Resumos
O artigo apresenta o conceito “Arte bruta” e acompanha suas principais articulações nos campos da arte e saúde mental até a década de 1960. Em uma análise crítica, explicita-se como este, apesar de incitar à valorização do material artístico produzido por pacientes psiquiátricos e outros artistas fora do circuito erudito, contribui para uma categorização segregacionista dos artistas ditos “loucos”, ao adotar uma compreensão reducionista e idealizada da criação como expressão espontânea, acessível a tais sujeitos justamente por estarem “apartados da cultura”. Mostra-se ainda que tal noção, apesar de utilizada ainda hoje, foi objeto de remodelamento e renomeação - como “outsider art”, especialmente - entre 1960/1970, com a desnaturalização do isolamento dos ditos “doentes” trazida pela Reforma Psiquiátrica e o advento de mudanças significativas na concepção de arte e produção artística.
Palavras-chave
Arte Bruta; Jean Dubuffet; outsider art; arte contemporânea
This paper presents the concept of “Raw Art,” following its main articulations in the field of art and mental health until the 1960s. Through a critical analysis, the text shows how this concept, despite encouraging the appreciation of artistic materials produced by psychiatric patients and other naïve artists, contributes to a segregationist categorization of the so-called “mad” artists, by adopting a reductionist and idealized understanding of creation as a spontaneous expression, accessible to these subjects precisely because they are “outsiders.” Such notion, although still used today, underwent remodeling and renaming-as “outsider art”-between 1960/70, following the denaturalization of isolation for the so-called “insane” brought by the Psychiatric Reform and the advent of significant changes in the conception of art and artistic production.
Keywords:
Raw Art; Jean Dubuffet; outsider art; contemporary art
Cet article présente le concept d’“art brut”, en suivant ses principales articulations dans les domaines de l’art et de la santé mentale jusqu’aux années 1960. Dans un abordage critique, le texte montre comment ce concept, bien qu’il mène à une valorisation du matériel artistique produit par des patients psychiatriques et d’autres artistes dits naïf, contribue à une catégorisation ségrégationniste des artistes dits «“fous”, en adoptant une compréhension réductionniste et idéalisée de la création en tant qu’expression spontanée, accessible à ces sujets précisément parce qu’ils sont “en dehors de la culture”. Cette notion, bien qu’encore utilisée aujourd’hui, a subi un remodelage et un changement de nom - en tant qu’“outsider art” - entre 1960/1970, suite à la dénaturalisation de l’isolement des soi-disant “fous” apportée par la réforme psychiatrique et à l’avènement de changements significatifs dans la conception de l’art et de la production artistique.
Mots-clés:
Art brut; Jean Dubuffet; outsider art; art contemporain
Este trabajo presenta el concepto de “Arte Bruto” y sigue sus principales articulaciones en los ámbitos del arte y la salud mental hasta la década de 1960. A través de un análisis crítico se muestra cómo este concepto, a pesar de incentivar la apreciación del material artístico producido por pacientes psiquiátricos y otros artistas fuera del ámbito erudito, contribuye a una categorización segregacionista de los llamados artistas “locos” al adoptar una comprensión reduccionista e idealizada de la creación como expresión espontánea, accesible a dichos sujetos precisamente por estar “apartados de la cultura”. También se muestra que tal noción, aunque todavía se utiliza hoy, fue objeto de remodelación y renombramiento - como “outsider arte” especialmente - entre 1960/1970, con la desnaturalización del aislamiento de los llamados “locos” que trajo la Reforma Psiquiátrica y el advenimiento de cambios significativos en la concepción del arte y la producción artística.
Palabras clave:
Arte Bruto; Jean Dubuffet; outsider arte; arte contemporáneo
Às vésperas do término da Segunda Guerra Mundial, em agosto de 1945, o pintor francês Jean Dubuffet cunha a expressão Arte Bruta (Art brut, que seria melhor traduzida por algo como “arte crua”) para denominar a produção que ele começava a buscar em viagens pela Suíça, Alemanha e por sua França natal. Em visita a diversas instituições, ele adquire obras de pacientes como Adolf Wölfli e Heinrich Anton Müller (de quem o psiquiatra e crítico de arte alemão Hans Prinzhorn já havia mostrado alguns desenhos em livro de 1922 que causara furor nos meios artísticos de vanguarda [Prinzhorn, 1922Prinzhorn, H. (1922). Bildnerei des Geisteskranken. Ein Beitrag zur Psychologie und Psychopatologie der Gestaltug. Springer.]). Em 1946, uma médica vem mostrar-lhe desenhos de sua paciente Aloïse Corbaz, que ficará conhecida como Aloïse e se tornará uma espécie de grande dama da Arte Bruta. No mesmo ano, Dubuffet terá acesso à obra de dois pintores médiuns: Fleury-Joseph Crépin e Augustin Lesage.
Em 1947 ele nomeia Foyer de l’Art Brut o espaço onde expõe desenhos, pinturas e objetos de seu acervo ao público, no subsolo da Galeria Drouin, em Paris. No ano seguinte, funda a “Companhia de Arte Bruta”, que tem como associados reconhecidos artistas e intelectuais como André Breton, André Malraux, Henri Michaux e Claude Lévi-Strauss, entre outros.
Apesar de sua pesquisa ter se iniciado em coleções de hospitais psiquiátricos, a classificação de uma obra como “bruta” não depende diretamente de ela provir do campo identificado como aquele da desrazão, mas se dá por critérios muito mais nuançados. De fato, traduzem o que o próprio Dubuffet - que decidira se dedicar à pintura apenas alguns anos antes, colecionava desenhos de crianças e havia adotado uma figuração voluntariamente infantil - buscava em suas investigações plásticas.
Tendo como fundo um cáustico repúdio da arte convencional, ele afirma no catálogo da Exposição de Arte Bruta, que acontece na Galeria Drouin em 1949, que nas obras dos artistas brutos transpareceria a “vidência” de que se trata na arte, em vez das ideias e da inteligência desenvolvida nos bancos escolares. Isentos do mimetismo vigente entre os profissionais, tais criadores tirariam tudo - tema, ritmo, material etc. - de si mesmos, e não dos modelos “da arte clássica ou da arte na moda”. Neles assistiríamos “à operação artística pura, crua (brute), inteiramente reinventada em todas suas fases por seu autor, a partir somente de suas próprias impulsões”. Tratar-se-ia, portanto, de uma produção “na qual se manifesta apenas a função de invenção, e não aquelas, constantes na arte cultural, do camaleão ou do macaco” (Dubuffet, 1949Dubuffet, J. (1949). L’Art Brut préféré aux Arts Culturels (Catálogo da exposição realizada na Galeria René Drouin, Paris)., s/p.).
Na defesa de tal suposta pureza não está mais em primeiro plano o alinhamento dessa produção à crítica do naturalismo e das regras acadêmicas capitaneadas pelos movimentos de arte moderna, como acontecera nos anos 1920 com o livro já citado de Prinzhorn e uma monografia do psiquiatra suíço Walther Morgenthaler (Morgenthaler, 1992Morgenthaler, W. (1992). Madness & Art. The Life and Works of Adolph Wölfli. University of Nebraska Press.). Dubuffet faz tábula rasa de toda a aventura modernista de problematização dos padrões de representação hegemônicos, em operação desde a primeira década do século, considerando a arte - em bloco e sem nuances - como “arte cultural” a serviço das convenções, para melhor delimitar o terreno da inocência e da autenticidade da criação nas obras de artistas que estão à margem - da sociedade ou, ao menos, da arte erudita e de seu circuito - como quem demarca uma terra indígena.
