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Sinterização da liga WC/10Co por altas pressões

High pressure sintering of the WC/10Co alloy

Resumos

Ligas de metal duro (WC/Co) são geralmente processadas pelas técnicas da metalurgia do pó, que compreende mistura dos pós elementares, compactação e sinterização por fase líquida, com ou sem a posterior prensagem isostática a quente (HIP). Uma nova rota de processamento de metal duro é aqui apresentada, chamada de altas pressões e altas temperaturas (HPHT). Neste trabalho foi estudada a sinterização da liga WC/10% pesoCo a 5GPa, nas temperaturas de 1200, 1300, e 1400ºC, para os tempos de 1 e 2 minutos. Os melhores resultados obtidos foram: densidade =95,6%, dureza HV45 =10GPa e tenacidade à fratura K Ic=11MPa.m½.

Sinterização HPHT; metal duro; dureza; tenacidade à fratura


Hardmetal is usually processed by the conventional powder technology techniques: mix of WC + Co powders, compacting, and liquid phase sintering. A new method to process hardmetal parts are described here. Parts of WC/10%wt Co were processed by using high pressure and high temperature sintering. It was used the pressure of 5GPa, temperatures of 1200, 1300, and 1400ºC, and times of 1and 2 minutes of sintering. The best results was density =95,5%, hardness HV45 =10GPa and fracture toughness of K Ic =11MPa.m½.

HPHT sintering; hardmetal; hardness; fracture toughness


Sinterização da liga WC/10Co por altas pressões

High pressure sintering of the WC/10Co alloy

Márcio Ferreira RodriguesI; Guerold Sergueevitch BobrovnitchiiI; Ronaldo QuintanilhaI; Rodolfo CândidoI; Gilbert SilvaII; Marcello FilgueiraI

IUniversidade Estadual do Norte Fluminense – UENF/ Centro de Ciências e Tecnologia CCT/ Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Ciência dos Materiais PPGECM/ Grupo de Pesquisa: Compósitos e Ferramentas de Materiais de Alta Dureza – GFer; Av. Alberto Lamego, 2000, Campos dos Goytacazes/RJ, CEP: 28013-600. e-mail: mfr@uenf.br, guerold@uenf.br, ronaldoquintanilha@bol.com.br, csrodolfo@gmail.com.br, marcello@uenf.br

IIDepartamento de Engenharia de Materiais – DEMAR/FAENQUIL, Pólo Urbo Industrial, Gleba AI6, Lorena/SP, CEP: 12600-000. e-mail: gil@demar.faenquil.br

RESUMO

Ligas de metal duro (WC/Co) são geralmente processadas pelas técnicas da metalurgia do pó, que compreende mistura dos pós elementares, compactação e sinterização por fase líquida, com ou sem a posterior prensagem isostática a quente (HIP). Uma nova rota de processamento de metal duro é aqui apresentada, chamada de altas pressões e altas temperaturas (HPHT). Neste trabalho foi estudada a sinterização da liga WC/10% pesoCo a 5GPa, nas temperaturas de 1200, 1300, e 1400ºC, para os tempos de 1 e 2 minutos. Os melhores resultados obtidos foram: densidade =95,6%, dureza HV45 =10GPa e tenacidade à fratura KIc=11MPa.m½.

Palavras chaves: Sinterização HPHT, metal duro, dureza, tenacidade à fratura.

ABSTRACT

Hardmetal is usually processed by the conventional powder technology techniques: mix of WC + Co powders, compacting, and liquid phase sintering. A new method to process hardmetal parts are described here. Parts of WC/10%wt Co were processed by using high pressure and high temperature sintering. It was used the pressure of 5GPa, temperatures of 1200, 1300, and 1400ºC, and times of 1and 2 minutes of sintering. The best results was density =95,5%, hardness HV45 =10GPa and fracture toughness of KIc =11MPa.m½.

Keywords: HPHT sintering, hardmetal, hardness, fracture toughness.

1 INTRODUÇÃO

Após a descoberta do tungstênio (W), em 1781, por Scheele, levou cerca de cem anos para que a primeira síntese de carbeto de tungstênio (WC) fosse realizada, por Moissan. Foram feitas várias tentativas de produzir materiais à base de WC via rota de fusão, embora todas sem sucesso devido à elevada fragilidade do material. Após isto, foi verificado que a rota adequada seria através da mistura de pós de WC e de Co (cobalto), produzindo um cermet, chamado carbeto cementado, de elevada dureza combinada com uma satisfatória tenacidade. Este novo material apresentou elevada resistência à abrasão, e usinava aços rapidamente, sendo, portanto, alvo de rápido desenvolvimento[1]. Após isto, o WC e ligas WC/Co foram utilizados em vários materiais e aplicações, e mais recentemente em coberturas e filmes [2].

