Acessibilidade / Reportar erro

Hipovitaminose D na gestação: um problema de saúde pública?

Resumo

Objetivos:

medir a prevalência de hipovitaminose D em gestantes saudáveis e analisar a associação entre variáveis e níveis de vitamina D.

Métodos:

estudo analítico transversal. 174 gestantes saudáveis selecionadas em quatro unidades básicas de saúde em São Luís, Brasil, em janeiro/fevereiro/2017. As participantes responderam um questionário contendo dados sociodemográficos e obstétricos. Coletou-se uma amostra de sangue para avaliar o nível plasmático de vitamina D. A associação entre as variáveis independentes e o desfecho foi avaliada pelos testes t de Student e Qui-quadrado.

Resultados:

a concentração média de vitamina D foi de 24,9±6,6 ng/mL. Quarenta mulheres (23,0%) apresentaram suficiência de vitamina D, 93 (53,4%) insuficiência, e 41 (23,6%) deficiência. Houve diferença na concentração de vitamina D entre evangélicas (23,1 ng/mL) e não-evangélicas (25,5 ng/mL) (p=0,02), e entre primigrávidas (23,8 ng/mL) e não-primigrávidas (25,7ng/mL) (p=0,03). Houve diferença na hipovitaminose D entre adolescentes (89,7%) e não-adolescentes (72,6%) (p=0,02) e entre primigrávidas (85,0%) e não-primigrávidas (69,2%) (p=0,01). Menor renda mensal per capita associou-se a uma maior frequência de suficiência de vitamina D.

Conclusões:

Devido ao impacto dos níveis inadequados de vitamina D na saúde das gestantes e dos seus recém-nascidos, mesmo em uma cidade equatorial, a hipovitaminose D em gestantes é um importante problema de saúde pública.

Palavras-chave
Vitamina D; Deficiência de vitamina D; Gravidez

Abstract

Objectives:

to measure the prevalence of hypovitaminosis D in healthy pregnant women and to analyze the association among some variables and the levels of vitamin D.

Methods:

an analytical cross-sectional study. 174 healthy pregnant women were selected from four basic health units in São Luís, Brazil, from January to February 2017. The participants answered a questionnaire about sociodemographic and obstetric data. A blood sample was collected to evaluate the plasmatic level of vitamin D. The association between independent variables and the outcome was evaluated by using the Student’s t-test and Chisquare test.

Results:

the mean of vitamin D concentration was 24.9±6.6ng/ml. Forty women (23.0%) presented vitamin D sufficiency, 93 (53.4%) insufficient, and 41 (23.6%) with deficiency. There was a difference in the vitamin D concentration between evangelical (23.1 ng/ml) and non-evangelical (25.5 ng/ml) (p=0.02) and between primigravida (23.8 ng/ml) and non-primigravida (25.7 ng/ml) (p=0.03). There was a difference in the hypovitaminosis D between adolescents (89.7%) and non-adolescents (72.6%) (p=0.02) and between primigravida (85.0%) and non-primigravida (69.2%) (p=0.01). Low monthly income per capita was associated with a higher frequency of vitamin D sufficiency.

Conclusions:

Due to the impact of inadequate levels of vitamin D in pregnant women and their babies’ health, even in an equatorial city, hypovitaminosis D in pregnant women is an important public health issue.

Key words
Vitamin D; Vitamin D deficiency; Pregnancy

Introdução

A vitamina D não é de fato uma vitamina, pois, sob condições adequadas, pode ser sintetizada pelos seres humanos. A síntese se inicia pela oxidação do colesterol da dieta no intestino, formando o 7-dehidroepicolesterol. Este composto é então carregado pela corrente sanguínea até a pele onde, sob efeito da radiação ultravioleta B solar (UVB), é convertido de forma não enzimática em Vitamina D3 ou Colecalciferol. A síntese responde por cerca de 90% do total de vitamina D do organismo.11 Holick MF, MacLaughlin JA, Clark MB, Holick SA, Potts JT Jr, Anderson RR, Blank IH, Parrish JA, Elias P. Photosynthesis of previtamin D3 in human skin and the physiologic consequences. Science. 1980; 210 (4466): 203-5.,22 Colonese F, Laganà AS, Colonese E, Sofo V, Salmeri FM, Granese R, Triolo O. The pleiotropic effects of vitamin D in gynaecological and obstetric diseases: an overview on a hot topic. Biomed Res Int. 2015; 2015: 1-11.

