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Comportamento térmico de argamassas com incorporação de Materiais de Mudança de Fase (PCM) no clima português

Thermal behavior of mortars with incorporation of Phase Change Materials (PCM) in the Portuguese climate

RESUMO

Atualmente, os elevados consumos energéticos constituem uma das maiores preocupações da sociedade e da comunidade científica. A União Europeia definiu várias estratégias para atenuar este problema até 2020, passando pela redução das emissões de CO2, redução do consumo de energia primária e aumento do consumo de energia proveniente de fontes renováveis. O sector da construção é responsável por elevados consumos energéticos durante a fase de construção e utilização dos edifícios. Assim, torna-se importante utilizar soluções construtivas funcionais, que minimizem os consumos energéticos nos edifícios. A incorporação de materiais de mudança de fase (PCM) em materiais de construção permite a regulação da temperatura no interior dos edifícios com recurso à sua capacidade de armazenamento e libertação de energia. Desta forma, o principal objetivo deste estudo consistiu na caracterização do desempenho térmico de argamassas com incorporação de microcápsulas de PCM e comparação com argamassas de referência (0% PCM). Para tal, foram desenvolvidas 8 composições distintas, à base de diferentes ligantes, sendo estes a cal aérea, cal hidráulica, cimento e gesso. Para cada ligante foi desenvolvida uma composição de referência (0% PCM) e uma composição com incorporação de 40% de PCM, em substituição da massa de agregado. As propriedades avaliadas foram a trabalhabilidade, microestrutura, comportamento mecânico e desempenho térmico. Foi possível observar que a utilização de microcápsulas de PCM em argamassas contribui para uma melhoria da eficiência energética dos edifícios, através da diminuição das temperaturas extremas, do desfasamento temporal das temperaturas extremas e da diminuição das necessidades de climatização dos edifícios.

Palavras-chave:
Argamassas; material de mudança de fase; microestrutura; comportamento térmico

ABSTRACT

Nowadays, the high energetic consumption is one of the biggest concerns of the modern society and scientific community. The European Union defined strategies for 2020 in order to reduce this problem, through the decrease of CO2 emissions, decrease the primary energy consumption and increase the energy consumption from renewable sources. The construction sector is responsible for high energetic consumptions during the production and utilization of buildings. Thus, it becomes important to use constructive solutions that allow minimize the energy consumption in buildings. The incorporation of phase change materials (PCM) in construction materials allows regulate the temperature inside the buildings, due to their capability of storage and release energy. The main objective of this study was to characterize the thermal performance of mortars with incorporation of PCM microcapsules. It were developed 8 different compositions based in different binders. The studied binders were aerial lime, hydraulic lime, cement and gypsum. For each binder a reference mortar (0% PCM) and a mortar with incorporation of 40% of PCM were developed. It was evaluated properties such as workability, microstructure, mechanical and thermal performance. It was possible to observe that the incorporation of PCM microcapsules in mortars effectively contributes to improving the energy efficiency of buildings, through the decrease of extreme temperatures, lag time delay of extreme temperatures and decrease of climatization needs of the buildings.

Keywords:
Mortars; phase change materials; microstructure; thermal performance

1. INTRODUÇÃO

A energia é um fator essencial para o desenvolvimento econômico, social e melhoria da qualidade de vida dos países. As fontes de energia podem ser renováveis ou não renováveis. Como fontes de energia não renováveis e que podem esgotar-se com o tempo, podem enunciar-se o petróleo, o carvão e o gás natural. Por outro lado, energias renováveis são fontes inesgotáveis de energia, tais como a energia hídrica, eólica, geotérmica e solar.

O crescimento econômico dos países tem causado um aumento no consumo de energia, sendo grande parte proveniente de fontes não renováveis, afetando diretamente a população e o meio ambiente. Os elevados consumos energéticos são uma das principais causas da deterioração ambiental global e da sobre-exploração de recursos energéticos não-renováveis [1[1] BILGEN, S., “Structure and environmental impact of global energy consumption”, Renewable and Sustainable Energy Reviews, v. 38, pp. 890–902, Oct. 2014.]. Assim, a utilização de fontes de energia renováveis constitui a chave para alcançar um desenvolvimento social, económico e ambiental mais sustentável.

A eficiência energética dos edifícios é hoje um dos principais objetivos da política energética a nível regional, nacional e internacional [2[2] SOARES, N., COSTA, J., GASPAR, A., SANTOS, P., “Review of passive PCM latent heat thermal energy storage systems towards buildings energy efficiency”, Energy and Buildings, v. 59, pp. 82–103, Apr. 2013.]. Os edifícios são um dos setores líderes no consumo de energia nos países desenvolvidos, sendo que na União Europeia são responsáveis por cerca de 40% do consumo de energia e pela produção de cerca de 40% das emissões de dióxido de carbono (CO2). Atualmente, a União Europeia definiu várias estratégias para controlo e diminuição dos elevados consumos energéticos. Algumas das medidas adotadas passam pela redução de pelo menos 20% no consumo de energia e emissões de CO2, e um aumento de 20% no consumo de energia proveniente de fontes renováveis [3[3] SANTIAGO, I., LOPEZ-RODRIGUEZ, M. A., TRILLO-MONTERO., et al., “Activities related with electricity consumption in the Spanish residential sector: Variations between days of the week, Autonomous Communities and size of towns”, Energy and Buildings, v.79, pp. 84–97, Aug. 2014.].

Numa abordagem sustentável, os edifícios devem ser projetados para garantir o conforto térmico dos seus ocupantes durante todo o ano, com um mínimo de energia auxiliar para aquecimento e arrefecimento. Em abordagens não-sustentáveis, os edifícios são cada vez mais dependentes de sistemas de climatização, o que origina um aumento no consumo de energia, bem como um aumento das emissões de gases de efeito de estufa. Consequentemente, verifica-se também um aumento dos custos de utilização dos edifícios, uma vez que os preços dos combustíveis fósseis têm um grande impacto nos custos de operação dos sistemas de climatização, conduzindo a um aumento do custo operacional dos edifícios durante todo o seu ciclo de vida [2[2] SOARES, N., COSTA, J., GASPAR, A., SANTOS, P., “Review of passive PCM latent heat thermal energy storage systems towards buildings energy efficiency”, Energy and Buildings, v. 59, pp. 82–103, Apr. 2013.,4[4] BLENGINI, G., CARLO, T., “The changing role of life cycle phases, subsystems and materials in the LCA of low energy buildings”, Energy and Buildings, v. 42, pp. 869–880, Jun. 2010.].

