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Influência do board interlocking no gerenciamento de resultados* * Trabalho apresentado no IX Congresso Associação Nacional de Programas de Pós-Graduação em Ciências Contábeis, Curitiba, PR, Brasil, junho de 2015

RESUMO

A participação de um conselheiro em mais de um conselho de administração é denominada de board interlocking. Tal fenômeno contribui para a disseminação de práticas gerenciais e de governança, a partir do compartilhamento de conhecimentos e experiências dos conselheiros em outros conselhos. Assim, um conselheiro poderia “levar” práticas de gerenciamento de resultados presentes em uma empresa para outra da qual faça parte do conselho. Presume-se que quanto maior for sua conexão, direta ou indireta, em conselhos, maior pode ser o compartilhamento de informações, sobretudo que possam refletir na qualidade do resultado das empresas. Diante do exposto, o objetivo deste estudo é verificar a influência do board interlocking no gerenciamento de resultados das empresas listadas na Bolsa de Valores, Mercadorias e Futuros de São Paulo (BM&FBOVESPA). A pesquisa caracteriza-se como descritiva, quantitativa e documental, com uma amostra composta por empresas listadas na BM&FBOVESPA no período de 2011-2013. Para o gerenciamento de resultados utilizou-se o modelo de Kang e Sivaramakrishnan (1995), enquanto que para o interlocking utilizaram-se as medidas de centralidade de grau, para conexões diretas de conselheiros, e centralidade de intermediação, para conexões indiretas. Os resultados indicam que o gerenciamento de resultados é influenciado pelo interlocking dos membros do conselho de administração. Conclui-se que quanto maior a centralidade de grau, maior o gerenciamento positivo de resultados, bem como variações dos accruals positivos e negativos são influenciadas pela intermediação dos membros do conselho de administração. Os resultados reforçam que o comportamento de gerenciamento de resultados pode ser transmitido entre empresas por meio dos membros que compõem seus conselhos de administração.

Palavras-chave
board interlocking; conselho de administração; gerenciamento de resultados; centralidade de grau; centralidade de intermediação

ABSTRACT

The participation of directors on more than one board is called “board interlocking”. This phenomenon contributes to the spread of management and governance practices, through directors sharing their knowledge and experiences on other boards. Thus, directors could “carry” the earnings management practices present in one company into another in which they sit on the board. It is assumed that the greater directors’ direct or indirect connections on boards, the greater the sharing of information, especially information that can be reflected in company earnings quality. In light of the above, the aim of this study is to verify the influence of board interlocking on earnings management in companies listed on the São Paulo Stock, Commodities, and Futures Exchange (BM&FBovespa). The study is characterized as descriptive, quantitative, and documentary, and uses a sample of companies listed on the BM&FBOVESPA between 2011 and 2013. For earnings management, the model from Kang and Sivaramakrishnan (1995) was used, while for interlocking, degree centrality measures were used for direct board member connections, and intermediation centrality for indirect connections. The results indicate that earnings management is influenced by the interlocking of board members. It is concluded that the greater the degree centrality, the greater positive earnings management is, and that variations in positive and negative accruals are influenced by board member intermediation. The results reinforce the idea that earnings management behavior can be transferred between companies by the directors that make up their boards.

Keywords
board interlocking; board of directors; earnings management; degree centrality; intermediation centrality

1. INTRODUÇÃO

Em um ambiente corporativo representado por gestores e acionistas, o crescimento do mercado acionário e a pulverização do capital acabam por favorecer a autonomia dos gestores, os quais acabam tomando decisões alinhadas aos seus próprios interesses (Ribeiro & Colauto, 2016Ribeiro, F., & Colauto, R. D. (2016). A relação entre board interlocking e as práticas de suavização de resultados. Revista Contabilidade & Finanças, 27(70), 55-66.; Santos & Silveira, 2007Santos, R. L., & Silveira, A. D. M. D. (2007). Board interlocking no Brasil: a participação de conselheiros em múltiplas companhias e seu efeito sobre o valor das empresas. Revista Brasileira de Finanças, 5(2), 125-163.) e que por vezes não são necessariamente os mesmos dos acionistas. A Teoria da Agência discute esse conflito, em que Fama e Jensen (1983Fama, E. F., & Jensen, M. C. (1983). Separation of ownership and control. Journal of Law and Economics, 26(jun), 301-325.) abordam ser o conselho de administração responsável por monitorar e mediar esse ambiente conflitante. Na percepção de Comet e Pizzaro (2011Comet, C., & Pizarro, N. (2011). The cohesion of intercorporate networks in France.Procedia-Social and Behavioral Sciences, 10, 52-61.), aliado a esse monitoramento, o conselho de administração tem como responsabilidade controlar as decisões tomadas pelos presidentes e executivos-chefes, tendo como objetivo a defesa dos interesses dos acionistas. Conflitos de agência são comuns no ambiente corporativo, a partir do momento em que o agente e o principal possuem objetivos distintos na organização.

O conselho de administração desempenha papel essencial na governança corporativa, em que prerrogativas legais impostas ao conselho de administração vão desde contratar, demitir e estabelecer compensações aos gestores (Bruére, 2010Bruére, A. J. (2010). Influência do board interlocking no valor e desempenho financeiro das empresas listadas na BMFBovespa (Dissertação de Mestrado). Administração, Faculdade Boa Viagem, Recife.; Williamson, 1985Williamson, O. E. (1985). The economic institutions of capitalism: firms. markets, relational contracting. New York (NY): Free Press.). Sua função é assegurar tratamento igualitário aos acionistas, intermediando os interesses desses às práticas de administração dos gestores, sendo importante agente de monitoramento (Brenes, Madrigal & Requena, 2011Brenes, E. R., Madrigal, K., & Requena, B. (2011). Corporate governance and family business performance. Journal of Business Research, 64(3), 280-285.; Campbell, Ghosh, Petrova & Sirmans, 2011Campbell, R. D., Ghosh, C., Petrova, M., & Sirmans, C. F. (2011). Corporate governance and performance in the market for corporate control: the case of REIT’s. The Journal of Real State Finance and Economics, 42(4), 451-480.).

O papel de monitorar e intermediar as ações dos gestores aos interesses dos acionistas também possui forte relação com a independência do conselho de administração. De acordo com Fama e Jensen (1983Fama, E. F., & Jensen, M. C. (1983). Separation of ownership and control. Journal of Law and Economics, 26(jun), 301-325.) e Christensen, Kent e Stewart (2010Christensen, J., Kent, P., & Stewart, J. (2010). Corporate governance and company performance in Australia. Australian Accounting Review, 20(4), 372-386.), a independência do conselho de administração pode ser vista como um bom instrumento de governança corporativa, a qual contribui para o maior monitoramento das práticas adotadas pelos gestores. Para Monks e Minow (1996Monks, R. A., & Minow, N. (1996).Watching the watchers: corporate governance for the 21st century. Cambridge, MA: Blackwell.), um dos principais pilares da governança corporativa está na forte atuação e na composição do conselho de administração no qual reside a independência de seus membros.