Sua posição pode ser entendida como uma denúncia dos maneirismos e padronizações que poderiam reduzir a experimentação modernista a meros estilos replicáveis. Distantes e livres de qualquer influência desse tipo, as obras brutas fariam “apelo ao fundo humano original e à invenção mais espontânea e pessoal”, sem qualquer “máscara e sem constrangimento” (Dubuffet, 1948Dubuffet, J. (1948). Notice sur la Compagnie de l’Art Brut, 1948. Manuscrito s/p., s/p.).
A expressão Arte Bruta visa sublinhar, assim, a noção de criação como expressão espontânea de um indivíduo que, unicamente guiado por suas pulsões ou instintos e inteiramente livre das convenções e interesses do mundo da arte, seria capaz de utilizar parâmetros artísticos incomuns e inovadores. Genuíno e insuspeito, tal modelo encarna-se inicialmente nos mesmos pacientes que fascinaram os artistas nos anos 1920, mas logo incluirá pessoas sem histórico psiquiátrico, tais como os médiuns citados, alguns criadores excêntricos e marginais ao mundo da arte. Para tanto, adota como critério geral o isolamento dessas pessoas em relação às normas cultas e ao círculo artístico profissional.
Nesse sentido, em vez de ressaltar as condições patológicas como determinantes para a explicitação de uma potência criativa, como fazia Prinzhorn (Prinzhorn, 1922Prinzhorn, H. (1922). Bildnerei des Geisteskranken. Ein Beitrag zur Psychologie und Psychopatologie der Gestaltug. Springer.) em seu livro, ou de buscar na doença mental certos padrões de representação, como costumavam fazer os psiquiatras que se inclinavam sobre a questão, Dubuffet põe em relevo a força de oposição e questionamento dos condicionamentos sociais que se revelariam nas obras de criadores “incultos”. Se cerca de metade de sua coleção de Arte Bruta consiste em obras de pacientes psiquiátricos, isso se deveria simplesmente ao fato de que
Entre as obras mais interessantes que encontramos, algumas têm por autores pessoas consideradas doentes mentais e internadas em estabelecimentos psiquiátricos. É natural que pessoas privadas de ocupação e de prazeres se mostrem (como fazem também os presos, inclusive) mais inclinados que outras a fazerem festa para si mesmas pelas vias de uma atividade artística. A ideia rígida que temos comumente da saúde de espírito e da demência parece-nos baseada em distinções muito frequentemente arbitrárias. […] Entendemos, por conseguinte, considerar trabalhos de autores reputados sadios ou reputados doentes com os mesmos olhos e sem estabelecer categorias especiais.(Dubuffet, 1948Dubuffet, J. (1948). Notice sur la Compagnie de l’Art Brut, 1948. Manuscrito s/p., s/p.)
A distinção entre saúde e doença mental é ela mesma uma das convenções culturais que Dubuffet visa denunciar e ultrapassar, sem dúvida. Mas renomear o artista “louco” como “artista bruto” não deixa de estabelecer uma “categoria especial”. Se as etiquetas diagnósticas são assim pretensamente suspensas, é graças a uma extremada naturalização de seu enclausuramento (transformado em uma ociosidade a recobrir e esconder a violência) e da ausência de referências culturais eruditas (uma suposta “liberdade” que oculta o sofrimento subjetivo e socioeconômico). Assim, o gesto que opõe a produção dos artistas brutos que viviam em hospícios às “artes culturais” (entendidas como a “arte homologada”, dos “museus, galerias, salões”, [(Dubuffet, 1949Dubuffet, J. (1949). L’Art Brut préféré aux Arts Culturels (Catálogo da exposição realizada na Galeria René Drouin, Paris)., s/p.]), apesar de visar obviamente valorizá-la, paradoxalmente a exclui de maneira peremptória. Ao adotar tal caracterização da cultura como erudição burguesa e da arte como instituição bem delimitada, acaba-se ignorando o lugar que a arte dos loucos ocupava há mais de duas décadas, ainda que timidamente, no questionamento de tais fronteiras, ao lado da arte etnográfica e da produção popular, naïf e feita por crianças.
Membro do comitê diretor da “Companhia de Arte Bruta”, André Breton segue no mesmo diapasão ao escrever em 1948 que “a arte daqueles que colocamos na categoria dos doentes mentais constitui um reservatório de saúde moral” (Breton, 1979Breton, A. (1979). L’art des fous. La clé des champs. In Le Surréalisme et la Peinture. Gallimard (Folio Essais)., p. 405), visto que escaparia das “influências exteriores, dos cálculos, do sucesso ou das decepções encontradas no plano social etc.” (p. 406).
Aqueles assim “categorizados” realizariam, portanto, o sonho dourado do Surrealismo: “Os mecanismos da criação artística estão aqui libertos de todo entrave” (p. 406). Esquecendo-se das críticas à internação feitas em Nadja, o poeta conclui o texto reafirmando a condição de confinamento como base e garantia de pureza:
Por um perturbador efeito dialético, a claustração, a renúncia a todos os proveitos como a todas as vaidades, a despeito do que apresentam individualmente de patético, são aqui as garantias de autenticidade total que falta em toda parte alhures […]. (p. 405)
O elogio da loucura desvela aqui sua face aterradora, ao transformar a segregação do doente em “renúncia”. A “garantia de autenticidade total” da produção dos pacientes psiquiátricos confirma e subscreve, assim, os preceitos excludentes do sistema, ocultando e naturalizando-os. Não deixa de ser surpreendente que Breton - arauto do desejo na arte como na vida - cale tão firmemente, por essa manobra, os próprios “doentes”, que apesar de tudo gritam suas decepções, seus desejos de sucesso e suas “vaidades” - em suas obras e/ou em seus delírios, como bem mostra, ao lado de Nadja, o caso Aimée, estudado por Lacan (1975)Lacan, J. (1975). De La Psychose Paranoïaque dans ses Rapports avec la Personnalité. Seuil. (Essais) e mencionado pelo poeta nesse mesmo texto de 1948.
A concepção de Arte Bruta implica, de fato, pressupostos discutíveis, tanto no que se refere à sua concepção de arte quanto de cultura. Faz parte da argumentação de Dubuffet, por exemplo, o entendimento da arte como “um meio de operação que não passa pelo caminho das ideias”, o que a Arte Bruta viria reafirmar, distinguindo-se da arte dos intelectuais (Dubuffet, 1949Dubuffet, J. (1949). L’Art Brut préféré aux Arts Culturels (Catálogo da exposição realizada na Galeria René Drouin, Paris)., s/p.). Mas apenas uma definição muito estreita do que sejam “ideias” permite que elas não sejam detectadas nos ditos artistas brutos, desde que nos prestemos a escutá-los. De fato, a noção de Arte Bruta precisa de dicotomias extremadas como intelecto versus impulsões, cultura versus indivíduo, convenções versus liberdade, interesse versus autenticidade e valor comercial versus necessidade de expressão, ao preço de ignorar que a arte costuma colocá-las em jogo e talvez até ultrapassá-las. Para que os “brutos” encarnem o segundo termo de cada um desses pares, é necessário ignorar suas singularidades e caracterizar seu processo de criação a partir de um modelo no qual só cabe, estritamente, a figura do “vidente”, místico ou médium espírita, encarnada com perfeição por Augustin Lesage.