A exposição de cerca de 18% da superfície corporal, área equivalente a braços e pernas, à luz solar por pelo menos 15 minutos diariamente é suficiente para garantir a síntese adequada de vitamina D,33 Wranicz J, Szostak-Wegierek D. Health outcomes of vitamin D. Part I. characteristics and classic role. Rocz Panstw Zakl Hig. 2014; 65 (3): 179-84. podendo variar de acordo com a latitude, a estação do ano, a cor da pele, a utilização de filtro solar e a influência cultural ou religiosa, dentre outros.44 Webb AR, DeCosta BR, Holick MF. Sunlight regulates the cutaneous production of vitamin D3 by causing its photodegradation. J Clin Endocrinol Metab. 1989; 68 (5): 882-7.,55 Lichtenstein A1, Ferreira-Júnior M, Sales MM, Aguiar FB, Fonseca LA, Sumita NM, Duarte AJ. Vitamin D: non-skeletal actions and rational use. Rev Assoc Med Bras. 2013; 59 (5): 495-506.

Numerosos estudos revelaram associação entre níveis plasmáticos maternos de vitamina D e vários desfechos do ciclo gravídico. Já na fecundação, o nível de vitamina D das mães está associado a um aumento na taxa de sucesso das técnicas de reprodução assistida.66 Pacis MM, Fortin CN, Zarek SM, Mumford SL, Segars JH. Vitamin D and assisted reproduction: should vitamin D be routinely screened and repleted prior to ART? A systematic review. J Assist Reprod Genet. 2015; 32 (3): 323-35. Andersen et al.77 Andersen LB, Jørgensen JS, Jensen TK, Dalgard C, Barington T, Nielsen J, Beck-Nielsen SS, Husby S, Abrahamsen B, Lamont RF, Christesen HT. Vitamin D insufficiency is associated with increased risk of first-trimester miscarriage in the Odense Child Cohort. Am J Clin Nutr. 2015; 102 (3): 633-8 constataram que o risco de abortamento foi menor em gestantes com níveis normais de vitamina D. A insuficiência de Vitamina D associa-se a uma maior ocorrência de diabetes gestacional, pré-eclâmpsia, bebês pequenos para a idade gestacional, partos prematuros e vaginose bacteriana.88 Aghajafari F, Nagulesapillai T, Ronksley PE, Tough SC, O'Beirne M, Rabi DM. (2013) Association between maternal serum 25-hydroxyvitamin D level and pregnancy and neonatal outcomes: systematic review and meta-analysis of observational studies. BMJ. 2013; 346: f1169.

9 Bodnar LM, Platt RW, Simhan HN. Early-pregnancy vitamin D deficiency and risk of preterm birth subtypes. Obstet Gynecol. 2015; 125 (2): 439-47.
-1010 Sablok A, Batra A, Thariani K, Batra A, Bharti R, Aggarwal AR, Kabi BC, Chellani H. Supplementation of vitamin D in pregnancy and its correlation with feto-maternal outcome. Clin Endocrinol (Oxf). 2015; 83 (4): 536-41.

Uma revisão sistemática realizada por Palacios e Gonzalez1111 Palacios C, Gonzalez L. Is vitamin D deficiency a major global public health problem? J Steroid Biochem Mol Biol. 2014; 144PA: 138-45. demonstra a grande prevalência de hipovitaminose D no mundo, mesmo em áreas com abundância de luz solar durante praticamente todo o ano e o grande vazio de informação ainda existente.

A escassez de trabalhos sobre a prevalência de hipovitaminose D em gestantes saudáveis na América Latina em geral, no Brasil, e em particular, na região nordeste nos motivou a realizar este estudo, que teve como objetivos: mensurar a prevalência de hipovitaminose D (deficiência ou insuficiência) em gestantes saudáveis e verificar a associação entre as variáveis demográficas, socioeconômicas, obstétricas e o nível plasmático de vitamina D.

