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Prevalência e fatores associados ao uso de drogas de abuso por gestantes

Resumo

Objetivos:

estimar a prevalência do uso de drogas de abuso nas gestantes e associar com as variáveis escolaridade, renda familiar, raça e número de gestações.

Métodos:

pesquisa descritiva, transversal, quantitativa. Desenvolvida no município de Bandeirantes-PR, no período de junho/2016 a dezembro/2017. A população foi de 114 gestantes e as variáveis dependentes foram uso de álcool/tabaco e drogas ilícitas e as independentes foram escolaridade, raça, renda familiar e número de gestações. A análise foi a comparação entre as variáveis e utilizado o Microsoft Excel 2007 e o SPSS 20.0. Foi aprovado pelo Comitê de Ética.

Resultados:

o uso de drogas de abuso na gestação foi de 19,2%, apresentando como caracterização de perfil sociodemográfico a idade entre 19 a 29 anos, predomínio da raça não branca, com tempo de estudo ≤ 9 anos, com renda de 1 a 2 salários mínimos e multi-gestas. A droga de abuso mais utilizada foi o álcool, seguido de tabaco. O uso concomitante entre as drogas apresentou-se significativo sendo álcool/tabaco e drogas ilícitas/tabaco.

Conclusão:

o uso de drogas teve uma prevalência de 19,2% e atua em conjunto com questões sociais, intervir neste caso se faz necessário com um plano de cuidado individualizado, garantindo assim a promoção e prevenção a saúde materno e infantil.

Palavras-chave
Gravidez de alto risco; Usuários de drogas; Enfermagem materno-infantil

Abstract

Objectives:

to estimate the prevalence of drug abuse in pregnant women and to associate with the variables education, family income, race and number of pregnancies.

Methods:

descriptive, cross-sectional, quantitative research. Developed in the municipality of Bandeirantes-PR, from June 2016 to December 2017. The population was 114 pregnant women and the dependent variables were alcohol / tobacco use and illicit drugs and the independent variables were education, race, family income and number of pregnancies. The analysis was the comparison between the variables and Microsoft Excel 2007 and SPSS 20.0 was used. It was approved by the Ethics Committee.

Results:

the use of drugs of abuse during pregnancy was 19.2%, presenting as a sociodemographic profile characterization the age between 19 to 29 years, predominance of nonwhite race, with study time ≤ 9 years, with income from 1 to 2 minimum wages and multiparous women. The most commonly used drug of abuse was alcohol, followed by tobacco. Concomitant use between drugs was significant with alcohol and tobacco / illicit drugs and tobacco.

Conclusions:

drug use had a prevalence of 19.2% and acts in conjunction with social issues and this case, intervening is necessary with an individualized care plan, thus ensuring the promotion and prevention of maternal and child health.

