Acessibilidade / Reportar erro

ADAPTAÇÃO CULTURAL E VALIDAÇÃO DO LOW ENERGY AVAILABILITY IN FEMALES QUESTIONNAIRE (LEAF-Q)

RESUMO

Introdução:

A baixa energia disponível, amenorreia e osteoporose compõe a tríade da mulher atleta, e afeta mulheres fisicamente ativas e atletas. O questionário Low Energy Availability in Females Questionnaire (LEAF-Q) foi criado com a finalidade de identificar atletas do sexo feminino em risco de tríade da mulher atleta.

Objetivo:

Traduzir e adaptar culturalmente para o português do Brasil e validar o LEAF-Q em um grupo de atletas brasileiras.

Métodos:

A primeira etapa do estudo consistiu em tradução, adaptação cultural e validação de conteúdo do instrumento em 20 atletas. Na segunda etapa, para a análise da confiabilidade teste-reteste e validação de construto, a versão final adaptada do questionário foi aplicada em uma amostra de 127 atletas de diversas modalidades e, dentre elas, 54 responderam o questionário em uma segunda ocasião. Para a análise da confiabilidade teste-reteste, foi calculado o coeficiente de correlação intraclasse (ICC), assim como a realização dos testes t pareado, de McNemar e do gráfico de Bland-Altman. A validação de construto modelada por grupos conhecidos ou contrastados foi realizada a partir da comparação das pontuações médias do LEAF-Q do grupo 1 (atletas de modalidades sensíveis ao peso) e do grupo 2 (atletas de esportes coletivos), empregando o teste t de Student.

Resultados:

A versão brasileira do LEAF-Q apresentou excelente confiabilidade teste-reteste, com ICC de 0,92. A validade de construto por grupos conhecidos ou contrastados foi confirmada ao demonstrar que atletas de modalidades sensíveis ao peso têm pontuação média maior no LEAF-Q do que atletas de esportes coletivos (p ≤ 0,05).

Conclusão:

A versão brasileira do LEAF-Q é uma ferramenta importante, que apresentou adequação textual e cultural, provou ser confiável, em termos de confiabilidade teste-reteste e apresenta evidências de validação para investigar o risco de tríade. Nível de evidência II; Estudos diagnósticos – Investigação de um instrumento diagnóstico .

Descritores:
Estudos de validação; Atletas; Síndrome da tríade da mulher atleta

ABSTRACT

Introduction:

Low energy availability, amenorrhea and osteoporosis make up the Female Athlete Triad observed in physically active females and athletes. The Low Energy Availability in Females Questionnaire (LEAF-Q) was created with the purpose of identifying female athletes at risk for the Female Athlete Triad.

Objective:

To translate and culturally adapt the LEAF-Q for Brazilian Portuguese and validate it in a group of Brazilian athletes.

Methods:

The first stage of the study consisted of translation, cultural adaptation and content validation of the questionnaire in 20 athletes. In the second stage, for the test-retest reliability analysis and the construct validation, the final adapted version was applied in a sample of 127 athletes from various sports disciplines, 54 of whom responded to the questionnaire on a second occasion. For the test-retest reliability analysis, the intraclass correlation coefficient (ICC) was calculated and the paired t-test, McNemar’s test and Bland-Altman plot were carried out. The construct validation modeled by known or contrasted groups was carried out by comparing the mean LEAF-Q scores of group 1 (athletes who practiced weight-sensitive sports) with those of group 2 (athletes who practiced team sports) using the Student’s t test.

Results:

The Brazilian version of the LEAF-Q showed excellent test-retest reliability, with an ICC of 0.92. The construct validity by known or contrasted groups was confirmed after demonstrating that athletes who practiced weight-sensitive sports had a higher LEAF-Q mean score than athletes who practiced team sports (p≤0.05).

Conclusion:

The Brazilian version of the LEAF-Q is an important tool, which presented textual and cultural adequacy, proved to be reliable in terms of test-retest reliability, and presents evidence of validity to investigate the risk of the triad. Level of evidence II; Diagnostic Studies – Investigating a diagnostic instrument .

Keywords:
Validation studies; Athletes; Female athlete triad syndrome

RESUMEN

Introducción:

La baja energía disponible, amenorrea y osteoporosis conforman la Tríada de la mujer deportista, y afecta a mujeres físicamente activas y atletas. El cuestionario Low Energy Availability in Females Questionnaire (LEAF-Q) fue creado con la finalidad de identificar a atletas del sexo femenino en riesgo de Tríada de la mujer deportista.

Objetivo:

Traducir y adaptar culturalmente al portugués de Brasil y validar el LEAF-Q en un grupo de atletas brasileñas.