Métodos

Foi realizado um estudo quantitativo, observacional, analítico, transversal, em quatro Unidades Básicas de Saúde (UBS) do Município de São Luís - MA A cidade de São Luís, capital do Maranhão, está localizada na latitude: 2º 31’48” S, isto é próxima à linha do equador. Esta região tem apenas duas estações climáticas definidas: um verão chuvoso e um inverno seco. A duração do dia em São Luís não varia significativamente durante o ano, tendo apenas 16 minutos a mais ou a menos que 12 horas de luz solar, ou seja, o dia mais curto do ano tem 11h 44min de luz solar, enquanto o dia mais longo tem 12h 16min.1212 WeatherSpark.com. Condições meteorológicas médias de São Luís. [online]. Excelsior, USA; 2018. [acesso 23 nov 2018]. Disponível em: https://pt.weatherspark.com/y/30549/Clima-característico-em-São-Luís-Brasil-durante-o-ano
https://pt.weatherspark.com/y/30549/Clim...

Foram convidadas a participar, todas as gestantes saudáveis, ou seja, sem comorbidades atendidas em consulta de pré-natal nas UBS, selecionadas no período de janeiro e fevereiro de 2017 (começo do verão – estação chuvosa). Não foram incluídas as gestantes que tinham feito suplementação de vitamina D em algum momento da gestação, anterior à coleta de dados. Ao final da coleta de dados, foram incluídas 174 mulheres.

Os dados foram coletados utilizando-se um formulário preenchido por um pesquisador. Foi colhida uma amostra de sangue das participantes em um laboratório privado de São Luís, para dosagem plasmática da vitamina D. As dosagens de vitamina D foram realizadas utilizando o ensaio ADVIA Centaur Vitamin D Total (Siemens®, Berlin, Germany).

Todos os dados foram digitados em uma planilha do programa MS-Excel® (Microsoft, Charlotte, NC, USA) e em seguida exportados para o programa Stata 12.0® (Statacorp, College Station, TX, USA) para análise estatística. As variáveis qualitativas são apresentadas como frequências absolutas e relativas, enquanto as variáveis quantitativas são apresentadas como média e desvio-padrão. A associação entre as variáveis independentes e o nível de vitamina D foi verificada através dos testes t-Student e Qui-quadrado. Um valor de p<0,05 foi considerado estatisticamente significante.

Em relação aos níveis de vitamina D, este estudo considerou: suficiência – nível plasmático maior ou igual a 30 ng/ml; insuficiência – nível plasmático maior ou igual a 20ng/ml e menor que 30ng/ml; deficiência – nível plasmático menor que 20ng/ml; hipovitaminose D – presença de insuficiência ou deficiência de vitamina D.1313 Maeda SS, Borba VZC, Camargo MBR, Silva DMW, Borges JLC, Bandeira F. Recommendations of the Brazilian Society of Endocrinology and Metabology (SBEM) for the diagnosis and treatment of hypovitaminosis D. Arq Bras Endocrinol Metab. 2014; 58 (5): 411-33.

Como a cor da pele pode influenciar a produção de vitamina D, foram criadas duas categorias baseadas no tom de pele: Gestantes com pele escura, compreendendo as pretas, pardas e indígenas e gestantes de pele clara, as brancas.

Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Ceuma (CEP-Ceuma), Parecer Consubstanciado nº 1.593.090. Toda a coleta de dados foi realizada após a aprovação final do projeto pelo CEP-Ceuma. Todas as pacientes, ou responsáveis quando foi o caso, foram esclarecidas a respeito dos riscos e benefícios de participar da pesquisa, e concordaram em participar assinando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Nenhum dado que pudesse identificar as pacientes foi coletado.

Resultados

Foram analisadas 174 gestantes saudáveis, com média de idade de 25,7±6,2 anos, (faixa de 14 a 40) anos. Quando analisada a cor da pele, 148 (85,1%) tinham pele escura e 26, (14,9%) pele clara. Em relação à situação conjugal, 120 mulheres (69,0%) viviam com seus companheiros. Quanto à opção religiosa, 94 participantes (54,0%) declararam-se católicas, 49 (28,2%) evangélicas, uma (0,6%) messiânica, 26 (14,9%) afirmaram não ter religião e quatro (2,3%) recusaram-se a responder. (Tabela 1)

Tabela 1
Cor da pele/etnia, situação conjugal e religião de 174 gestantes saudáveis em São Luís (2017).

O número médio de habitantes por domicílio foi de 3,8 pessoas (IC 95% 3,6-4,1). A renda familiar média mensal foi de R$ 1.290,25 (IC95%= 1.185,09–1.395,42) que equivale a US$ 403,20 (95% CI 370,34-436,06). A renda per capita média por mês foi, portanto, de R$ 382,69 (IC95%= 344,99 – 420,39), equivalente a US$ 119,59 (95% CI 107,80-131,37).