Key words
High risk pregnancy; Drug users; Maternal-child nursing

Introdução

O uso de drogas, sejam elas de natureza lícita ou ilícita, é considerado um problema de ordem pública, pois trata-se de hábito comum em todos os estados sociais, gêneros e raças.11 Reis TF, Loureiro J R. Repercussões neonatais decorrentes da exposição ao crack durante a gestação. Rev Eletrônica Saúde Mental Álcool Drog. 2015; 11 (4): 217-24.,22 Ricci. SS. Enfermagem Materno-Neonatal e Saúde da Mulher. Conduta de Enfermagem na Gravidez de Risco: Condições de Saúde Específicas e Populações Vulneráveis. 3 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2015. De acordo com o II Levantamento domiciliar sobre o uso de drogas psicotrópicas no Brasil, realizado pelo Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas de Abuso, o consumo de álcool, uma vez na vida por mulheres, deu-se em sua maioria entre 18 a 24 anos e 25 a 34 anos, considerados como idade fértil com percentil de 72,6% e 73% respectivamente. O consumo de tabaco, relatado ao menos uma vez na vida por mulheres na faixa etária da idade fértil, foi de 33,9% a 35,7% e o consumo de substâncias ilícitas, ao menos uma vez na vida por mulheres de 18 a 34 anos, resultou em uma média de 6,15%.33 CEBRID. II Levantamento domiciliar sobre o uso de drogas psicotrópicas no Brasil: Estudo envolvendo as 108 maiores cidades do país. 2005. [acesso em 29 out 2018]. Disponível em: https://www.cebrid.com.br/wp-content/uploads/2014/10/II-Levantamento-Domiciliar-sobre-o-Uso-de-Drogas-Psicotr%C3%B3picas-no-Brasil.pdf.
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Quando comparado aos levantamentos realizados pelo Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas de Abuso, no período 2005 e 2010, há evidências do aumento do consumo de drogas entre as mulheres em idade fértil, e desta forma, o binômio mãe e filho está cada vez mais expostos à tais substâncias. O uso, o abuso e a dependência de drogas, por tratar-se de comportamento capaz de provocar consequências físicas potencialmente graves, tanto para a mãe quanto para a criança, representam uma grande preocupação para as diversas instituições e esferas da sociedade.33 CEBRID. II Levantamento domiciliar sobre o uso de drogas psicotrópicas no Brasil: Estudo envolvendo as 108 maiores cidades do país. 2005. [acesso em 29 out 2018]. Disponível em: https://www.cebrid.com.br/wp-content/uploads/2014/10/II-Levantamento-Domiciliar-sobre-o-Uso-de-Drogas-Psicotr%C3%B3picas-no-Brasil.pdf.
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Sabe-se que o uso de drogas no período gestacional não é recomendado em nenhuma dose ou quantidade por ocasionar danos à mulher e ao feto. Porém, algumas gestantes ao descobrirem a gravidez não alteram seus hábitos nocivos de vida colocando-se em risco, e ao concepto; os motivos apresentados são diversos, como a dificuldade em abandonar o vício, problemas psicológicos, dificuldades de relacionamento, dificuldade financeira, gestação não desejada e a desinformação.44 Lima MPL, Santos PAA, Póvoas XTF. O papel do enfermeiro durante a consulta de pré- natal á gestante usuária de drogas. Espaç Saúde. 2015; 16 (3): 39-46.

O consumo de álcool, que é uma substância legalizada e de fácil acesso, não é recomendado para mulheres em fase gestacional, devido a não existirem doses seguras de uso para a mãe e o feto. Os danos fetais podem variar em relação à quantidade ingerida, ao trimestre gestacional, capacidade metabólica materna e fetal, dentre outros.55 Meucci DR, Saavedra SJ, Silva. SE, Branco AM, Freitas NJ, Santos M, Cesar AJ. Consumo de Bebida Alcoólica durante a gestação entre parturientes do extremo Sul do Brasil. Rev Bras Saúde Materno Infantil. 2017; 17 (4): 66371.

No primeiro trimestre há maior risco de anomalias físicas, no segundo trimestre há risco aumentado de abortos e no terceiro trimestre pode haver ocorrência da diminuição do crescimento fetal. Uma das consequências mais graves do consumo de álcool no período da gestação é a Síndrome Alcoólica Fetal caracterizada como anomalias craniofaciais, deficiência de crescimento e disfunção do sistema nervoso central.55 Meucci DR, Saavedra SJ, Silva. SE, Branco AM, Freitas NJ, Santos M, Cesar AJ. Consumo de Bebida Alcoólica durante a gestação entre parturientes do extremo Sul do Brasil. Rev Bras Saúde Materno Infantil. 2017; 17 (4): 66371.

Ainda sobre os tóxicos de natureza lícita, o tabaco também está incluso neste grupo. Seu consumo também traz consequências maternas e fetais como gravidez ectópica, descolamento prematuro de placenta, ruptura das membranas, placenta prévia e aborto. Para o feto pode causar problemas no desenvolvimento neurológico, prematuridade e baixo peso ao nascer.66 Lucchese R, Paranhos LD, Netto SN, Vera I, Silva CG. Fatores associados ao uso nocivo do tabaco durante a gestação. Acta Paul Enferm. 2016; 29 (3): 325-331. O uso do tabaco pode ocasionar hipóxia fetal e retardo do crescimento intrauterino devido ao efeito vasoconstritor da nicotina, substância presente no cigarro que atravessa placenta reduzindo assim o fluxo sanguíneo para o feto.22 Ricci. SS. Enfermagem Materno-Neonatal e Saúde da Mulher. Conduta de Enfermagem na Gravidez de Risco: Condições de Saúde Específicas e Populações Vulneráveis. 3 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2015.,77 Yabuuti KLP, Bernardy FCC. Perfil de gestantes usuárias de drogas atendidas em um Centro de Atenção Psicossocial. Rev Baiana Saúde Pública. 2014; 38 (2): 344-56.