Métodos:

La primera etapa del estudio consistió en traducción, adaptación cultural y validación de contenido del instrumento en 20 atletas. En la segunda etapa, para el análisis de la confiabilidad test-retest y validación de constructo, la versión final adaptada del cuestionario fue aplicada a una muestra de 127 atletas de diversas modalidades y, entre ellas, 54 respondieron el cuestionario en una segunda ocasión. Para el análisis de la confiabilidad test-retest fue calculado el coeficiente de correlación intraclase (ICC), así como la realización de los tests t pareado, de McNemar y del gráfico de Bland-Altman. La validación de constructo modelada por grupos conocidos o contrastados fue realizada a partir de la comparación de las puntuaciones promedio del LEAF-Q del grupo 1 (atletas de modalidades sensibles al peso) y del grupo 2 (atletas de deportes colectivos), empleando el test t de Student.

Resultados:

La versión brasileña de LEAF-Q presentó excelente confiabilidad de test-retest, con ICC de 0,92. La validez de constructo por grupos conocidos o contrastados fue confirmada al demostrar que atletas de modalidades sensibles al peso tienen puntuación promedio mayor en el LEAF-Q que atletas de deportes colectivos (p ≤ 0,05).

Conclusión:

La versión brasileña del LEAF-Q es una herramienta importante, que presentó adecuación textual y cultural, probó ser confiable, en términos de confiabilidad de test-retest, y presenta evidencias de validación para investigar el riesgo de tríada. Nivel de evidencia II; Estudios diagnósticos – Investigación de un instrumento diagnóstico .

Descriptores:
Estudios de validación; Atletas; Síndrome de la tríada de la atleta femenina

INTRODUÇÃO

Desde 2007, a Tríade da Mulher Atleta é descrita como uma síndrome que consiste na inter-relação entre baixa energia disponível (BED), com ou sem transtorno alimentar, amenorreia e osteoporose. 11. De Souza MJ, Nattiv A, Joy E, Misra M, Williams NI, Mallinson RJ, et al. 2014 Female Athlete Triad Coalition consensus statement on treatment and return to play of the female athlete triad: 1st International Conference held in San Francisco, CA, May 2012, and 2nd International Conference held in Indianapolis, IN, May 2013. Clin J Sport Med. 2014;24(2):96-119. A síndrome, que tem a BED como causa principal, pode se manifestar na condição mais extrema ou se encontrar em algum ponto entre os estados saudável e doente. Isso pode ocorrer com qualquer um de seus componentes. 11. De Souza MJ, Nattiv A, Joy E, Misra M, Williams NI, Mallinson RJ, et al. 2014 Female Athlete Triad Coalition consensus statement on treatment and return to play of the female athlete triad: 1st International Conference held in San Francisco, CA, May 2012, and 2nd International Conference held in Indianapolis, IN, May 2013. Clin J Sport Med. 2014;24(2):96-119.

A energia disponível (ED) é a energia remanescente para a ocorrência dos processos metabólicos, após a energia utilizada no exercício físico, relativa à massa livre de gordura, ser considerada 22. Nattiv A, Loucks AB, Manore MM, Sanborn CF, Sundgot-Borgen J, Warren MP, et al. American College of Sports Medicine Position Stand. The female athlete triad. Med Sci Sports Exerc. 2007;39(10):1867–82. . A ED é calculada pela equação: [ED = ingestão de energia (IE)(kcal)- gasto energético no exercício físico (GEE)(kcal)/ massa livre de gordura (MLG)(kg)]. 22. Nattiv A, Loucks AB, Manore MM, Sanborn CF, Sundgot-Borgen J, Warren MP, et al. American College of Sports Medicine Position Stand. The female athlete triad. Med Sci Sports Exerc. 2007;39(10):1867–82. A ED é considerada adequada quando ≥45 kcal/kg MLG/dia e baixa quando ≤30 kcal/kg MLG/dia, enquanto sintomas subclínicos podem ser identificados quando ED está entre 30 e 45 kcal/kg MLG/dia. 33. Schofield KL, Thorpe H, Sims ST. Resting metabolic rate prediction equations and the validity to assess energy deficiency in the athlete population. Exp Physiol. 2019;104(4):469-75.