Sabe-se que todos os anos, a energia solar que atinge a superfície terrestre é cerca de 10 000 vezes superior ao consumo real de energia por ano em todo o mundo [5[5] DIAMANTI, M., ORMELLESE, M., PEDEFERRI, M., “Characterization of photocatalytic and superhydrophilic properties of mortars containing titanium dioxide”, Cement and Concrete Research, v. 38, pp. 1349–1353, Nov. 2008.]. Tendo em consideração os elevados consumos energéticos do sector da construção, grande parte destes se encontram relacionados com o aquecimento e arrefecimento dos edifícios, torna-se urgente encontrar e desenvolver tecnologias construtivas que nos permitam tirar o maior partido da energia proveniente do sol. Este tipo de soluções construtivas devem permitir minimizar os consumos energéticos nos edifícios, assim como melhorar a eficiência energética dos mesmos sem prejuízo do meio ambiente. Portanto, o recurso ao armazenamento térmico através da utilização de materiais de mudança de fase constitui uma estratégia para a construção de edifícios com elevado desempenho energético.

Em Portugal existem grandes áreas urbanas com graves deficiências energéticas, apresentando simultaneamente um desafio e uma oportunidade para os sectores da construção e reabilitação. As argamassas com incorporação de materiais de mudança de fase (PCM) para o revestimento interior dos edifícios, podem ser vistas como uma possibilidade na tentativa de resolver, ou pelo menos minimizar, os elevados consumos energéticos dos edifícios. Os materiais de mudança de fase permitem reduzir e deslocar os consumos energéticos, devido à sua capacidade de absorção e libertação de energia para o meio ambiente. A atuação destes materiais passa por diminuir as temperaturas máximas, aumentar as temperaturas mínimas e deslocar os consumos de picos para horários de menor procura e consequentemente, com menor taxação da energia, melhorando desta forma a eficiência energética dos edifícios. Assim, as argamassas aditivadas com PCM proporcionam benefícios sociais, econômicos e ambientais, demonstrando uma contribuição significativa para uma construção mais sustentável. Os benefícios sociais encontram-se diretamente relacionados com o aumento do conforto térmico, devido à sua capacidade de regular a temperatura, reduzindo as temperaturas extremas no interior dos edifícios. As questões ambientais encontram-se relacionadas com a redução da exploração de combustíveis fósseis e com a diminuição da necessidade de utilização de equipamentos de climatização. Por ultimo, os benefícios econômicos encontram-se relacionados com a redução do consumo de energia e o desfasamento dos consumos para horas de menor procura, diminuindo desta forma os custos de operação do edifício [6[6] CUNHA, S., AGUIAR, J., FERREIRA, V., TADEU, A., “Influence of the type of phase change materials microcapsules on the properties of lime-gypsum thermal mortars”, Advanced Engineering Materials, v. 16, pp. 433–441, 2014.].

A importância da adequação da temperatura de transição do PCM e da temperatura atmosférica do local de aplicação da tecnologia, constitui um fator extremamente importante para o correto funcionamento da solução construtiva. KHUDHAIR et al. [7[7] KHUDHAIR, A., FARID, M., “A review on energy conservation in building applications with thermal storage by latent heat using phase change materials”, Energy Convers Management, v. 45, pp. 263–275, Jan. 2004.], mostrou a adequação de vários PCM para incorporação em placas de gesso cartonado. Contudo, mesmo possuindo grande capacidade de armazenamento térmico, o PCM utilizado não entrou em funcionamento, uma vez que a temperatura de mudança de fase do mesmo não coincidiu com a gama de temperaturas ambiente.

O PCM pode ser incorporado em materiais de construção através de diferentes métodos: incorporação direta, imersão, encapsulamento e estabilização [8[8] MEMON, S. A., “Phase change materials integrated in building walls: A state of the art review”, Renewable and Sustainable Energy Reviews, v. 31, pp. 870–906, Mar. 2014.]. A incorporação direta é o método mais simples, em que o PCM é diretamente misturado com os materiais de construção. No método de imersão, os produtos de construção são mergulhados numa solução de PCM líquido, de forma a absorver o material por capilaridade. No entanto, o PCM pode interferir com os produtos de hidratação dos materiais de construção e afetar as propriedades mecânicas e de durabilidade [9[9] HAWES, D. W., BANU, D., FELDMAN, D., “Latent heat storage in concrete”, Solar Energy Materials, v. 19, pp. 335–348, Nov. 1989.]. A estabilização do PCM pode ser realizada através da sua integração num material de apoio [10[10] FANG, G., TANG, F., CAO, L., “Preparation, thermal properties and applications of shape-stabilized thermal energy storage materials”, Renewable and Sustainable Energy Reviews, v. 40, pp. 237–259, Dec. 2014.]. Por último, relativamente ao encapsulamento importa referir a existência de dois tipos: macroencapsulamento e microencapsulamento. O macroencapsulamento consiste na introdução de PCM em tubos, painéis ou outros recipientes grandes dimensões. Geralmente é feito em recipientes com mais de 1 cm de diâmetro, apresentando uma melhor compatibilidade com o material de suporte e fácil manuseio [11[11] CABEZA, L., CASTELL, A., BARRENECHE, C., et al., “Materials used as PCM in thermal energy storage in buildings: A review”, Renewable and Sustainable Energy Reviews, v. 15, pp. 1675–1695, Apr. 2011.]. O microencapsulamento consiste na obtenção de pequenas partículas de PCM, revestidas por polímeros de alto desempenho. As microcápsulas podem ser esféricas ou assimétricas, com diâmetro inferior a 1 cm, contudo o diâmetro preferencial situa-se entre os 1 – 60 μm [11[11] CABEZA, L., CASTELL, A., BARRENECHE, C., et al., “Materials used as PCM in thermal energy storage in buildings: A review”, Renewable and Sustainable Energy Reviews, v. 15, pp. 1675–1695, Apr. 2011.12[12] TYAGI, V., KAUSHIK, S., TYAGI, S., et al., “Development of phase change materials based microen-capsulated technology for buildings: A review”, Renewable and Sustainable Energy Reviews, v. 15, pp. 1373–1391, Feb. 2011.]. As principais vantagens desta técnica estão relacionadas com a capacidade de prevenir a fuga do PCM durante a sua mudança de fase através da existência de uma barreira, aumentando assim as suas possibilidades de incorporação em vários materiais de construção, proporcionando uma elevada transferência de calor através da sua maior superfície por unidade de volume [8[8] MEMON, S. A., “Phase change materials integrated in building walls: A state of the art review”, Renewable and Sustainable Energy Reviews, v. 31, pp. 870–906, Mar. 2014.].