Em relação ao uso do filtro solar, 129 gestantes (74.1%), declararam não usar. Quanto aos hábitos de vida, cinco (2,9%) disseram fumar, e duas (1,1%) faziam uso regular de maconha (Cannabis sp). O Etilismo foi referido por seis participantes (3.5%).

Cento e vinte mulheres (69,0%) eram pri-migestas e a idade gestacional média foi de 20,8 (±9,6) semanas (Tabela 2).

Tabela 2
Dados obstétricos de 174 gestantes saudáveis em São Luís (2017).

A concentração média de 25(OH)D foi de 24,9±6,6 ng/mL. Para efeito de análise, as participantes foram divididas em três categorias: 40 mulheres (23,0%) apresentavam suficiência de vitamina D, 93 (53,4%) insuficiência e 41 (23,6%) deficiência de vitamina D.

Quando analisada a associação entre os dados sociodemográficos e obstétricos e a concentração média de vitamina D, observou-se diferença estatisticamente significante entre as gestantes evangélicas (23,1ng/mL) e as não-evangélicas (25,5 ng/mL) (p=0,02) e entre as primigestas (23,8 ng/mL) e as não-primigestas (25,7ng/mL) (p=0,03). As demais variáveis (situação conjugal, cor da pele, uso de filtro solar e trimestre gestacional) não apresentaram diferença estatisticamente significante. (Tabela 3)

Tabela 3
Fatores associados à concentração média de vitamina D em 174 gestantes saudáveis em São Luís (2017).

Quando analisada a associação entre as variáveis independentes e a hipovitaminose D, houve diferença estatisticamente significante entre as adolescentes (89,7%) e as não-adolescentes (72,6%) (p=0,02) e entre as primigestas (85,0%) e as não primigestas (69,2%) (p=0,01). (Tabela 4)

Tabela 4
Prevalência de hipovitaminose D em relação a situação conjugal, cor da pele, religião, uso de filtro solar, adolescência, número de gestações e trimestre gestacional em 174 gestantes saudáveis em São Luís (2017).

Ainda em relação à hipovitaminose D, houve uma diferença estatisticamente significante quando analisada a renda mensal per capita. Entre as gestantes com hipovitaminose D, a média da renda mensal per capita foi de R$ 416,20 (IC 95% 370,71-461,69) equivalente a US$ 130,06, enquanto entre aquelas com suficiência de vitamina D a média da renda mensal per capita foi de R$ 273,99 (IC95% 222,53-325,44), que equivale a US$ 85,62 (p<0,01).

Quando analisada a associação entre as variáveis sócio-demográficas e a presença de deficiência, insuficiência e suficiência de vitamina D, encontrou-se diferença estatisticamente significante entre as evangélicas e as não-evangélicas (p=0,01) e entre as primigestas e as não primigestas (p=0,04). (Tabela 5)

Tabela 5
Prevalência de deficiência, insuficiência e suficiência de vitamina D em relação a situação conjugal, cor da pele, religião, uso de filtro solar, adolescência, número de gestações e idade gestacional em 174 gestantes saudáveis em São Luís (2017).

Discussão

Esta pesquisa encontrou quase 80% de hipovitaminose D na amostra analisada.

A composição racial da amostra selecionada reflete a realidade nacional em seu todo e, em particular, a maranhense. A miscigenação intensa originou a maioria parda encontrada. Somando-se as gestantes pardas (62,0%), negras (21,8%) e indígenas (1,2%) chega-se a cerca de 85% da amostra de gestantes com pele escura.