Dado que a BED desempenha papel fundamental no desenvolvimento da Tríade, o diagnóstico desse quadro deve ter como foco identificar a presença e causa da BED. 44. Mountjoy M, Sundgot-Borgen J, Burke L, Carter S, Constantini N, Lebrun C, et al. The IOC consensus statement: beyond the Female Athlete Triad - Relative Energy Deficiency in Sport (RED-S). Br J Sports Med. 2014;48(7):491-7. Apesar de não haver um guia padronizado para a determinação dessa condição, 44. Mountjoy M, Sundgot-Borgen J, Burke L, Carter S, Constantini N, Lebrun C, et al. The IOC consensus statement: beyond the Female Athlete Triad - Relative Energy Deficiency in Sport (RED-S). Br J Sports Med. 2014;48(7):491-7. pela definição, o cálculo de ED requer informações sobre IE, GEE e MLG. 55. Burke LM, Lundy B, Fahrenholtz IL, Melin AK. Pitfalls of conducting and interpreting estimates of energy availability in free-living athletes. Int J Sport Nutr Exerc Metab. 2018;28(4):350-63. No entanto, os métodos de medida desses componentes são imprecisos ou pouco acessíveis. 55. Burke LM, Lundy B, Fahrenholtz IL, Melin AK. Pitfalls of conducting and interpreting estimates of energy availability in free-living athletes. Int J Sport Nutr Exerc Metab. 2018;28(4):350-63.

Diante da dificuldade em se mensurar os componentes da ED, 66. Viner RT, Harris M, Berning JR. Energy availability and dietary patterns of adult male and female competitive cyclists with lower than expected bone mineral density. Int J Sport Nutr Exerc Metab. 2015;25(6):594–602. Melin et al. 77. Melin A, Tornberg AB, Skouby S, Faber J, Ritz C, Sjödin A, et al. The LEAF questionnaire: a screening tool for the identification of female athletes at risk for the female athlete triad. Br J Sports Med. 2014;48(7):540-5. construíram e validaram o Low Energy Availability in Females Questionnaire (LEAF-Q) , um questionário autoaplicável, originalmente apresentado na língua inglesa, composto por 25 itens relacionados ao status menstrual e gastrointestinal e à ocorrência de lesões, ou seja, fatores associados à persistente deficiência de energia que permitem a identificação do risco de Tríade. O LEAF-Q foi validado em mulheres, de 18 a 39 anos, que treinavam, pelo menos, cinco horas semanais, atletas de resistência e bailarinas inglesas, suecas e dinamarquesas, e identifica atletas em risco de Tríade quando a pontuação é ≥8. 77. Melin A, Tornberg AB, Skouby S, Faber J, Ritz C, Sjödin A, et al. The LEAF questionnaire: a screening tool for the identification of female athletes at risk for the female athlete triad. Br J Sports Med. 2014;48(7):540-5. Além disso, cada domínio do questionário apresenta ponto de corte que indica disfunção: ≥2 para o domínio Lesões, ≥2 para Função Gastrointestinal e ≥4 para Função Menstrual. 77. Melin A, Tornberg AB, Skouby S, Faber J, Ritz C, Sjödin A, et al. The LEAF questionnaire: a screening tool for the identification of female athletes at risk for the female athlete triad. Br J Sports Med. 2014;48(7):540-5.

O objetivo desse trabalho foi traduzir, adaptar culturalmente e validar, a partir da análise da confiabilidade e da validade de construto por grupos conhecidos ou contrastados, a versão brasileira do LEAF-Q como um instrumento para identificar atletas em risco de Tríade.

MÉTODOS

Tradução, adaptação cultural e validação de conteúdo

Para realizar a tradução do LEAF-Q para o português do Brasil, obteve-se o consentimento dos autores responsáveis pela versão original do questionário. O processo de tradução, adaptação cultural e validação de conteúdo do LEAF-Q foi realizado a partir de recomendações de Guillemin et al. 88. Guillemin F, Bombardier C, Beaton D. Cross-cultural adaptation of health-related quality of life measures: literature review and proposed guidelines. J Clin Epidemiol. 1993;46(12):1417–32. e Beaton et al. 99. Beaton DE, Bombardier C, Guillemin F, Ferraz MB. Guidelines for the process of cross- cultural adaptation of self-report measures. Spine (Phila Pa 1976). 2000;24(31):86–91. ( Figura 1 )

Figura 1
Fluxograma das etapas do processo de tradução, adaptação cultural e validação de conteúdo do Low Energy Availability in Females Questionnaire (LEAF-Q) .

A versão original do LEAF-Q foi traduzida por dois tradutores independentes com fluência na língua inglesa. O tradutor 1, especialista da área da saúde, conhecia o objeto de estudo. O tradutor 2 era um indivíduo não especialista na área e sem conhecimento sobre o questionário. As duas versões em português (T1 e T2) foram analisadas, de forma independente, por três professores doutores da área da saúde (psicologia, nutrição e educação física), envolvidos na área esportiva. As três versões foram sintetizadas, pela pesquisadora principal, a uma única versão em português (V1). V1 foi retrotraduzida para o inglês por dois tradutores nativos na língua inglesa e sem conhecimento sobre o conteúdo do instrumento, originando RT1 e RT2. Em seguida, as versões original, T1, T2, V1, RT1 e RT2 foram analisadas, de forma independente, por um comitê de especialistas, composto por dois profissionais da saúde (medicina e nutrição), atuantes na área de esporte e com fluência na língua inglesa, e um dos tradutores do processo. Cada participante do comitê elaborou uma versão brasileira do LEAF-Q , que foram sintetizadas em uma única versão em português (versão piloto) pelas pesquisadoras deste estudo.

