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Comportamento ótico de vidros e policarbonatos translúcidos frente à radiação solar

Optical behavior of translucent glasses and polycarbonates against solar radiation

RESUMO

Nesse trabalho, apresentam-se valores de Fator de Calor Solar (FS) e da Transmitância da Luz Visível (Tv). para dezesseis tipos de vidros translúcidos e para seis tipos de policarbonatos translúcidos, utilizados no Brasil. Foram realizados ensaios em espectrofotômetro, com esfera integradora, para incidência normal, obtendo-se a curva de variação da transmissão e da reflexão na faixa espectral entre 300 e 2000 nm. A partir da integração das curvas de valores obtidos em cada comprimento de onda, ponderados em função do espectro solar padrão, foram calculados os valores de transmitância, refletância e absortância, para o espectro total e para as regiões do ultravioleta (UV), do visível e do infravermelho (IV) separadamente. Os vidros translúcidos incolores ensaiados apresentam transmitância na região do IV inferior ao visível, resultando uma relação entre o ganho de luz e de calor igual ou superior a um, sendo uma boa indicação para utilização desse tipo de vidro em climas quentes. Os vidros translúcidos coloridos têm valores do FS inferiores ao vidro incolor de mesmo tipo, com Tv ainda mais baixa, estando seu uso mais associado a uma questão estética do que a cuidados com ganhos de calor. Todos os policarbonatos ensaiados transmitem uma parcela muito pequena no UV, e apenas o alveolar verde transmite mais na luz visível que no IV, sendo a relação entre o ganho de luz e de calor destes materiais baixa, com exceção dos alveolares verde e incolor. Com exceção do alveolar incolor, todos possuem alta absorção da radiação solar, indicando materiais com alto ganho de calor solar e alta temperatura radiante superficial quando expostos ao sol, o que pode causar desconforto localizado.

Palavras-chave
vidros translúcidos; policarbonatos translúcidos; Fator de Calor Solar; Transmitância da luz visível

ABSTRACT

This paper presents values of Solar Heat Factor (SHF) and Visible Light Transmittance (VLT) to sixteen types of translucent glasses and to six types of translucent polycarbonates, used in Brazil. Tests were performed in spectrophotometer, with integrative sphere, for normal incidence, resulting curves of transmission and reflection for a spectral range from 300 to 2000 nm. From the integration of the obtained value curves at each wavelength, weighted according to the standard solar spectrum, were calculated the values of transmittance, reflectance and absorptance, for the total spectrum and for the regions of ultraviolet (UV), visible and infrared (IR) separately. Translucent colorless glasses tested present transmittance in the region of infrared below visible, resulting a relation between the light gain and heat gain equals to or greater than one, presenting that is a good indication to use this glass type in hot climates. Translucent colored glasses have SHF values lower than colorless glass of same type, with VLT even lower, being its use more related to esthetics issues than care with heat gains. All tested polycarbonates transmit a very small portion in UV, and only the green alveolar transmits more in visible light than in IR, wherein the ratio between the light gain and heat gain of these materials is low, except green and colorless alveolar. Except colorless alveolar, all have high absorption of solar radiation, indicating materials with high solar heat gain and high surface radiant temperature when exposed to the sun, which can cause localized discomfort.

Keywords
translucent glass; translucent polycarbonates; Solar Heat Factor; Visible Light Transmittance

1. INTRODUÇÃO

A engenharia deve servir ao homem de maneira a melhorar sua qualidade de vida, o que automaticamente inclui o conforto térmico da sua residência ou local de trabalho. Segundo [11 FROTA, A. B., SCHIFFER, S. R., Manual de conforto térmico: arquitetura, urbanismo, ed. 5, São Paulo, Studio Nobel, 2001.], o ser humano está em conforto térmico quando as trocas de calor entre o corpo e o ambiente se dão sem esforço, e sob esse ponto de vista a capacidade de trabalho do indivíduo é máxima.

Com a publicação da NBR 15575: Edificações habitacionais – Desempenho [22 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. ABNT NBR 15575: Edificações habitacionais – Desempenho. Rio de Janeiro, 2013.], a busca do conhecimento sobre as propriedades dos diferentes materiais que compõe a envoltória da edificação e que, por consequência, afetam o conforto térmico da mesma está se tornando dia a dia mais presente, pois é na fase de projeto e especificação de materiais que são definidos os principais fatores que terão influência direta e indireta no conforto térmico.

