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Efeito de fatores endógenos na percepção química de Grapholita molesta(Busck) (Lepidoptera: Tortricidae) ao feromônio sexual

Effect of endogenous factors on the chemical perception of Grapholita molesta (Busck) (Lepidoptera: Tortricidae) to sex pheromone

Resumo

The oriental fruit moth, Grapholita molesta (Busck), stands out as one of the most important pest in Rosaceae orchards in Brazil. During feeding, caterpillars bore into shoots, branches and fruits, impairing the commercial production. This work aimed to study the effect of endogenous factors in the chemical perception and in the species chemotactic behavior, seeking to optimize monitoring and the behavioral control of this pest. We evaluated male electroantennographical (EAG) and chemotactical (olfactometry) responses to the synthetic sex pheromone in different ages, virgins or mated and fed or unfed. The EAG responses of males did not differ for all evaluated factors. Nevertheless, the chemotactical behavior of males seems to decrease with age, not varying as a function of mating or feeding conditions. The knowledge about the interference of these factors in G. molesta may help with the interpretation of field results, allowing the development of suitable and reliable control measures based on infochemicals for behavioral control.

Electroantennography; olfactometry; oriental fruit moth; behavioral control


Electroantennography; olfactometry; oriental fruit moth; behavioral control

ECOLOGY, BEHAVIOR AND BIONOMICS

Efeito de fatores endógenos na percepção química de Grapholita molesta(Busck) (Lepidoptera: Tortricidae) ao feromônio sexual

Effect of endogenous factors on the chemical perception of Grapholita molesta (Busck) (Lepidoptera: Tortricidae) to sex pheromone

Deisi L Altafini; Josué Sant'Ana; Luiza R Redaelli

Programa de Pós-Graduação em Fitotecnia, Depto de Fitossanidade, UFRGS, Av. Bento Gonçalves, 7712, 91540-000 Porto Alegre, RS, Brasil; deisila@gmail.com

ABSTRACT

The oriental fruit moth, Grapholita molesta (Busck), stands out as one of the most important pest in Rosaceae orchards in Brazil. During feeding, caterpillars bore into shoots, branches and fruits, impairing the commercial production. This work aimed to study the effect of endogenous factors in the chemical perception and in the species chemotactic behavior, seeking to optimize monitoring and the behavioral control of this pest. We evaluated male electroantennographical (EAG) and chemotactical (olfactometry) responses to the synthetic sex pheromone in different ages, virgins or mated and fed or unfed. The EAG responses of males did not differ for all evaluated factors. Nevertheless, the chemotactical behavior of males seems to decrease with age, not varying as a function of mating or feeding conditions. The knowledge about the interference of these factors in G. molesta may help with the interpretation of field results, allowing the development of suitable and reliable control measures based on infochemicals for behavioral control.

Key words: Electroantennography, olfactometry, oriental fruit moth, behavioral control

A mariposa-oriental, Grapholita molesta (Busck), é uma espécie originária do continente asiático (Gonzalez 1989), hoje considerada uma praga cosmopolita, presente em diversas regiões agrícolas do mundo onde se cultivam frutíferas da família Rosaceae, seus principais hospedeiros (Salles 2001). No Brasil, representa uma das principais pragas das culturas da macieira e do pessegueiro. Os danos de G. molesta são decorrentes do hábito alimentar da fase larval, que consome os brotos, ramos e frutos (Salles 2001).

Atualmente, estão disponíveis para o controle químico da mariposa-oriental produtos de amplo espectro, principalmente carbamatos e fosforados (Kovaleski & Ribeiro 2003). Muitos destes permanecem com registro em fase de revisão no mercado externo devido ao elevado período de carência, que limita sua utilização em período pré-colheita (Kovaleski & Ribeiro 2003), e à sua alta toxicidade, com possibilidade de terem proibida a sua aplicação em pomares (Brasil 2006). Além disso, já foi descrita resistência da praga a inseticidas fosforados em outros países (Usmani & Shearer 2001). Assim, é fundamental que sejam desenvolvidas novas formas de controle de G. molesta.

A utilização do feromônio sexual sintético é uma prática alternativa adotada para monitoramento e controle comportamental da mariposa-oriental (Botton et al 2005). No entanto, para compreender a biodinâmica de feromônios e fazer uso racional desse método, é necessário conhecer não só a eficácia de substâncias atrativas, mas também as características endógenas do inseto alvo que estão envolvidas no processo de emissão e percepção do odor (Bento 2001).