Não houve diferença estatisticamente significante nas concentrações de vitamina D entre as grávidas de pele escura e de pele clara, isto pode ser devido ao fato de que, apesar de muito ensolarada por estar praticamente na linha do Equador, São Luís é também bastante quente, com temperatura média anual ao redor de 27ºC. Por este motivo, as pessoas evitam expor-se ao sol, procurando áreas sombreadas ao longo do dia, utilizando guarda-sol ao se deslocarem a pé ou até mesmo evitando atividades ao ar livre durante as horas mais ensolaradas do dia. Este fenômeno foi observado por outros autores,1414 Halicioglu O, Aksit S, Koc F, Akman SA, Albudak E, Yaprak I, Coker I, Colak A, Ozturk C, Gulec ES. Vitamin D deficiency in pregnant women and their neonates in spring time in western Turkey. Paediatr Perinat Epidemiol. 2012; 26 (1): 53-60.,1515 Jani R, Palekar S, Munipally T, Ghugre P, Udipi S. Widespread 25-hydroxyvitamin D deficiency in affluent and nonaffluent pregnant Indian women. BioMed research international. 2014; 892162: 1-8. mas um estudo realizado em Riad – Arábia Saudita, parece corroborar mais firmemente esta hipótese já que encontrou que gestantes que se expuseram ao sol mais ao entardecer, do que ao meio dia ou pela manhã, tiveram significativamente menos deficiência de vitamina D.1616 Al-Faris NA. High Prevalence of Vitamin D Deficiency among Pregnant Saudi Women. Nutrients. 2016; 8 (2): 77.

Ainda com potencial impacto sobre a síntese cutânea de vitamina D, 25,9% das gestantes entrevistadas declarou usar filtro solar. Entretanto, esta variável também não se associou de forma significativa às concentrações de vitamina D, o que faz supor, uma vez mais, que as participantes, como um todo, não se expuseram suficientemente à luz solar, diminuindo o possível impacto do filtro, ou fizeram uso do bloqueador solar de forma inadequada ou irregular.44 Webb AR, DeCosta BR, Holick MF. Sunlight regulates the cutaneous production of vitamin D3 by causing its photodegradation. J Clin Endocrinol Metab. 1989; 68 (5): 882-7.

A religião evangélica se relacionou tanto com uma concentração média de vitamina D menor, quanto com uma maior prevalência de deficiência de vitamina D. Esta diferença foi atribuída ao uso, por parte das evangélicas, de roupas que cobrem mais o corpo, o que levaria a menor produção de vitamina D, em consequência de menor área exposta de pele à luz solar. Um estudo israelense encontrou diferença na prevalência de insuficiência e de deficiência de vitamina D ao comparar gestantes judias ortodoxas e não-ortodoxas.1717 Mukamel MN, Weisman Y, Somech R, Eisenberg Z, Lanman J, Shapira I, Spirer Z, Jurgenson U. Vitamin D deficiency and insufficiency in Orthodox and non-Orthodox Jewish mothers in Israel. Isr Med Assoc J. 2001; 3 (6): 419- 21. Alguns estudos comparando gestantes usuárias de véu com outras que não o utilizam também demonstraram diferença significativa na concentração de vitamina D.1818 Gannagé-Yared MH, Chemali R, Yaacoub N, Halaby G. Hypovitaminosis D in a sunny country: relation to lifestyle and bone markers. J Bone Miner Res. 2000; 15(9): 1856- 62.,1919 Fenina H, Chelli D, Ben Fradj MK, Feki M, Sfar E, Kaabachi N. Vitamin D Deficiency is Widespread in Tunisian Pregnant Women and Inversely Associated with the Level of Education. Clin Lab. 2016; 62 (5): 801-6.

Foi observada uma relação inversa entre suficiência de vitamina D e renda familiar per capita. Este achado pode ser atribuído ao fato de que as gestantes com menor renda familiar podem tender a trabalhar mais expostas ao sol. Um estudo realizado na Tailândia parece corroborar esta hipótese, pois encontrou que mulheres com menor nível educacional e renda familiar, apresentaram valores mais elevados de vitamina D provavelmente por maior exposição ao sol.2020 Islam MZ, Akhtaruzzaman M, Lamberg-Allardt C. Hypovitaminosis D is common in both veiled and nonveiled Bangladeshi women. Asia Pac J Clin Nutr. 2006; 15 (1): 81- 7.,2121 Pratumvinit B, Wongkrajang P, Wataganara T, Hanyongyuth S, Nimmannit A, Chatsiricharoenkul S, Manonukul K, Reesukumal K. (2015) Maternal Vitamin D Status and Its Related Factors in Pregnant Women in Bangkok, Thailand. PLoS One. 2015; 10 (7): e0131126.