Em relação aos fechamentos, torna-se importante diferenciá-los em transparentes, translúcidos e opacos. Através dos fechamentos transparentes e translúcidos ocorrem importantes trocas térmicas da edificação, pois quando a radiação solar incide num fechamento desses tipos, parte da energia é transmitida diretamente para o interior do ambiente, enquanto o restante é refletido ou absorvido, o que não ocorre com os fechamentos opacos nos quais somente existem as parcelas refletidas e absorvidas.

Na literatura internacional é possível encontrar estudos sobre o comportamento ótico de vidros e policarbonatos translúcidos frente à radiação solar, porém no Brasil o desenvolvimento de pesquisas nesta área ainda está incipiente. O conhecimento deste comportamento torna-se importante quando se deseja avaliar o impacto sobre o conforto térmico e visual do emprego desses materiais nos fechamentos das edificações. Geralmente, estes dados estão disponíveis em catálogos de fabricantes, sem maiores detalhes sobre o processo de obtenção ou sobre o comportamento espectrofotométrico nas diferentes regiões espectrais.

Em relação aos fechamentos transparentes, [33 CARAM R. M., Caracterização ótica de materiais transparentes e sua relação com o conforto ambiental em edificações, Tese de D.SC., Departamento de Saneamento e Ambiente, Universidade de Campinas, Campinas, SP, Brasil, 1998.] estudou o comportamento ótico de vidros transparentes utilizando espectrofotômetro sem esfera integradora para ângulos de incidência normal e [44 SANTOS, J. C. P., Avaliação do desempenho térmico e visual de elementos transparentes frente à radiação solar, Tese de D.Sc, Ciência e Engenharia de Materiais, Universidade de São Paulo, São Carlos, SP, Brasil, 2002.] analisou o comportamento de vidros e policarbonatos transparentes para ângulos de incidência variados. Já [55 SARDEIRO, P.S., Parâmetros para a escolha de superfícies translúcidas visando o conforto térmico e visual na edificação, Tese de D.Sc., Faculdade de Engenharia Civil Arquitetura e Urbanismo, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, SP, Brasil, 2007.] utilizou metodologia semelhante a estes dois autores para o estudo de vidros translúcidos em relação à transmissão para incidência normal.

Diante disto, o presente trabalho visa caracterizar o comportamento ótico de diferentes tipos de vidros e policarbonatos translúcidos em relação à transmissão e reflexão da radiação solar para incidência normal, utilizando espectrofotômetro com esfera integradora, que é um diferencial importante para a realização das medições, pois permite a medida da radiação que é transmitida ou refletida de forma difusa por este tipo de material.

Com os dados obtidos será possível analisar e calcular os ganhos de calor solar e luz natural através destes materiais em diferentes situações de projeto, gerando informações sobre o respectivo comportamento térmico e de transmissão luminosa, subsídios importantes para um processo de especificação mais criterioso desses materiais por parte dos profissionais responsáveis pelo projeto de edificações.

1.1 As superfícies translúcidas e seus comportamentos óticos

O uso de vidros impressos ou translúcidos, geralmente, está associado a custo baixo e solução estética de fachada, sendo usados de forma isolada ou em conjunto com vidros transparentes, na busca de um efeito arquitetonico diferenciado. A principal característica destes vidros, que os diferenciam dos vidros transparentes, é a difusão da luz nas diferentes texturas impressas em sua superfície, causando uma distorção leve da imagem e, principalmente, uma redução na admissão de luz natural em relação aos vidros transparentes, a qual depende do tipo de textura, da cor e da espessura do material. Estes vidros são indicados para projetos que demandam ganho de luz natural, mas com privacidade do ambiente e redução do ofuscamento causado pela incidência da radiação direta.

O sistema de fabricação dos vidros translúcidos ocorre de forma semelhante à dos vidros transparentes, com as mesmas matérias-primas e insumos básicos. Na saída do forno são utilizados dois cilindros metálicos, o rolo superior liso e o inferior tendo em sua superfície a gravação a ser impressa, sendo que a espessura é determinada pelo espaçamento entre estes rolos. Corantes podem ser adicionados à massa vítrea durante o processo de fabricação, dando origem aos vidros translúcidos coloridos. Ainda é possível realizar outros tipos de tratamento, como laminação, têmpera, jateamento, espelhamento, aramado e bisotê, aumentando as suas possibilidades de aplicação [66 ABRAVIDRO – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DISTRIBUIDORES E PROCESSADORES DE VIDROS PLANOS, http://www.abravidro.org.br. Acesso em março de 2017.
http://www.abravidro.org.br...
]. O vidro aramado não é impresso como os demais vidros ensaiados nesse trabalho, sendo translúcido por possuir uma tela metálica no seu interior.