Nesse contexto de composição dos membros do conselho, tem-se a participação de um conselheiro em mais de um conselho. A literatura denomina essa prática corporativa de conselhos interconectados (board interlocking), ou seja, quando o membro do conselho de uma empresa participa do conselho de outra (Burt, 1979Burt, R. S. (1979). A structural theory of interlocking corporate directorates. Social Networks, 1(4) 415-435.; Mizruchi, 1996Mizruchi, M. S. (1996). Cohesion, structural equivalence, and similarity of behavior: an approach to the study of corporate political power. Sociological Theory, 22, 271-298.). Para Shropshire (2010Shropshire, C. (2010). The role of the interlocking director and board receptivity in the diffusion of practices.Academy of Management Review, 35(2), 246-264.), interlocking pode ser definido como sobreposição de membros, os quais criam uma estrutura de rede que pode influenciar as decisões gerenciais, compartilhando conhecimentos e experiências. Para Hashim e Rahman (2011Hashim, H. A., & Rahman, M. S. A. (2011). Multiple board appointments: are directors effective? International Journal of Business and Social Science, 2(17), 137-143.) e Shi, Dharwadkar e Harris (2013Shi, L., Dharwadkar, R., & Harris, D. (2013). Board interlocks and earnings quality [Working Paper]. Social Science Research Network. Recuperado de http://www1.american.edu/academic.depts/ksb/finance_realestate/mrobe/Seminar/dharwakar.pdf.
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), o board interlocking pode disseminar práticas gerenciais e de governança a partir do compartilhamento de conhecimento e experiências, tendo reflexos na qualidade do resultado das empresas.

A qualidade do resultado das empresas tem reflexos a partir de decisões e práticas discricionárias dos gestores, em que, de maneira oportunista, a gestão toma decisões para maximizar o resultado, não representando a realidade deste aos demais usuários. Para Almeida (2010Almeida, J. E. F. (2010). Qualidade da informação contábil em ambientes competitivos (Tese de Doutorado), Ciências Contábeis, Universidade de São Paulo, São Paulo.), a qualidade do resultado torna-se relevante para a compreensão dos incentivos que influenciam executivos e acionistas a interferirem em sua mensuração e como esses agentes são influenciados por tais incentivos, haja vista serem esses os responsáveis pela discricionariedade das escolhas contábeis. Martinez (2001Martinez, A. L. (2001). Gerenciamento dos resulta dos contábeis: estudo empírico das companhias abertas brasileiras (Tese de Doutorado). Ciências Contábeis, Universidade de São Paulo, São Paulo.) afirma que essa prática caracteriza-se, fundamentalmente, como uma alteração proposital dos resultados contábeis, visando a alcançar uma motivação particular, não se tratando de fraude contábil, devido a sua ocorrência ser permitida pela legislação a partir da faculdade de cada administrador.

A presença do board interlocking pode influenciar a adoção de práticas discricionárias caracterizadas como gerenciamento de resultados. Gerenciamento de resultados é um processo em que as decisões são limitadas às imposições das normas contábeis a fim de apresentar um nível desejado de resultado (Schipper, 1989Schipper, K. (1989). Commentary on earnings management. Accounting horizons, 3 (4), 91-102.; Shi et al., 2013Shi, L., Dharwadkar, R., & Harris, D. (2013). Board interlocks and earnings quality [Working Paper]. Social Science Research Network. Recuperado de http://www1.american.edu/academic.depts/ksb/finance_realestate/mrobe/Seminar/dharwakar.pdf.
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) que pode beneficiar acionistas e gestores.

O gerenciamento de resultados observado por meio do board interlocking tem efeito contágio nas empresas, ou seja, a participação de alguns membros em outras empresas faz com que práticas administrativas, boas ou más, sejam compartilhadas de empresa para empresa (Chiu, Teoh & Tian, 2013Chiu, P. C., Teoh, S. H., & Tian, F. (2013). Board interlocks and earnings management contagion. The Accounting Review, 88(3), 915-944.).

Estudos demonstram associação entre práticas de gerenciamento de resultados e interconexão de membros de conselhos de administração (Carrera, 2013Carrera, N. (2013). Audit committees’ interlocks and financial reporting Quality. In 36º Annual Congress European Accounting Association, Paris, France.; Chiu et al., 2013Chiu, P. C., Teoh, S. H., & Tian, F. (2013). Board interlocks and earnings management contagion. The Accounting Review, 88(3), 915-944.; Mindzak, 2013Mindzak, J. (2013). Interlocked boards of directors, voluntary disclosures and earnings quality. Voluntary disclosures and earnings quality. InCAAA Annual Conference, School of Business Economics. Montreal, Canadá.; Shi et al., 2013Shi, L., Dharwadkar, R., & Harris, D. (2013). Board interlocks and earnings quality [Working Paper]. Social Science Research Network. Recuperado de http://www1.american.edu/academic.depts/ksb/finance_realestate/mrobe/Seminar/dharwakar.pdf.
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). No contexto de empresas norte-americanas, têm-se os estudos de Carrera (2013Carrera, N. (2013). Audit committees’ interlocks and financial reporting Quality. In 36º Annual Congress European Accounting Association, Paris, France.) e Chiu et al., (2013Chiu, P. C., Teoh, S. H., & Tian, F. (2013). Board interlocks and earnings management contagion. The Accounting Review, 88(3), 915-944.). Mindzak (2013Mindzak, J. (2013). Interlocked boards of directors, voluntary disclosures and earnings quality. Voluntary disclosures and earnings quality. InCAAA Annual Conference, School of Business Economics. Montreal, Canadá.) realizou estudo em empresas canadenses e Shi et al. (2013Shi, L., Dharwadkar, R., & Harris, D. (2013). Board interlocks and earnings quality [Working Paper]. Social Science Research Network. Recuperado de http://www1.american.edu/academic.depts/ksb/finance_realestate/mrobe/Seminar/dharwakar.pdf.
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) verificaram a relação entre o interlocking do conselho de administração e do comitê de auditoria no cenário norte-americano. No Brasil, Ribeiro e Colauto (2016Ribeiro, F., & Colauto, R. D. (2016). A relação entre board interlocking e as práticas de suavização de resultados. Revista Contabilidade & Finanças, 27(70), 55-66.) relacionaram o board interlocking do conselho de administração com gerenciamento de resultados por meio da suavização de resultados, entretanto tal relação não ocorreu por meio do modelo de Kang e Sivaramakrishnan (1995Kang, S. H., & Sivaramakrishnan, K. (1995). Issues in testing earnings management and an instrumental variable approach. Journal of Accounting Research 33 (2), 353-367.) (Modelo KS) para verificação do gerenciamento de resultados. A partir desse contexto, em que a interconexão de membros do conselho de administração pode transferir experiências de práticas administrativas das empresas em que atuam no conselho de administração, dos quais o gerenciamento de resultados pode se configurar em uma dessas práticas, apresenta-se o seguinte problema de pesquisa: qual a influência do board interlocking no gerenciamento de resultados das empresas listadas na Bolsa de Valores, Mercadorias e Futuros de São Paulo (BM&FBOVESPA)? O objetivo do estudo consiste em verificar a influência do board interlocking no gerenciamento de resultados das empresas listadas na BM&FBOVESPA.