Em 1911, após ter ouvido, do fundo de uma mina, uma voz dizer-lhe que um dia seria pintor, ele providenciou material de pintura e uma tela de três metros de largura, que levou um ano para preencher inteiramente, com um método surpreendente: usando um pincel por cor e trabalhando ao longo da superfície, muito rapidamente, como hoje faria uma impressora. Ao longo de sua carreira, ele realizou mais de 700 quadros. Em dado momento tentou, sem sucesso, pintar na ausência de luz, para constatar que seu “espírito-guia” não gostava “da escuridão” (Danchin, 2006Danchim, L. (2006). Art Brut. Instinct Créateur. Gallimard., p. 52).
Casos excepcionais como esse parecem, à primeira vista, comprovar a possibilidade de uma ação inteiramente involuntária e automática, apesar de a questão ser bem mais complexa - como mostra o fracasso da experiência de Lesage em pintar sem o recurso do olhar. Mas o fascínio por tal modelo do artista inteiramente fora de si e como que possuído por um espírito é forte e mantém-se como mito necessário para a concepção mesma de Arte Bruta - mesmo quando se declina em uma espécie de método, como aquele empregado pelo próprio Dubuffet ao adotar uma atitude de “receptividade passiva” a algo que surgiria, como uma aparição. A valorização do caráter incessante e compulsório, longe de confirmar o mito da criação bruta, parece-me, antes, bastante próxima do modo como muitos artistas “culturais” encaram seu trabalho, eventualmente tomando-o até como uma espécie de missão. Seria necessário, para uma apreciação mais fina da questão, perguntar aos próprios artistas considerados “brutos” sobre seu processo de criação, suas ideias sobre arte e a sua arte, ouvindo a singularidade de cada resposta - o que Dubuffet efetivamente não fez.
Aloïse Corbaz, ex-governanta suíça, é uma dessas figuras obcecadas, que inicialmente se escondia nos banheiros do hospital psiquiátrico para desenhar nos papéis que estivessem a seu alcance. Dita apenas “Aloïse” ou “Aloyse”, foi a primeira mulher a entrar no rol dos grandes criadores loucos, que contava com dez homens, da seleção de Prinzhorn, ao lado da estrela de Morgenthaler, Adolf Wölfli.
A jovem Aloïse concluiu seus estudos secundários aos 18 anos, antes de seguir um curso profissional de costura. Ela participava do coral da igreja e sonhava ser cantora de ópera. Após um relacionamento amoroso com um ex-padre, reprovado pela irmã mais velha que ocupava o lugar da mãe falecida, a moça foi mandada para trabalhar na Alemanha. Em Potsdam, teve contato com a vida da corte ao ocupar o posto de governanta do Capelão de Guilherme II, e começou a cultivar uma paixão platônica pelo Imperador. De volta à Suíça, no início da Primeira Guerra Mundial, manifestava posições pacifistas e humanistas com ardor, até ser internada por sua família em 1918, aos 34 anos.
Além de sua história trágica e romântica, o processo de trabalho de Aloïse é do tipo que fascina Dubuffet e acabou tornando-se uma espécie de clichê da “Arte Bruta”, pela presença de cores fortes, do uso dos dedos no lugar de pincéis e de papel de embrulho à guisa de tela, a reforçar o ideal de espontaneidade e pureza que, no entanto, é em boa medida condicionado pela mera precariedade do ambiente hospitalar.
A obra da artista parece-me trazer, contudo, elementos muito mais interessantes, e de alcance conceitual. Seus imensos painéis de papel costurado chegam a ter mais de dez metros e são seccionados como frames de filmes, dialogando com o universo do glamour do cinema que então se consolidava na cultura. As engenhosas costuras, muitas vezes realizadas com linha vermelha, não se esgotam na função de aumentar a superfície de representação, mas muitas vezes enfatizam ou determinam elementos do desenho, assumindo-se como traçado que é parte da obra e assim superando a convencional distinção entre superfície de representação e conteúdo representacional.
Na mesma direção, devemos notar que Aloïse desenha, com frequência, sobre páginas impressas de jornal ou revista e mescla escrita e desenho, além de compor longos poemas. Além disso, a natureza do suporte utilizado eventualmente condiciona o motivo, de modo que ela retrata Hitler sobre o papel de embrulho do açougue, por exemplo. Outras características devem ser vistas como gestos artísticos que performam uma densa crítica da representação, tais como a frontalidade e estaticidade dos personagens e a frequente presença de elementos como cortinas, a delimitar e explicitar criticamente o espaço de representação como uma espécie de palco.
Mais do que simplesmente registrar conteúdos alucinatórios ou oníricos de uma espécie de delírio inspirado, usando cores fortes que seriam inerentes a tais “visões” e ao erotismo que elas veiculariam, a obra de Corbaz trata, assim, de rever as próprias condições de representação e de propor determinados arranjos representacionais que constroem, ao longo do tempo e em conjunto, um universo artístico denso e singular, como costuma ocorrer com aqueles que reconhecemos como grandes artistas.
Contra tal julgamento, pode-se objetar que Aloïse não estava em diálogo com outros artistas e que não seria capaz de formular teoricamente tais ideias, e portanto não poderia ser horizontalmente comparada a eles. Mas não se pediu, por exemplo, a Picasso, no contexto do reconhecimento dos grandes gênios da arte moderna, que explicasse o que visava com suas Senhoritas de Avignon (1907). É fato que Corbaz passou muitos anos em hospitais psiquiátricos, que sofreu muito, que se movia à beira do abismo, no mais extremo, no mais agudo da vida. Mas isso não determina simplesmente uma condição patológica capaz de retirá-la da cultura - parece, antes, que talvez ela seja capaz de pôr em questão e tratar das próprias condições da cultura - de suas linhas de força, digamos - como costuma-se esperar dos artistas. De resto, o próprio Dubuffet declara que Aloïse não era doente e que sua dificuldade de comunicação com o outro seria voluntária, uma tática engenhosa que lhe garantia um conveniente “lugar de refúgio” (Thévoz, 1995Thévoz, M. (1995). Art Brut. Skira., p. 65). Sagaz e talvez irônica, a paciente era ela mesma capaz de perceber o que dela se esperava e de jogar com isso, ao declarar, por exemplo, que “vermelho, você sabe, é bom para esquizofrênicos” (p. 172). A fina ironia desse tipo de observação não chega, contudo, a despertar no colecionador francês a necessidade de nuançar suas concepções.
