentimento para publicaçãoAs entrevistadas da pesquisa declararam no ato da entrevista o consentimento para a publicação de seus dados em momentos posteriores. Portanto, está autorizada a publicação desse artigo na Revista Katálysis.

Referências

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  • BRASIL. Lei nº. 11.340, de 7 de agosto de 2006. Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm Acesso em: 10 mar. 2021.
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  • CISNE, M.; SANTOS, S. M. M. dos. Feminismo, diversidade sexual e serviço social. São Paulo: Cortez, 2018.
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  • PAULO NETTO, J. Cinco notas a propósito da “questão social”. Temporalis, Brasília, ano 2, n. 3, 2001. Disponível em: https://www.abepss.org.br/arquivos/anexos/temporalis_n_3_questao_social-201804131245276705850.pdf Acesso em: 08 mar. 2021.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Fev 2023
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2023

Histórico

  • Recebido
    31 Mar 2022
  • Aceito
    07 Out 2022
  • Revisado
    21 Nov 2022
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