O estudo se justifica pela evolução de redes sociais, destacando-se pela importância de pesquisar possíveis transferências de informações por meio do interlocking dos membros do conselho de administração, tendo em vista a escassez de pesquisas empíricas desse tipo na área contábil (Shi et al., 2013Shi, L., Dharwadkar, R., & Harris, D. (2013). Board interlocks and earnings quality [Working Paper]. Social Science Research Network. Recuperado de http://www1.american.edu/academic.depts/ksb/finance_realestate/mrobe/Seminar/dharwakar.pdf.
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). Para Chiu et al. (2013Chiu, P. C., Teoh, S. H., & Tian, F. (2013). Board interlocks and earnings management contagion. The Accounting Review, 88(3), 915-944.), observando o gerenciamento de resultados a partir de uma rede social, no caso os membros do conselho de administração, pode-se identificar o porquê e quando o contexto dessa rede é importante para a qualidade dos resultados, mostrando que a qualidade das informações transmitidas influencia as chances de a qualidade dos lucros ser repercutida.

Ao pesquisar o interlocking do comitê de auditoria e do conselho de administração, Carrera (2013Carrera, N. (2013). Audit committees’ interlocks and financial reporting Quality. In 36º Annual Congress European Accounting Association, Paris, France.) afirma que estudos como esses também fornecem insights com base na Teoria da Agência, isto é, a participação de um membro em mais de um conselho faz com que esse não disponha de tempo e de recursos necessários para o acompanhamento eficaz dos objetivos da organização.

O estudo também se justifica por contribuir para a pesquisa na área de governança corporativa e de rede social, uma vez que busca investigar o interlocking corporativo e sua relação com o gerenciamento de resultados a partir da troca de informações e de conhecimento de práticas contábeis originadas da participação dos membros do conselho de administração em mais de uma empresa. Para Wong, Gigax e Wang (2015Wong, L. H., Gygax, A., & Wang, P. (2015). Board interlocking network and the design of executive compensation packages. Social Networks, 41, 85-100. Recuperado de http://dx.doi.org/10.1016/j.socnet.2014.12.002.
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), negligenciar a essência de como se comportam as redes de relacionamento pode resultar em estatísticas não confiáveis e conclusões incorretas.

O artigo está estruturado da seguinte forma: na seção 2 apresenta-se a revisão da literatura nacional e internacional referente ao interlocking do conselho de administração e gerenciamento de resultados, bem como a construção das hipóteses da pesquisa. Na seção 3 tem-se a metodologia aplicada no estudo. Na seção 4 discutem-se os resultados dos testes estatísticos aplicados e encerra-se com a conclusão apresentada na seção 5.

2. REVISÃO DA LITERATURA

2.1 Interlocking do Conselho de Administração

A estrutura de propriedade e os conflitos de interesse sempre fizeram parte das discussões sobre governança corporativa. A governança corporativa pode ser considerada como um conjunto integrado de controles internos e externos, visando a harmonizar os objetivos dos acionistas e gestores (Baysinger & Hoskisson, 1990Baysinger, B., & Hoskisson, R. E. (1990). The composition of boards of directors and strategic control: effects on corporate strategy.Academy of Management Review, 15(1), 72-87.) para que não haja conflitos de interesse resultantes da separação entre propriedade e controle (Berle & Means, 1932Berle, A., Jr. & Means, G. (1932). The modern corporation and private property. Chicago (IL): Commerce Clearing House.; Jensen & Meckling, 1976Jensen, M. C., & Meckling, W. H. (1976). Theory of the firm: managerial behavior, agency costs, and ownership structure.Journal of Financial Economics,3(4), 305-360.). No contexto de práticas de governança corporativa tem-se o conselho de administração como órgão mediador no conflito de interesses entre gestores e acionistas. Para Campbell et al. (2011Campbell, R. D., Ghosh, C., Petrova, M., & Sirmans, C. F. (2011). Corporate governance and performance in the market for corporate control: the case of REIT’s. The Journal of Real State Finance and Economics, 42(4), 451-480.), o conselho de administração é um importante agente de monitoramento, particularmente em eventos corporativos em que os interesses dos gestores tangenciam as preferências dos acionistas. O desafio para todos os conselhos de administração é alinhar a estratégia de negócios com os interesses dos acionistas, em um ambiente em que os acionistas visam a obter valor no longo prazo, enquanto a alta gestão procura crescimento e valorização no curto prazo (Brenes et al., 2011Brenes, E. R., Madrigal, K., & Requena, B. (2011). Corporate governance and family business performance. Journal of Business Research, 64(3), 280-285.).

Considerado um importante mecanismo de governança corporativa, o desempenho do conselho de administração aos olhos dos gestores é monitorado a partir de sua reputação no mercado (Fama, 1980Fama, E. F. (1980). Agency problems and the theory of the firm.The Journal of Political Economy, 88(2), 288-307.). Mace (1986Mace, M. 1986. Directors: myth and reality. Boston, MA: Harvard Business School Press.) sugere que os conselhos com prestígio e com possibilidades de bons contratos de negócios podem induzir a busca por membros externos, fazendo com que um conselheiro participe em mais de um conselho, influenciando no tamanho e independência desse conselho.

Embora deva haver equilíbrio no tamanho do conselho, em que se tem membros internos e externos, a participação de membros internos tem se mostrado mais comprometida com os interesses das companhias, enquanto a participação externa faz com que as reuniões e decisões não evoluam (Salmon, 2001Salmon, W. J. (2001). Prevenção de crises: como engrenar o conselho. In Harvard business review: experiências de governança corporativa (pp. 9-31). Rio de Janeiro, RJ: Campus.). Por outro lado, Hsu e Petshsakulwong (2010Hsu, W. Y., & Petchsakulwong, P. (2010). The impact of corporate governance on the efficiency performance of the Thai non-life insurance industry.The Geneva Papers on Risk and Insurance-Issues and Practice, 35(1), 28-49.) asseveram que conselheiros externos são mais propensos a discutir os interesses da empresa pelo fato de não possuírem relação econômica com a administração. Assim, a participação de conselheiros independentes no conselho de administração produz melhoria na qualidade dos lucros, reduzindo a assimetria de informação (Goh, Ng & Young, 2012Goh, B. W., Ng, J., & Yong, K. O. (2012). The effect of board independence on the information environment: an instrumental variable approach based on director social network. In Annual Meeting American Accounting Association, Washington, D.C.). Dessa forma, observa-se que as pesquisas sobre independência do conselho de administração evoluíram e que essa independência contribui para reduzir problemas de agência, melhorando as práticas de governança corporativa (Carrera, 2013Carrera, N. (2013). Audit committees’ interlocks and financial reporting Quality. In 36º Annual Congress European Accounting Association, Paris, France.) e criando valor para os acionistas (Hoitash, 2011Hoitash, U. (2011). Should independent board members with social ties to management disqualify themselves from serving on the board?Journal of Business Ethics, 99(3), 399-423.).

Nota-se que os autores, ao abordarem a independência do conselho, relacionam a participação externa de seus membros e que quando há participação deles em mais de um conselho tem-se então o board interlocking, isto é, quando o membro de um conselho de uma empresa ocupa cargo em conselho de outra empresa.