Afinal, se Aloïse não era propriamente “louca”, o que garantiria sua caracterização como artista bruta? É frágil o argumento de que ela estava irremediavelmente apartada dos círculos de arte e ignorava inteiramente tal universo. Nas ricas casas em que trabalhou, sem dúvida teve acesso direto a obras de arte, além de ali poder consultar revistas, livros e jornais - assim como era provavelmente o caso também no hospício suíço em que passou a maior parte de sua vida, até morrer em 1964. Não se pode tomar como dado empírico um total desconhecimento a respeito de arte, de cinema e do universo imagético das revistas ilustradas, do teatro e da ópera - aliás, consta que para muitos desenhos teria se inspirado em fotografias de celebridades do mundo do espetáculo.
A noção de Arte Bruta costuma deixar de lado, de fato, a cultura de massa que nascia e florescia no período entreguerras, impulsionada pela difusão da fotografia e do cinema, ignorando as complexas relações que ela estabelece com a arte dita erudita.
Outra justificativa frequente para classificar sumariamente como Arte Bruta a produção daqueles que não tinham acesso aos elitistas círculos artísticos, consiste em considerá-la guiada pela simples autossatisfação de seu criador. Mas toda produção imagética e objetual, não seria, em última instância, sempre destinada aos olhos de outrem? E o fato de alguém não contar com a inserção em um circuito no qual possa mostrar suas obras faria dessas, automaticamente, uma produção fora da cultura? Tais questões se amplificam no que diz respeito aos chamados “doentes mentais”. Seriam o diagnóstico ou as internações, tão questionáveis, uma espécie de portal que os retiraria da cultura, apagando sua trajetória anterior? Chegariam eles a calar o mundo - ainda que restrito, espacial e afetivamente - que eles se põem a construir e reconstruir ativamente, mesmo no mais agudo sofrimento e na mais terrível prisão?
E estariam os artistas “loucos” ou “crus” - assim como os naïfs, de resto - por um terrível paradoxo, condenados a não serem jamais considerados literalmente “artistas” para que suas obras sejam admiradas? Isso é o que parece sentenciar Dubuffet ao afirmar, categórico, que a verdadeira arte está sempre ali onde não se espera por ela. Ali onde ninguém pensa nela nem pronuncia seu nome. A arte detesta ser reconhecida e saudada por seu nome (Dubuffet, 1949Dubuffet, J. (1949). L’Art Brut préféré aux Arts Culturels (Catálogo da exposição realizada na Galeria René Drouin, Paris)., s/p.).
Tais propósitos correm o risco de parecerem um tanto hipócritas, talvez, vindos de um artista que não recusa esse epíteto. Mas creio que eles devem ser tomados como um gesto artístico fundamental para a própria obra de Dubuffet: aquele de reconhecer como arte e designar como tal produções que naquela época não faziam parte do mundo da arte, e de um só golpe questionar o lugar do artista como aquele que produz imagens, alargando-o na articulação com as tarefas convencionalmente designadas ao colecionador e ao crítico de arte. Além disso, devemos reconhecer que Dubuffet chega, por vezes, a delinear um verdadeiro questionamento da noção de “doença mental”:
Tal distinção entre normal e anormal nos parece bastante imperceptível; quem é normal? Mostre-o a nós! O ato de arte, com a extrema tensão que implica, a alta febre que o acompanha, poderia ser normal? Enfim, as “doenças” mentais são extremamente diversas - há tantas quase quanto doentes - e parece bem arbitrário colocá-las todas no mesmo saco falacioso da Doença. Nosso ponto de vista sobre a questão é que a função da arte é a mesma em todos os casos e que não há mais arte dos loucos quanto arte dos dispépticos ou dos doentes do joelho. (Dubuffet, 1949Dubuffet, J. (1949). L’Art Brut préféré aux Arts Culturels (Catálogo da exposição realizada na Galeria René Drouin, Paris)., s/p.)
De fato, o artista e colecionador recusa-se a dar valor à produção asilar por ela mesma e a idealizar a loucura como condição especial de criação, como argumenta em carta de 1952 ao psiquiatra Robert Volmat, que organizara uma importante exposição de Arte Psicopatológica no Centro Psi- quiátrico Saint-Anne, em Paris, durante o I Congresso Mundial de Psiquiatria, em 1950.
Apesar de ter emprestado para o evento obras do acervo da Companhia de Arte Bruta, Dubuffet rechaça a categoria de “arte psicopatológica” e nega que sua coleção consista em um conjunto de obras de doentes mentais, não apenas por contar com obras de artistas considerados “normais”, mas sobretudo porque seria sempre arbitrário distinguir aqueles que seriam “anormais” - afinal, “pede-se - eu peço, eu, em todo caso - a uma produção de arte que tenha um caráter excepcional, ou seja, que seja anormal” (Dubuffet, 1949Dubuffet, J. (1949). L’Art Brut préféré aux Arts Culturels (Catálogo da exposição realizada na Galeria René Drouin, Paris)., s/p.). Poder-se-ia legitimamente sustentar, prossegue, que a criação é sempre um fenômeno doentio, mas “os ventos” da arte “sopram em todas as ‘cabeças humanas’, e não necessariamente naquelas que geralmente se consideram como doentes” (s/p.). Nas obras dessas encontrar-se-ia com frequência, aliás, aquilo que caracteriza a arte ruim - “imitação”, “maneirismos”, “mediocridade e banalidade” -, como seria o caso da maior parte das obras expostas nessa exposição de 1950, que Dubuffet considera, sem qualquer benevolência, como “sem conteúdo e sem valor”, sem qualquer interesse para o amante da arte e nem sequer para o médico. Como golpe final, o pintor escreve:
Não creio que os doentes (nem outras pessoas) se exteriorizem mais livremente pelas vias do desenho ou da pintura do que por aquelas de suas outras atividades. Acredito mesmo no contrário, e que é nelas, salvo raras exceções, que as pessoas mais se falsificam e menos entregam de si mesmas. (Dubuffet apud Volmat, 1956Volmat, R. (1956). L’Art Psychopathologique. PUF., p. 90)
Dubuffet recusa rigorosamente, assim, a ideologia da expressão direta da psique ou personalidade na produção de imagens, na qual acreditavam, na época, muitos psiquiatras (ao cotejarem desenhos ou pinturas à história clínica de pacientes). Tal ideia era também corroborada por alguns psicanalistas -seguindo a pista aberta por Anna Freud no trabalho com crianças - e muitos outros profissionais, que começavam em várias instituições pelo mundo a ver os ateliês de arte como algo mais importante que uma mera terapia ocupacional.
No início da mesma carta, entretanto - e em uma das raras caracterizações positivas e categóricas da Arte Bruta - Dubuffet afirmava que sua busca seria por obras que, estando fora e sendo contrárias a qualquer “retórica”, concerniriam “uma espécie de delírio inspirado” (Dubuffet apud Volmat, 1956Volmat, R. (1956). L’Art Psychopathologique. PUF., p. 90). Mais do que rechaçar a noção de expressão, trata-se assim de depurá-la de modo um tanto vago e que mantém certa alusão à loucura pelo uso do termo delírio, ainda que mesclado à antiga quimera da inspiração.