Alguns estudos têm vindo a ser publicados relativamente à incorporação de PCM microencapsulado em placas de gesso, devido ao seu baixo custo e variadas possibilidades de aplicação [13[13] SHILEI, L., NENG, Z., GUOHUI, F., “Impact of Phase Change Wall Room on Indoor Thermal Environment in winter”, Energy and Buildings, v. 38, pp. 18–24, Jan. 2006.15[15] SCHOSSIG, P., HENNING H., GSCHWANDER S., et al., “Micro-encapsulated Phase Change Materials Integrated Into Construction Materials”, Solar Energy Materials & Solar Cells, v. 89, pp. 297–306, Nov. 2005.]. DARKWA et al. [14[14] DARKWA, K., O'CALLAGHAN, P., TETLOW, D., “Phase-change drywalls in a passive-solar building”, Applied Energy, v. 83, pp. 425–435, May 2006.] investigaram o comportamento de duas soluções de placas de gesso com incorporação de PCM. Uma das soluções consistia numa placa de gesso com 12 mm de espessura, impregnada com PCM. A segunda solução consistia numa placa de gesso, com 10 mm de espessura, coberta por PCM laminado com 2 mm de espessura. A quantidade de PCM incorporado em ambos os casos foi a mesma. Contudo, os resultados mostraram que a utilização de PCM laminado foi mais eficiente, uma vez que contribuiu para um aumento mais significativo da temperatura mínima. LAI et al. [16[16] LAI C., CHEN R.H., LIN C., “Heat transfer and thermal storage behaviour of gypsum boards incorporating micro-encapsulated PCM”, Energy and Buildings, v. 42, pp. 1259–1266, Aug. 2010.] realizaram um estudo que permitiu avaliar o contributo de várias quantidades de PCM incorporadas em placas de gesso. Para tal, utilizaram percentagens de PCM de 23%, 30% e 40%. Foi possível concluir que a capacidade de armazenamento térmico aumenta com a incorporação de uma maior percentagem de PCM. ATHENITIS et al. [17[17] ATHIENITIS, A., LIU, C., HAWES, D., BANU, D., FELDMAN, D., “Investigation of the Thermal Performance of a Passive Solar Test-Room with Wall Latent Heat Storage”, Building and Environment, v. 32, pp. 405–410, Sep. 1997.] realizaram uma campanha experimental e numérica, com materiais de mudança de fase incorporados em placas de gesso, aplicadas nas paredes de um edifício. Demonstrando, uma diminuição da temperatura ambiente máxima em cerca de 4°C. SCHOSSIG et al. [18[18] SCHOSSIG, P., HENNING, H., GSCHWANDER, S., et al., “Micro-encapsulated Phase Change Materials Integrated in to Construction Materials”, Solar Energy Materials & Solar Cells, v. 89, pp. 297–306, Nov. 2005.] efetuaram um estudo em que abordaram a incorporação de PCM em gesso projetado, desta forma evoluiu-se para uma nova forma de aplicação dos materiais de mudança de fase. Para a sua experiência, os autores construíram duas células de teste, nas quais as paredes foram revestidas com gesso projetado com e sem incorporação de PCM. As soluções estudadas foram um revestimento com 6 mm de espessura, com incorporação 40% PCM e uma segunda solução com um revestimento de 15 mm de espessura e 20% de PCM incorporado. Durante o período de tempo monitorizado, foi possível observar que o revestimento com 6 mm de espessura e com incorporação de PCM manteve a temperatura no interior da célula cerca de 4°C mais baixa, sendo esta atingida cerca de 1 hora mais tarde. O contributo do PCM para o conforto térmico foi de tal forma significativo que durante três semanas, as temperaturas situaram-se acima de 28°C durante cerca de 5 horas na célula com PCM contra cerca de 50 horas na célula de referência.

Outras soluções foram também desenvolvidas, tais como painéis de PVC alveolares, blocos e tijolos [11[11] CABEZA, L., CASTELL, A., BARRENECHE, C., et al., “Materials used as PCM in thermal energy storage in buildings: A review”, Renewable and Sustainable Energy Reviews, v. 15, pp. 1675–1695, Apr. 2011., 19[19] AHMAD, M., BONTEMPS, A., SALLÉE, H., QUENARD, D., “Thermal Testing and Numerical Simulation of a Prototype Cell Using Light Wallboards Coupling Vacuum Isolation Panels and Phase Change Material”, Energy and Buildings, v. 38, pp. 673–681, Jun. 2006.]. CABEZA et al. [11[11] CABEZA, L., CASTELL, A., BARRENECHE, C., et al., “Materials used as PCM in thermal energy storage in buildings: A review”, Renewable and Sustainable Energy Reviews, v. 15, pp. 1675–1695, Apr. 2011.] construíram e monitorizaram o comportamento de células de teste em betão, sem incorporação de PCM e com incorporação de 5% em massa de microcápsulas de PCM. O betão com incorporação de PCM foi utilizado na cobertura e nas paredes Sul e Oeste. Durante o verão e sem ventilação, foram registados 3°C de diferença na temperatura superficial máxima da parede Oeste, com um desfasamento temporal de 2 horas. SHARMA et al. [20[20] SHARMA A., TYAGI, V., CHEN, C., BUDDHI, D., “Review on thermal energy storage with phase change materials and applications”, Renewable and Sustainable Energy Reviews, v. 13, pp. 318–345, Feb. 2009.] estudaram o armazenamento térmico em paredes, utilizando cloreto de cálcio hexa-hidratado, com ponto de fusão 29° C, como um material de mudança de fase. Tendo os resultados obtidos permitido concluir que uma parede contendo PCM com 8.1 cm de espessura possui melhor desempenho térmico que uma parede em alvenaria com 40 cm de espessura.