Em lepidópteros, a idade de machos, por exemplo, pode ser uma característica endógena relevante na comunicação intra-específica. Em trabalhos de campo, machos de lepidópteros exibiram níveis crescentes de percepção ao feromônio durante os primeiros dias após a emergência, havendo um decréscimo de respostas, em insetos mais velhos (Tomescu et al 1981, Turgeon et al 1983, Proshold 1991, Gadenne & Anton 2000). Em bioensaios eletrofisiológicos, no entanto, a percepção de machos ao feromônio pode não diferir ao longo da vida (Roelofs & Comeau 1971). Assim como a idade, a condição de acasalamento dos insetos machos pode não interferir na percepção eletroantenográfica periférica ao feromônio e mesmo no seu comportamento de vôo em laboratório (Pearson & Schal 1999, Gadenne et al 2001) e campo (Evenden & Gries 2006, Reardon & Sappington 2007). Informações sobre outros fatores, tais como, a influência da quantidade e qualidade do alimento ingerido, nas fases jovem e/ou adulta, sobre a percepção química em insetos, de modo geral, são escassos (Hardee 1970), sendo, contudo, relevantes para a maior compreensão da influência de fatores endógenos no comportamento quimiotáxico em lepidópteros.

Este trabalho teve por objetivo estudar a influência da idade, o status de cópula e a condição alimentar na percepção química de machos de G. molesta, no sentido de aprimorar os conhecimentos a respeito da biodinâmica de feromônios nessa espécie.

Material e Métodos

Criação de G. molesta. Os insetos foram mantidos em sala climatizada (25 ± 1ºC; 60 ± 10% U.R.; fotofase de 16h e luminância igual a 1,46 klx). A criação foi conduzida seguindo Arioli et al (2007), sendo os adultos mantidos em gaiolas feitas com garrafas PET, recebendo solução de mel a 15 % e Nipagin® a 0,15% em algodão embebido como alimento. As fêmeas realizavam posturas na parede da garrafa a qual, após dois dias, era recortada e os pedaços, contendo os ovos de G. molesta, eram colocados sobre dieta artificial à base de maçã seca e farinha de milho para alimentação das lagartas. Quando estas atingiam o último ínstar, os potes com dieta eram cobertos com gaze, onde ocorria a pupação. Os sexos eram separados na fase de pupa, com auxílio de estereomicroscópio.

Testes de sensibilidade ao feromônio sexual sintético. As substâncias que fazem parte do feromônio sexual sintético de G. molesta foram fornecidas pela empresa Isca Tecnologias Ltda. Foram realizadas seis diluições progressivas da mistura feromonal dos isômeros Z- e E-8-acetato de dodecenila (10:1) em solvente hexano (Mallinckrodt, 99% de pureza). A dose dos isômeros variou de 89.10-3 a 89.10-8 pg.ml-1 e de 85.10-4 a 85.10-9 pg.ml-1, respectivamente. Essas diluições foram utilizadas como estímulo para medir a sensibilidade olfativa de G. molesta em eletroantenografia (EAG) à mistura feromonal dos dois isômeros (n = 10). As doses relativas ao somatório das massas dos isômeros, da menor para maior, foram as seguintes: 4,87; 48,75; 487,5; 4.875; 48.750 e 487.500 ng. Esses valores foram transformados pelo logaritmo (log) da soma das massas para melhor representação gráfica dos resultados.

Bioensaios eletroantenográficos. As técnicas eletro-antenográficas utilizadas nesses experimentos são similares às descritas por Trimble & Marshall (2007), onde cada inseto foi observado sob estereomicroscópio e uma de suas antenas foi seccionada na base do escapo com auxílio de microtesoura, e então posicionada entre dois eletrodos de prata, com as extremidades imersas em gel condutor de sinal elétrico. As respostas analógicas do sinal, em milivolts, foram capturadas, amplificadas e processadas com um controlador de aquisição de dados (IDAC-4, Syntech®), e registradas posteriormente com auxílio do software EAG 2000 (Syntech®).

Machos e fêmeas de G. molesta de até um dia de idade foram individualizados em recipientes plásticos (500 ml) e aí mantidos até que atingissem a idade estabelecida para os experimentos, recebendo solução nutritiva ou apenas água.