Apesar das tensões e contradições implicadas na expressão Arte Bruta, deve-se reconhecer em sua própria imprecisão um poder evocativo - e poético, pode-se dizer - de alargamento do campo da arte. Fiel a tal dimensão suspensiva, muitas vezes Dubuffet recusou-se a caracterizá-la teórica ou criticamente, alegando que “definir uma coisa - ou apenas isolá-la - é estragá-la bastante”. E neste sentido talvez ele tenha razão ao recorrer à tautologia para fechar questão, peremptório: “A arte bruta é a arte bruta e todo mundo entendeu muito bem” (Dubuffet apud Danchin, 2006Danchim, L. (2006). Art Brut. Instinct Créateur. Gallimard., p. 137).
Outsider Art
Entre o fim da Segunda Guerra Mundial e os anos 1960 a noção de Arte Bruta delineou portanto, de forma bastante vaga, um tipo de produção artística pretensamente mais autêntica do que as demais - apesar de se alinhar à contestação do naturalismo e à busca de novos protocolos de representação que já caracterizavam a produção dos artistas europeus de vanguarda desde o início do século - e que teria como suporte a figura do artista “inculto” representado especialmente por pacientes psiquiátricos, logo por médiuns e outras pessoas que não teriam uma formação erudita em arte. O gesto parece socialmente inclusivo - e segue a corrente já aberta por psiquiatras com profundo conhecimento de arte (Prinzhorn e Morgenthaler) e diversos artistas modernistas -, mas naturaliza e confirma, paradoxalmente, a exclusão social dessas pessoas, cuja situação socioeconômica teria distanciado do acesso à cultura erudita, em última instância.
A partir dos anos 1960, a proposta não deixa de mostrar sua fragilidade, à medida que os campos tanto da arte quanto da dita “loucura” vivenciam um questionamento radical de seus próprios lugares na cultura. No campo da saúde mental, as ações de Franco Basaglia na Itália e de David Cooper e Ronald Laing na Inglaterra, levaram à Psiquiatria Democrática e à Antipsiquiatria, impulsionando pelo mundo o Movimento Antimanicomial e a Reforma Psiquiátrica. A própria delimitação diagnóstica do portador de sofrimento psíquico grave foi denunciada como parte de um dispositivo de poder e os hospícios começaram a ser combatidos como instituições que, sob a justificativa de “tratamento” de distúrbios, revelavam-se parte de um sistema disciplinar produtor de exclusão social, segregação e cronificação. De “pacientes”, os sujeitos ditos “loucos”, e tomados por muitos como incapazes, começaram a ser reinvestidos como atores sociais capazes de tomar parte na sociedade de modo ativo e pertinente.
Também a partir da passagem para os anos 1960, artistas diversos e em diferentes países levaram o campo da arte a questionar suas fronteiras institucionais, abrindo museus e galerias ao corpo e ao mundo. Tal gesto denuncia a arbitrariedade do circuito e do mercado de arte e põe em xeque a formação técnica e o lugar idealizado do produtor de obras, rompendo assim as linhas de força da arte moderna e fundando o que a historiografia nomeia arte contemporânea.
Apesar de tanto o campo da “loucura” quanto o da arte terem assim vivido questionamentos tão radicais de suas fronteiras, devemos reconhecer que a corrente marcada pela ideologia da expressão espontânea segue praticamente intocada, salvo por sutis deslocamentos de terminologia, que tendem a assimilá-la à Arte Naïf e Popular. É o caso da expressão Outsider Art, que se consagra nos países de língua inglesa nos anos 1970, no contexto da contracultura, ao lado de Raw Art, mais literal, porém, bem menos utilizada.
A expressão parece justificada pelo léxico anticultural dominante nos escritos de Dubuffet e que faz dele, e da noção mesma de Arte Bruta, um dos mais importantes precursores do ambiente de contestação das décadas de 1960 e 1970. Trata-se para o artista e colecionador, sempre, de criticar a cultura como normativa, restritiva e coercitiva, em suma: “asfixiante”, como indica o título de seu livro originalmente publicado em 1968. Deve-se combater, em nome do indivíduo, não apenas o social, mas “o mundo externo em sua totalidade”, e como este só se configura por convenções sociais, deve-se contestar “todas as figuras dadas ao mundo externo pela cultura” (Dubuffet, 1986Dubuffet, J. (1986). Asphyxiante Culture. Les Éditions de Minuit., p. 93). A questão da consideração pelo “mundo externo”, predominante nas décadas anteriores, recoloca-se assim pela via da cultura, mas a figura do louco genial não perde em importância, ainda que declinada em revolta contra os valores estabelecidos, como mostra a seguinte declaração:
Inclino-me a pensar que entre as pessoas declaradas “irrecuperáveis” pela coletividade (e cujos comportamentos declarados “anormais” são de espécie - e de fontes - tão diversas, tão díspares) encontra-se um bom número no qual a única “doença” é, levada a um grau extremo, a contestação do social e, por extensão, da cultura, ou seja, em suma, a exasperação do individualismo. (p. 93)
Renomear os segregados como contestadores é um gesto de peso, apesar de o termo outsider carrear o risco de se reafirmar a exclusão como condição definitória de certo tipo de produção artística. Isso mostra-se ainda mais problemático quando lembramos as experimentações e questionamentos radicais realizados pelos próprios artistas a respeito das instituições de arte e das delimitações convencionais do campo da arte, na mesma época. É de espantar que enquanto a produção artística buscava revirar-se para fora, inside out, críticos pudessem reafirmar uma posição outsider fixa e predeterminada.
Seja como for, marginalização e isolamento seguiam sendo os critérios que diferenciavam as obras brutas no texto-manifesto “Lugar ao incivismo”, publicado no catálogo da exposição Arte Bruta, que levou setecentas peças da coleção ao Museu de Artes Decorativas em Paris, em 1967. Tais obras seriam mais preciosas que as “culturais” por serem “fruto da solidão” e de “autêntico impulso criativo”, purificado de competição ou autopromoção (Dubuffet, 1981Dubuffet, J. (1981). Lugar ao Incivismo. In Catálogo de Arte Incomum. XVI Bienal de Arte de São Paulo. Vol. III. Fundação Bienal de São Paulo, out./dez., p. 35). A ideia de expressão pura ou direta, em total desconhecimento e desobediência dos parâmetros acadêmicos graças ao autismo e ao distanciamento da realidade, deslizava assim para a ideia de isenção quanto à perversão dos valores do circuito de arte, e tentava tomar através dela uma potência de contestação política, como indica o provocativo título do texto.
A exaltação individualista dos representantes de tal posição anticívica como uma espécie de excentricidade naturalizava, assim, a condição “incomum” como característica subjetiva, deixando à sombra a pluralidade de modos de circulação de obras e de obtenção de reconhecimento por parte de outros, para além do mercado de arte e de seus laços com a publicidade. Tampouco é levado em consideração o fato de que a busca poética de artistas “comuns” e inseridos no circuito poucas vezes pode ser resumida à procura de fama e ganhos financeiros.
De fato, a partir de fins dos anos 1950, à medida que a coleção de Dubuffet crescia em notoriedade e em número de obras, mais difícil se tornava a delimitação da Arte Bruta. O uso do que ele eventualmente caracteriza como “técnicas elementares” ou “sumárias” (Dubuffet, apud Danchin 2006, p. 59), a falta de habilidade e a distância em relação à arte erudita dificilmente se demarcam no contexto da emergência de movimentos como a Pop Art e o Novo Realismo, nos quais a produção de artistas “profissionais” ou “culturais” põe-se ela mesma a suspender e questionar a fronteira entre Belas Artes e indústria cultural e a questionar o papel da habilidade técnica e da própria noção de representação na produção artística.