Comparado aos vidros, os policarbonatos translúcidos são polímeros termoplásticos recicláveis que permitem uma liberdade ainda maior no projeto arquitetônico, uma vez que possuem baixa densidade e podem ser conformados a frio, além de possuírem alta resistência ao impacto, baixa cristalinidade (semelhante ao vidro incolor e transparente), boa estabilidade dimensional, boa resistência ao escoamento sob carga, às intempéries e a chama. O principal problema deste material é a oxidação das moléculas ao longo do tempo devido à radiação ultravioleta, embora as chapas recebam tratamento especial com a inserção de aditivos, a redução na transmissão luminosa e mudanças na coloração são visíveis com o tempo, resultando em superfícies com diferentes tonalidades e transparências, devido aos diferentes graus de incidência da radiação solar.

Estudos realizados por [77 CARAM, R. M., SICHIERI, E. P., LABAKI, L. “Conforto térmico e efeito estufa”, Revista Finestra, ed. 36, 2004.] para avaliar o comportamento dos policarbonatos em relação ao efeito estufa, comprovaram que os mesmos se comportam semelhante ao vidro, sendo totalmente opacos à radiação emitida na região do infravermelho longo, irradiada pelo ambiente aquecido, geralmente entre 7000 e 13000 nm. Em relação às trocas térmicas por condução, os policarbonatos têm menor condutividade térmica que o vidro, cerca de 0,21 W/mK, contra 1,2 W/mK para o vidro, sendo importante nas perdas do calor interno. No entanto, o desempenho térmico dos materiais transparentes ou translúcidos deve principalmente ser analisado em relação à transmissão, absorção e reflexão da radiação solar, principal fonte de ganhos térmicos através destas superfícies [88 ÇENGEL, Y.A., GHAJAR, A.J., KANOGLU, M., Transferência de calor e massa: uma abordagem prática, 4. ed., São Paulo, Mc Graw Hill, 2012.].

2. MATERIAIS E MÉTODOS

A seguir, serão apresentados os tipos e as características dos vidros e policarbonatos translúcidos ensaiados, além dos procedimentos de ensaio destes materiais à transmissão e à reflexão em espectrofotômetro, para o ângulo normal de incidência, o método de ponderação dos resultados em relação ao espectro solar padrão adotado, e ainda o procedimento de obtenção dos resultados de transmitância, refletância e absortância para diferentes regiões espectrais.

2.1 Amostras

Nesta pesquisa, foram avaliados 16 tipos de vidros translúcidos, sendo 12 incolores e 4 coloridos, e 6 tipos de policarbonatos translúcidos, englobando uma grande parte dos tipos de materiais translúcidos empregados em edificações no Brasil. Todas as amostras foram cortadas em formato retangular, higienizadas com pano limpo e álcool e, posteriormente, secas.

Na Tabela 1, apresentam-se os diferentes tipos de vidros estudados e suas respectivas espessuras.

Tabela 1
Tipos e espessuras dos vidros translúcidos ensaiados.

Na Tabela 2 encontram-se as variantes de policarbonatos avaliados e suas respectivas espessuras, sendo que os policarbonatos alveolares eram constituídos de duas lâminas delgadas com estruturas de paredes gêmeas e um espaço de ar entre elas (alvéolos), tendo o aspecto semelhante ao vidro canelado.

Tabela 2
Tipos e espessuras dos policarbonatos translúcidos ensaiados.

2.2 Descrição dos procedimentos de ensaio

As medidas de transmissão e reflexão foram realizadas com a utilização do espectrofotômetro da marca Varian modelo CARY 5G, pertencente ao Instituto de Química da Universidade de São Paulo. Devido ao fato que os materiais translúcidos transmitem e refletem a radiação de forma difusa, foi utilizado no espectrofotômetro um dispositivo denominado esfera integradora, conforme ilustrado na Figura 1. Este dispositivo permite a medição da radiação transmitida ou refletida de forma difusa pelos materiais translúcidos, a qual é refletida na sua superfície interna, revestida com material altamente refletivo, até ser captada pelos detectores de medição, que para a radiação ultravioleta e visível consiste em um foto tubo, e para a radiação infravermelha é constituído por elemento à base de sulfeto de chumbo.