Para a validade de conteúdo do instrumento, a versão piloto foi testada a fim de identificar potenciais problemas de interpretação. Nove atletas de diversas modalidades, de 18 a 39 anos, preencheram a versão piloto, enquanto eram observadas quanto a qualquer comportamento de dúvida ou dificuldade relativo ao instrumento. Após o preenchimento, as atletas foram questionadas sobre a clareza do questionário e sugestões em casos de incompreensão. Dois pontos para correção foram identificados: 1) um ou mais itens não foram respondidos, devido à presença da expressão “se sim” que causou confusão entre as atletas e, por isso, foi retirada; e 2) ao lerem uma das questões na seção C, algumas atletas precisaram rever a questão original da seção que estava na página anterior, portanto, para facilitar, foi realizada modificação como consta na Tabela 1 .

Tabela 1
Alterações da versão piloto, originando a versão final (versão brasileira do LEAF-Q ).

Após essas adaptações, a nova versão, preenchida por outras 11 atletas, foi definida como a versão final do LEAF-Q brasileiro, pois não houve relato de incompreensão ou demonstração de dificuldades frente ao instrumento.

Participantes

Cento e sessenta atletas do sexo feminino, de diversas modalidades, foram contatadas. As participantes deveriam treinar, pelo menos, cinco horas/semana para competição, ter tido a menarca e apresentar idade entre 18 e 39 anos. Atletas grávidas, lactantes, portadoras de doença crônica, usuárias de contraceptivo hormonal (ou que utilizaram anticoncepcional oral seis semanas antes do estudo), apresentando alguma lesão que as impediram de treinar por duas semanas ou mais e participantes da primeira etapa do estudo (validação de conteúdo) não foram incluídas. Trinta e três atletas relataram o uso de métodos hormonais de contracepção e, portanto, não fizeram parte deste estudo. A amostra foi composta por 127 atletas das seguintes modalidades: corrida, triatlon, natação, ciclismo, ginástica rítmica, jiu-jitsu, muay-thai, artes marciais mistas (MMA), rúgbi, futebol, basquete, vôlei, handebol e CrossFit®.

As participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. O Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo aprovou este estudo sob o número de parecer 2.044.177/2017.

Confiabilidade

A confiabilidade é a capacidade do questionário em produzir os mesmos resultados em testagens repetidas sob várias condições. 1010. Melissant HC, Neijenhuijs KI, Jansen F, Aaronson NK, Groenvold M, Holzner B, et al. A systematic review of the measurement properties of the Body Image Scale (BIS) in cancer patients. Support Care Cancer. 2018;26(6):1715-26. Para a análise da confiabilidade teste-reteste da versão brasileira do LEAF-Q , das 127 participantes, 54 responderam o instrumento em dois momentos, em um intervalo de duas a quatro semanas, sem conhecer o primeiro resultado e em um mesmo ciclo menstrual. Pela característica autoaplicável do questionário, não houve influência da pesquisadora nas respostas das participantes em momento algum.

Validade de construto

A validade de construto pode ser acessada pelo grau de correlação entre as pontuações de um instrumento e as hipóteses sobre o conceito que está sendo medido. 1111. Streiner DL, Norman GR. Health Measurement Scales (a pratical guide to theirs development and use). 4th ed. Oxford, England: Oxford University Press; 2008. Para a verificação da validade de construto da versão brasileira do LEAF-Q , por meio da abordagem de grupos conhecidos ou contrastados, estabeleceu-se a hipótese de que atletas de esportes sensíveis ao peso (modalidades de resistência, estética e luta), componentes do grupo 1, apresentariam pontuação média de LEAF-Q maior que atletas de esportes coletivos (grupo 2). Os esportes sensíveis ao peso são definidos como aqueles em que dietas restritivas, baixa adiposidade, oscilações frequentes de massa corporal e distúrbios alimentares são relatados na literatura e na prática. 1212. Meyer NL, Sundgot-Borgen J, Lohman TG, Ackland TR, Stewart AD, Maughan RJ, et al. Body composition for health and performance: a survey of body composition assessment practice carried out by the Ad Hoc Research Working Group on Body Composition, Health and Performance under the auspices of the IOC Medical Commission. Br J Sports Med. 2013;47(16):1044-53.

Análise estatística

Os dados de caracterização demográfica e antropométrica foram submetidos à análise descritiva e apresentados por meio de média e desvio padrão (DP).