As ligas de metal duro são processadas via sinterização por fase líquida, as quais consistem de um carbeto refratário de elevada dureza, embebido numa matriz tenaz de Co[3],[4]. Estas ligas são extensivamente utilizadas em aplicações que demandem resistência à abrasão (por exemplo: ferramentas de corte, matrizes de conformação, equipamentos de perfuração, dentre outros).

O Co é o ligante mais utilizado em metal duro devido às suas elevadas molhabilidade e solubilidade para com o WC, aliado às boas propriedades mecânicas [5]. O teor de Co no metal duro pode variar, dependendo da aplicação, mas é em geral inferior a 15% em peso [6].

O processamento de ligas de metal duro se dá pelas rotas convencionais da metalurgia do pó, onde os pós elementares são cominuídos, misturados e granulados, compactados e sinterizados. A sinterização é normalmente realizada a vácuo ou à baixa pressão de gás inerte ou redutor (em torno de 0,1MPa), mas recentemente vem sendo largamente empregado a HIP (em torno de 100MPa) – após a sinterização convencional, ou o ciclo único de sinterização a média pressão de gás (1,5 a 10MPa). Através da aplicação de pressão em alta temperatura, estes dois processos citados assistem na eliminação parcial ou total de poros na microestrutura [7].

Este trabalho apresenta uma tentativa exploratória de processar a liga WC-10% pesoCo, de agora em diante chamada WC/10Co, através de uma rota alternativa, denominada HPHT – altas pressões e altas temperaturas, onde a sinterização ocorre em intervalos de tempos muito curtos. No processo original, nenhum agente lubrificante ou aglomerante orgânico é utilizado (em contraste com as demais técnicas de processamento de metal duro), e nenhum outro tratamento pós-sinterização é necessário, tal qual o HIP.

2 PROCEDIMENTO EXPERIMENTAL

O fluxograma da Figura 1 mostra a rota empregada para processar a liga WC/10Co. Os pós de grau comercial de WC (formato prismático convencional) e Co (forma de esponja e irregular), ambos de tamanho médio de partícula de 5mm, foram adquiridos da Derivata Ind. Com. – o que caracteriza os materiais de partida do metal duro na classe grosso. Estes pós foram misturados manualmente na estequiometria desejada. A densidade teórica desta liga é de 14,6g/cm3. A mistura (cada amostra de 1g) foi posta dentro de um cilindro vazado, de grafite, o qual atua como resistência elétrica para aquecer o material (passagem de corrente direta), e então montado dentro de uma cápsula de calcita – responsável pela formação da gaxeta, que garante a distribuição homogênea da alta pressão nas amostras. As sinterizações foram realizadas em prensa a quente especial (Ryazantyashpressmash - O138B - 2500tons) – escala industrial, normalmente utilizada na síntese de diamantes. Foram obtidos sinterizados cilíndricos, de diâmetro e altura de aprox. 4mm. A Tabela 1 mostra os parâmetros da sinterização assistida por alta pressão.


As densidades dos sinterizados foram determinadas pelo método de Arquimedes, medindo-se as massas das amostras em balança Scaltec SBC 31 – 0,0001g. Os ensaios de dureza Vickers (HV) foram conduzidos em durômetro PANTEC RBS, aplicando uma carga (P) de 45kgf, e usando a Equação 1. Este procedimento foi realizado 5 vezes em cada amostra, para fins de confiabilidade dos resultados obtidos. A tenacidade à fratura (K1c) foi determinada de acordo com o método proposto por Shetty e colaboradores [8], via uso da Equação 2.

Onde d é o comprimento médio da diagonal de impressão (mm).

(2)

Onde l é o comprimento da trinca formada no plano superficial (m).

Para verificar se houve dissolução do grafite do cilindro aquecedor nas amostras, ou a formação de fases durante a sinterização, foram feitas difração de raios-X (DRX) em cada amostra (difractômetro Seifert URD 65, rad. CuKa – 0,03º/s). Aspectos microestruturais foram observados por microscopia eletrônica de varredura (MEV - Zeiss DSM 962), para tanto, as amostras foram lixadas e polidas.