Figura 1
Esquema de funcionamento do espectrofotômetro com uso da esfera integradora.

Para todos os ensaios de transmissão e reflexão foram considerados os parâmetros da Tabela 3.

Tabela 3
Parâmetros considerados nos ensaios de transmissão e reflexão.

Para as medições efetuadas com o uso da esfera integradora, a calibração do equipamento é feita utilizando duas medidas de referência: 1) a primeira com a colocação de um material branco com coeficiente de reflexão de 99% na abertura de colocação da amostra; 2) a segunda com a obstrução do orifício de entrada na esfera. A análise conjunta destas duas curvas resulta em linhas de base, que permitem a correção dos valores das medições com a exclusão dos erros inerentes ao conjunto do equipamento.

Após a varredura das linhas de base, o aparelho é aberto na parte superior e a amostra é introduzida e aderida à esfera integradora. Como o sensor que executa as medidas está localizado dentro da esfera, no caso das medidas de transmissão, a amostra é posicionada em frente ao orifício T de entrada dos raios na esfera, como mostrado na figura 4, sendo medida a energia que passa pela amostra. Neste caso, o orifício R é fechado com a colocação de uma superfície com coeficiente de reflexão de 99%. No caso das medidas de reflexão, a amostra é colocada na saída do orifício R da esfera, medindo a energia que é refletida pela mesma para o interior da esfera. Em ambos os casos, a amostra é colocada com a superfície lisa posicionada no lado de qual incidia o feixe de radiação do aparelho, simulando o uso da face lisa para o lado externo da construção, condição mais comum de utilização desse tipo de material.

2.3 Tratamento dos dados em relação ao espectro solar padrão

A Transmitância e a Refletância, considerando os resultados de transmissão e de reflexão em todos os comprimentos de onda, são obtidas pela relação entre a integral de toda a energia que é transmitida ou refletida, respectivamente, e o total da energia incidente.

Quando se utiliza, diretamente, a integração da curva resultante do espectrofotômetro para a obtenção destes valores, considera-se que em todos os comprimentos de onda chega o mesmo valor de energia incidente, o que acarreta distorções no caso da caracterização do elemento frente à radiação solar, pois essa possui variações acentuadas de valores de energia incidente nos comprimentos de onda do intervalo estudado.

Levando em consideração esse fato, neste trabalho foi feita uma associação entre os resultados fornecidos pelas medições no aparelho e o espectro solar padrão, adotado conforme ASTM E892: Standard Tables for Terrestrial Solar Spectral Irradiance at Air Mass [99 AMERICAN SOCIETY FOR TESTING AND MATERIALS. ASTM Standards. E892-87: Standard tables for terrestrial solar spectral irradiance at air mass 1.5 for a 37-deg tilted surface. West Conshohocken, 1992.], de maneira que o resultado de ensaio obtido fosse ponderado pelo valor correspondente de energia da radiação solar em seu respectivo comprimento de onda.

O procedimento utilizado para este fim foi a multiplicação, em cada comprimento de onda, dos resultados do ensaio de transmissão ou reflexão pelo valor da energia solar do espectro padrão adotado. Resulta desta forma, para cada comprimento de onda, o valor da energia solar que seria transmitida ou refletida quando incidindo sobre o respectivo material. O percentual da energia total que é transmitida ou refletida é calculado pela razão entre a integral da curva resultante destes valores e a integral da curva do espectro solar padrão. Pode-se efetuar este cálculo dentro de diferentes regiões espectrais, as quais foram divididas neste trabalho em ultravioleta, visível e infravermelho próximo, além do espectro total.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

A seguir, serão apresentados os resultados sobre o comportamento ótico dos vidros e policarbonatos translúcidos frente à radiação solar.

3.1 Comportamento espectrofotométrico na transmissão

Para os vidros, utilizou-se como referência a curva espectrofotométrica na transmissão do vidro plano incolor 3 mm e, para os policarbonatos, utilizou-se como referência a curva espectrofotométrica na transmissão do policarbonato compacto incolor 5 mm e do vidro plano incolor 3 mm, materiais que foram ensaiados com essas espessuras em [44 SANTOS, J. C. P., Avaliação do desempenho térmico e visual de elementos transparentes frente à radiação solar, Tese de D.Sc, Ciência e Engenharia de Materiais, Universidade de São Paulo, São Carlos, SP, Brasil, 2002.], resultando suas curvas espectrofotométricas disponíveis para comparação. Além disso, o vidro 3 mm incolor é o vidro base para cálculo do Coeficiente de Sombreamento pelos fabricantes.