Quanto às drogas ilícitas, estas atuam sobre o sistema cardiovascular da gestante causando hiper-estimulação adrenérgica e vasoconstrição, e com isto, há um aumento na frequência cardíaca e pressão arterial levando a uma diminuição de fluxo sanguíneo para a placenta.88 Oliveira AT, Bersusa SAA, Santos FT, Aquino AMM, Neto MC. Perinatal Outcomes in Pregnant Women Users of Illegal Drugs. Rev Bras Ginecol Obstet. 2016; 38 (4): 1838.

Em uma pesquisa realizada no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais, entre 1997 a 2012, foi constatado que 30,6% das gestantes consumiam álcool, 52,9% eram tabagistas e mantiveram o hábito durante a gestação; 18,8% das mulheres fizeram uso de álcool e tabaco concomitantemente, e o uso de drogas ilícitas apresentou a frequência de 7,6%.99 Melo HV, Botelho MPA, Maia MMM, Correa Júnior DM, Pinto AJ. Uso de drogas ilícitas por gestantes infectadas pelo HIV. Rev Bras Ginecol Obstet. 2014; 36 (12): 555-61.

Visando fornecer uma atenção pré-natal adequada a este grupo vulnerável e de risco, bem como a necessidade de conhecer a prevalência e as condições socioeconômicas e culturais, juntamente a seus antecedentes obstétricos para uma assistência de qualidade e resolutiva durante o período gravídico, este estudo objetiva estimar a prevalência do uso de drogas de abuso em gestantes e verificar a associação com as variáveis escolaridade, renda familiar, raça e número de gestações.

Métodos

Trata-se de uma pesquisa descritiva, transversal de natureza quantitativa. Desenvolvida no município de Bandeirantes, localizado no norte do Paraná, com uma população inferior a 50 mil habitantes. A estrutura do serviço de saúde do município é composta por dois hospitais, sendo um filantrópico e um privado, seis Unidades Básicas de Saúde com Estratégia Saúde da Família, um Pronto-Atendimento, um atendimento médico especializado, um Atendimento Materno Infantil, um Centro de Saúde da Mulher e criança e o Programa de Agentes Comunitários de Saúde. O tamanho mínimo da amostra foi de 114 participantes, considerando-se uma população de 432 nascimentos/ano, intervalo de confiança de 95%, proporção de 11% e margem de erro de 5%.

O critério de inclusão para participar da pesquisa foi ser gestante no terceiro trimestre gestacional.

A coleta de dados foi realizada pela pesquisadora de forma aleatória, no período de Junho de 2016 a Dezembro de 2017, no Centro de Saúde da Mulher e da Criança, em uma sala restrita para a entrevista, realizada em um único encontro, após as devidas assinaturas dos Termos de Consentimento Livre e Esclarecido e de Assentimento Livre e Esclarecido.

O estudo apresenta como variável dependente o uso de álcool/tabaco e drogas ilícitas e como variáveis independentes a escolaridade, raça, renda familiar e número de gestações, focando nas gestantes que fizeram uso, ao menos uma vez durante a gestação, de drogas lícitas e ilícitas em qualquer dose. Consideraram-se como drogas lícitas o álcool e o tabaco em forma de cigarro e as como drogas ilícitas, a maconha, o crack e a cocaína.

Este trabalho apresentou limitações de estudo como a ausência de precisão de doses e quantidade de drogas utilizadas, por semana, pelas mulheres, e a falta de informação acerca do desfecho materno infantil das gestantes usuárias de drogas.

Os dados foram processados no programa Microsoft Excel® 2007 e apresentados em tabelas, sendo as variáveis nominais ou categóricas descritas em frequências absolutas e relativas; e as variáveis numéricas em frequências, média e desvio padrão.

A planilha de dados foi exportada para o software SPSS® versão 20.0, no qual procedeu as análises e foram realizadas algumas associações de interesse, por meio do teste qui-quadrado. As decisões estatísticas foram tomadas adotando-se nível de significância de p < 0,05.

A pesquisa foi apresentada para o Gestor da Secretaria Municipal de Saúde de Bandeirantes -PR, e em seguida foi encaminhada ao Comitê de Ética em Pesquisa para análise. Esta pesquisa obedeceu aos princípios da Resolução no 466/2012 do Conselho Nacional de Pesquisa, sob o parecer de número 1.606.067.