A idade gestacional não se associou a variação dos níveis plasmáticos de vitamina D. Apesar disto, percebeu-se alta prevalência de hipovitaminose D em todos os trimestres de gravidez. Marwaha et al.2222 Marwaha RK, Tandon N, Chopra S, Agarwal N, Garg MK, Sharma B, Kanwar RS, Bhadra K, Singh S, Mani K, Puri S. Vitamin D status in pregnant Indian women across trimesters and different seasons and its correlation with neonatal serum 25-hydroxyvitamin D levels. Br J Nutr. 2011; 106 (9): 1383-9., de forma semelhante, em pesquisa realizada na cidade de Déli-Índia, não detectaram diferença estatística na prevalência de hipovitaminose D entre os trimestres de gravidez e também encontraram uma grande prevalência de hipovitaminose D, agravada ainda pelo fato de 96,3% do total de gestantes estudadas terem deficiência de vitamina D.

Ser primigesta associou-se a uma menor concentração média de vitamina D, maior percentual de hipovitaminose D e menor percentual de suficiência de vitamina D, concordando com o que encontraram outros autores.2020 Islam MZ, Akhtaruzzaman M, Lamberg-Allardt C. Hypovitaminosis D is common in both veiled and nonveiled Bangladeshi women. Asia Pac J Clin Nutr. 2006; 15 (1): 81- 7.,2323 Johnson DD, Wagner CL, Hulsey TC, McNeil RB, Ebeling M, Hollis BW. Vitamin D deficiency and insufficiency is common during pregnancy. Am J Perinatol. 2011; 28 (1): 7-12.

24 Shiraishi M, Haruna M, Matsuzaki M, Murayama R. Demographic and lifestyle factors associated with vitamin D status in pregnant Japanese women. J Nutr Sci Vitaminol (Tokyo). 2014; 60 (6): 420-8.
-2525 Parlak M, Kalay S, Kalay Z, Kirecci A, Guney O, Koklu E. Severe vitamin D deficiency among pregnant women and their newborns in Turkey. J Matern Fetal Neonatal Med. 2015; 28 (5): 548-51.

As gestantes adolescentes apresentaram um maior percentual de hipovitaminose D. Talvez as adolescentes grávidas tendam a se retrair mais e ter menos atividades ao ar livre, ou ainda tenham menor aderência às recomendações pré-natais. Estudos demonstram que esta faixa etária parece estar mais vulnerável à carência de vitamina D.2626 Davis LM, Chang SC, Mancini J, Nathanson MS, Witter FR, O'Brien KO. Vitamin D insufficiency is prevalent among pregnant African American adolescents. J Pediatr Adolesc Gynecol. 2010; 23 (1): 45-52.

27 Young BE, McNanley TJ, Cooper EM, McIntyre AW, Witter F, Harris ZL, O'Brien KO. Maternal vitamin D status and calcium intake interact to affect fetal skeletal growth in utero in pregnant adolescents. Am J Clin Nutr. 2012; 95 (5): 1103-12.

28 Black LJ, Burrows SA, Jacoby P, Oddy WH, Beilin LJ, Chan She Ping-Delfos W, Marshall CE, Holt PG, Hart PH, Mori TA. Vitamin D status and predictors of serum 25-hydroxyvitamin D concentrations in Western Australian adolescents. Br J Nutr. 2014; 112 (7): 1154-62.
-2929 Musson P, Collin J. Management of vitamin D deficiency in childhood and adolescence. Nurs Child Young People. 2015; 27 (9): 27-35.

Observa-se portanto que, mesmo estudos realizados em cidades diferentes, situadas em distintas latitudes, com diferentes etnias e culturas, revelam uma prevalência de hipovitaminose D bastante elevada, de forma semelhante ao achado na presente pesquisa, realizada praticamente na linha do Equador, zona de máxima irradiação solar ao longo do ano. Isto leva a crer que o principal fator em comum nesta epidemia de hipovitaminose D deva ser a falta de exposição adequada à luz solar, imposta pelo clima, pela cultura ou pelo estilo de vida moderno.

A coleta de dados epidemiológicos por um único pesquisador, e todas as dosagens plasmáticas realizadas no mesmo laboratório e com o mesmo equipamento, demonstram que os resultados do presente estudo podem ser estendidos ao grupo de gestantes da região de São Luís e outras cidades com as mesmas características climáticas e sociais.

A principal limitação deste estudo foi o seu delineamento transversal que não permite o estabelecimento de relações de causa-efeito entre as variáveis analisadas e os níveis plasmáticos de vitamina D, porém os achados da pesquisa sugerem forte associação entre eles. Estudos longitudinais posteriores serão necessários para confirmar os achados do presente estudo.