As Figuras 2(a) e 2(b) apresentam as curvas espectrofotométricas na transmissão para os vidros translúcidos incolores, sendo possível observar um comportamento semelhante na variação da curva de transmissão entre os vidros translúcidos e entre eles e o vidro incolor, o que evidencia a composição química igual da massa vítrea que os compõem. Os valores da curva na região do visível e ultravioleta são bastante semelhantes entre todos os vidros enquanto na região do infravermelho, os vidros translúcidos transmitem percentuais menores de energia que o incolor, o que indica uma redução no ganho de calor solar importante com o uso destes vidros, sem uma perda proporcional de ganho de luz natural. Os menores valores de transmissão dos vidros aramado e spotlite são causados pela maior espessura destas duas amostras, fato que aumenta o percentual de absorção da amostra.

Figura 2
Curvas espectrofotométricas na transmissão dos vidros translúcidos incolores: (a) aramado, ártico, boreal, canelado, martelado, miniboreal; (b) oásis, rideau, silezia, spot, spotlite, teorema.

Com base na Figura 3 é possível concluir que os vidros translúcidos árticos incolor e coloridos tem comportamento espectrofotométrico na transmissão bem diversos, evidenciando, na região do visível, a maior transmissão na faixa espectral associada às suas cores características, devido à adição do corante na massa vítrea. É importante observar a grande transmissão do vidro roxo na região do IV.

Figura 3
Curvas espectrofotométricas na transmissão dos vidros translúcidos árticos incolor e coloridos (amarelo, azul, roxo e verde).

A Figura 4 apresenta as curvas espectrofotométricas na transmissão para os policarbonatos translúcidos. A partir dessas curvas é possível concluir que a transmissão na região do ultravioleta é praticamente nula para todos os policarbonatos, o que não ocorre com o vidro incolor. Na região do visível, cada policarbonato tem um comportamento diferenciado de acordo com sua coloração característica. Na região do infravermelho, o policarbonato verde tem um comportamento mais adequado a climas quentes, com baixa transmissão do infravermelho próximo. Já o policarbonato compacto branco tem a menor transmissão em praticamente todos os comprimentos de onda, devido a sua maior absorção. O policarbonato alveolar branco não repete este comportamento devido a sua menor espessura de material na trajetória da radiação. Com exceção do policarbonato verde, todos os policarbonatos têm maior valor de transmissão na região do infravermelho que no visível, o que demonstra pouca aptidão para melhoria do conforto térmico no uso em edificações em clima quente. Observa-se uma grande semelhança no perfil espectral da transmissão entre os policarbonatos incolores compacto e alveolar, e entre os policarbonatos brancos compacto e alveolar, o que evidencia a composição química igual da massa que os compõem.

Figura 4
Curvas espectrofotométricas na transmissão dos policarbonatos ensaiados.

3.2 Comportamento espectrofotométrico na reflexão

Para os vidros, utilizou-se como referência a curva espectrofotométrica na reflexão do vidro plano incolor 3 mm e, para os policarbonatos, utilizou-se como referência a curva espectrofotométrica na reflexão do policarbonato compacto incolor 5 mm e do vidro plano incolor 3 mm, disponíveis em [44 SANTOS, J. C. P., Avaliação do desempenho térmico e visual de elementos transparentes frente à radiação solar, Tese de D.Sc, Ciência e Engenharia de Materiais, Universidade de São Paulo, São Carlos, SP, Brasil, 2002.].