O estudo de argamassas com incorporação de PCM tem sido alvo de interesse por parte da comunidade científica. No entanto, a caracterização e comparação do desempenho térmico de argamassas com base em diferentes ligantes é ainda uma das principais lacunas do conhecimento nesta área. Assim, o principal objetivo deste trabalho foi o estudo do comportamento térmico de argamassas com incorporação de materiais de mudança de fase, quando aplicadas num clima tipicamente português. Este estudo foi desenvolvido com base em diferentes ligantes e com diferentes teores de PCM. Os ligantes estudados foram a cal aérea, cal hidráulica, cimento e gesso. Para cada ligante foram desenvolvidas duas composições distintas, sendo uma composição de referência, sem adição de microcápsulas de PCM, e uma composição com incorporação de 40% de microcápsulas de PCM, em substituição da massa de agregado. Foram realizadas observações da sua microestrutura com recurso a um microscópio eletrónico, ensaios mecânicos e térmicos das oito composições em análise.

2. MATERIAIS E MÉTODOS

2.1 Materiais

A seleção dos materiais, tais como ligantes e microcápsulas de PCM, teve em consideração trabalhos anteriores [21[21] CUNHA, S., ALVES, V., AGUIAR, J., et al., “Use of phase change materials microcapsules in aerial lime and gypsum mortars”, Cement Wapno Beton, Special Issue, pp. 17–21, 2012.23[23] CUNHA, S., AGUIAR, J., KHERADMAND, M., BRAGANÇA, L., FERREIRA, V., “Thermal mortars with incorporation of PCM microcapsules”, Restoration of Buildings and Monuments, v. 19, pp. 171–177, Mar. 2013.].

A cal aérea utilizada possui uma pureza de 90% e uma densidade de 2450 kg/m3. O gesso utilizado possui uma elevada finura e uma densidade de 2740 kg/m3. Foi também utilizada uma cal hidráulica natural (NHL5) com densidade de 2550 kg/m3. Por último, o cimento utilizado é do tipo CEM II B-L 32.5N com densidade de 3030 kg/m3.

O superplastificante utilizado é baseado em poliacrilato, com densidade de 1050 kg/m3. A areia utilizada apresentou um tamanho de partícula médio de 439,9 μm e uma massa volúmica real de 2600 kg/m3. Com base na sua distribuição granulométrica, foram obtidos os parâmetros D50, D10 e D90, correspondendo a 150 µm, 310 µm e 480 µm, respetivamente. As fibras utilizadas são fibras sintéticas de poliamida, com um comprimento de 6 mm, uma espessura de 22,3 µm e densidade de 1380 kg/m3.

O PCM utilizado é composto por uma parede de melamina-formaldeído e um núcleo de parafina com uma densidade de 880 kg/m3 e uma entalpia de 147,9 kJ/kg (Figura 1). A temperatura de transição foi avaliada com base em ensaios de calorimetria diferencial de varrimento (DSC), apresentando uma temperatura de mudança de fase de 24°C no ciclo de aquecimento e 21°C no ciclo de arrefecimento (Figura 2). É importante notar que existiu uma seleção apropriada do PCM, tendo em consideração a sua temperatura de mudança de fase. Em Portugal, tal como em muitos outros países, existem regulamentos energéticos que indicam intervalos de temperaturas para a obtenção de condições ambiente de conforto. Tendo sido utilizada uma gama de temperatura de conforto compreendida entre 20°C e 25°C.

Figura 1
Observação das microcápsulas de PCM.
Figura 2
Termograma das microcápsulas de PCM.

O processo de fabrico do PCM é por policondensação por adição e o material é comercializado pela Devan Chemicals, com o nome comercial de Micathermic D24. As dimensões das microcápsulas de PCM foram avaliadas com base em testes de granulometria, com recurso a um granulómetro laser, tendo sido possível observar uma distribuição das dimensões das partículas entre 5,8 e 339 µm, apresentando uma dimensão média de 44 µm.

2.2 Composições

Foram desenvolvidas 8 composições distintas com base nos diferentes ligantes (Tabela 1). As composições em estudo são constituídas por diferentes ligantes, existindo sempre uma composição de referência, sem adição de PCM, e uma composição com incorporação de 40% de PCM. Para todas as composições o volume de ligante foi mantido contante. O volume dos restantes materiais foi estabelecido em função do volume de ligante. Relativamente às argamassas à base de cal aérea verificou-se a necessidade de aumentar o volume de ligante, de forma a obter uma classificação da argamassa, com base na resistência à compressão, adequada.

Tabela 1
Composições das argamassas (kg/m3).

A incorporação de fibras de poliamida foi realizada de acordo com trabalhos anteriores [21[21] CUNHA, S., ALVES, V., AGUIAR, J., et al., “Use of phase change materials microcapsules in aerial lime and gypsum mortars”, Cement Wapno Beton, Special Issue, pp. 17–21, 2012.23[23] CUNHA, S., AGUIAR, J., KHERADMAND, M., BRAGANÇA, L., FERREIRA, V., “Thermal mortars with incorporation of PCM microcapsules”, Restoration of Buildings and Monuments, v. 19, pp. 171–177, Mar. 2013.]. Sendo que o principal objetivo da sua incorporação em argamassas com PCM consistiu no controlo da retração destas argamassas, devida à presença de uma maior quantidade de água nas mesmas.

2.3 Métodos experimentais

Os ensaios de trabalhabilidade foram realizados com o objetivo de conferir uma trabalhabilidade adequada à aplicação das argamassas desenvolvidas, tendo sido realizados com base no método da mesa de espalhamento, especificado pela norma europeia EN 1015-3 [24[24] EUROPEAN COMMITTEE FOR STANDARDIZATION (CEN), EN 1015-3, “Methods of test for mortar for masonry - Part 3: Determination of consistence of fresh mortar (by flow table)”, 1999.]. O valor resultante do ensaio apenas foi considerado, quando igual a 200±5 mm.