Uma aliquota de 487,5 ng de feromônio (dose pré-estabelecida nos testes de sensibilidade) foi aplicada sobre recortes de papel filtro (1,5 x 2,5 cm) dobrados, os quais eram mantidos em condições ambiente por 5 min para evaporação do solvente e, após esse período, o papel de fi ltro impregnado com as soluções era colocado na extremidade posterior de uma pipeta Pasteur. O estímulo controle continha papel filtro impregnado com o solvente hexano no mesmo volume da amostra testada. Para evitar o ressecamento das antenas, estas foram constantemente umidificadas durante os testes via corrente de ar emitida por um balão de Erlenmeyer borbulhador (50 ml) contendo água destilada. Os pulsos de ar que atingiam as antenas com os diferentes tratamentos testados eram gerados por um controlador de fl uxo (CS-02, Syntech®), em um volume de 5 ml/s. Um minuto era dado entre estímulos sucessivos, para que a antena recobrasse sua capacidade de percepção odorífera. Os papéis filtro contendo o feromônio sintético eram renovados a cada seis antenas testadas, para que a volatilização dos compostos não interferisse nas respostas. As antenas eram inicialmente submetidas ao controle e, subsequentemente, ao feromônio. Foram realizadas 15 repetições para cada tratamento em todos os bioensaios eletroantenográficos.

A percepção eletrofisiológica de machos de G. molesta ao feromônio sexual foi avaliada em função de três diferentes fatores, ordenados a seguir.

Idade dos insetos. Machos, a partir da emergência, foram alimentados com solução de mel a 15% e Nipagin® a 0,15%, disponibilizada em algodão embebido, e mantidos em câmara climatizada até atingirem a idade para realização dos testes. Foram avaliadas as respostas ao feromônio em antenas de machos de até 24h, 3, 7, 9, 11 e 13 dias de vida.

Condição alimentar. Machos recém-emergidos foram individualizados e metade destes recebeu solução de mel a 15% e Nipagin® a 0,15%, sendo que a outra metade foi mantida sem alimento, apenas com água destilada. Os adultos permaneceram nessas condições por três dias, quando os testes foram realizados.

Status de cópula. Machos de até 24h de idade foram confinados com uma fêmea da mesma idade em recipientes plásticos de 500 ml e alimentados com solução de mel a 15% e Nipagin® a 0,15%. Após 48h do início do pareamento, o macho foi individualizado em outro recipiente similar, com alimento. As fêmeas de cada casal tiveram suas bolsas copuladoras analisadas para a confirmação da cópula. Somente os machos que copularam foram utilizados nos experimentos. As respostas de machos virgens e copulados foram avaliadas em adultos com três dias de idade.

Bioensaios comportamentais. Nos experimentos em olfatometria, foram avaliadas as respostas comportamentais de machos ao feromônio, nas mesmas condições fisiológicas dos bioensaios eletroantenográficos.

O comportamento de adultos de G. molesta foi observado em olfatômetro "Y" de vidro de dupla escolha, com diâmetro de 4 cm, arena inicial de 22 cm, bifurcada em dois "braços" de 24 cm cada, utilizando método adaptado de Gökçe et al (2005). Os testes foram conduzidos em capela com sistema de exaustão de ar, mantida em sala climatizada (25 ± 1ºC e 60 ± 10% UR). O fluxo de ar, previamente fi ltrado com carvão ativo, era conduzido para dentro do sistema com o auxílio de um propulsor conectado a um fluxímetro, à taxa de 0,79 L/min. A observação do comportamento dos insetos foi realizada sempre à tarde, no período das 14:00h às 18:00h, durante a fotofase, sob luz incandescente (60W, luminância igual a 0,518 klx).

Antes do início dos experimentos, as mariposas foram aclimatadas por 1h na sala de testes. Após esse período, um cilindro de vidro (1 cm de diâmetro x 8 cm de comprimento), contendo no seu interior um indivíduo, foi colocado na entrada da arena. Os insetos foram submetidos à escolha entre dois tratamentos posicionados nas extremidades de cada braço do olfatômetro. Os estímulos utilizados foram o feromônio sexual sintético, na dose de 487,5 ng da mistura, e o solvente hexano, sendo o volume de 10 µl de cada um deles aplicado a papel filtro (1,5 x 12 cm).

Para obtenção de machos com diferentes idades, status de cópula e condição alimentar, seguiram-se os mesmos protocolos experimentais descritos para a eletroantenografia. Nos testes comportamentais, as idades dos machos testados foram de 1, 5, 10 e 15 dias, sendo estabelecida, posteriormente, a idade de cinco dias para a realização dos bioensaios relacionados ao status de cópula e à condição alimentar.