A apropriação de fragmentos e restos, tão comum na produção de pacientes psiquiátricos - e que talvez não se deva apenas à falta de meios mais nobres, mas também à potência de desmonte e reconfiguração da realidade que se põe em obra em situações de sofrimento psíquico grave - torna-se um dos procedimentos caros a artistas diversos.
No primeiro Manifesto do Novo Realismo, de 1960, o crítico Pierre Restany (1979)Restany, P. (1979). Os novos realistas. Perspectiva. fala da “aventura do real percebido em si e não através do prisma da transcrição conceitual ou imaginativa” (p. 144). Acumulação e seriação de objetos respondem a tal lógica de fragmentação da narrativa totalizante, além de eventualmente dialogarem com o mecanismo de produção de mercadorias, na busca do que Restany chama de “socialização da arte numa estética popular generalizada” (p. 144). Em 1967, Germano Celant cria a expressão italiana Arte Povera para ressaltar a utilização de material “pobre” na arte como possibilidade de identificação e valorização do individual, em uma espécie de guerrilha contra a imitação e a mediação do real que, através das “enormes possibilidades instrumentais e informacionais oferecidas pelo sistema”, separaria a arte da vida e o público do privado (Celant, 1967Celant, G. (1967). Arte Povera: Notes on a Guerrilla War. Flash Art, 5., s/p.).
A solução encontrada por Dubuffet para esse impasse - ou o modo pelo qual ele evita discuti-lo - consiste em restringir a denominação de Arte Bruta à sua coleção, ou, mais precisamente, a parte dela: o núcleo histórico inicial. Na década de 1970, ele negará ao colecionador Alain Bourbonnais o direito de utilizá-la, alegando que a expressão deve ser considerada “como um nome próprio”, “exclusivamente reservado à associação criada em 1948 sob tal nome e à atividade desta e de suas coleções” (Champenois, 2017Champenois, E. (2017). L’Art Brut. PUF (collection Que sais-je)., p. 35).
O catálogo da Coleção de Arte Bruta, publicado em 1971, distingue sob a denominação “Coleções Anexas” cerca de duas mil obras que não corresponderiam ao ideal de pureza encarnado pelas peças autenticamente “brutas”, em número superior a quatro mil, e realizadas por 135 artistas. Instalada desde 1972 na cidade suíça de Lausanne, a Coleção terá em 1982 seus anexos renomeados como “Nova invenção”. Nesse ínterim, outra expressão havia surgido em 1978 como variante da Arte Bruta, para nomear uma exposição no Museu de Arte Moderna da Cidade de Paris: “Os singulares da Arte”. Com o subtítulo “Dos inspirados aos habitantes-paisagistas”, a mostra trazia, ao lado de autodidatas não repertoriados pela coleção de Dubuffet, ambientes de arquitetura espontânea apresentados em fotografias, vídeos e instalações. No ano seguinte, inaugurava-se em Londres a exposição Outsiders, agrupando obras oriundas de acervos europeus diversos, inclusive da Coleção Prinzhorn, além de alguns artistas americanos.
A ética da arte “incomum”
Até fins da década de 1970, a contracultura, o grafitti e outras for- mas de manifestação cultural urbana, além do ativismo político, foram abrindo e problematizando em diversos países a própria definição de obra, com happenings, performances e proposições poéticas que por vezes se aproximavam das “margens” da sociedade. Com um artista como Jean-Michel Basquiat, consubstancializa-se em Nova York, no início dos anos 1980, a paradoxal figura do outsider midiático. Adolescente nascido no Brooklyn, negro, pobre e grafiteiro, que sobrevive da venda de cartões pintados na rua, o filho de pai haitiano e mãe porto-riquenha torna-se rapidamente um sucesso de vendas. O estilo que o consagra é próximo ao de Jean Dubuffet - que ele nega conhecer - e será com frequência descrito como “primitivo” pelos críticos.
Na infância, Basquiat teve contato com obras e exposições graças ao interesse da mãe por arte e moda, mas, mesmo assim, um crítico sublinha sua “maravilhosamente intuitiva compreensão da linguagem da arte moderna”, na qual se mesclariam as imagens da rua e da televisão à “espiritualidade de sua herança haitiana” (Deitch, 1982Deitch, J. (1982). Jean-Michel Basquiat: Annina Nosei. Flash Art., p. 50). Deve-se reconhecer na obra do artista a façanha conceitual de mesclar arte de rua e Belas Artes, cultura popular e de massa e cultura erudita, mas parece fácil demais - se não claramente preconceituoso - relacionar o jovem negro da periferia à intuição e à espiritualidade. Depois de grafitar por meses em frente às galerias de arte do Soho em busca de uma oportunidade de reconhecimento, ele próprio provavelmente percebeu que, para ingressar no mundo da arte, teria que fazer arte “primitiva” - ou seja, teria que assumir o lugar do “outro” em seu exotismo fetichizado.
No Brasil, um módulo da XVI Bienal de Arte de São Paulo reunia, em 1981, obras de pacientes psiquiátricos brasileiros e internacionais, ao lado de artistas populares, sob a denominação “Arte incomum”. O núcleo da mostra era constituído por obras do Museu de Imagens do Inconsciente, realizadas no ateliê de pintura que a psiquiatra Nise da Silveira e o artista Almir Mavignier inauguraram em 1946 no então Centro Psiquiátrico Nacional, bem como obras de pacientes do Hospital de Juquery, coletadas desde a década de 1920 pelo psiquiatra e crítico de arte Osório César e fomentadas de maneira mais sistemática desde fins dos anos 1940, no ateliê organizado por ele e o também psiquiatra Mário Yahn na instituição.
A definição de Arte Incomum dada pelo curador geral da Bienal, Walter Zanini, espelhava as ideias clássicas da Arte Bruta: tratava-se, segundo ele, de “múltiplas manifestações individuais da espontaneidade de invenção não redutíveis a princípios culturais estabelecidos”, e nelas se usariam material e técnicas “absolutamente distintos da arte apoiada nas normas consagradas pela história da arte” (Zanini, 1981Zanini, W. (1981). A Bienal e os Artistas Incomuns. In Catálogo de Arte Incomum. XVI Bienal de Arte de São Paulo. Vol. III. Fundação Bienal de São Paulo, out./dez., p. 7). A lista desses artistas, que seriam “marginais” à atividade profissional, incluía, ao lado das obras das instituições de Nise da Silveira e Osório Cesar e de estrangeiros clássicos da Arte Bruta como Adolf Wölfli e Aloïse, além de Müller, Scottie Wilson e Ferdinand Cheval (conhecido como Facteur [Carteiro] Cheval), representantes da arte popular já consagrados no Brasil, como Antônio Poteiro e G. T. O. (que começara a esculpir aos 50 anos a partir de sonhos e visões que transmitiriam ordens divinas), ao lado de Eli Heil (artista naïf que também gozava de amplo reconhecimento naquele momento).