A confiabilidade teste-reteste foi avaliada pelo Coeficiente de Correlação Intraclasse (ICC). O valor de ICC recomendado deve ser o mais próximo de +1, com um valor mínimo aceitável de 0,70. 1313. Terwee CB, Bot SD, De Boer MR, Van Der Windt DA, Knol DL, Dekker J. Quality criteria were proposed for measurement properties of health status questionnaires. J Clin Epidemiol. 2007;60(1):34-42. No gráfico de Bland-Altman , 1414. Bland JM, Altman DG. Statistical methods for assessing agreement between two methods of clinical measurement. Lancet. 1986;1(8476):307-10. as diferenças individuais entre as pontuações de teste-reteste foram plotadas contra a média de ambas as pontuações. Os limites de concordância de 95% foram calculados como a diferença média entre a pontuação do teste e reteste ±1,96 DP das diferenças.

O teste de McNemar 1515. McNemar Q. Note on the sampling error of the difference between correlated proportions or percentages. Psychometrika. 1947;12(2):153-7. foi usado para comparar o diagnóstico de risco de Tríade no teste-reteste, tendo como desejável a hipótese nula p>0,05, que demonstra a ausência de alteração do diagnóstico nesse intervalo. O teste t pareado entre as médias das pontuações do teste e reteste foi realizado, esperando ausência de diferença estatística entre elas.

Para a análise de validade de construto por grupos conhecidos ou contrastados, foi utilizado o teste t de Student para comparar a pontuação média do LEAF-Q de atletas de esportes sensíveis ao peso com a de atletas de esportes coletivos.

Os dados foram processados pelo programa Statistical Package for the Social Sciences - SPSS , versão 22.0, para Windows 7.0. 1616. IBM Corp. Released 2013. IBM SPSS Statistics for Windows. Version 22.0. Armonk, NY: IBM Corp. Para a interpretação dos resultados e para os testes de hipóteses, foram adotados valores de significância iguais ou menores que 5% (p≤0,05).

RESULTADOS

Confiabilidade

A Tabela 2 apresenta as características demográficas e antropométricas das participantes.

Tabela 2
Características da amostra.

A versão brasileira do LEAF-Q apresentou excelente confiabilidade com ICC de 0,92.

A medida das pontuações de teste-reteste das 54 atletas apresentou distribuição normal, possibilitando a análise do gráfico de Bland-Altman . A Figura 2 mostra que 95% das diferenças entre a 1ª e a 2ª medidas apresentaram-se entre -4 e +4 pontos (p=0,58). Similarmente, obteve-se p=0,61 no teste t pareado entre as médias das pontuações de teste-reteste.

Figura 2
Gráfico de Bland-Altman referente à concordância entre teste e reteste, aplicados em um intervalo de duas a quatro semanas.

O teste de McNemar foi aplicado para avaliar a mudança intra-sujeitos do risco de Tríade. Observou-se que não houve mudança significante (p=0,50) do quadro entre teste e reteste nessa amostra, reforçando a confiabilidade da versão brasileira do questionário.

Validade de construto

A validade de construto por grupos conhecidos ou contrastados da versão brasileira do LEAF-Q foi constatada ao se observar maior pontuação média do questionário no grupo 1, quando comparada com a pontuação média do grupo 2, nos dois momentos de aplicação do instrumento. ( Tabela 3 )

Tabela 3
Pontuação média do LEAF-Q dos grupos 1 e 2 no teste e reteste.

A Tabela 4 apresenta as características antropométricas das mulheres que compõem esses grupos.

Tabela 4
Características da amostra de atletas dos grupos 1 e 2.

DISCUSSÃO

O método utilizado neste estudo possibilitou a realização da tradução, da adaptação cultural e da validação do LEAF-Q para aplicação em atletas brasileiras, a fim de identificar o risco de Tríade a partir de sintomas relacionados à BED. O instrumento, em sua versão brasileira, não apresenta vieses linguísticos ou culturais, e, portanto, possibilita a identificação de atletas em risco de Tríade.

Apesar da falta de consenso, alguns aspectos são identificados como importantes no processo de tradução e adaptação de um instrumento:1) é necessário que a tradução seja realizada por mais de uma pessoa com alto nível de conhecimento do idioma de origem quanto do idioma de destino, e que esteja familiarizada com ambas as culturas; 1717. Hambleton RK, Patsula L. Increasing the validity of adapted tests: myths to be avoided and guidelines for improving test adaptation practices. J Appl Test Technol. 2009;1(1):1-30. 2) o papel do comitê de especialistas é essencial na revisão de todas as versões de tradução, na tomada de decisão para se chegar a um consenso sobre discrepâncias encontradas e na consolidação do processo para dar origem à versão final; 1818. Acquadro C, Conway K., Hareendran A, Aaronson N, European Regulatory Issues and Quality of Life Assessment (ERIQA) Group. Literature review of methods to translate health-related quality of life questionnaires for use in multinational clinical trials. Value Health. 2008;11(3):509-21. e 3) o instrumento elaborado deve ser testado no público-alvo, para garantir a abrangência, objetividade, simplicidade, clareza, relevância, credibilidade, variedade e amplitude semântica e idiomática do conteúdo a partir das impressões dessa população. 1919. Pasquali L. Princípios de elaboração de escalas psicológicas. Rev Psiquiatr Clin. 1998;25(5):206-13. Todos esses aspectos foram adotados neste estudo.