A microestrutura das argamassas foi avaliada com recurso a um microscópio eletrónico de varrimento de alta resolução. Para cada composição prepararam-se 2 provetes cilíndricos com diâmetro e altura de aproximadamente 1 cm. Os provetes foram armazenados durante sete dias em sacos de polietileno e posteriormente colocados em laboratório à temperatura ambiente de aproximadamente 22°C durante 21 dias.

No que diz respeito às propriedades mecânicas, foram avaliadas a resistência à flexão e compressão. A preparação dos diferentes provetes e a realização dos ensaios foram efetuados em conformidade com a norma europeia EN 1015-11 [25[25] EUROPEAN COMMITTEE FOR STANDARDIZATION (CEN), EN 1015-11, “Methods of test for masonry - Part 11: Determination of flexural and compressive strength of hardened mortar”, 1999.]. Após a sua preparação todos os provetes foram armazenados durante sete dias em sacos de polietileno e posteriormente colocados em laboratório à temperatura ambiente (22°C), durante 21 dias. Os ensaios de determinação da resistência à flexão e compressão realizaram-se com controlo de força a uma velocidade de 50 N/s e150 N/s, respetivamente.

O comportamento térmico foi avaliado com recurso a uma câmara climática, programada com uma lei de temperaturas representativa de cada estação do ano no norte de Portugal. Assim, analisou-se o comportamento térmico das argamassas na estação de inverno, verão, primavera e outono. Os dados climáticos foram obtidos a partir de uma estação meteorológica instalada no campus da Universidade do Minho, em Guimarães, Portugal.

Para cada composição foi desenvolvida uma célula de teste em pequena escala, com recurso a um material isolante (poliestireno extrudido) com 3 cm de espessura e revestidas no interior com uma camada de argamassa de 1 cm de espessura (Figura 3). As células de teste de pequena escala possuem uma dimensão de 200×200×200 mm3. Em cada célula colocou-se um termopar no seu interior, na zona central, a uma altura de 10 cm da base da célula. Posteriormente, as células de teste colocaram-se dentro de uma câmara climática instrumentalizada com termopares, de forma a controlar a temperatura de ensaio. Cada termopar utilizado durante os ensaios térmicos conectou-se a um sistema de aquisição de dados de alta sensibilidade (Agilent 34970A), sendo o registo da temperatura no interior da câmara climática e das células de teste em escala reduzida avaliado a cada minuto. Os termopares utilizados foram do tipo K.

Figura 3
Célula de teste, em escala reduzida, revestida com argamassa com incorporação de microcápsulas de PCM.

3. Resultados e Discussão

3.1 Trabalhabilidade

Os ensaios de trabalhabilidade revelam que a incorporação de microcápsulas de PCM origina um aumento na quantidade de água (Figura 4). Foi possível verificar que a incorporação de 40% de PCM originou um aumento na quantidade de água superior a 8% em todas os ligantes estudados, com exceção das argamassas à base de cal aérea. O aumento da quantidade de água nas argamassas é justificado pela finura característica das microcápsulas de PCM. Contudo, a diminuição da quantidade de água observada para as argamassas à base de cal aérea é justificada pela presença de um teor mais elevado de superplastificante, sendo que este se encontra diretamente relacionado com a maior dosagem de ligante das mesmas. Esta alteração foi necessária para obter uma classificação mecânica adequada para todas as argamassas. No que diz respeito à incorporação das fibras de poliamida, verificou-se que a sua incorporação não provocou qualquer alteração na quantidade de água a adicionar às argamassas (Figura 4).

Figura 4
Razão água/ligante das argamassas.

3.2 Microestrutura

A avaliação da microestrutura das argamassas foi realizada com o objetivo de avaliar a existência de possíveis incompatibilidades entre os diferentes materiais constituintes das argamassas.

A Figura 5 mostra a microestrutura das argamassas à base de cal aérea, cal hidráulica, gesso e cimento, sem e com incorporação de 40% de microcápsulas de PCM. Estas observações revelam uma boa compatibilidade entre os diferentes materiais (PCM, fibras, agregado e ligante) evidenciado pela ausência de fissuras na ligação entre os diferentes materiais. Pode ainda observar-se que as microcápsulas de PCM apresentam uma distribuição homogénea na matriz das argamassas. Por outro lado, as microcápsulas de PCM mostram uma boa integridade, sem sinais de rutura ou danos, demonstrando que resistem adequadamente ao processo de mistura, aplicação e cura das argamassas.

Figura 5
Microestrutura das argamassas com incorporação de PCM: a) Argamassa à base de cal aérea (CA800-80PCM-F); b) Argamassa à base de cal hidráulica (CH500-40PCM-F); c) Argamassa à base de gesso (G500-40PCM-F); d) Argamassa à base de cimento (C500-40PCM-F).

Com o objetivo de avaliar o tamanho e distribuição dos poros nas diferentes argamassas foram realizadas outras observações microscópicas. As Figuras 6 a 9 revelam as alterações observadas na distribuição dos poros nas diferentes argamassas, causadas pela incorporação de microcápsulas de PCM. Foi possível observar um aumento da microporosidade para todos ligantes testados, assim como a presença de microporos com dimensões superiores nas argamassas com incorporação de PCM, comparativamente com as argamassas de referência. A microestrutura das argamassas de referência revela-se mais compacta quando comparada com as argamassas com incorporação de PCM, que apresentam poros de maiores dimensões. Este comportamento pode ser explicado pela presença de uma maior quantidade de água nas argamassas aditivadas com PCM, em resultado do reduzido tamanho do material.

Figura 6
Argamassas à base de cal aérea: a) Argamassa de referência, sem incorporação de PCM (CA500-0PCM); b) Argamassa com incorporação de 40% de microcápsulas de PCM (CA800-40PCM-F).
Figura 7
Argamassas à base de cal hidráulica: a) Argamassa de referência, sem incorporação de PCM (CH500-0PCM); b) Argamassa com incorporação de 40% de microcápsulas de PCM (CH500-40PCM-F).
Figura 8
Argamassas à base de cimento: a) Argamassa de referência, sem incorporação de PCM (C500-0PCM); b) Argamassa com incorporação de 40% de microcápsulas de PCM (C500-40PCM-F).
Figura 9
Argamassas à base de gesso: a) Argamassa de referência, sem incorporação de PCM (G500-0PCM); b) Argamassa com incorporação de 40% de microcápsulas de PCM (G500-40PCM-F).