Resultados

Das 114 gestantes participantes, 22 (19,2%) são usuárias de drogas de abuso no período gestacional. Das 22 gestantes usuárias de drogas de abuso 72,7% (16/22) tinham entre 19 e 29 anos, com idade mínima de 15 anos e idade máxima de 41 anos; em questão à raça houve um predomínio de não branca com 68,2% (15/22) gestante; relataram ainda ter estudado ≤ 9 anos 50,0% (11/22) gestantes. Sobre a renda familiar 77,3% (17/22) gestantes relataram de 1 a 2 salários mínimos e, quanto ao número de gestações 77,3% (17/22) eram multigestas (Tabela 1).

Tabela 1
Caracterização das gestantes - Bandeirantes- PR no ano de 2016 a 2017.

Na análise bruta, quanto ao uso de drogas lícitas, observa-se que predomina o uso de álcool em 45,4% (10/22) dos casos, seguido do uso concomitante de álcool e tabaco em 9,1% (2/22) dos casos e o uso exclusivo de tabaco em 18,2% (4/22). Quanto ao uso de substâncias ilícitas 9,1% (2/22) gestantes relataram utilizá-las; a mesma porcentagem foi relatada na utilização concomitante com o álcool e tabaco (Tabela 2).

Tabela 2
Drogas lícitas e ilícitas consumidas pelas gestantes de Bandeirantes- PR em 2016 a 2017.

Quando associada às variáveis pré-determinadas com o uso individual de álcool, tabaco e drogas ilícitas notou-se que a associação do uso de álcool e drogas ilícitas não apresenta resultado significativo nesta pesquisa.

Porém, quando associadas às variáveis ao uso de tabaco, observou-se que houve uma relevância a baixa escolaridade (p=0,06) (Tabela 3).

Tabela 3
Associação do uso de álcool, tabaco e drogas ilícitas com as variáveis renda familiar, raça, escolaridade e número de gestações das gestantes em Bandeirantes- PR no ano de 2016 a 2017.

Quando avaliado o uso concomitante de drogas pelas gestantes estudadas percebeu-se significância estatística em duas situações, ao uso de tabaco / álcool e drogas ilícitas / tabaco (p<0,001 e p=0,039 respectivamente) (Tabela 4).

Tabela 4
Associação dos tipos de drogas utilizadas concomitantemente das gestantes em Bandeirantes- PR no ano de 2016 a 2017.

Discussão

O presente estudo identificou a prevalência do uso de drogas de abuso em 19,2% das gestantes. Dado este que também foi evidenciado em um estudo realizado em Maringá - PR, onde a prevalência foi de 18,3%.1010 Kassada ST, Marcon SS, Pagliarini AM, Rossi MR. Prevalência do uso de drogas de abuso por gestante. Acta Paul Enferm. 2013; 26 (5): 467-71.

A prevalência mostrada, neste estudo, é considerada alta e indica um problema de saúde pública, pois estas gestantes são estratificadas como alto risco.1111 Secretaria de Estado da Saúde do Paraná. Linha guia Rede Mãe Paranaense. 7 edição. Paraná; 2018. Disponível em: https://www.saude.pr.gov.br/sites/default/arquivos_restritos/files/documento/2020-09/LinhaGuiaMaeParanaense_2018.pdf
https://www.saude.pr.gov.br/sites/defaul...
O uso de drogas de abuso pode ocasionar danos à saúde materno e infantil como hipertensão materna, placenta prévia ou seu descolamento prematuro, trabalho de parto pré-termo, bebês pequenos para a idade gestacional, o transtorno do espectro alcóolico fetal (TEAF), prematuridade entre outros danos.11 Reis TF, Loureiro J R. Repercussões neonatais decorrentes da exposição ao crack durante a gestação. Rev Eletrônica Saúde Mental Álcool Drog. 2015; 11 (4): 217-24.,22 Ricci. SS. Enfermagem Materno-Neonatal e Saúde da Mulher. Conduta de Enfermagem na Gravidez de Risco: Condições de Saúde Específicas e Populações Vulneráveis. 3 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2015.,1010 Kassada ST, Marcon SS, Pagliarini AM, Rossi MR. Prevalência do uso de drogas de abuso por gestante. Acta Paul Enferm. 2013; 26 (5): 467-71.