As respostas foram consideradas positivas quando os insetos percorreram, pelo menos, 4 cm dentro dos braços contento o tratamento teste e permaneceram nessa área por, no mínimo, 1 min, e negativas, caso os indivíduos percorressem a mesma distância e ficassem o mesmo tempo no braço contendo o tratamento controle. Foi registrada ausência de resposta quando os insetos permaneceram apenas no braço principal do olfatômetro.

O olfatômetro foi invertido (rotação de 180º) a cada duas repetições. A cada seis repetições, ele era lavado com sabão neutro e etanol, e seco em estufa de esterilização a 150ºC. Após esse procedimento, os papéis filtro, contendo as diferentes substâncias, eram renovados. Foram realizadas, no mínimo, 30 repetições para cada tratamento e cada inseto foi observado por 10 min.

Análise estatística. Os dados foram submetidos à análise estatística utilizando-se os softwares Bioestat® 4.0 e SPSS®for Windows 13.0. Calcularam-se médias, erros padrões e as variâncias, sendo os resultados eletroantenográficos comparados por ANOVA e os dados comportamentais pelo teste t ou exato de Fischer, com 95% de confiabilidade.

Resultados e Discussão

A sensibilidade das sensilas antenais de machos de G. molesta ao feromônio sexual sintético foi diretamente proporcional à dose do estímulo químico (Fig 1). O terceiro ponto da curva equivale a 2,69 log [MZ+E] (ng) e é o ponto de inflexão, correspondendo à dose de 487,5 ng. As respostas eletroantenográficas a doses inferiores a esta não diferiram daquelas obtidas com o solvente hexano. Por outro lado, observou-se o início de uma estabilização de respostas, estimulando-se as antenas com doses acima de 487,5 ng. Nesse caso, a antena entra em processo de saturação e a resposta não mais aumenta proporcionalmente à dose. Desta forma, a dose de 487,5 ng foi selecionada e utilizada em todos os experimentos eletrofisiológicos e comportamentais.


Influência da idade na percepção ao feromônio. As respostas eletrofisiológicas de machos de G. molesta ao feromônio sexual sintético não diferiram entre as idades testadas (P > 0,05; F = 36,695) (Tabela 1), indicando que a capacidade de percepção química periférica da antena não varia com o avanço da idade dos insetos. Roelofs & Comeau (1971) também não evidenciaram a influência da idade na percepção periférica de machos de Argyrotaenia velutinana (Walker) (Lepidoptera: Tortricidae) ao feromônio sexual de fêmeas coespecíficas. Esse fator também não foi relevante em estudos semelhantes realizados com machos de Agrotis ipsilon (Hufnagel) (Lepidoptera: Noctuidae) (Gadenne et al 1993). Em experimentos em que as respostas ao estímulo feromonal foram avaliadas em nível de lobo antenal, a percepção química tendeu a aumentar durante o período de maturação sexual, com posterior decréscimo à medida que o inseto envelhece (Seabrook et al 1979, Masson & Arnold 1984, Gadenne & Anton 2000). Esse fato pode estar vinculado à regulação endócrina relacionada ao efeito cronológico da resposta. Sendo assim, como não se observaram diferenças entre as idades testadas nesse bioensaio, acredita-se que os fatores que modulam essa percepção ao nível periférico, tais como a presença e quantidade de proteínas feromonais de ligação (Dickens 1997), não tenham se alterado ao longo do período observado.

Nos bioensaios comportamentais, o número de machos de G. molesta que se locomoveram em direção ao feromônio sexual (respostas positivas) foi maior do que o de indivíduos que se dirigiram ao tratamento controle (respostas negativas), independentemente da idade (Fig 2). No entanto, o número total de respostas positivas foi superior nas idades de um dia (56,7%) e cinco dias (50%) em comparação às idades de 10 (20%) e 15 dias (13,4%). Respostas negativas não ocorreram nas idades mais avançadas. Constatou-se, dessa forma, um decréscimo da quimiotaxia dos machos frente ao feromônio com o aumento da idade.


Trabalhos que evidenciam a influência da idade no comportamento quimiotáxico de insetos em laboratório, de modo geral, são escassos. Em A. ipsilon as respostas de machos ao feromônio decresceram com o avanço da idade (Gadenne et al 1993). Em experimentos de campo, machos de lepidópteros geralmente, exibem níveis crescentes de resposta ao feromônio durante os primeiros dias após a emergência, decrescendo ao longo de suas vidas (Szocs & Tóth 1979, Tóth 1979, Tomescu at al. 1981, Turgeon et al 1983).

