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Religião – perspectivas contemporâneas

Religion – contemporary perspectives

É sabido que o fenômeno religioso contemporâneo se mostra cada vez mais desafiador às Ciências Sociais. A resistência da religião à modernidade, e mesmo a sua revitalização, têm sido abundantemente analisadas por antropólogos, sociólogos e cientistas políticos de todos os quadrantes. São muitas as estratégias encontradas pelas diversas modalidades dessa tradicional atividade cultural humana utilizadas para permanecerem vigorantes num mundo, que deveria estar, segundo várias previsões, cada vez mais secularizado e desencantado. Elas podem ser situadas num continuum onde, num polo, estaria a mais completa simbiose entre modernidade e religião e, noutro, a mais radical recusa e o mais ruidoso protesto contra os estilos de vida e valores trazidos pela modernização social. Diante deste quadro, uma série de questões socioantropológicas emerge como temas quentes para as Ciências Sociais. Visando contribuir para esse debate temos, então, a satisfação de apresentar aos nossos leitores um novo número da Revista Civitas com um dossiê temático dedicado a esse assunto, intitulado “Religião: perspectivas contemporâneas”.

Num primeiro bloco dessa coletânea de textos, temos três artigos onde são abordadas as relações entre “mídia” e “religião”. Eles tematizam uma dessas curiosas simbioses entre a modernidade e a tradição religiosa. No primeiro destes artigos, intitulado “A religião como comunicação na era digital”, Enzo Pace e Giuseppe Giordan, analisam os instrumentos teóricos e metodológicos disponíveis na Sociologia para a abordagem da comunicação religiosa mediada pelo computador. Particularmente, lhes interessa avaliar o potencial heurístico da “teoria dos sistemas” na busca da compreensão desse fenômeno. Já Pablo Semán e Agustina Battaglia analisam, em artigo intitulado “De la industria cultural a la religión: nuevas formas y caminos para el sacerdocio”, o caso de certas personagens de Buenos Aires vinculados à religiosidade New Age (Nova Era), que estão se tornando lideranças midiáticas ao desenvolverem eficientemente formatos e conteúdos inovadores que rearticulam as fronteiras entre “cultura” e “religião”. Ainda nesse bloco, Airton Luiz Jungblut, no artigo “Transformações na comunicação religiosa: análise dos dois modelos comunicacionais operantes no Brasil atual”, apresenta uma análise comparativa entre a utilização dos Meios de Comunicação de Massa (MCM) e da Comunicação Mediada por Computador (CMC) por grupos e/ou indivíduos vinculados a religiões e religiosidades no Brasil atual. Faz isso dando especial atenção aos aspectos mercadológicos implicados nestes usos.

Num segundo bloco temos dois textos em que questões envolvendo práticas mágicas e/ou religiosas investigadas na África servem de pano de fundo para instigantes indagações sobre o ofício antropológico e sobre o lugar (cultural, societário, discursivo, cognitivo, etc.) de onde falam esses cientistas sociais representantes da modernidade. Assim, enquanto que Antonádia Borges, em artigo intitulado “Ser embruxado: notas epistemológicas sobre razão e poder na antropologia”, busca, numa aproximação entre e “estado” e “bruxaria” na África do Sul, discutir razão, poder, relativismo, cultura e universalismo; Silvia Montenegro, em seu artigo “Etnografías y contextos islámicos: apuntes sobre puntos de vista nativos y miradas postcoloniales en Marruecos”, que tematiza suas pesquisas etnográficas sobre o islamismo no Marrocos, reflete sobre as tensões e ambiguidades implicadas na interação entre antropólogos e “nativos”, observadores e observados.

Num terceiro bloco temos quatro textos onde são descritas e/ou analisadas situações vividas pela religião na América Latina. O primeiro deles, “La religiosidad popular como ‘entre-medio’ entre la religión institucional y la espiritualidad individualizada”, de Renée de la Torre, se debruça sobre as novas formas desinstitucionalizadas de religiosidade popular latino-americana no que ali se pode encontrar de “entremeio” que se situa “entre o tradicional e o emergente, entre o local e o transnacional, entre o social e o individual e entre a sacralidade profana e a profanação da religiosidade tradicional”. O segundo, intitulado “Los vínculos entre religión y política a la luz del debate sobre matrimonio para parejas del mismo sexo en Argentina”, de Daniel Jones e Juan Marco Vaggione, aborda as relações entre religião e política tomando como foco as manifestações discursivas de agentes e instituições católicas e evangélicas na Argentina a cerca dos direitos legais dos casais de mesmo sexo naquele país. Miguel Ángel Mansilla, por sua vez, em texto intitulado “Sociología y pentecostalismo: intereses, énfasis y limitaciones de las investigaciones del pentecostalismo chileno (1990-2011)” nos apresenta um quadro de informações atualizadas a respeito dos movimentos no interior do pentecostalismo chileno nas duas últimas décadas. Por fim, neste bloco, contamos com a análise de Ari Pedro Oro sobre a situação atual das religiões afro-brasileiras no extremo sul do Brasil. Em texto intitulado “O atual campo afro-religioso gaúcho”, esse autor nos brinda com uma oportuna abordagem sobre a realidade dessas religiões no Rio Grande do Sul, estado brasileiro que, curiosamente, segundo os dois últimos censos do IBGE, se mostra o mais afro-religioso do país.

Ainda neste número de Civitas, contamos com dois outros textos que não integram o dossiê temático “Religião: perspectivas contemporâneas”. O primeiro deles, de Theophilos Rifiotis, intitula-se “Desafios contemporâneos para a antropologia no ciberespaço: o lugar da técnica”. Neste texto, o autor opera uma releitura das formas como a tradição antropológica tem abordado o tema da “técnica”, com o intuito de problematizar a noção moderna de “objeto-técnico”, noção esta que tem sido utilizada em análises sobre o que se convencionou chamar de “ciberespaço”. Por fim, o texto de Marina Dantas de Figueiredo e Neusa Rolita Cavedon, intitulado “O espaço dos indesejáveis: a circularidade da representação de estigma em um centro comercial de Porto Alegre”, aborda, sob uma perspectiva afim com as Ciências Administrativas, o uso de categorias sociais estigmatizantes como percepções incorporadas à “cultura organizacional” de um espaço comercial urbano.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Jul 2020
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2012
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