Curador internacional do núcleo, o inglês Victor Musgrave denominava outsiders os artistas selecionados, para logo notar que na verdade deveriam ser considerados insiders, por se posicionarem, cada um em sua singularidade, no centro da arte, na medida em que estariam em “transe poético”, em “um estado criativo de total absorção em si mesmos, de total obscurecimento do mundo exterior” (Zanini, 1981Zanini, W. (1981). A Bienal e os Artistas Incomuns. In Catálogo de Arte Incomum. XVI Bienal de Arte de São Paulo. Vol. III. Fundação Bienal de São Paulo, out./dez., p. 7). Perto deles, artistas profissionais poderiam parecer pintores ocasionais, enquanto os naïfs revelar-se-iam tranquilos e acomodados em seu desejo de agradar e serem aceitos pela arte oficial. Vistos como verdadeiros subversivos, os outsiders frequentemente apresentariam “referências e implicações de caráter social” e elaborariam “lutas épicas” (p. 12), o que os distinguiria tanto da arte tribal, na qual a tradição é passada de pai para filho de forma conservadora, quanto das obras realizadas em instituições psiquiátricas com fins terapêuticos, que seria “monótona em termos de tema e conteúdo” e submetida ao desejo do paciente de satisfazer às expectativas do terapeuta (p. 13). Musgrave percebe e rechaça, assim, a estilística domesticada pelos parâmetros que viemos apontando acima, além de recusar a ideia de que alguém possa ser artista por ser um “doente mental.”
Refletindo o alargamento da própria concepção de arte e o delineamento da figura do marginal que lançaria no mundo obras não convencionais, o módulo de Arte Incomum incluía, ao lado de telas, desenhos e esculturas, algumas fotografias de construções arquitetônicas bizarras como o Palácio Ideal do carteiro Cheval, que tanto encantou Breton. Ou a Casa-Flor de Gabriel dos Santos, erigida entre 1912 e 1923 com garrafas, cacos de vidro e detritos mesclados a conchas e búzios, entre São Pedro da Aldeia e Cabo Frio, na Região dos Lagos, no Estado do Rio de Janeiro. Ou ainda o Museu de Jesus edificado por Jakim Volambuk em 1952 e posteriormente transformado em Simitério (sic) de Adão e Eva no bairro da Mooca, em São Paulo, contendo os túmulos de Eva, Adão, Cristo e Abel - este último, em forma de barco.
A caracterização da produção de arte que se apartaria dos modelos culturais hegemônicos distancia-se, assim, da querela entre naturalismo e experimentação modernista que a guiava até a metade do século, para configurar sob o termo outsider a força e autenticidade de um engajamento subjetivo radical do artista na construção compulsiva de obras aparentemente desinteressadas, por se darem fora do circuito artístico tradicional. Para a curadora brasileira do módulo, Annateresa Fabris, o que importa nessas obras é transmitir ao mundo a própria mensagem, de qualquer maneira, em qualquer suporte. Josette Balsa (1981)Balsa, J. (1981). A Arte é um Antidestino. In Catálogo de Arte Incomum. XVI Bienal de Arte de São Paulo. Vol. III. Fundação Bienal de São Paulo, out./dez., por sua vez, afirma em texto presente no mesmo catálogo que o artista “incomum”, “transcendendo culturas e contraculturas”, “expressa a vitória do indivíduo sobre as forças coletivas a que chamamos destino” (p. 48).
O “louco” passa, assim, a se assimilar à figura de encarnação da potência contracultural da subjetividade, afirmando sua singularidade até mesmo frente aos padrões que acabam caracterizando a “contracultura” - que, contraditoriamente, termina por se tornar uma espécie de estilo muito em voga nos anos 1970.
Fabris (1981)Fabris, A. (1981). Cosmogonias Outras. In Catálogo de Arte Incomum. XVI Bienal de Arte de São Paulo. Vol. III. Fundação Bienal de São Paulo, out./dez. chega a relativizar a ideia de espontaneidade e distanciamento da cultura, afirmando que “não se pode pretender, nos dias de hoje, uma pureza edênica, uma total imunidade à cultura” (pp. 24-25). Mesmo que alguns dos artistas expostos no Módulo de Arte Incomum estejam inseridos no mercado de arte, o mais importante, para a curadora, seria ressaltar “como, apesar do mercado, tenham conseguido manter uma visão própria, um frescor e uma ânsia de criação que fazem passar para um segundo plano os holofotes da publicidade” (pp. 24-25).
Se a figura do artista outsider perpetua assim a lógica da “pureza” suposta nos pacientes psiquiátricos, dando nova roupagem a seu corolário - a noção de expressão -, deve-se contudo assinalar que ela toma outra via graças à sua articulação com a ética clínico-política dos movimentos de Antipsiquiatria e Reforma Psiquiátrica.
Ronald Laing e David Cooper deflagraram uma forte contestação do saber psiquiátrico na segunda metade dos anos 1950, na Grã-Bretanha. Enquanto isso, na França, a Psicoterapia Institucional - que já tentava humanizar o tratamento dos doentes e rever as fronteiras institucionais desde a experiência realizada por François Tosquelles em Saint-Alban durante a Segunda Guerra Mundial - dava origem em 1953 à inovadora proposta de La Borde, da qual Jean Oury foi o diretor, contando durante alguns anos com a importante contribuição de Félix Guattari.
No começo da década de 1960, Franco Basaglia punha em prática no Hospital de Gorizia, na Itália, uma radical proposta de negação da instituição psiquiátrica, denunciando a violência inerente a tal sistema e propondo medidas concretas para sua extinção. O histórico e as bases teóricas e políticas dessa e das demais propostas são muito vastos e não podem ser aqui apresentados e analisados em seus sucessos e fracassos. Sublinharei apenas a seriedade com a qual a experiência de Basaglia faz reconhecer que a própria noção de doença mental deve ser posta em suspenso, na medida em que a única diferença existente entre os “doentes” e os ditos “normais” refere-se ao poder que estes pareceriam exercer sobre aqueles. Tal dicotomia é, em última análise, apenas a justificativa para o manicômio - a “instituição total”, nos termos de Erving Goffman, na qual se está “à mercê do controle, do julgamento e dos planos de outros, sem que o interessado possa intervir para modificar o andamento e o sentido da instituição” (Ongaro, 1985Ongaro, F. B. (1985). Transformação Institucional e Objetivos Comuns. In F. Basaglia, A instituição negada. Graal., p. 273), como resume Franca Basaglia Ongaro, esposa e parceira de Franco.
Nesse tipo de instituição se é objetificado como “doente” ou como “profissional” e assim posicionado, sob a justificativa do tratamento ou do cuidado, em uma relação de poder - dominação ou submissão - com seu complementar. Para romper com tal estrutura, a experiência de Gorizia propunha um verdadeiro “revolucionamento institucional” (Basaglia, 1985Basaglia, F. (1985). A instituição negada. Graal., p. 113), nas palavras de Franco Basaglia, negando-se a configurar um modelo definitivo que resultasse em outro sistema (“mais humanizado”, eventualmente), para defender a negação total da distinção entre os atores sociais em jogo e o estabelecimento de estruturas comunitárias nas quais tudo deveria ser tratado e gerido horizontalmente, em uma situação dialética e sempre em movimento.