A prática do board interlocking há décadas tem sido um tema bastante debatido em governança corporativa. Nos Estados Unidos da América, em 1914, o Ato nº 8 de Clayton, que tinha por objetivo proibir que companhias concorrentes se interligassem a partir de redes corporativas, não obteve o sucesso desejado, pois não possuía mecanismos que condenassem tal prática corporativa. Em 1992, a Securities and Exchange Commission (SEC) exigia que todas as companhias divulgassem o board interlocking diante da preocupação com a remuneração dos executivos (Fich & White, 2005Fich, E. M., & White, L. J. (2005). Why do CEOs reciprocally sit on each other's boards? Journal of Corporate Finance, 11(1), 175-195.).

Na prática, o board interlocking ocorre em todos os setores e na sua maioria tem sido elogiado por mobilizar um recurso escasso nas organizações: a experiência de gerentes e diretores (Fich & White, 2005Fich, E. M., & White, L. J. (2005). Why do CEOs reciprocally sit on each other's boards? Journal of Corporate Finance, 11(1), 175-195.). Para Nawfal (2011Nawfal, W. (2011).Interlocking directors: impact on canadian merger and acquisition outcomes (Tese de Doutorado). Administração, John Molson School of Business, Concordia University, Montreal, Canadá.), as grandes companhias tendem a apresentar maior número de interlocking, haja vista a experiência, capacidade e competência de seus conselheiros. Nesse sentido, Connelly, Johnson, Tihanyi e Ellstrand (2011Connelly, B. L., Johnson, J. L., Tihanyi, L. & Ellstrand, A. E. (2011). More than adopters: competing influences in the interlocking directorate. Organization Science, 22(3), 688-703. ) afirmam que ser membro de um conselho de administração pode beneficiar as empresas a partir de um canal de comunicação de informações externas.

Chiu et al. (2013Chiu, P. C., Teoh, S. H., & Tian, F. (2013). Board interlocks and earnings management contagion. The Accounting Review, 88(3), 915-944.) expõem que a maioria das pesquisas buscou investigar o comportamento corporativo das organizações em temáticas diferentes do comportamento dos resultados a partir do board interlocking. No Brasil, as pesquisas abordam a temática com legitimidade e valor das empresas (Rossoni & Machado-da-Silva, 2013Rossoni, L., & Machado-da-Silva, C. L. (2013). Legitimidade, governança corporativa e desempenho: análise das empresas da BMFBovespa. Revista de Administração de Empresas, 53 (3), 272-289.), conexões políticas (Brey, Camilo, Marcon & Alberton, 2011Brey, N. K., Camilo, S. P. O., Marcon, R., & Alberton, A. (2011). A estrutura de propriedade das corporações: conexões políticas sob a perspectiva da dependência de recursos - um ensaio teórico.Revista Ibero-Americana de Estratégia, 10(3), 126-146.; Brey, Camilo, Marcon & Bandeira-de-Mello, 2012Brey, N. K., Camilo, S. P. O., Marcon, R., & Bandeira-de-Mello, R. (2012). Conexões políticas das empresas por estruturas de propriedade: uma abordagem do governo como acionista.RACE: Revista de Administração, Contabilidade e Economia, 11(2), 319-350.; Camilo, Marcon & Bandeira-de-Melo, 2012Camilo, S. P. O., Marcon, R., & Bandeira-de-Mello, R. (2012). Conexões políticas das firmas e seus efeitos na performance: uma convergência entre as perspectivas da governança e da dependência de recursos - um ensaio teórico.Revista Alcance, 19(2), 241-258.; Costa, Bandeira-de-Melo & Marcon, 2013Costa, M., Bandeira-de-Mello, R., & Marcon, R. (2013). Influência da conexão política na diversificação dos grupos empresariais brasileiros.Revista de Administração de Empresas, 53(4), 376-387.; Macedo, Silva & Machado, 2015Macedo, J. M. A., Silva, C. A. T., & Machado, M. A. V. (2015). Conexões políticas e as empresas brasileiras: um estudo experimental sobre as decisões de investimento no mercado de capitais. Advances in Scientific and Applied Accounting, 8(2), 157-178.), reputação das empresas (Rossoni & Guarrido, 2015Rossoni, L., & Guarido Filho, E. R. (2015). O que faz um nome? Status, conselho de administração e características organizacionais como antecedentes da reputação corporativa.Revista de Administração RAUSP,50(3), 292-309.) e gerenciamento de resultados (Ribeiro & Colauto, 2016Ribeiro, F., & Colauto, R. D. (2016). A relação entre board interlocking e as práticas de suavização de resultados. Revista Contabilidade & Finanças, 27(70), 55-66.).

Rossoni e Machado-da-Silva (2013Rossoni, L., & Machado-da-Silva, C. L. (2013). Legitimidade, governança corporativa e desempenho: análise das empresas da BMFBovespa. Revista de Administração de Empresas, 53 (3), 272-289.) avaliaram como a legitimidade condiciona o valor de mercado das empresas listadas na BM&FBOVESPA. Como origem da legitimidade cultural-cognitiva foi considerada a posição do conselho de administração da organização com base no board interlocking. Rossoni e Machado-da-Silva (2013Rossoni, L., & Machado-da-Silva, C. L. (2013). Legitimidade, governança corporativa e desempenho: análise das empresas da BMFBovespa. Revista de Administração de Empresas, 53 (3), 272-289.) argumentam que bons conselheiros tendem a participar de um maior número de organizações, sendo que a centralidade e posição desses conselheiros na rede revelam evidências de seus prestígios como executivos, ficando, assim, melhor posicionados na rede e com maior capacidade de acesso a informações e recursos privilegiados.

As pesquisas acerca das interconexões entre empresas no cenário nacional têm maior abrangência ao discuti-las pela perspectiva das conexões políticas. Brey et al. (2011Brey, N. K., Camilo, S. P. O., Marcon, R., & Alberton, A. (2011). A estrutura de propriedade das corporações: conexões políticas sob a perspectiva da dependência de recursos - um ensaio teórico.Revista Ibero-Americana de Estratégia, 10(3), 126-146.) observaram a relevância das conexões políticas de estrutura de propriedade para a sobrevivência das organizações. Adiante, Brey et al. (2012Brey, N. K., Camilo, S. P. O., Marcon, R., & Bandeira-de-Mello, R. (2012). Conexões políticas das empresas por estruturas de propriedade: uma abordagem do governo como acionista.RACE: Revista de Administração, Contabilidade e Economia, 11(2), 319-350.) retomam a discussão das conexões políticas sob a interação entre a Teoria da Estratégia Política corporativa e a Teoria da Agência, buscando aprofundar os efeitos das conexões políticas por meio da estrutura de propriedade e da presença do governo como acionista.

Camilo et al. (2012Camilo, S. P. O., Marcon, R., & Bandeira-de-Mello, R. (2012). Conexões políticas das firmas e seus efeitos na performance: uma convergência entre as perspectivas da governança e da dependência de recursos - um ensaio teórico.Revista Alcance, 19(2), 241-258.) estudaram as conexões políticas e seus efeitos no desempenho das empresas por meio de três proxies: doação à campanha política, contratação de membros com background em política para compor diretoria ou conselho e atividades de board interlocking. Costa et al. (2013Costa, M., Bandeira-de-Mello, R., & Marcon, R. (2013). Influência da conexão política na diversificação dos grupos empresariais brasileiros.Revista de Administração de Empresas, 53(4), 376-387.) verificaram a influência da conexão política na diversificação dos grupos empresariais brasileiros.