Observou-se neste trabalho uma faixa de idade onde o comportamento quimiotáxico tende a ser maior, devido, possivelmente, a fatores neurofisiológicos e endócrinos, com posterior senescência do sistema e diminuição desse comportamento. As diferenças observadas, com relação ao fator idade, entre as respostas eletrofisiológicas e comportamentais, evidenciam que os bioensaios de eletroantenografia periférica não refletem necessariamente a capacidade motora de resposta do inseto frente ao estímulo, pois essa resposta está vinculada a um complexo de fatores endógenos envolvidos no comportamento reprodutivo.

Influência da condição alimentar na percepção ao feromônio. As respostas eletroantenográficas de machos de G. molesta ao feromônio de fêmeas coespecíficas não foram influenciadas pela condição alimentar, ou seja, a percepção química de adultos alimentados com mel não foi distinta daqueles que receberam apenas água como recurso alimentar (P > 0,05; F = 29,853). Em ambos os casos, as respostas foram maiores quando os insetos foram estimulados com o feromônio (Tabela 2).

Diversos estudos com lepidópteros constataram que o consumo e a utilização de alimento em insetos adultos estão intimamente relacionados a processos fisiológicos e comportamentais direcionados, principalmente, à reprodução e, em alguns casos, à dispersão (Panizzi & Parra 1991). No entanto, são poucos os trabalhos que relatam de que forma a alimentação de adultos pode afetar a percepção a substâncias feromonais. Um exemplo desse tipo de interação foi registrado por Hardee (1970) em machos de Anthonomus grandis Boheman (Coleoptera: Curculionidae) alimentados com o botão floral do algodoeiro, os quais foram mais atraídos ao feromônio de agregação do que aqueles que receberam outras partes da planta.

No presente trabalho, foi comparada a atratividade de machos não-alimentados com aqueles que receberam solução de mel, a qual apresenta essencialmente carboidratos. Os carboidratos, por sua vez, não são relatados como substâncias que atuem diretamente no metabolismo fisiológico de percepção química, sendo outros grupos, tais como, proteínas, aminas e hormônios de insetos, os principais responsáveis por essa função (Dickens 1997, Hildebrand 1997, Anton & Gadenne 1999).

Na maioria dos lepidópteros jovens e adultos, os carboidratos atuam como reserva de energia, a qual auxilia na manutenção e prolongamento de sistemas vitais, ocasionando o incremento de parâmetros biológicos e comportamentais como a longevidade, número de ovos/fêmea, peso do corpo, período de oviposição e aumento da atividade motora (Benz 1991, Panizzi & Parra 1991, Carroll & Quiring 1992, Fonseca et al 2005).

No bioensaio de olfatometria não se observaram diferenças significativas da atividade motora quimiotáxica entre machos alimentados com solução de mel, em comparação com aqueles que receberam somente água (P = 0,1835) (Fig 3). Nesse caso, é possível que a presença de carboidratos na dieta alimentar de machos não seja um fator decisivo na indução da atividade locomotora ou que a presença do estímulo feromonal suplemente um déficit físico relacionado à alimentação.


As implicações da qualidade do alimento na percepção química ao feromônio sexual devem ser avaliadas para a melhor compreensão do comportamento reprodutivo de G. molesta.

Influência do status de cópula na percepção ao feromônio. A percepção eletrofisiológica de machos de G. molesta copulados e virgens ao feromônio sexual não diferiu (P > 0,05, F = 27,695) (Tabela 3). O mesmo foi observado quanto ao comportamento quimiotáxico (P = 0,782) (Fig 4). Contudo, as respostas dos machos virgens foram maiores para o tratamento com feromônio nos dois bioensaios.


Estudos relatando a influência da condição de acasalamento na percepção química de machos sob condições controladas, também são escassos. A maioria dos trabalhos publicados refere-se à influência negativa da cópula na capacidade biossintética de produção e liberação de feromônio de fêmeas de lepidópteros (Ando et al 1996, Delisle et al 1999). Contudo, inúmeros registros indicam a inexistência de diferenças na capacidade de resposta de machos virgens e experientes ao feromônio sexual de fêmeas (Pearson & Schal 1999, Gadenne et al 2001, Evenden & Gries 2006, Reardon & Sappington 2007). Por outro lado, há registros da maior captura de indivíduos copulados no período de maior densidade populacional no campo. Sendo assim, essa diferença estaria relacionada à flutuação populacional da espécie e não diretamente à diferença de percepção química relacionada ao status de cópula.