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 Caracterização Estrutural

A Figura 2 mostra os difractogramas obtidos para as amostras sinterizados nas seis condições descritas. Claramente observa-se que não há qualquer diferença entre os perfis de cada amostra. São observados os picos relativos ao WC e ao Co, apenas. Entretanto, quando analisamos os difractogramas de cada amostra em separado, para melhor resolução (vide Figura 3 - DRX da amostra F, sinterizada a 5GPa/1400ºC/2min.), observamos que durante a sinterização ocorreu a formação, mesmo que em pequenas quantidades (picos de baixa intensidade), da fase Co3W para as amostras sinterizadas por 2 minutos, a 1300 e 1400ºC, a qual é deletéria às propriedades mecânicas do metal duro.



A análise nas amostras sinterizadas a 1 minuto em qualquer temperatura, ou a 1200ºC/2 minutos mostrou que não houve formação da fase Co3W. No primeiro caso, atribui-se isto ao tempo mais curto de sinterização; no segundo caso, à temperatura mais baixa de sinterização – 1200ºC, ambos os casos não propiciaram a difusão do carbono do WC e posterior formação do Co3W. Vale informar que esta fase secundária é formada porque durante a sinterização HPHT (que foi muito rápida > 2min.) o carbono reage com o oxigênio adsorvido quase que instantaneamente, promovendo, então, depleção no teor de carbono do WC. Como conseqüência, o carbono livre não se dissolve efetivamente na fase líquida, eliminando, via difusão, tal fase indesejável. Recentemente, Shi e colaboradores [9], chegaram a resultados muito similares do acima descrito, ao estudar a liga WC/6,29Co sinterizada por plasma, durante 10 minutos, que é considerado um tempo curto frente ao tempo normalmente empregado nas tecnologias convencionais, que é de cerca de 1 hora.

3.2 Densificação

A Figura 4 ilustra que o tempo de 1 minuto de sinterização promoveu maiores densificações. A elevação da temperatura também aumentou a densificação. Observa-se que chegou-se a 95,5% da densidade teórica da liga WC/10Co para a condição de sinterização de 5GPa/1400ºC/1min., indicando que o uso de alta pressão permite a obtenção de corpos densos de metal duro, a tempos curtos de sinterização. Pode-se também observar que amostras sinterizadas a 5Gpa/1400ºC/2min. apresentaram densidade de 90%, ou seja, 5% inferior às das amostras sinterizadas na mesma condição, mas para o tempo de 1 minuto. Isto pode ser atribuído ao fato de que com tempos maiores de sinterização, há uma maior difusão do cobalto líquido, o qual, em parte, solubiliza-se nos grãos de WC, formando novos compostos (no caso Co3W), deixando em seus locais originais uma porosidade residual.


3.3 Dureza e Tenacidade à Fratura

A Figura 5 mostra que os melhores resultados de dureza foram encontrados para as amostras sinterizadas a 5GPa/1400ºC/1min. e 5GPa/1200ºC/2min., correspondendo a HV45=10GPa.


Conforme visto no item 3.1, as amostras sinterizadas durante 1 minuto não apresentaram a fase Co3W, pois o tempo não foi suficiente para a difusão. Por outro lado, para conseguir propriedades mecânicas satisfatórias, se fez necessário o uso da temperatura mais elevada – 1400ºC, para o tempo de 1 minuto. Já para a sinterização durante 2 minutos ocorre o oposto, onde temperaturas mais elevadas propiciaram a formação da fase Co3W, reduzindo drasticamente a dureza, aliada à densificação insatisfatória destas amostras. Assim sendo, para o tempo de 2 minutos, a melhor temperatura de sinterização foi de 1200ºC, pois nestas condições não houve a formação da fase Co3W.

O melhor resultado de tenacidade à fratura, KIC=11MPa.m½, foi encontrado para as amostras sinterizadas a 5GPa/1400ºC/1min. Entretanto pode-se observar que os resultados de KIC não foram marcantemente influenciados pelas condições de sinterização, a despeito da densidade e da dureza, o que sugere que a mesma é governada pelo teor de cobalto e sua distribuição no sinterizado, ao invés do WC e demais fases tenham sido formadas durante a sinterização.