Quando associadas as drogas de abuso aos fatores socioeconómicos e culturais observou-se um baixo nível de escolaridade com frequência ≤ 9 anos de estudo, com predomínio da raça não branca; sobre a renda familiar houve predominância de 1 a 2 salários mínimos, e as mulheres eram multíparas.

Demonstrou-se nesta pesquisa um dado estatístico aproximadamente relevante sobre a associação da baixa escolaridade ao uso da nicotina, fato semelhante à que foi exibida em um trabalho realizado numa cidade brasileira de porte médio no ano de 2016, o qual reforça que o fator socioeconômico escolar influencia o uso de drogas de abuso, visto que uma educação deficiente e falta de informações podem propiciar o inicio e permanência dos maus hábitos de vida.66 Lucchese R, Paranhos LD, Netto SN, Vera I, Silva CG. Fatores associados ao uso nocivo do tabaco durante a gestação. Acta Paul Enferm. 2016; 29 (3): 325-331.

Quando analisada descritivamente a variável raça, nota-se considerável relevância, sendo que mais de 50% da amostra usuária de drogas de abuso pertencem à cor de pele parda ou preta, no entanto sem p-valor significativo. Dado encontrado nas demais pesquisas.1212 Santos MM, Porto NP, Oliveira FJ, Pires SGC, Araújo SJA. Associação entre característica sociodemográficas e frequência de uso de álcool por gestantes. Rev Baiana Enferm. 2016; 30 (2): 1-9.,1313 Porto NP, Oliveira FJ, Campos PCA, Pires SGC. Acesso aos serviços de saúde: Fatores associados ao envolvimento de gestantes com drogas. Rev Baiana Enferm. 2015; 29 (4): 350-60.

Na avaliação estatística foram observadas três associações de drogas de abuso: o uso do tabaco/álcool, o uso de drogas ilícitas/tabaco e drogas ilícitas/álcool. Constatou-se associação estatística quanto ao uso do tabaco/álcool e o uso de drogas ilícitas/tabaco; este resultado também foi encontrado em estudos semelhantes. O uso isolado de drogas na gestação representa um risco para o binômio, porém quando associado a mais um tipo de substância ocorre a potencialização dos efeitos adversos para a mãe e o feto.66 Lucchese R, Paranhos LD, Netto SN, Vera I, Silva CG. Fatores associados ao uso nocivo do tabaco durante a gestação. Acta Paul Enferm. 2016; 29 (3): 325-331.,88 Oliveira AT, Bersusa SAA, Santos FT, Aquino AMM, Neto MC. Perinatal Outcomes in Pregnant Women Users of Illegal Drugs. Rev Bras Ginecol Obstet. 2016; 38 (4): 1838.

Após rastrear e identificar o uso de drogas e o fator de risco faz-se necessário atuar mediante às políticas públicas disponíveis, a exemplo do acolhimento na unidade básica de saúde conforme os protocolos do Ministério da Saúde; e encaminhamento da gestante para os Centros de Atenção Psicossocial (Caps), e ou centros especializados; e, quando houver necessidade, acompanhamento dela pela Estratégia Saúde da Família (ESF) a fim de proporcionar-lhe uma assistência integral.44 Lima MPL, Santos PAA, Póvoas XTF. O papel do enfermeiro durante a consulta de pré- natal á gestante usuária de drogas. Espaç Saúde. 2015; 16 (3): 39-46.,77 Yabuuti KLP, Bernardy FCC. Perfil de gestantes usuárias de drogas atendidas em um Centro de Atenção Psicossocial. Rev Baiana Saúde Pública. 2014; 38 (2): 344-56.

Neste contexto, a enfermagem tem um papel muito importante na atenção ao pré-natal de qualidade garantindo promoção da saúde física e mental a fim de reduzir os agravos. A concessão da informação à gestante usuária de drogas é imprescindível, esclarecendo os males que esta prática pode trazer a si e ao feto em formação; contudo, para que a assistência seja efetiva é necessária a criação de vínculo entre a mulher e o profissional enfermeiro, bem como a confiança nele. Esta formação dá-se por meio do acolhimento, característica de extrema importância para a adesão da gestante ao pré-natal às orientações indicadas.