3.3 Comportamento mecânico

Na Figura 10 observou-se uma diminuição da resistência à flexão causada pela incorporação de PCM. A incorporação de 40% de microcápsulas de PCM resultou numa diminuição superior a 35%, com exceção das argamassas de cal aérea em que se verifica um aumento de cerca de 64%, sendo que neste caso este comportamento pode ser justificado pela presença de uma elevada dosagem de ligante.

Figura 10
Resistência à flexão das argamassas.

Relativamente à resistência à compressão (Figura 11), observou-se uma redução significativa com a incorporação de PCM. A incorporação de 40% de microcápsulas de PCM originou diminuições na resistência à compressão superiores a 20% comparativamente com as argamassas de referência.

Figura 11
Resistência à compressão das argamassas.

A incorporação de fibras de poliamida conduziu a um aumento da resistência à flexão de cerca de 51% nas argamassas à base de cal aérea. As argamassas à base de cal hidráulica, gesso e cimento não demonstraram qualquer influência associada com esta adição. A melhoria observada para argamassas à base de cal aérea encontra-se relacionada com a capacidade das fibras em se oporem à formação de fissuras e à incorporação de um volume de fibras superior. No que respeita à resistência à compressão, foi possível verificar um aumento significativo nas argamassas à base de cal aérea. As argamassas à base dos restantes ligantes mostraram uma diminuição residual na resistência à compressão. Nestes casos, é possível considerar que a incorporação de fibras de poliamida não provocou alterações significativas.

O ligante que apresentou menores perdas de resistência à flexão e à compressão foi o cimento. Em contraste, o ligante que apresentou uma maior sensibilidade para a incorporação de microápsulas de PCM e, consequentemente, maiores perdas nas propriedades mecânicas foi a cal aérea. Este comportamento pode ser justificado pelo aumento da relação água/ligante, causado pela incorporação de PCM.

Um dos objetivos deste trabalho foi a obtenção de argamassas com qualidade suficiente para utilização em rebocos interiores, pelo que foi efetuada a classificação das mesmas segundo a resistência à compressão (Tabela 2), de acordo com a norma NP EN 998-1 [26[26] INSTITUTO PORTUGUÊS DA QUALIDADE (IPQ), NP EN 998-1, “Especificações de argamassas para alvenarias – Parte 1: Argamassas para rebocos interiores e exteriores”, 2010.]. Assim, a premissa desta investigação foi a obtenção de argamassas aditivadas com material de mudança de fase com uma classe mínima de resistência CSII. Na Tabela 3 verifica-se que todas as argamassas desenvolvidas possuem uma classe de resistência adequada para utilização em rebocos interiores. Contudo, alguns estudos iniciais, permitiram verificar que as argamassas à base de cal aérea mostravam uma classificação inferior pelo que foi realizada uma nova campanha experimental, enriquecendo as argamassas com uma dosagem superior de ligante (800kg/m3). Assim, foi possível verificar que apesar das argamassas com PCM sofreram uma diminuição das suas características mecânicas, ainda se encontram em boas condições de utilização.

Tabela 2
Classificação das argamassas de acordo com a especificação NP EN 998-1:2010.
Tabela 3
Classificação das argamassas segundo a resistência à compressão.

3.4 Comportamento térmico

É sabido que a temperatura externa influencia significativamente o desempenho térmico do PCM [27[27] KHUDHAIR, A., FARID, M., “A review on energy conservation in building applications with thermal storage by latent heat using phase change materials”, Energy Conversion and Management, v. 45, pp. 263–275, Jan. 2004.29[29] HERNÁNDEZ, V., MORILLÓN, D., BEST, R., et al., “Experimental and numerical model of wall like solar heat discharge passive system”, Applied Thermal Engineering, v. 26, pp. 2464–2469, Dec. 2006.]. Realizou-se uma campanha experimental, com o intuito de avaliar o comportamento térmico de argamassas com incorporação de PCM, quando aplicadas num clima típico da região norte de Portugal. Para tal, foram avaliadas todas as estações do ano, com base em leis de temperatura definidas com base em dados meteorológicos (Figura 12).

Figura 12
Leis de temperatura utilizadas para a avaliação do desempenho térmico das argamassas nas estações do ano: a) Inverno; b) Verão; c) Primavera; d) Outono.

A estação de primavera foi estudada com base numa lei de temperatura, com uma temperatura mínima de 12°C e uma temperatura máxima de 29°C. Na estação de outono, as temperaturas variaram entre os 17°C e 34°C. Por sua vez, a estação de verão foi avaliada com base numa gama de temperaturas compreendidas entre os 11°C e 44°C. Por último, a estação de inverno foi avaliada para uma gama de temperaturas compreendida entre a temperatura mínima de 5°C e a temperatura máxima de 22°C. Nesta situação, a observação do efeito de PCM não foi possível, uma vez que o ponto de mudança de fase do material não foi atingido. Para o estudo desta estação com mais detalhe, seria necessário a utilização de um sistema de aquecimento auxiliar. Assim, no presente estudo, o efeito do PCM na estação de inverno foi considerado nulo. O estudo de cada estação compreendeu o desenvolvimento e análise de três ciclos, sendo cada ciclo composto por 24 horas.

As Figuras 13 a 15 mostram o comportamento térmico das argamassas durante as estações de verão, primavera e outono. Em cada estação foram analisadas argamassas à base de cal aérea, cal hidráulica, cimento e gesso, sendo que em cada ligante se estudou o comportamento de argamassas sem incorporação de PCM e com incorporação de PCM.

Figura 13
Desempenho térmico das argamassas durante a estação de verão: a) Argamassas à base de cal aérea; b) Argamassas à base de cal hidráulica; c) Argamassas à base de cimento; d) Argamassas à base de gesso.
Figura 14
Desempenho térmico das argamassas durante a estação de primavera: a) Argamassas à base de cal aérea; b) Argamassas à base de cal hidráulica; c) Argamassas à base de cimento; d) Argamassas à base de gesso.
Figura 15
Desempenho térmico das argamassas durante a estação de outono: a) Argamassas à base de cal aérea; b) Argamassas à base de cal hidráulica; c) Argamassas à base de cimento; d) Argamassas à base de gesso.