Com base nas Figuras 5(a), 5(b) e 6, observa-se que todos os vidros possuem o mesmo valor de refletividade na primeira interface, pois esta face é lisa em todas as amostras, sendo possivel concluir que as diferenças nos gráficos de refletância são causadas pela variação da reflexão na segunda interface, que depende da energia que chega a essa interface. O valor desta energia é função da absorção que a radiação sofre ao longo da espessura do material, e do formato do desenho impresso sobre a mesma, que influi no ângulo de incidência e de reflexão da radiação nesta interface. É possível inferir ainda que na reflexão existem poucas diferenças entre as curvas dos diferentes vidros translúcidos, sendo que as maiores diferenças entre os vidros translúcidos e o vidro plano incolor se encontram na região do visível e

Figura 5
Curvas espectrofotométricas na reflexão dos vidros translúcidos incolores: (a) aramado, ártico, boreal, canelado, martelado, miniboreal; (b) oásis, rideau, silezia, spot, spotlite, teorema.
Figura 6
Curvas espectrofotométricas na reflexão dos vidros translúcidos árticos incolor e coloridos (amarelo, azul, roxo e verde)

As diferenças que ocorrem nas curvas de transmissão entre os vidros translúcidos, e entre eles e o vidro plano incolor, principalmente na região do IV, não são observadas em mesma intensidade nas curvas de reflexão, sendo, portanto, causadas mais intensamente pelas diferenças na absorção. Nos vidros translúcidos incolores esta diferença na absorção está relacionada à diferença na absortividade da camada superficial interna do vidro, a qual sofre o trabalho de impressão, e no ângulo de reflexão na segunda interface, função do desenho impresso no vidro, que faz com que os feixes de radiação refletidos tenham caminhos óticos alterados dentro do material, alterando o valor da absorção da energia refletida na segunda interface.

Nos vidros coloridos, além dos fatos citados anteriormente, a diferença na absorção é também causada pelos diferentes corantes adicionados à massa vítrea, que alteram sensivelmente a absorção, principalmente na região do visível, resultando na cor característica de cada um dos vidros.

No caso dos policarbonatos, observa-se, na Figura 7, que na reflexão existem maiores diferenças entre as curvas dos policarbonatos brancos (alveolar e compacto) e os demais, sendo que esta diferença é mais acentuada na região do visível e do ultravioleta. Ainda, é possível concluir que as diferenças que ocorrem nas curvas de transmissão entre os diferentes policarbonatos, e entre eles e o vidro plano incolor, não são observadas na mesma intensidade nas curvas de reflexão, portanto, sendo causadas mais intensamente pelas diferenças na absorção.

Figura 7
Curvas espectrofotométricas na reflexão dos policarbonatos ensaiados.

3.3 Transmitância, refletância e absortância da radiação solar

A Tabela 4 apresenta os valores de Transmitância e Refletância dos vidros e policarbonatos translúcidos para as diferentes faixas espectrais da radiação solar, obtidos através da integral das curvas espectrofotométricas ponderadas pela energia do espectro solar padrão em cada comprimento de onda, conforme item 3.3. A coluna “VIS” da Transmitância equivale aos valores da transmitância da luz visível, sendo que os valores para o vidro plano incolor 3 mm foram obtidos por [44 SANTOS, J. C. P., Avaliação do desempenho térmico e visual de elementos transparentes frente à radiação solar, Tese de D.Sc, Ciência e Engenharia de Materiais, Universidade de São Paulo, São Carlos, SP, Brasil, 2002.], sendo acrescentados à tabela como um valor de referência para comparação.

Tabela 4
Transmitância, refletância e absortância dos vidros e policarbonatos translúcidos para as diferentes faixas espectrais.

Os valores de Absortância (A) são obtidos a partir da equação 1.

A = 100 - T - R (1)
  • T – Transmitância, expressa em porcentagem;

  • R – Refletância, expressa em porcentagem.

Pode-se observar que os vidros translúcidos incolores têm comportamentos óticos semelhantes ao vidro incolor transparente, com destaque para o martelado que possui valores de transmitância muito semelhantes em todas as faixas espectrais. Em geral, esses vidros têm valores da transmitância e refletância inferiores ao incolor transparente de 3 mm, e valores de absortância superiores, sendo as diferenças maiores nas faixas espectrais do UV e do IV.

Nos vidros coloridos translúcidos, se comparados ao vidro 3 mm incolor, também tem-se uma baixa sensível na transmitância, principalmente na região do visível e do UV, e um aumento sensível na absortância, devido à adição de corantes na massa vítrea, que eleva a temperatura radiante do vidro quando sob incidência solar.

Observou-se que todos os policarbonatos ensaiados transmitem uma parcela muito pequena no UV, e, com exceção do alveolar verde, transmitem maior percentual de energia na região do IV que no visível, característica desfavorável para o uso em climas quentes.