Devido ao impacto de níveis inadequados de vitamina D na saúde de mulheres grávidas e seus conceptos, a hipovitaminose D na gestação é um importante problema de saúde pública.

References

  • 1
    Holick MF, MacLaughlin JA, Clark MB, Holick SA, Potts JT Jr, Anderson RR, Blank IH, Parrish JA, Elias P. Photosynthesis of previtamin D3 in human skin and the physiologic consequences. Science. 1980; 210 (4466): 203-5.
  • 2
    Colonese F, Laganà AS, Colonese E, Sofo V, Salmeri FM, Granese R, Triolo O. The pleiotropic effects of vitamin D in gynaecological and obstetric diseases: an overview on a hot topic. Biomed Res Int. 2015; 2015: 1-11.
  • 3
    Wranicz J, Szostak-Wegierek D. Health outcomes of vitamin D. Part I. characteristics and classic role. Rocz Panstw Zakl Hig. 2014; 65 (3): 179-84.
  • 4
    Webb AR, DeCosta BR, Holick MF. Sunlight regulates the cutaneous production of vitamin D3 by causing its photodegradation. J Clin Endocrinol Metab. 1989; 68 (5): 882-7.
  • 5
    Lichtenstein A1, Ferreira-Júnior M, Sales MM, Aguiar FB, Fonseca LA, Sumita NM, Duarte AJ. Vitamin D: non-skeletal actions and rational use. Rev Assoc Med Bras. 2013; 59 (5): 495-506.
  • 6
    Pacis MM, Fortin CN, Zarek SM, Mumford SL, Segars JH. Vitamin D and assisted reproduction: should vitamin D be routinely screened and repleted prior to ART? A systematic review. J Assist Reprod Genet. 2015; 32 (3): 323-35.
  • 7
    Andersen LB, Jørgensen JS, Jensen TK, Dalgard C, Barington T, Nielsen J, Beck-Nielsen SS, Husby S, Abrahamsen B, Lamont RF, Christesen HT. Vitamin D insufficiency is associated with increased risk of first-trimester miscarriage in the Odense Child Cohort. Am J Clin Nutr. 2015; 102 (3): 633-8
  • 8
    Aghajafari F, Nagulesapillai T, Ronksley PE, Tough SC, O'Beirne M, Rabi DM. (2013) Association between maternal serum 25-hydroxyvitamin D level and pregnancy and neonatal outcomes: systematic review and meta-analysis of observational studies. BMJ. 2013; 346: f1169.
  • 9
    Bodnar LM, Platt RW, Simhan HN. Early-pregnancy vitamin D deficiency and risk of preterm birth subtypes. Obstet Gynecol. 2015; 125 (2): 439-47.
  • 10
    Sablok A, Batra A, Thariani K, Batra A, Bharti R, Aggarwal AR, Kabi BC, Chellani H. Supplementation of vitamin D in pregnancy and its correlation with feto-maternal outcome. Clin Endocrinol (Oxf). 2015; 83 (4): 536-41.
  • 11
    Palacios C, Gonzalez L. Is vitamin D deficiency a major global public health problem? J Steroid Biochem Mol Biol. 2014; 144PA: 138-45.
  • 12
    WeatherSpark.com. Condições meteorológicas médias de São Luís. [online]. Excelsior, USA; 2018. [acesso 23 nov 2018]. Disponível em: https://pt.weatherspark.com/y/30549/Clima-característico-em-São-Luís-Brasil-durante-o-ano
    » https://pt.weatherspark.com/y/30549/Clima-característico-em-São-Luís-Brasil-durante-o-ano
  • 13
    Maeda SS, Borba VZC, Camargo MBR, Silva DMW, Borges JLC, Bandeira F. Recommendations of the Brazilian Society of Endocrinology and Metabology (SBEM) for the diagnosis and treatment of hypovitaminosis D. Arq Bras Endocrinol Metab. 2014; 58 (5): 411-33.
  • 14
    Halicioglu O, Aksit S, Koc F, Akman SA, Albudak E, Yaprak I, Coker I, Colak A, Ozturk C, Gulec ES. Vitamin D deficiency in pregnant women and their neonates in spring time in western Turkey. Paediatr Perinat Epidemiol. 2012; 26 (1): 53-60.
  • 15