Macedo et al. (2015Macedo, J. M. A., Silva, C. A. T., & Machado, M. A. V. (2015). Conexões políticas e as empresas brasileiras: um estudo experimental sobre as decisões de investimento no mercado de capitais. Advances in Scientific and Applied Accounting, 8(2), 157-178.) verificaram a temática na perspectiva dos analistas, se estariam propensos a manter na sua carteira de investimentos empresas que têm conexões políticas explícitas.

Em abordagem quanto à reputação corporativa, Rossoni e Guarido (2015Rossoni, L., & Guarido Filho, E. R. (2015). O que faz um nome? Status, conselho de administração e características organizacionais como antecedentes da reputação corporativa.Revista de Administração RAUSP,50(3), 292-309.) analisaram como os mercados diferenciados (status), o conselho de administração e as características organizacionais condicionam a reputação das empresas brasileiras de capital aberto. Os autores mostram que uma das formas de avaliar o conselho está na estrutura de relações entre conselhos, caracterizada como board interlocking, na qual considera-se que bons conselheiros buscam participar em mais organizações, o que cria redes de relacionamentos que podem gerar prestígio.

Ainda no cenário nacional, a temática de board interlocking e gerenciamento de resultados ocorreu por meio do estudo de Ribeiro e Colauto (2016Ribeiro, F., & Colauto, R. D. (2016). A relação entre board interlocking e as práticas de suavização de resultados. Revista Contabilidade & Finanças, 27(70), 55-66.) ao relacionar o board interlocking do conselho de administração com o gerenciamento de resultados por meio da suavização de resultados, diferente do presente estudo, que verifica a influência do board interlocking no gerenciamento de resultados por meio da variação dos accruals discricionários pelo Modelo KS. Outras perspectivas ocorreram no cenário internacional, como os estudos de Carrera (2013Carrera, N. (2013). Audit committees’ interlocks and financial reporting Quality. In 36º Annual Congress European Accounting Association, Paris, France.), Chiu et al. (2013Chiu, P. C., Teoh, S. H., & Tian, F. (2013). Board interlocks and earnings management contagion. The Accounting Review, 88(3), 915-944.), Mindzak (2013Mindzak, J. (2013). Interlocked boards of directors, voluntary disclosures and earnings quality. Voluntary disclosures and earnings quality. InCAAA Annual Conference, School of Business Economics. Montreal, Canadá.) e Shi et al. (2013Shi, L., Dharwadkar, R., & Harris, D. (2013). Board interlocks and earnings quality [Working Paper]. Social Science Research Network. Recuperado de http://www1.american.edu/academic.depts/ksb/finance_realestate/mrobe/Seminar/dharwakar.pdf.
http://www1.american.edu/academic.depts/...
).

Chiu et al. (2013Chiu, P. C., Teoh, S. H., & Tian, F. (2013). Board interlocks and earnings management contagion. The Accounting Review, 88(3), 915-944.) encontraram fortes evidências de que o gerenciamento de resultados é transmitido de empresa para empresa a partir do relacionamento externo dos membros do conselho de administração, chief executive officer (CEO) e membros do comitê de auditoria. Utilizaram a regressão de dados em painel com a identificação das redes de relacionamento a partir das centralidades de grau, intermediação e proximidade. Carrera (2013Carrera, N. (2013). Audit committees’ interlocks and financial reporting Quality. In 36º Annual Congress European Accounting Association, Paris, France.) relacionou o interlocking do comitê de auditoria e do conselho de administração ao gerenciamento de resultados a partir de 13.065 observações de empresas americanas do período de 2003 a 2010 e concluiu que as centralidades medidas pelo interlocking dos conselheiros estão associadas positivamente ao gerenciamento de resultados.

Mindzak (2013Mindzak, J. (2013). Interlocked boards of directors, voluntary disclosures and earnings quality. Voluntary disclosures and earnings quality. InCAAA Annual Conference, School of Business Economics. Montreal, Canadá.) analisou a formação de board interlocking e o gerenciamento de resultados em empresas canadenses. Após analisar 120 médias empresas, foi possível afirmar que as empresas interligadas apresentaram menor gerenciamento de resultados que as empresas não interligadas, ou seja, os membros do conselho, quando interligados, refletem de maneira positiva na qualidade dos resultados e no desempenho de longo prazo da empresa. Shi et al. (2013Shi, L., Dharwadkar, R., & Harris, D. (2013). Board interlocks and earnings quality [Working Paper]. Social Science Research Network. Recuperado de http://www1.american.edu/academic.depts/ksb/finance_realestate/mrobe/Seminar/dharwakar.pdf.
http://www1.american.edu/academic.depts/...
) buscaram relacionar o interlocking do comitê de auditoria e do conselho de administração com o gerenciamento de resultados. Para os autores, os resultados são fortemente inconsistentes com a ideia de que empresas semelhantes simplesmente selecionam diretor semelhante (incluindo o mesmo diretor) e fortemente consistente com a teoria de redes de transferência de informação. Os achados dos autores suportam a hipótese de que as empresas não precisam pertencer a um mesmo setor ou ramo de atividade para que haja o board interlocking.

2.2 Gerenciamento de Resultados

Observa-se que o gerenciamento de resultados tem se tornado um dos principais temas na área da contabilidade e finanças nas últimas décadas (Santos & Paulo, 2006Santos, A., & Paulo, E. (2006). Diferimento das perdas cambiais como instrumento de gerenciamento de resultados.BBR-Brazilian Business Review, 3 (1), 15-31.). Por outro lado, Trapp (2009Trapp, A. C. G. (2009). A relação do conselho fiscal como componente do controle no gerenciamento de resultados contábeis (Tese de Doutorado) Ciências Contábeis, Universidade de São Paulo, São Paulo.) salienta que há extensa literatura internacional sobre o tema, e que no Brasil tornou-se objeto de estudos a partir de Martinez (2001Martinez, A. L. (2001). Gerenciamento dos resulta dos contábeis: estudo empírico das companhias abertas brasileiras (Tese de Doutorado). Ciências Contábeis, Universidade de São Paulo, São Paulo.).

Gerenciamento de resultado, conforme definição de Schipper (1989Schipper, K. (1989). Commentary on earnings management. Accounting horizons, 3 (4), 91-102., p. 92), é a “intervenção proposital no processo de informação das demonstrações financeiras externas, com a intenção de obter algum benefício particular (contrário ao processo neutro de reportar resultados financeiros)”. Schipper (1989Schipper, K. (1989). Commentary on earnings management. Accounting horizons, 3 (4), 91-102.) comenta que sua definição limita a discussão sobre gerenciamento de resultados quando inclui apenas a comunicação externa dos demonstrativos contábeis, não fazendo menção a demonstrações de caráter gerencial.