Em G. molesta, os machos são poligínicos, ou seja, copulam com mais de uma fêmea ao longo da vida (Dustan 1964, Baker & Cardé 1979). Assim, é relevante para a viabilização de maior número de encontros entre casais e consequente aumento do potencial biótico da espécie, que a percepção química de machos não se altere com a variação do status de cópula, permitindo ao macho copular o maior número possível de fêmeas. A constância dessa percepção, entretanto, parece não ser a mesma ao longo do período de pós-cópula. De acordo com Gadenne et al (2001), as respostas eletrofisiológicas registradas no complexo antenal glomerular do deutocérebro e o comportamento quimiotáxico, em túnel-de-vento, de machos de A. ipsilon recém-acasalados foram menores quando comparadas àqueles testados 24h após a cópula.

O período refratário de machos, ou seja, o tempo necessário para ocorrência de uma re-cópula parece ser mediado pela presença de hormônios, aminas biogênicas, tais como serotonina e octopamina, ou mesmo de neuropeptídeos, que, quando presentes, poderiam modular a sensibilidade dos neurônios do lobo antenal em resposta ao feromônio de fêmeas coespecíficas (Linn & Roelofs 1992, Gadenne et al 2001). A inibição ou ausência de respostas relacionadas à quimiotaxia ou mesmo de comportamento reprodutivo durante o período refratário, como citado para A. ipsilon (Gadenne et al 2001), também pode estar relacionada à quantidade de substâncias protéicas presentes nas glândulas acessórias sexuais dos machos, as quais podem ter um importante papel na regulação da percepção olfativa durante esse período (Duportets et al 1998).

Os dados de percepção eletrofisiológica e de comportamento quimiotáxico observados neste trabalho em machos de G. molesta, não evidenciam diferenças de respostas relacionadas ao status reprodutivo. É importante ressaltar que em todos os tratamentos, os insetos testados tinham acasalado há mais de 24hs. Desta forma, em G. molesta, machos com período refratário de, pelo menos, 24h, parecem estar fisiologicamente aptos não somente a perceber o feromônio sexual de fêmeas, mas também a desenvolver um comportamento quimiotáxico frente a esse estímulo. Bioensaios com machos que tenham realizado cópula recente poderiam elucidar a importância desse fator no comportamento reprodutivo de G. molesta.

Com base nos resultados obtidos e nas condições em que foram realizados os bioensaios, foi possível concluir que a idade, o status de cópula e a condição alimentar não interferem na percepção eletroantenográfica de machos de G. molesta ao feromônio. No entanto, seu comportamento quimiotáxico em direção ao feromônio diminui com o avanço da idade, apesar de não ser influenciado pelo status de cópula e condição alimentar.

A possibilidade de não haver interferência do status de cópula e da condição alimentar na captura de machos a campo, é um resultado positivo que sustenta a confiabilidade da técnica de monitoramento. Desta forma, não se estaria subestimando a densidade populacional do inseto em armadilhas em virtude desses fatores. Apesar de a percepção química diminuir com o aumento da idade e, possivelmente, haver menor captura de machos velhos, esse parece não ser um fator relevante na interpretação dos dados de coleta em armadilhas, já que os machos velhos teriam menor número de encontros para cópula com fêmeas coespecíficas e, consequentemente, sua população não influenciaria significativamente na prole da geração seguinte. Além disso, machos copulados ou virgens, independentemente da condição alimentar, estariam sujeitos aos mesmos mecanismos de desorientação utilizados na técnica de confusão sexual.

Agradecimentos

A Luiz Antônio Mazzini Fontoura e Fabrício Naciuk, do Laboratório de Química da CIENTEC - Fundação de Ciência e Tecnologia (Cachoeirinha, RS), pela elaboração das diluições feromonais e ao Dr. Marcos Botton, da EMBRAPA Uva e Vinho (Bento Gonçalves, RS), pelo fornecimento de pupas de G. molesta. À empresa Isca Tecnologias Ltda pelo provimento do feromônio sintético e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pela concessão de bolsa de estudo ao primeiro e terceiro autores.

Received 17/XI/08.

Accepted 05/II/10.

Edited by Wesley A C de Godoy - ESALQ/USP

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Jul 2010
  • Data do Fascículo
    Jun 2010

Histórico

  • Aceito
    05 Fev 2010
  • Recebido
    17 Nov 2008
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