    Jani R, Palekar S, Munipally T, Ghugre P, Udipi S. Widespread 25-hydroxyvitamin D deficiency in affluent and nonaffluent pregnant Indian women. BioMed research international. 2014; 892162: 1-8.
  • 16
    Al-Faris NA. High Prevalence of Vitamin D Deficiency among Pregnant Saudi Women. Nutrients. 2016; 8 (2): 77.
  • 17
    Mukamel MN, Weisman Y, Somech R, Eisenberg Z, Lanman J, Shapira I, Spirer Z, Jurgenson U. Vitamin D deficiency and insufficiency in Orthodox and non-Orthodox Jewish mothers in Israel. Isr Med Assoc J. 2001; 3 (6): 419- 21.
  • 18
    Gannagé-Yared MH, Chemali R, Yaacoub N, Halaby G. Hypovitaminosis D in a sunny country: relation to lifestyle and bone markers. J Bone Miner Res. 2000; 15(9): 1856- 62.
  • 19
    Fenina H, Chelli D, Ben Fradj MK, Feki M, Sfar E, Kaabachi N. Vitamin D Deficiency is Widespread in Tunisian Pregnant Women and Inversely Associated with the Level of Education. Clin Lab. 2016; 62 (5): 801-6.
  • 20
    Islam MZ, Akhtaruzzaman M, Lamberg-Allardt C. Hypovitaminosis D is common in both veiled and nonveiled Bangladeshi women. Asia Pac J Clin Nutr. 2006; 15 (1): 81- 7.
  • 21
    Pratumvinit B, Wongkrajang P, Wataganara T, Hanyongyuth S, Nimmannit A, Chatsiricharoenkul S, Manonukul K, Reesukumal K. (2015) Maternal Vitamin D Status and Its Related Factors in Pregnant Women in Bangkok, Thailand. PLoS One. 2015; 10 (7): e0131126.
  • 22
    Marwaha RK, Tandon N, Chopra S, Agarwal N, Garg MK, Sharma B, Kanwar RS, Bhadra K, Singh S, Mani K, Puri S. Vitamin D status in pregnant Indian women across trimesters and different seasons and its correlation with neonatal serum 25-hydroxyvitamin D levels. Br J Nutr. 2011; 106 (9): 1383-9.
  • 23
    Johnson DD, Wagner CL, Hulsey TC, McNeil RB, Ebeling M, Hollis BW. Vitamin D deficiency and insufficiency is common during pregnancy. Am J Perinatol. 2011; 28 (1): 7-12.
  • 24
    Shiraishi M, Haruna M, Matsuzaki M, Murayama R. Demographic and lifestyle factors associated with vitamin D status in pregnant Japanese women. J Nutr Sci Vitaminol (Tokyo). 2014; 60 (6): 420-8.
  • 25
    Parlak M, Kalay S, Kalay Z, Kirecci A, Guney O, Koklu E. Severe vitamin D deficiency among pregnant women and their newborns in Turkey. J Matern Fetal Neonatal Med. 2015; 28 (5): 548-51.
  • 26
    Davis LM, Chang SC, Mancini J, Nathanson MS, Witter FR, O'Brien KO. Vitamin D insufficiency is prevalent among pregnant African American adolescents. J Pediatr Adolesc Gynecol. 2010; 23 (1): 45-52.
  • 27
    Young BE, McNanley TJ, Cooper EM, McIntyre AW, Witter F, Harris ZL, O'Brien KO. Maternal vitamin D status and calcium intake interact to affect fetal skeletal growth in utero in pregnant adolescents. Am J Clin Nutr. 2012; 95 (5): 1103-12.
  • 28
    Black LJ, Burrows SA, Jacoby P, Oddy WH, Beilin LJ, Chan She Ping-Delfos W, Marshall CE, Holt PG, Hart PH, Mori TA. Vitamin D status and predictors of serum 25-hydroxyvitamin D concentrations in Western Australian adolescents. Br J Nutr. 2014; 112 (7): 1154-62.
  • 29
    Musson P, Collin J. Management of vitamin D deficiency in childhood and adolescence. Nurs Child Young People. 2015; 27 (9): 27-35.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2019

Histórico

  • Recebido
    07 Ago 2018
  • Revisado
    23 Nov 2018
  • Aceito
    16 Jan 2019
Instituto de Medicina Integral Prof. Fernando Figueira Rua dos Coelhos, 300. Boa Vista, 50070-550 Recife PE Brasil, Tel./Fax: +55 81 2122-4141 - Recife - PR - Brazil
E-mail: revista@imip.org.br