Durante a tradução e adaptação do LEAF-Q , não houve alteração do formato do questionário original ou de seus itens. As modificações linguísticas e culturais propostas pelo comitê de especialistas se deram para proporcionar maior compreensão pela população brasileira. Identificou-se uma versão adaptada do LEAF-Q para praticantes de atividade física neozelandesas. 2020. Slater J, Mclay-Cooke R, Brown R, Black K. Female recreational exercisers at risk for low energy availability. Int J Sport Nutr Exerc Metab. 2016;26(5):421-7. Nessa versão, algumas palavras e expressões foram substituídas para maior compreensão pela população da Nova Zelândia, já que a versão original do LEAF-Q foi desenvolvida na Escandinávia. 2121. Black K, Slater J, Brown RC, Cooke R. Low energy availability, plasma lipids, and hormonal profiles of recreational athletes. J Strength Cond Res. 2018;32(10):2816-24. Entretanto, não houve relatos da realização de validação de conteúdo na população-alvo. Da mesma forma, Meng et al. 2222. Meng K, Qiu J, Benardot D, Carr A, Yi L, Wang J, et al. The risk of low energy availability in Chinese elite and recreational female aesthetic sports athletes. J Int Soc Sports Nutr. 2020;17(1):13. aplicaram o LEAF-Q em atletas chinesas, mas não mencionaram a realização de tradução e adaptação do instrumento para essa população. Portanto, até o momento, esse é o único estudo que traduziu e adaptou culturalmente o LEAF-Q , de acordo com as recomendações. 88. Guillemin F, Bombardier C, Beaton D. Cross-cultural adaptation of health-related quality of life measures: literature review and proposed guidelines. J Clin Epidemiol. 1993;46(12):1417–32.,99. Beaton DE, Bombardier C, Guillemin F, Ferraz MB. Guidelines for the process of cross- cultural adaptation of self-report measures. Spine (Phila Pa 1976). 2000;24(31):86–91.

A confiabilidade teste-reteste da versão brasileira do LEAF-Q , em um intervalo de duas a quatro semanas, teve ICC excelente de 0,92. O período para repetir a medida deve ser longo o bastante para evitar que a voluntária lembre as respostas, mas curto o suficiente para garantir que a mudança clínica não tenha ocorrido. 2323. Terwee CB, Mokkink LB, Steultjens, MP, Dekker J. Performance-based methods for measuring the physical function of patients with osteoarthritis of the hip or knee: a systematic review of measurement properties. Rheumatology (Oxford). 2006;45(7):890-902. Portanto, neste estudo, somente as atletas que não tiveram novo ciclo menstrual entre teste e reteste responderam o instrumento pela segunda vez, garantindo que não teriam vivenciado e observado características diferentes do ciclo anterior, quando responderam à primeira aplicação. A versão original, criada e validada por Melin et al., 77. Melin A, Tornberg AB, Skouby S, Faber J, Ritz C, Sjödin A, et al. The LEAF questionnaire: a screening tool for the identification of female athletes at risk for the female athlete triad. Br J Sports Med. 2014;48(7):540-5. teve ICC adequado de 0,79 e intervalo teste-reteste de duas semanas, sem indicação se as atletas se encontravam no mesmo ciclo menstrual.

