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Apresentação

O artigo A escola pagã foi publicado pela primeira vez na edição de 22 de janeiro de 1852 da revista Semaine Théâtrale e republicado quatorze anos mais tarde, com alguns cortes e pequenas variações, na Revue de Poche de 25 de dezembro de 1866, sob os cuidados de Charles Monselet. A aparente ausência de traduções integrais para o português e o pouco interesse suscitado por esse artigo, mesmo no âmbito de algumas alas da crítica especializada, contrastam com sua importância para a compreensão do pensamento estético de Baudelaire e para a reavaliação de suas relações com a assim chamada modernidade poética.

À primeira vista, o próprio autor aparece como o principal responsável por esse desinteresse. Ao anexar o artigo a uma longa carta enviada a sua mãe no dia 27 de março de 1852, Baudelaire parece reduzi-lo a um texto de circunstância quando afirma que ele trata de assuntos “especificamente parisienses” e que sua compreensão pode não ser fácil para quem está “fora dos meios para os quais e sobre os quais” ele foi escrito (BAUDELAIRE, 1973: 191). Outro fato relevante é que o artigo sequer é citado nas duas últimas listas (1865 e 1866) de textos selecionados pelo poeta para compor suas obras completas.

O texto apresenta uma crítica carregada de ironia a um grupo indeterminado de poetas que teriam em comum o interesse renovado pela mitologia pagã. Banville, Laprade, Gautier e até mesmo Nerval podem ser alguns dos poetas visados pelo autor, embora a ausência de referências diretas desautorize qualquer afirmação a esse respeito. Para além do interesse pela obra de um poeta específico, o texto de Baudelaire parece atacar uma tendência mais geral da poesia e da arte de seu tempo a supervalorizar a “forma”, a “paixão” e as aparências em detrimento da “razão”, do “bom” e do “verdadeiro”. Opondo-se frontalmente ao anticlericalismo da época, retomando a crítica de Santo Agostinho ao “excessivamente grande prazer dos olhos” e reafirmando explicitamente a importância da “sociedade precedente, cristã e filosófica”, o ataque de Baudelaire ao neopaganismo em poesia contrasta com a imagem do “poeta da modernidade”, herói das vanguardas, que rompe com a tradição e contribui para a instauração da autonomia do estético e da busca pelo novo como ideais da arte, o que também poderia explicar as reservas de determinadas alas da crítica a esse texto.

Para compreender melhor a importância do artigo, é preciso relativizar os comentários que o próprio poeta tece sobre ele na carta a Mme. Aupick. Não é difícil perceber que o texto apresenta uma série de reflexões importantes sobre a arte que, em virtude de seu alcance teórico, ultrapassam bastante os limites do circunstancial. Para além do ataque à poesia dita neopagã, a denúncia da “loucura da arte”, do “gosto imoderado da forma” nos ajuda a compreender a visão dualista e por vezes paradoxal que Baudelaire tem da poesia e da arte em geral. Cotejado com outros artigos e ensaios posteriores – como L’Art philosophique, para citar o exemplo de um texto no qual o poeta apresenta sua crítica aos artistas que, ao contrário dos neopagãos, subordinam a arte ao pensamento e à razão –, o artigo A Escola Pagã oferece uma excelente baliza para o entendimento do pensamento baudelairiano sobre a arte e a poesia.

Por tudo isso, o retorno a esse texto contribui para uma releitura da obra de Baudelaire para além do reducionismo vanguardista e, consequentemente, para uma reavaliação do lugar que ela ocupa na tradição da lírica moderna, na linha do que já vem sendo feito há alguns anos no âmbito da crítica especializada, especialmente na França.

Diante da impossibilidade de se atestar com segurança a autoria das modificações que deram origem à versão de 1866, esta tradução tomou como referência exclusivamente o texto de 1852, conforme a fixação feita por Claude Pichois para as obras completas de Baudelaire (cf. 1976: 44-49) publicadas em dois volumes nos anos de 1975 e 1976.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Apr 2016
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