Com base nos resultados obtidos foi possível observar que quando a temperatura atinge o intervalo de temperaturas de conforto térmico em Portugal, compreendidas entre 20°C e 25°C, ocorre a transição de fase do PCM e o comportamento térmico das argamassas com incorporação de PCM começa a desenvolver-se de um modo distinto, comparativamente com o comportamento térmico das argamassas de referência.

É importante notar que em todos os ensaios realizados observa-se o efeito benéfico da incorporação de PCM, uma vez que se verificou uma diminuição das temperaturas máximas e aumento das temperaturas mínimas nas células revestidas com argamassas aditivadas com PCM. Verificou-se, também, com base neste ensaio, que a temperatura no interior das células com PCM permanece mais próxima ou até mesmo dentro das temperaturas de conforto por um período de tempo mais longo. Este efeito traduz-se numa redução do tempo de operação dos sistemas de aquecimento e/ou arrefecimento no interior dos edifícios, proporcionando desta forma uma redução nos consumos energéticos dos edifícios e aumento dos parâmetros de conforto dos seus ocupantes. Tendo em consideração a inexistência de normas e a existência de diferentes leis de temperatura representativas de vários países, a comparação dos resultados desta investigação com outros trabalhos científicos não é possível. Contudo, em vários trabalhos foi sempre possível verificar que a incorporação de PCM em materiais de construção conduz a menores consumos energéticos, uma vez que reduz a variação da temperatura no interior dos edifícios [17[17] ATHIENITIS, A., LIU, C., HAWES, D., BANU, D., FELDMAN, D., “Investigation of the Thermal Performance of a Passive Solar Test-Room with Wall Latent Heat Storage”, Building and Environment, v. 32, pp. 405–410, Sep. 1997.18[18] SCHOSSIG, P., HENNING, H., GSCHWANDER, S., et al., “Micro-encapsulated Phase Change Materials Integrated in to Construction Materials”, Solar Energy Materials & Solar Cells, v. 89, pp. 297–306, Nov. 2005.].

Relativamente à estação de verão (Figura 13), com base nas curvas de temperatura, identificaram-se situações com necessidades de arrefecimento, ou seja, temperaturas superiores a 25°C e situações com necessidades de aquecimento, ou seja temperaturas inferiores a 20°C. Na situação com necessidades de arrefecimento observa-se que as argamassas com incorporação de PCM apresentam uma velocidade de arrefecimento superior e uma temperatura máxima inferior. O mesmo se verifica para a situação com necessidades de aquecimento, na qual se verificou um aumento da temperatura mínima, evidenciando uma diminuição destas necessidades. Foi ainda possível verificar uma diminuição da temperatura máxima superior a 5% na situação de arrefecimento e um aumento da temperatura mínima superior a 14% na situação de aquecimento.

Durante estes ensaios observa-se também um desfasamento temporal nas temperaturas extremas. Sendo que na situação de arrefecimento se verifica um desfasamento temporal na temperatura máxima superior a 55 minutos e na situação de aquecimento um desfasamento temporal superior a 45 minutos, para a temperatura mínima (Tabela 4). Tendo em consideração que grande parte da energia consumida nos edifícios se encontra relacionada com a climatização dos mesmos (aquecimento e arrefecimento) e o custo diferenciado da energia durante o dia, estes resultados revelam que é possível deslocalizar os consumos energéticos mais elevados para fora das horas de maior procura, que apresentam um custo de energia mais baixo, o que se traduz numa vantagem do ponto de vista económico.

Tabela 4
Desfasamento temporal das temperaturas máximas e mínimas na estação de verão.

De acordo com a Figura 14, observa-se que a incorporação de microcápsulas de PCM em argamassas para revestimento interior originou uma diminuição da temperatura máxima superior a 11% e uma aumento da temperatura mínima superior a 13%, demonstrando que o PCM influencia de forma similar as altas e baixas temperaturas durante a estação de primavera. Verifica-se também, que as células de teste revestidas com argamassas aditivadas com PCM não apresentam temperaturas máximas superiores à temperatura de conforto de 25°C, o que se traduz na eliminação das necessidades de arrefecimento durante esta estação.

Na Tabela 5 observa-se o desfasamento temporal das temperaturas máximas e mínimas verificadas para as células revestidas com argamassas de referência (0% PCM) e com 40% de PCM, para a estação de primavera. Verifica-se um desfasamento temporal superior a 145 minutos e 15 minutos para as temperaturas máximas e mínimas, respetivamente.

Tabela 5
Desfasamento temporal das temperaturas máximas e mínimas na estação de primavera.

A Figura 15 mostra o desempenho térmico das argamassas em estudo para a estação de outono. Neste caso, verifica-se que não existem temperaturas inferiores à temperatura de conforto de 20°C, o que consequentemente elimina a existência de necessidades de aquecimento para as células revestidas com argamassas com incorporação de PCM, conduzindo a um menor consumo energético. Verifica-se, também, uma ligeira redução da temperatura máxima e aumento da temperatura mínima superior a 10%. Assim conclui-se que, para a estação de outono as argamassas com PCM exibem uma maior influência na situação de aquecimento comparativamente com a situação de arrefecimento.

De acordo com a Tabela 6, observa-se um desfasamento temporal superior a 45 minutos para a temperatura máxima e superior a 200 minutos para a temperatura mínima.

Tabela 6
Desfasamento temporal das temperaturas máximas e mínimas na estação de outono.

A análise das curvas de temperatura pode ser também realizada com recurso ao cálculo do gradiente térmico. Este representa a diferença entre a temperatura no interior da célula revestida com uma argamassa de referência e a temperatura no interior da célula revestida com uma argamassa aditivada com 40% de PCM (equação 1), em cada minuto. Durante o decorrer dos ensaios verificam-se variações no gradiente térmico resultantes da libertação ou acumulação de calor. É de notar que as diferenças negativas dizem respeito ao período de aquecimento e as diferenças positivas ao período de arrefecimento. Uma argamassa possui um potencial de regulação térmica tanto maior quanto maior for o gradiente térmico.