A validade de construto visa sustentar a capacidade do instrumento em medir o que se designa a medir 2424. Waltz C, Strickland OL, Lenz ER. Measurement in nursing research. 4th ed. New York: Springer; 2010. e pode ser avaliada a partir de hipóteses predefinidas, como, por exemplo, diferenças esperadas nas pontuações entre grupos “conhecidos”. 1313. Terwee CB, Bot SD, De Boer MR, Van Der Windt DA, Knol DL, Dekker J. Quality criteria were proposed for measurement properties of health status questionnaires. J Clin Epidemiol. 2007;60(1):34-42. A hipótese deste estudo foi baseada na alegação de Ackland et al., 2525. Ackland TR, Lohman TG, Sundgot-Borgen J, Maughan RJ, Meyer NL, Stewart AD, et al. Current status of body composition assessment in sport: review and position statement on behalf of the ad hoc research working group on body composition health and performance, under the auspices of the I.O.C. Medical Commission. Sports Med. 2012;42(3):227-49. de que atletas de esportes sensíveis ao peso (esporte gravitacional, estético e de categoria de peso) utilizam métodos extremos de restrição calórica, para reduzir rapidamente ou manter a massa corporal, visando obter vantagem competitiva, sendo então mais suscetíveis à BED e, consequentemente, Tríade. A alegação corroborou o estudo de Torstveit e Sundgot-Borgen, 2626. Torstveit MK, Sundgot-Borgen J. The female athlete triad: are elite athletes at increased risk? Med Sci Sports Exerc. 2005;37(2):184-93. que observaram menor risco de Tríade em atletas de esportes coletivos, quando comparadas com atletas de resistência, luta e esportes estéticos. Sendo assim, a validade por grupos conhecidos, da versão brasileira do LEAF-Q , mostrou-se satisfatória ao provar que as atletas de modalidades sensíveis ao peso apresentaram maior risco de Tríade com relação às atletas de esportes coletivos. Apesar da correlação demonstrada nesse trabalho, Logue et al. 2727. Logue DM, Madigan SM, Heinen M, Mcdonnell SJ, Delahunt E, Corish CA. Screening for risk of low energy availability in athletic and recreationally active females in Ireland. Eur J Sport Sci. 2019;19(1):112-22. não conseguiram encontrar diferença na pontuação do LEAF-Q entre atletas e praticantes de atividade física irlandesas de esportes individuais e coletivos.

O LEAF-Q original apresentou sensibilidade de 78% e especificidade de 90% obtidos por análise da validade de critério, 77. Melin A, Tornberg AB, Skouby S, Faber J, Ritz C, Sjödin A, et al. The LEAF questionnaire: a screening tool for the identification of female athletes at risk for the female athlete triad. Br J Sports Med. 2014;48(7):540-5. a qual não foi realizada neste estudo, mas que é sugerida para futuras avaliações psicométricas do instrumento. A falta de outros questionários validados para identificar o risco de Tríade, ou seus componentes, impossibilitou a comparação da eficácia diagnóstica do LEAF-Q e, consequentemente, a abrangência da análise de validade de construto.

CONCLUSÃO

A versão brasileira do LEAF-Q apresentou adequação contextual e cultural, mostrou-se ser confiável, em termos de confiabilidade teste-reteste, e possui evidências de validação para identificar o risco de Tríade em atletas brasileiras. Este é o primeiro estudo que traduziu o LEAF-Q para o português do Brasil, avaliando confiabilidade e validade de construto.

AGRADECIMENTOS

Aos especialistas que participaram das fases de tradução e adaptação. Esse estudo teve o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).