Assim, neste estudo, as amostras sinterizadas a 5GPa/1400ºC/1min. foram as que apresentaram globalmente os melhores resultados, pois empata nos resultados de dureza e tenacidade com as amostras sinterizadas a 5GPa/1200ºC/2min., e apresentaram maior densificação, da ordem de 95,5%. Para efeito comparativo, ao analisarmos o trabalho feito por Scieszka [10], onde foram sinterizadas convencionalmente amostras de metal duro, as mesmas apresentaram dureza HV=11GPa e tenacidade à fratura KIC=12,8MPa.m½, indicando que neste trabalho conseguiu-se amostras sinterizadas via HPHT com propriedades mecânicas satisfatórias.

3.4 Microestrutura

As Figuras 6 e 7 ilustram, respectivamente, o aspecto microestrutural das amostras sinterizadas a 5GPa/1400ºC/1min. e 5GPa/1400ºC/2min. Pode-se observar a microestrutura típica do metal duro, com o coalescimento de algumas partículas de WC (partículas claras), pequena porosidade (preto), e distribuição do cobalto (cinza escuro). Nota-se uma microestrutura mais homogênea na Figura 7, a qual apresenta uma maior distribuição do cobalto, e com lagos de Co da ordem de 5 a 15mm, quando comparada à microestrutura apresentada pela Figura 6, onde os lagos de Co são da ordem de 10 a 25mm. Entretanto, observa-se na Figura 7 a presença de uma fase cinza clara (com a aparência de manchas), uniformemente distribuída. Atribuímos ser esta a fase Co3W, identificada no difractograma da Figura 3.



4 CONCLUSÕES

Conclui-se neste trabalho que é possível sinterizar metal duro via altas pressões, considerando os seguintes pontos:

1. A fase Co3W surge para maiores tempo e temperaturas de sinterização termobárica;

2. Tempos maiores de sinterização promovem maior difusão do Co, o qual se solubiliza no WC, resultando em porosidade residual, e em formação de Co3W;

3. Os lagos de cobalto reduzem as propriedades mecânicas;

4. A melhor condição de sinterização estudada foi de 5GPa/1400ºC/1min., promovendo a densificação de 95,5%, HV45=10GPa, e KIC=11MPa.m½, compatíveis com a literatura.

5 AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem a FAPERJ (Edital Primeiros Projetos) pelo auxílio financeiro concedido.

6 REFERÊNCIAS

  • [1] EXNER, H.E, "Physical and Chemical Nature of Cemented Carbides", International Materials Reviews, v. 4, pp. 194, 1979.
  • [2] HUGOSSON, H.W., ENGGVIST, H., "The Connection Between the Electronic Structure and the Properties of Binderless Tungsten Carbides", International Journal of Refractory Metals and Hard Materials, v. 21, pp. 55-61, 2003.
  • [3] McCOLM, I.J. "Ceramic Science for Materials Technologists", New York: Chapman and Hall, pp. 321, 1983.
  • [4] SCHWARZKOPF, P., KIEFFER, R., "Cemented Carbides", New York: MacMillan, 1986.
  • [5] HANYALOGLU, C., AKSAKAL, B., BOLTON, J.D, "Production and Indentation Analysis of WC/Fe-Mn as an Alternative to Cobalt Bonded Hardmetals", Materials Characterization, v. 47, pp. 315-322, 2001.
  • [6] FRYKHOLM, R., JANSSON, B., ANDRÉN, H.O., "The Influence of Carbon Content on Formation of Carbo-Nitride Free Surface Layers in Cemented Carbides", International Journal of Refractory Metals and Hard Materials, v. 20, pp. 345-353, 2002.
  • [7] NORTH, B., PFOUTS, W.R., "Greenfield, M.S. Pressure sinter and HIP on Cemented Carbides", Metal Powder Report. PM Special Feature, pp. 40-45, 1991.
  • [8] SHETTY, D.K., "Indentation Fracture of WC-Co Cermets", Journal of Materials Science, v. 20, pp. 1973-1982, 1985.
  • [9] SHI, X.L., "Mechanical Properties, Phases and Microstructure of Ultrafine Hardmetals Prepared by WC-6.29Co nanocrystalline Composite Powder", Materials Science and Engineering A, v. 392, pp. 335-339, 2005.
  • [10] SCIESZKA, S.F., "The Wear Transition as Means for Hardmetal Fracture Toughness Evaluation", International Journal of Refractory Metals and Hard Materials, v. 19, pp. 101-108, 2001.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Mar 2007
  • Data do Fascículo
    Set 2006
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