Deve-se atentar para a alta absorção da radiação na maioria dos tipos de policarbonatos, com exceção do alveolar incolor, o que pode causar desconforto localizado devido à alta temperatura radiante dos mesmos quando sofrem incidência da radiação solar.

3.4 Fator de calor solar (FS) e Transmitância da luz visível (Tv)

Os valores do Fator de Calor Solar (FS) para incidência normal são obtidos a partir da Equação 2.

F S = T + N i . A (2)

Ni – Percentual da energia absorvida que migra para o interior da edificação, dado pela Equação 3.

N i = U / h e (3)
  • U – Transmitância térmica (W/m2K);

  • he – coeficiente de trocas superficiais externas (W/m2K);

Conforme [44 SANTOS, J. C. P., Avaliação do desempenho térmico e visual de elementos transparentes frente à radiação solar, Tese de D.Sc, Ciência e Engenharia de Materiais, Universidade de São Paulo, São Carlos, SP, Brasil, 2002.], considerando-se um vento médio de 2m/s e superfície na vertical, resulta he=11,0 W/m2K e hi=8,7 W/m2K, sendo hi o coeficiente de trocas superficiais internas. Utilizando-se esses valores de he e hi, e adotando-se a condutividade térmica média do vidro de 1,0 W/mK, calcula-se a Resistência Térmica (RT) do mesmo e o valor de U (1/RT), chegando-se a um valor aproximado de Ni=0,43, para todos os vidros apresentados. Conforme o mesmo autor, para as mesmas condições, resulta para os policarbonatos he=11,4 W/m2K e hi=9,1 W/m2K. Sendo considerada a resistência térmica do espaço de ar do material alveolar de 0,14 m2K/W [1010 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. ABNT NBR 15220-2: Desempenho térmico de edificações – Parte 2: Métodos de cálculo da transmitância térmica, da capacidade térmica, do atraso térmico e do fator solar de elementos e componentes de edificações. Rio de Janeiro, 2005.], e a condutividade do material do policarbonato de 0,2 W/m2K, têm-se os valores de U e Ni apresentados na Tabela 5.

Tabela 5
Valores de he, hi, U e Ni para os policarbonatos alveolares e compactos

Com estes dados, são calculados o Fator de Calor Solar (FS) que estão listados na Tabela 6, juntamente com a Transmitância da Luz Visível (Tv) e da relação Tv/FS, tanto para os vidros quanto para os policarbonatos translúcidos estudados. Para fins de referência, os valores obtidos por [44 SANTOS, J. C. P., Avaliação do desempenho térmico e visual de elementos transparentes frente à radiação solar, Tese de D.Sc, Ciência e Engenharia de Materiais, Universidade de São Paulo, São Carlos, SP, Brasil, 2002.] para o vidro plano incolor 3 mm e para o policarbonato incolor 5 mm foram acrescentados à tabela.

Tabela 6
Valores de T, A, FS e Tv dos vidros e policarbonatos translúcidos.

Os vidros impressos incolores apresentaram valores de Fator de Calor Solar (FS) e Transmitância da Luz Visível (Tv) inferiores ao vidro plano incolor de mesma espessura, mas com diferenças pequenas, variando o FS entre 71,6 % no tipo Aramado a 86,1 % no vidro martelado, e a Tv entre 67,2 % e 86,3 % nos mesmos vidros.

Observou-se que todos os vidros impressos incolores ensaiados transmitem maior percentual de energia na região da luz visível, com diferença sensível em relação ao ultravioleta e o infravermelho. Com isto, a relação entre o ganho de luz e de calor destes vidros é alta, alguns apresentando valor desta relação superior a um, o que é muito difícil nos vidros simples comercializados no Brasil. Entre os materiais transparentes ensaiados por [44 SANTOS, J. C. P., Avaliação do desempenho térmico e visual de elementos transparentes frente à radiação solar, Tese de D.Sc, Ciência e Engenharia de Materiais, Universidade de São Paulo, São Carlos, SP, Brasil, 2002.], o vidro plano incolor e o vidro plano verde são os que apresentam maiores valores desta relação, ambos em torno de um. Observa-se que o vidro aramado é o único vidro translúcido incolor ensaiado com a relação Tv/FS abaixo de um, com 0,94, sendo ainda um valor alto comparado a outros tipos de vidros transparentes.