Sob a perspectiva de Roychowdhury (2006Roychowdhury, S. (2006). Earnings management through real activities manipulation. Journal of Accounting and Economics, 42(3), 335-370. ), tem-se o gerenciamento das atividades operacionais, em que os gestores buscam desenvolver ações que se desviam das melhores práticas gerenciais, com objetivo de reportar resultados melhores em um contexto diferente, atendendo às suas possíveis necessidades. Para o autor, as decisões a partir das atividades operacionais afetam o fluxo de caixa da empresa e podem também afetar os accruals discricionários. Nessa mesma vertente de pensamento, Kuo, Ning e Song (2014Kuo, J. M., Ning, L., & Song, X. (2014). The real and accruals-based earning management behaviors: evidence from the split share structure reform in China. The International Journal of Accounting, 49(1), 101-136.) abordam que o gerenciamento a partir das atividades operacionais está relacionado a mecanismos de governança, em que uma governança forte e eficaz tende a aumentar a proteção dos investidores e a qualidade das informações financeiras, intensificando o controle no mercado de capitais.

Para Martinez (2001Martinez, A. L. (2001). Gerenciamento dos resulta dos contábeis: estudo empírico das companhias abertas brasileiras (Tese de Doutorado). Ciências Contábeis, Universidade de São Paulo, São Paulo.), é importante entender que o gerenciamento dos resultados não é fraude contábil, isto é, utiliza-se da discricionariedade do gestor quando da faculdade da norma em aplicar esse ou aquele procedimento, realizando escolhas contábeis não no que se refere à realidade dos negócios, mas em função de incentivos que os levam a desejar resultado diferente.

Apesar de não englobar fraudes e atos ilícitos, o gerenciamento de resultados pode afetar negativamente a função primordial das demonstrações contábeis, que é prover informações úteis e confiáveis ao processo decisório dos usuários (Fuji, 2004Fuji, A. H. (2004). Gerenciamento de resultados contábeis no âmbito das instituições financeiras atuantes no Brasil (Dissertação de Mestrado). Ciências Contábeis, Universidade de São Paulo, São Paulo.) em que o lucro é um dos vários sinais utilizados na tomada de certas decisões e julgamentos.

Ante ao exposto, a diferença entre a contabilidade pelo regime de caixa e a contabilidade pelo regime de competência reside no aspecto temporal de reconhecimento de receitas e despesas, apresentando uma diferença denominada accruals. Para Martinez (2001Martinez, A. L. (2001). Gerenciamento dos resulta dos contábeis: estudo empírico das companhias abertas brasileiras (Tese de Doutorado). Ciências Contábeis, Universidade de São Paulo, São Paulo., p.16), accruals se definem como “a diferença entre o lucro líquido e o fluxo de caixa líquido”, ou seja, seriam “todas as contas de resultado que entram no cômputo do lucro, mas não implicam em necessária movimentação de disponibilidades”.

A literatura tem abordado, desde Healy (1985Healy, P. M. (1985). The effect of bonus schemes on accounting decisions. Journal of Accounting and Economics, 7(1), 85-107.), a metodologia de verificação dos accruals totais, os quais são divididos em discricionários e não discricionários. Para Goulart (2007Goulart, A. M. C. (2007). Gerenciamento de resultados contábeis em instituições financeiras no Brasil (Tese de Doutorado). Ciências Contábeis, Universidade de São Paulo, São Paulo., p. 43), “são considerados discricionários quando dependem do julgamento do gestor e não discricionários quando independem do julgamento do preparador de demonstrações financeiras”. A escolha do método de depreciação é discricionária e é nos accruals discricionários que se podem encontrar componentes de gerenciamento de resultados, quando na verdade sua utilização deveria ser a de prestar ao mercado informações verídicas sobre a empresa (Trapp, 2009Trapp, A. C. G. (2009). A relação do conselho fiscal como componente do controle no gerenciamento de resultados contábeis (Tese de Doutorado) Ciências Contábeis, Universidade de São Paulo, São Paulo.).

A utilização dos accruals discricionários como medida de gerenciamento de resultados é que quanto maior os accruals, mais forte ou evidente a prática de gerenciamento. Dessa forma, sendo os accruals positivos (negativos), constata-se o interesse em aumentar (reduzir) o lucro ou melhorar (piorar) o resultado (Goulart, 2007Goulart, A. M. C. (2007). Gerenciamento de resultados contábeis em instituições financeiras no Brasil (Tese de Doutorado). Ciências Contábeis, Universidade de São Paulo, São Paulo.). Nesse sentido, Martinez (2001Martinez, A. L. (2001). Gerenciamento dos resulta dos contábeis: estudo empírico das companhias abertas brasileiras (Tese de Doutorado). Ciências Contábeis, Universidade de São Paulo, São Paulo.) complementa que as acumulações discricionárias têm como propósito gerenciar os resultados contábeis.

Para encontrar os accruals totais (accruals discricionários e não discricionários), eles podem ser calculados a partir de informações extraídas do Balanço Patrimonial, da Demonstração do Resultado e da Demonstração do Fluxo de Caixa (Goulart, 2007Goulart, A. M. C. (2007). Gerenciamento de resultados contábeis em instituições financeiras no Brasil (Tese de Doutorado). Ciências Contábeis, Universidade de São Paulo, São Paulo.; Martinez, 2001Martinez, A. L. (2001). Gerenciamento dos resulta dos contábeis: estudo empírico das companhias abertas brasileiras (Tese de Doutorado). Ciências Contábeis, Universidade de São Paulo, São Paulo.; Paulo, 2007Paulo, E. (2007). Manipulação das informações contábeis: uma análise teórica e empírica sobre os modelos operacionais de detecção de gerenciamento de resultados (Tese de Doutorado). Ciências Contábeis, Universidade de São Paulo, São Paulo.), em que diversos modelos podem ser utilizados para medir a variação dos accruals discricionários, porém não há um que possa ser considerado perfeito. Neste estudo utiliza-se o Modelo KS.

Para Martinez (2001Martinez, A. L. (2001). Gerenciamento dos resulta dos contábeis: estudo empírico das companhias abertas brasileiras (Tese de Doutorado). Ciências Contábeis, Universidade de São Paulo, São Paulo.), talvez por envolver grande número de variáveis e dados, o Modelo KS é considerado o mais completo, tanto no sentido contábil, por descrever mais eficientemente o processo de definição dos accruals, como no aspecto ligado à precisão estatística. Entretanto, para Martinez (2011), uma das maiores dificuldades da adoção do modelo é a preparação dos dados para a regressão múltipla, por sua robustez e quantidade de dados contábeis exigidos a serem coletados.

Ainda para Martinez (2008Martinez, A. L. (2008). Detectando earnings management no Brasil: estimando os accruals discricionários. Revista Contabilidade & Finanças, 19(46), 7-17., p.12), “o Modelo KS é, no estado da arte atual, aquele que proporciona os melhores resultados”, em consonância com Thomas e Zhang (2001Thomas, J., & Zhang, X. (2001). Identifying unexpected accruals: a comparison of current approaches. Journal of Accounting and Public Policy, 19(4), 347-376., p.364), os quais revisaram seis modelos de gerenciamento de resultados e concluíram também que o Modelo KS é o mais preciso e que melhor se ajusta ao tratamento dos dados.