(1) Δ T = T R E F T P C M

Onde:

ΔT - Gradiente térmico (°C);

TREF - Temperatura no interior da célula revestida com a argamassa de referência (0% PCM) (aC);

TPCM - Temperatura no interior da célula revestida com a argamassa aditivada com 40% de PCM (aC).

À medida que a lei de temperatura é executada, o gradiente térmico aumenta como resultado do processo de armazenamento de calor. Posteriormente, verifica-se a diminuição do gradiente térmico até atingir o ponto em que as células se encontram à mesma temperatura (ΔT=0), sendo este ponto atingido na zona de conforto térmico entre os 20°C e 25°C.

A Figura 16 apresenta a variação do gradiente térmico para cada composição em estudo e em cada estação. Observa-se que as argamassas à base de gesso apresentam uma melhor regulação térmica, baseada na presença de diferenças mais significativas entre as temperaturas observadas no interior da célula de referência e na célula com PCM, em todas as estações. As argamassas à base de cal aérea apresentam o menor gradiente térmico e, consequentemente, o pior desempenho térmico.

Figura 16
Gradiente térmico: a) Argamassas à base de cal aérea; b) Argamassas à base de cal hidráulica; c) Argamassas à base de cimento; d) Argamassas à base de gesso.

A verificação do efeito causado pela incorporação do PCM é extremamente importante. Contudo, importa também quantificar com precisão as necessidades de arrefecimento e de aquecimento, de forma a avaliar a poupança de energia efetivamente alcançada. Assim, com base nas curvas de temperatura (Figura 13 a 15) foram também quantificadas as reduções do consumo de energia durante os ciclos de arrefecimento e aquecimento. Ou seja, foram determinadas as necessidades de arrefecimento e aquecimento para manter a temperatura no interior das células dentro do intervalo das temperaturas de conforto (20°C a 25°C).

A Tabela 7 apresenta as necessidades de arrefecimento e aquecimento para as diferentes argamassas nas diferentes estações do ano. Observou-se que a incorporação de microcápsulas de PCM em argamassas causou um decréscimo superior a 12% nas necessidades de arrefecimento e superior a 10% nas necessidades de aquecimento, na situação de verão. Quanto à estação de primavera verificou-se uma diminuição das necessidades de arrefecimento em 100% e uma diminuição das necessidades de aquecimento superior a 7%, com exceção das argamassas à base de cal aérea e argamassas à base de cimento, cujos valores se mantêm sensivelmente constantes. Por último, na situação de outono, identificou-se uma diminuição das necessidades de arrefecimento superior a 6% e a eliminação das necessidades de aquecimento.

Tabela 7
Necessidades de arrefecimento e aquecimento (J/m3)

Os resultados obtidos com base nos ensaios de avaliação do desempenho térmico demonstram que as argamassas à base de gesso apresentam um melhor comportamento térmico, tendo em conta a maior redução da temperatura máxima, maior aumento da temperatura mínima e maior desfasamento temporal. Esta situação pode ser justificada pela presença de uma maior quantidade de poros com maiores dimensões, na microestrutura das mesmas (Figura 9), que melhora o efeito de regulação da temperatura, uma vez que existem mais microcápsulas de PCM em contacto com o ambiente. Por outro lado, as argamassas à base de cal aérea apresentam o pior comportamento térmico, com base na menor variação das temperaturas extremas e desfasamento temporal. Este comportamento encontra-se associado com a presença de microporos com dimensões inferiores na sua microestrutura (Figura 6).

4. CONCLUSÃO

A realização desta investigação permitiu concluir que a incorporação de material de mudança de fase em argamassas para revestimento no interior dos edifícios provoca alterações significativas na sua trabalhabilidade, comportamento mecânico, desempenho térmico e microestrutura. Por outro lado, possibilitou a comparação do desempenho térmico de diferentes argamassas, produzidas com base em diferentes ligantes e com incorporação de 40% de microcápsulas de PCM.

No que respeita à trabalhabilidade verificou-se que a incorporação de PCM provocou um aumento na quantidade de água necessária a adicionar à argamassa, o que se encontra relacionado com a finura característica do PCM, necessitando a argamassa de mais água de forma a obter uma mistura homogénea.

Relativamente à microestrutura das argamassas desenvolvidas, foi possível identificar uma boa interação entre os diversos materiais que as constituem, assim como, uma boa resistência das microcápsulas PCM durante o processo de fabrico e cura. Observou-se ainda que a incorporação de microcápsulas de PCM nas argamassas originou um aumento na microporosidade das mesmas, para todos os ligantes testados. Esta situação pode ser justificada pelo aumento do teor de água das argamassas com incorporação de PCM.

Relativamente às resistências mecânicas (resistência à flexão e resistência à compressão) foi possível evidenciar uma diminuição das mesmas com a incorporação de PCM. Este fenómeno é uma consequência da presença de uma maior quantidade de água, sendo que origina uma maior porosidade nas argamassas, levando à diminuição das suas resistências mecânicas.

Por último, os ensaios térmicos permitiram verificar que a utilização de PCM em argamassas, originou uma diminuição da temperatura máxima, um aumento da temperatura mínima e um desfasamento temporal significativo entre as temperaturas extremas com argamassas de referência e com incorporação de PCM. Verificou-se, ainda, uma redução das necessidades de aquecimento e arrefecimento no verão, primavera e outono. Sendo que, na estação de primavera não se verificaram necessidades de arrefecimento e na situação de outono não se observaram necessidades de aquecimento. Sendo assim, foi possível concluir que a incorporação de PCM em argamassas contribuiu para a redução dos consumos energéticos, possibilitando a utilização de energias renováveis, tais como a energia solar, reduzindo a exploração de combustíveis fósseis, que por sua vez permite reduzir os impactos negativos para o meio ambiente.

5. AGRADECIMENTOS

Os autores desejam expressar os seus agradecimentos à Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) pelo financiamento deste trabalho no âmbito da bolsa de doutoramento SFRH/BD/95611/2013.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2017

Histórico

  • Recebido
    11 Out 2016
  • Aceito
    21 Mar 2017
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