Os vidros impressos coloridos apresentam condição diferente, com transmissão da radiação na região do IV sendo superior ao visível a ao UV, assim, embora tenham valores do Fator de Calor Solar inferiores aos vidros incolores de mesma espessura, possuem uma Transmitância da Luz Visível ainda mais baixa que o Fator Solar. O FS varia entre 63,8 % no ártico amarelo e 76,6 % no ártico azul, enquanto a Tv tem valores entre 21,9 % no ártico roxo e 58,1 % no ártico azul. Assim tem-se uma baixa relação Tv/FS nesse tipo de vidro, com valores entre 0,33 no vidro ártico roxo e 0,76 no ártico azul.

Os policarbonatos translúcidos ensaiados apresentaram valores de Fator Solar (FS) variando entre um máximo de 75,4 % no tipo alveolar incolor e um mínimo de 47,7 % no compacto branco, enquanto a Transmitância da Luz Visível (Tv) varia entre 72% e 21,9% nos mesmos policarbonatos, respectivamente. Estes valores são inferiores aos do policarbonato compacto incolor e ao vidro plano incolor de mesma espessura.

O fato de transmitirem mais na região do IV que no visível faz com que a relação entre o ganho de luz e de calor (Tv/FS) destes materiais seja baixa, com exceção do alveolar verde e o alveolar incolor. Além disso, a alta absorção da radiação pelos policarbonatos translúcidos, principalmente os coloridos, indicam alta temperatura radiante do material quando há incidência solar.

4. CONCLUSÃO

A principal conclusão deste trabalho está relacionada ao comportamento dos vidros e policarbonatos translúcidos com relação aos ganhos de calor e luz solar, pois este é um fator importante a ser considerado na especificação destes tipos de materiais.

O uso de ensaios em espectrofotômetro com esfera integradora para analisar o comportamento ótico desses materiais permitiu uma análise bastante minuciosa e a obtenção de valores bastante consistentes, com boa repetitividade dos resultados.

Observou-se que o vidro translúcido incolor é uma boa opção para situações em que sejam necessárias características óticas semelhantes ao vidro incolor, com relação a ganhos de calor e luz, e se deseje privacidade e/ou redução do ofuscamento, ou ainda um efeito estético diferenciado em esquadrias de ambientes em que a visão para o exterior não seja importante. Esses vidros possuem valor de FS acima de 71, 6% e Tv acima de 67,2%.

Já os vidros impressos coloridos, embora tenham redução dos valores de FS em relação aos incolores apresetaram uma redução ainda mais acentuada na Tv, podendo ser usados para redução do ganho de calor solar, mas com uma perda acentuada de luz natural, portanto em esquadrias dimensionadas com área de vidros superior à necessária para uma iluminação natural de qualidade. Portanto, o uso em clima quente dos vidros impressos coloridos está mais associado a uma questão estética, a redução do ofuscamento e a privacidade dos ambientes, e não ao atendimento de necessidades relacionadas ao conforto térmico ou melhoria da iluminação natural, pois o FS desses vidros está acima de 63,85% e a Tv acima de 21,9%.

Observou-se que os policarbonatos translúcidos em geral são boas opções para situações em que se necessite maior resistência, baixo peso na estrutura, proteção contra UV, e se deseje privacidade e/ou redução do ofuscamento, mas apenas o alveolar verde e o incolor possuem uma relação Tv/FS mais elevada, próxima de um (1), que seria mais adequado para uso em clima quente.

Deve-se atentar para a grande absorção da radiação de diversos tipos de vidros translúcidos, principalmente os coloridos, e de policarbonatos, em geral os que possuem menor Fator Solar, o que pode trazer desconforto pela alta temperatura radiante dos mesmos quando instalados nas proximidades de pessoas, tanto em fechamentos verticais, como principalmente em coberturas, no caso do uso do vidro aramado e dos policarbonatos.

Salienta-se que os dados aqui disponibilizados são de grande utilidade para a avaliação dos ganhos de calor e luz natural através destes materiais, mas, devido ao fato de que as medições foram realizadas apenas para a incidência normal da radiação, não permitem um cálculo mais apurado de ganhos de calor e luz ao longo de um período de tempo, em que o ângulo de incidência da radiação solar é variável. Para que isto seja possível com maior precisão, torna-se necessário o estabelecimento da curva de variação do Fator Solar e da Transmitância da Radiação Visível em função do ângulo de incidência da radiação.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2018

Histórico

  • Recebido
    22 Maio 2017
  • Aceito
    29 Ago 2017
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