2.3 Board Interlocking e Gerenciamento de Resultados

A governança corporativa apresenta mecanismos que contribuem para o monitoramento dos gestores, em que o conselho de administração é considerado como um dos principais. Esse mecanismo possui a responsabilidade de implantar e acompanhar diretrizes estratégicas e decisões relevantes nas empresas (Santos & Silveira, 2007Santos, R. L., & Silveira, A. D. M. D. (2007). Board interlocking no Brasil: a participação de conselheiros em múltiplas companhias e seu efeito sobre o valor das empresas. Revista Brasileira de Finanças, 5(2), 125-163.).

Quando as empresas possuem alinhamento de estratégias com outras, tendem a compartilhar membros do conselho de administração e, por sua vez, podem adotar práticas organizacionais semelhantes (Ribeiro & Colauto, 2016Ribeiro, F., & Colauto, R. D. (2016). A relação entre board interlocking e as práticas de suavização de resultados. Revista Contabilidade & Finanças, 27(70), 55-66.). Esse fenômeno ocorre, de acordo com Chiu et al. (2013Chiu, P. C., Teoh, S. H., & Tian, F. (2013). Board interlocks and earnings management contagion. The Accounting Review, 88(3), 915-944.), devido à observação do comportamento em relação à adoção de determinada ação ou resultado gerado pela ação escolhida. As empresas podem adotar práticas organizacionais semelhantes a outras pelos vínculos sociais criados e observação de ações e resultados adotados por essas. Somado a isso, os vínculos sociais criados pelas empresas, originados pelo compartilhamento de conselheiros, podem favorecer a partilha de informações entre as empresas e a propagação de práticas organizacionais diferenciadas.

Dentre as práticas organizacionais diferenciadas, tem-se a prática de gerenciamento de resultados, a qual pode ser realizada por diferentes tipos, tais como: target earnings, income smoothing, big bath accounting (Martinez, 2008Martinez, A. L. (2008). Detectando earnings management no Brasil: estimando os accruals discricionários. Revista Contabilidade & Finanças, 19(46), 7-17.), observados pelas acumulações discricionárias das empresas (diferença entre lucro líquido e fluxo de caixa operacional) (Mendes-Da-Silva, Onusic & Bergmann, 2014Mendes-Da-Silva, W., Onusic, L. M., & Bergmann, D. R. (2014). The influence of e-disclosure on the ex-ante cost of capital of listed companies in Brazil. Journal of Emerging Market Finance, 13 (3), 335-365.) ou por decisões operacionais que influenciam o caixa da empresa (Martinez & Cardoso, 2009Martinez, A. L., & Cardoso, R. L. (2009). Gerenciamento da informação contábil no Brasil mediante decisões operacionais. Revista Eletrônica de Administração, 15(3), 600-626.).

Destaca-se que mecanismos de governança corporativa e compartilhamento de conselheiros do conselho de administração podem influenciar na adoção de práticas organizacionais diferenciadas pelas empresas em que uma dessas práticas refere-se ao gerenciamento de resultados. De acordo com Ribeiro e Colauto (2016Ribeiro, F., & Colauto, R. D. (2016). A relação entre board interlocking e as práticas de suavização de resultados. Revista Contabilidade & Finanças, 27(70), 55-66.), o compartilhamento de conselheiros entre as empresas favorece a propagação do gerenciamento de resultados tanto por decisões operacionais, quanto por práticas discricionárias relacionadas ao lucro. Dessa forma, autores internacionais e nacionais têm-se preocupado com essa temática, investigando a relação entre os mecanismos da governança corporativa e o board interlocking com os diferentes tipos de gerenciamento de resultados.

Dechow e Skinner (2000Dechow, P. M., & Skinner, D. J. (2000). Earnings management: reconciling the views of accounting academics, practitioners, and regulators. Accounting Horizons, 14(2), 235-250.) argumentam que organizações com estrutura de governança fraca possuem maior tendência para desenvolverem práticas de gerenciamento de resultados. A pesquisa de Xie, Davidson e Dadalt (2003Xie, B., Davidson, W. N., & Dadalt, P. J. (2003). Earnings management and corporate governance: the role of the board and the audit committee. Journal of Corporate Finance, 9(3 ), 295-316.) teve o objetivo de examinar o papel do conselho de administração, do comitê de auditoria e do comitê executivo na prevenção do gerenciamento de resultados. Os achados permitiram inferir que o conselho de administração, os membros do comitê de auditoria e as atividades realizadas pelos comitês de auditoria são fatores relevantes que limitam a predisposição dos administradores de se envolverem em gerenciamento de resultados.

No estudo de Chen, Elder e Hsieh (2007Chen, K. Y., Elder, R. J., & Hsieh, Y. M. (2007). Corporate governance and earnings management: the implications of corporate governance best-practice principles for Taiwanese listed companies. Journal of Contemporary Accounting Economics, 3(2), 73-105.), o propósito foi investigar se as características da governança corporativa estão associadas ao gerenciamento de resultados nas empresas sediadas em Taiwan. Dentre os resultados, observaram que a independência e a expertise do conselho de administração estão associadas à menor probabilidade da realização do gerenciamento de resultados. Além disso, o estudo revelou que após a promulgação dos princípios das boas práticas de governança corporativa implicou-se na redução de gerenciamento de resultados.

Quanto aos estudos que avaliaram a relação entre o compartilhamento de membros do conselho de administração (board interlocking) e o gerenciamento de resultados, Chiu et al. (2013Chiu, P. C., Teoh, S. H., & Tian, F. (2013). Board interlocks and earnings management contagion. The Accounting Review, 88(3), 915-944.) avaliaram se o gerenciamento de resultados (por contas discricionárias) se propaga de empresa para empresa por meio de conexões do conselho de administração em empresas dos Estados Unidos da América. Os resultados demonstram que empresas com compartilhamento de membros do conselho de administração são mais suscetíveis de manipular os resultados. Verificaram, também, que a propagação da prática de gerenciamento de resultados dentre as empresas com board interlocking é mais intensa quando há compartilhamento de membros com posição de liderança, como presidente do conselho.

No contexto nacional, Ribeiro e Colauto (2016Ribeiro, F., & Colauto, R. D. (2016). A relação entre board interlocking e as práticas de suavização de resultados. Revista Contabilidade & Finanças, 27(70), 55-66.) analisaram a relação entre o board interlocking e o gerenciamento de resultados (income smoothing) de empresas listadas no Índice Bovespa. Os achados evidenciaram fortes indícios de que o board interlocking influencia as empresas a manipular seus resultados por meio do income smoothing. De maneira geral, constataram que empresas que compartilham conselheiros com outras organizações possuem práticas diferenciadas de gerenciamento de resultados que comprometem a qualidade das informações contábeis divulgadas.

Dado esse contexto, observa-se, com evidências empíricas de pesquisas nacionais e internacionais, que a governança corporativa e o board interlocking influenciam na adoção de práticas diferenciadas de gerenciamento de resultados. Em relação ao board interlocking, esse se demonstra associado com a propagação do gerenciamento de resultados entre as empresas que compartilham membros do conselho de administração, o que sugere a construção das hipóteses.