REFERENCES

  • 1
    De Souza MJ, Nattiv A, Joy E, Misra M, Williams NI, Mallinson RJ, et al. 2014 Female Athlete Triad Coalition consensus statement on treatment and return to play of the female athlete triad: 1st International Conference held in San Francisco, CA, May 2012, and 2nd International Conference held in Indianapolis, IN, May 2013. Clin J Sport Med. 2014;24(2):96-119.
  • 2
    Nattiv A, Loucks AB, Manore MM, Sanborn CF, Sundgot-Borgen J, Warren MP, et al. American College of Sports Medicine Position Stand. The female athlete triad. Med Sci Sports Exerc. 2007;39(10):1867–82.
  • 3
    Schofield KL, Thorpe H, Sims ST. Resting metabolic rate prediction equations and the validity to assess energy deficiency in the athlete population. Exp Physiol. 2019;104(4):469-75.
  • 4
    Mountjoy M, Sundgot-Borgen J, Burke L, Carter S, Constantini N, Lebrun C, et al. The IOC consensus statement: beyond the Female Athlete Triad - Relative Energy Deficiency in Sport (RED-S). Br J Sports Med. 2014;48(7):491-7.
  • 5
    Burke LM, Lundy B, Fahrenholtz IL, Melin AK. Pitfalls of conducting and interpreting estimates of energy availability in free-living athletes. Int J Sport Nutr Exerc Metab. 2018;28(4):350-63.
  • 6
    Viner RT, Harris M, Berning JR. Energy availability and dietary patterns of adult male and female competitive cyclists with lower than expected bone mineral density. Int J Sport Nutr Exerc Metab. 2015;25(6):594–602.
  • 7
    Melin A, Tornberg AB, Skouby S, Faber J, Ritz C, Sjödin A, et al. The LEAF questionnaire: a screening tool for the identification of female athletes at risk for the female athlete triad. Br J Sports Med. 2014;48(7):540-5.
  • 8
    Guillemin F, Bombardier C, Beaton D. Cross-cultural adaptation of health-related quality of life measures: literature review and proposed guidelines. J Clin Epidemiol. 1993;46(12):1417–32.
  • 9
    Beaton DE, Bombardier C, Guillemin F, Ferraz MB. Guidelines for the process of cross- cultural adaptation of self-report measures. Spine (Phila Pa 1976). 2000;24(31):86–91.
  • 10
    Melissant HC, Neijenhuijs KI, Jansen F, Aaronson NK, Groenvold M, Holzner B, et al. A systematic review of the measurement properties of the Body Image Scale (BIS) in cancer patients. Support Care Cancer. 2018;26(6):1715-26.
  • 11
    Streiner DL, Norman GR. Health Measurement Scales (a pratical guide to theirs development and use). 4th ed. Oxford, England: Oxford University Press; 2008.
  • 12
    Meyer NL, Sundgot-Borgen J, Lohman TG, Ackland TR, Stewart AD, Maughan RJ, et al. Body composition for health and performance: a survey of body composition assessment practice carried out by the Ad Hoc Research Working Group on Body Composition, Health and Performance under the auspices of the IOC Medical Commission. Br J Sports Med. 2013;47(16):1044-53.
  • 13
    Terwee CB, Bot SD, De Boer MR, Van Der Windt DA, Knol DL, Dekker J. Quality criteria were proposed for measurement properties of health status questionnaires. J Clin Epidemiol. 2007;60(1):34-42.
  • 14
    Bland JM, Altman DG. Statistical methods for assessing agreement between two methods of clinical measurement. Lancet. 1986;1(8476):307-10.
  • 15
    McNemar Q. Note on the sampling error of the difference between correlated proportions or percentages. Psychometrika. 1947;12(2):153-7.
  • 16
    IBM Corp. Released 2013. IBM SPSS Statistics for Windows. Version 22.0. Armonk, NY: IBM Corp.
  • 17
    Hambleton RK, Patsula L. Increasing the validity of adapted tests: myths to be avoided and guidelines for improving test adaptation practices. J Appl Test Technol. 2009;1(1):1-30.
  • 18
    Acquadro C, Conway K., Hareendran A, Aaronson N, European Regulatory Issues and Quality of Life Assessment (ERIQA) Group. Literature review of methods to translate health-related quality of life questionnaires for use in multinational clinical trials. Value Health. 2008;11(3):509-21.
  • 19
    Pasquali L. Princípios de elaboração de escalas psicológicas. Rev Psiquiatr Clin. 1998;25(5):206-13.
  • 20
    Slater J, Mclay-Cooke R, Brown R, Black K. Female recreational exercisers at risk for low energy availability. Int J Sport Nutr Exerc Metab. 2016;26(5):421-7.
  • 21
    Black K, Slater J, Brown RC, Cooke R. Low energy availability, plasma lipids, and hormonal profiles of recreational athletes. J Strength Cond Res. 2018;32(10):2816-24.
  • 22
    Meng K, Qiu J, Benardot D, Carr A, Yi L, Wang J, et al. The risk of low energy availability in Chinese elite and recreational female aesthetic sports athletes. J Int Soc Sports Nutr. 2020;17(1):13.
  • 23
    Terwee CB, Mokkink LB, Steultjens, MP, Dekker J. Performance-based methods for measuring the physical function of patients with osteoarthritis of the hip or knee: a systematic review of measurement properties. Rheumatology (Oxford). 2006;45(7):890-902.
  • 24
    Waltz C, Strickland OL, Lenz ER. Measurement in nursing research. 4th ed. New York: Springer; 2010.
  • 25
    Ackland TR, Lohman TG, Sundgot-Borgen J, Maughan RJ, Meyer NL, Stewart AD, et al. Current status of body composition assessment in sport: review and position statement on behalf of the ad hoc research working group on body composition health and performance, under the auspices of the I.O.C. Medical Commission. Sports Med. 2012;42(3):227-49.
  • 26
    Torstveit MK, Sundgot-Borgen J. The female athlete triad: are elite athletes at increased risk? Med Sci Sports Exerc. 2005;37(2):184-93.
  • 27
    Logue DM, Madigan SM, Heinen M, Mcdonnell SJ, Delahunt E, Corish CA. Screening for risk of low energy availability in athletic and recreationally active females in Ireland. Eur J Sport Sci. 2019;19(1):112-22.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Jun 2021
  • Data do Fascículo
    Apr/Jun 2021

Histórico

  • Recebido
    13 Maio 2019
  • Aceito
    04 Dez 2020
Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte Av. Brigadeiro Luís Antônio, 278, 6º and., 01318-901 São Paulo SP, Tel.: +55 11 3106-7544, Fax: +55 11 3106-8611 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: atharbme@uol.com.br