Como sabemos, os resultados da Reforma Psiquiátrica que chegaram até nós estão muito longe de alcançar tais aspirações. O movimento antimanicomial logrou, contudo, estabelecer como política pública algumas diretrizes que fizeram diferença de peso - como a proibição de internações longas, a ênfase no gerenciamento de situações de crise e em serviços como os centros de atenção psicossocial, com funcionamento diurno, e as pensões protegidas -, buscando direcionar a atenção em saúde mental para a ressocialização ou a manutenção do paciente na vida em sociedade. Muitas são as contradições que persistem, entretanto, e que não posso aqui examinar. Cito apenas uma delas, das mais complexas: o papel da prescrição de medicamentos e da posição de poder que ela implica, agravada pelo fato de alguns médicos se deixarem cooptar pela poderosa indústria farmacêutica para prescrever remédios em demasia, acreditando na ideologia do funcionamento dos neurotransmissores como independente da complexa trama entre o macro e o microssocial, o afetivo e o político, no quadro de cada pessoa que passa por sofrimento psíquico grave, nas particularidades de cada momento de sua vida. Não bastassem problemas sérios como este, atualmente vivemos uma tentativa clara de sucateamento e desmonte da rede brasileira de atenção em saúde mental, no bojo da grave desestruturação das políticas sociais já em andamento.
Ao longo das décadas de luta antimanicomial na Europa (desde os anos 1960) e no Brasil (que se inicia nos anos 1980, com a reabertura democrática), propostas artísticas diversas misturaram-se ao ativismo, principalmente com grupos de teatro e música, ao lado da criação de rádios e TVs comunitárias. A criação de centros de atenção - onde os pacientes passam o dia, ou parte dele - encorajou, por outro lado, a criação de oficinas diversas, nas quais as atividades coletivas são consideradas terapêuticas em sentido amplo e as propostas são conduzidas tanto por artistas quanto profissionais de saúde em geral.
Temos hoje, assim, um panorama amplo e disperso de iniciativas nas quais a arte configura um terreno bastante vago, muitas vezes em interseção com práticas propriamente psicoterápicas mais ou menos sistemáticas, outras vezes de forma mais intensa e bem delimitada, em atividades conduzidas por artistas. Não existem estudos que mapeiem tal campo ao longo dessas décadas, e sua documentação tende a ser escassa ou mesmo inexistente. Uma exceção digna de nota é fornecida pelo material produzido pelo Prêmio Cultural Loucos pela Diversidade 2009. Edição Austregésilo Carrano, promovido por uma parceria entre Ministério da Cultura e Ministério da Saúde sob a coordenação do psiquiatra Paulo Amarante, que agraciou dezenas de iniciativas na interface entre saúde mental, arte e cultura em diversos Estados brasileiros, mas infelizmente não teve edições posteriores.
Hoje assistimos a um amplo redirecionamento de ateliês de arte em instituições de saúde mental para oficinas de artesanato ou outras atividades que trariam geração de renda mais garantida e imediata. Nessas oficinas há uma tendência crescente à padronização de produtos e à mecanização das atividades - seguindo a ideia equivocada de que para gerar renda se deva produzir objetos de design massificado -, o que pode impossibilitar a abertura para processos de apropriação e invenção singular a que convida a atividade artística.
Em algumas instituições, em contrapartida, prosseguem hoje importantes núcleos de produção e reflexão artística, como o Ateliê Gaia (no IMAS Juliano Moreira), o Espaço Aberto ao Tempo (EAT) e o Museu de Imagens do Inconsciente (ambos no IMAS Nise da Silveira), a Oficina de Criatividade do Hospital São Pedro, em Porto Alegre e o ateliê do artista Rafael Matos no Hospital de Jurujuba, entre muitos outros. De forma complementar à disseminação de oficinas e ao alargamento do que se considera “terapêutico” no terreno da saúde mental, intensificaram-se no campo da própria arte, mais recentemente, propostas relacionais em contexto institucional que levaram artistas do circuito a equipamentos da rede de saúde mental para desenvolverem projetos pontuais, eventualmente no formato de “residência artística”.
Se a “descoberta” e valorização de produção de pacientes psiquiátricos na Europa, no início dos anos 1920, contribuiu para a defesa do valor “expressivo” da arte moderna contra o academicismo naturalista vigente, atualmente, uma vez denunciada a arbitrariedade do isolamento social das pessoas que vivem experiências psicóticas, torna-se ingênuo - se não claramente violento e segregador - fazê-las encarnarem a figura do gênio subtraído da vida cultural, do artista “bruto”. Que sentido poderia ter tal qualificação no campo da produção contemporânea, no qual nem a formação técnica, nem a recepção por parte da crítica garantem o lugar de artista “autêntico”, ou não “bruto”? Apesar de existirem ainda galerias de Arte Bruta em diversos países, parece-nos problemático, hoje, incensar a produção de artistas outsiders e buscar lançar luz sobre eles, pois isso realça, paradoxalmente, sua suposta distinção em relação aos “artistas” em geral.
Nesse sentido, é hoje um importante desafio, tanto para os trabalhadores da Saúde Mental como da Arte, rearticular entre o terreno da arte e o da loucura de modo fiel à abertura ética que os expandiu e problematizou desde os anos 1960, frente ao complexo cenário atual, no qual mesmo iniciativas que visam a valorização artística da produção de “pacientes psiquiátricos” correm o risco de caírem em um paternalismo que os reafirma como “loucos” e portanto diferentes de “outros artistas”. Como abordar propostas realizadas por artistas em instituições psiquiátricas como aproximações ao “outro”, uma vez que elas correm sempre o risco de reafirmá-lo em um lugar distinto daqueles “dos artistas” já reconhecidos pelo circuito?
Para lidar de forma propositiva com tais questões, parece-me necessário negar a própria noção de Arte Bruta, para pôr em suspenso a naturalização da delimitação entre artistas eruditos ou incluídos no circuito de arte e aqueles que estariam em situação de marginalização social - reconhecendo, inclusive, as fronteiras complexas entre esta e o aparecimento de sofrimento mental grave. Seria importante, nesse sentido, recusando qualquer delimitação prévia do que seria “o lugar” da arte, do artista ou mesmo da cultura, e denominar simplesmente como artistas aqueles criadores que porventura tenham suas histórias marcadas por situações de vulnerabilidade e segregação social (situações que no Brasil, é importante lembrar, com muita frequência são consubstanciais à condição racial de tais indivíduos). Longe de invisibilizar a situação de vida desses artistas, o gesto de recusa de categorizá-los e lhes dar de saída um lugar específico, de exceção, no amplo e muito indefinido campo da arte contemporânea, parece-me permitir que se perceba o alcance micropolítico de suas obras, indissociáveis das estratégias de criação e reconhecimento que permitem furar o pesado muro da exclusão social.
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Financiamento/Funding: Este trabalho não recebeu apoio. / This work received no funding.
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Este ensaio encontra maior desenvolvimento no livro de minha autoria, Lugares do delírio. Arte e expressão, loucura e política, que se enconta no prelo.
Referências
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
13 Mar 2023 -
Data do Fascículo
Dez 2022
Histórico
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Recebido
24 Out 2022 -
Aceito
16 Dez 2022