A gravidez é caracterizada como condição crônica que vai além de doenças, por incorporar certos estados fisiológicos. Os portadores de condições crônicas de menor risco têm sua condição centrada em tecnologias de autocuidado apoiado, com foco na ESF; enquanto que os portadores de condições de alto e muito alto riscos requerem presença mais significativa de atenção profissional, com uma concentração maior de cuidados pela equipe de saúde, com a coparticipação da APS e da atenção especializada.1515 Mendes EV. O cuidado das condições crônicas na atenção primária á saúde: O imperativo da consolidação da Estratégia Saúde da Família. Brasília, DF: OPAS; 2012. Disponível em: https://www.conass.org.br/bibliotecav3/pdfs/livro_cronicas.pdf
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Sendo assim, a gestante usuária de drogas de abuso deve ser estratificada como de alto risco. A estratificação das pessoas usuárias por estratos de risco é um elemento central da gestão baseada na população. Ao invés de ter uma atenção única para todas as pessoas usuárias, diferencia-as por riscos, e define, nas diretrizes clínicas, os tipos de atenção e a sua concentração relativa à cada grupo populacional.1515 Mendes EV. O cuidado das condições crônicas na atenção primária á saúde: O imperativo da consolidação da Estratégia Saúde da Família. Brasília, DF: OPAS; 2012. Disponível em: https://www.conass.org.br/bibliotecav3/pdfs/livro_cronicas.pdf
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Portanto, sugere-se que gestantes usuárias de drogas de abuso devem ser acompanhadas pela estratégia de gestão de caso (GC). Esta estratégia tem o papel principal de um gestor de caso, podendo ser um enfermeiro ou assistente social, qual seja, de gerenciar o cuidado da pessoa portadora de condição crônica muito complexa, de sua família e de sua rede de suporte social. Implica, assim, em defender seus interesses, empoderá-las para o autocuidado, para a autonomia e para a independência, facilitar a comunicação com os prestadores de serviços; e coordenar o cuidado em toda a Rede de Atenção à Saúde (RAS).1616 Secretária de Estado da Saúde do Paraná. Manual para a gestão de caso na Rede Mãe Paranaense. Paraná; 2017. Disponível em: http://www.saude.pr.gov.br/sites/default/arquivos_restritos/files/documento/2020-04/manualges-taodecasopreliminar.pdf
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Contudo, para que a gestão de caso destas gestantes usuárias de drogas de abuso seja eficaz é necessário primeiramente identificar o problema, após isto criar um plano de cuidado individualizado e monitorar a eficiência deste plano de cuidado aplicado. Acredita-se que com tais medidas seja possível realizar uma gestão de caso resolutiva a fim de prevenir danos posteriores ao binômio, propiciando, desta forma, qualidade de vida à mulher e ao bebê.1515 Mendes EV. O cuidado das condições crônicas na atenção primária á saúde: O imperativo da consolidação da Estratégia Saúde da Família. Brasília, DF: OPAS; 2012. Disponível em: https://www.conass.org.br/bibliotecav3/pdfs/livro_cronicas.pdf
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Nesta pesquisa obteve-se como principais resultados a prevalência do uso de drogas de abuso em 19,2%, tendo como perfil sociodemográfico das gestantes com idade entre 19 e 29 anos, predomínio da raça não branca, tempo de estudo ≤9 anos, renda familiar de 1 a 2 salários mínimos e multigestas. Encontrou-se uma alta frequência de utilização de bebida alcoolica e do seu uso concomitante com o tabaco/ e do tabaco com as drogas ilícitas.

Conclui-se que o uso de drogas de abuso atua em conjunto com aspectos sociais, e que intervir neste caso faz-se necessário com um plano de cuidado individualizado e eficaz, garantindo assim a promoção a prevenção a saúde da mulher e do seu bebê.

A atenção ao pré-natal de qualidade é de suma importância, devido à promoção da saúde e à prevenção de agravos a mãe e ao filho. Para que isto ocorra é necessário conhecer a população, seu perfil socioeconômico e os hábitos de vida para que seja possível atuar frente aos seus problemas e fragilidades.

Sugere-se para outras pesquisas a investigação do desfecho materno- infantil das gestantes usuárias de drogas de abuso, e avaliar a eficiência da gestão de caso no cuidado das gestantes usuárias de drogas.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Fev 2021
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2020

Histórico

  • Recebido
    22 Abr 2019
  • Revisado
    11 Mar 2020
  • Aceito
    20 Ago 2020
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