2.4 Construção das Hipóteses

Connelly et al. (2011Connelly, B. L., Johnson, J. L., Tihanyi, L. & Ellstrand, A. E. (2011). More than adopters: competing influences in the interlocking directorate. Organization Science, 22(3), 688-703. ) destacam que o interlocking tem por objetivo o compartilhamento de conhecimento e de informações, desempenhando papel fundamental na determinação de estratégias das empresas, superando as incertezas dos investidores.

Para Borgatti e Foster (2003Borgatti, S. P., & Foster, P. C. (2003). The network paradigm in organizational research: a review and typology.Journal of Management, 29(6), 991-1013.), a redução de incertezas também está associada a escolhas estratégicas em que o board interlocking surge como elemento essencial, fazendo com que os conselheiros observem o comportamento de outras empresas, ficando propensos a imitar e aprender com o sucesso ou fracasso delas. Nesse sentido, o compartilhamento de conselheiros e de boas práticas contábeis e de governança reflete no desempenho da empresa e acaba por aumentar o seu valor de mercado, beneficiando assim seus acionistas (Yeo, Pochet & Alcouffe, 2003Yeo, H. J., Pochet, C., & Alcouffe, A. (2003). CEO reciprocal interlocks in French corporations.Journal of Management and Governance, 7(1), 87-108.).

Gulati e Westphal (1999Gulati, R., & Westphal, J. D. (1999). Cooperative or controlling? The effects of CEO-board relations and the content of interlocks on the formation of joint ventures.Administrative Science Quarterly, 44(3), 473-506.) apontam que o board interlocking oferece oportunidade única de ligação para troca de informações e observação de práticas de liderança e estilo de seus pares, testemunhando em primeira mão as consequências dessas práticas, e que quanto maior o grau central dos membros do conselho de administração, maior a probabilidade de cooperação estratégica entre as empresas.

Para Gulati e Westphal (1999Gulati, R., & Westphal, J. D. (1999). Cooperative or controlling? The effects of CEO-board relations and the content of interlocks on the formation of joint ventures.Administrative Science Quarterly, 44(3), 473-506.), o board interlocking é tratado de forma positiva, facilitando a coesão e a troca de informações entre as empresas, ignorando a heterogeneidade à medida que o canal de informações gera confiança entre os membros do conselho. Portanto entende-se que quanto maior o número de ligações entre as empresas, maior será a troca de informações e de experiências, podendo melhorar inclusive as práticas contábeis adotadas. Wasserman e Faust (1994Wasserman, S., & Faust, K. (1994). Social network analysis: methods and applications. Cambridge, MA: Cambridge University Press.) afirmam que o número de ligações entre os atores de uma rede é medido pela centralidade de grau. Uma das principais medidas de centralidade utilizadas em pesquisas sociais é a medida de centralidade de grau (degree). Freeman (1979Freeman, L. C. (1979). Centrality in social networks conceptual clarification. Social Networks, 1(3), 215-239.) destaca que a degree é simples, medida pelo número de ligações diretas que envolvem um determinado nó ou membro da rede. A centralidade de grau é a mais simples e mais direta das medidas de centralidade, ou seja, demonstra o número de ligações que um ator, no caso um membro do conselho de administração, possui com os demais conselheiros da rede.

Diante das considerações que a partir do board interlocking há o compartilhamento de informações e que, segundo Carrera (2013Carrera, N. (2013). Audit committees’ interlocks and financial reporting Quality. In 36º Annual Congress European Accounting Association, Paris, France.), há relação positiva entre centralidade de grau e gerenciamento de resultados, indicando que quanto maior o número de conexões entre conselheiros, maior o nível de gerenciamento, têm-se as seguintes hipóteses:

H1a: quanto maior a centralidade de grau, maior o gerenciamento de resultados positivos;

H1b: quanto maior a centralidade de grau, maior o gerenciamento de resultados negativos.

Outra medida de centralidade normalmente utilizada em pesquisas de redes é a medida de centralidade de intermediação. A centralidade de intermediação tem por objetivo interligar atores que não se conectam diretamente, demonstrando a importância que têm esses atores intermediários ao canalizarem o fluxo de informações aos demais atores da rede (Freeman, 1979Freeman, L. C. (1979). Centrality in social networks conceptual clarification. Social Networks, 1(3), 215-239.). A partir da centralidade de intermediação, pequenas empresas tendem a se interligar a grandes empresas a fim de reduzir incertezas de estratégias. A intermediação de conselhos interligados canaliza informações às empresas centrais a partir do caminho mais curto entre os atores da rede (Elouaer-Mrizak & Chastand, 2013Elouaer-Mrizak, S., & Chastand, M. (2013). Detecting communities within French intercorporate network.Procedia-Social and Behavioral Sciences, 79, 82-100. ).

O uso da centralidade de intermediação pode ser considerado uma das medidas mais poderosas sobre a intensidade da relação entre as empresas (Elouaer-Mrizak & Chastand, 2013Elouaer-Mrizak, S., & Chastand, M. (2013). Detecting communities within French intercorporate network.Procedia-Social and Behavioral Sciences, 79, 82-100. ). Empresas interligadas por meio do board interlocking são potencialmente fios condutores na partilha de informação que pode levar a comportamentos de gerenciamento de resultados (Chiu et al., 2013Chiu, P. C., Teoh, S. H., & Tian, F. (2013). Board interlocks and earnings management contagion. The Accounting Review, 88(3), 915-944.). Para Carrera (2013Carrera, N. (2013). Audit committees’ interlocks and financial reporting Quality. In 36º Annual Congress European Accounting Association, Paris, France.), a variação do nível de gerenciamento de resultados está relacionada com o grau de intermediação dos membros da rede. Como se percebe, uma vez que conselheiros pertencem simultaneamente a outros conselhos, eles têm oportunidade de se comunicar e de trocar informações. A partir da centralidade de intermediação, de forma indireta, também há o compartilhamento de informações e de práticas de contabilidade, o que nos remete a testar também as seguintes hipóteses:

H2a: quanto maior a centralidade de intermediação, maior o gerenciamento de resultados positivos;

H2b: quanto maior a centralidade de intermediação, maior o gerenciamento de resultados negativos.

3. MÉTODOS E PROCEDIMENTOS DA PESQUISA

3.1 População e Amostra

A pesquisa se caracteriza como descritiva, quantitativa e documental. A população é composta por empresas não financeiras que compõem o mercado de capitais brasileiro nos anos de 2011 a 2013, totalizando 358 empresas distribuídas em nove setores distintos, conforme classificação da BM&FBOVESPA.

A amostra foi constituída a partir de pesquisa realizada nos Formulários de Referência, no item 12.6/8 das 358 empresas, disponível no site da BM&FBOVESPA. Iniciou-se com a tabulação das empresas e dos membros ativos no conselho de administração. Após, foram identificadas as empresas que tinham membros de seu conselho de administração com participação em conselhos de administração de outras empresas, de forma que se constituísse a amostra da pesquisa para o board interlocking.

Constatou-se que 246 empresas possuíam, em seus conselhos de administração, um ou mais membros que participavam em conselhos de administração de outras empresas, ocorrendo, dessa forma, o board interlocking.

Dessas 246 empresas, verificou-se que algumas não apresentaram todas as informações necessárias para a aplicação do Modelo KS para cálculo de gerenciamento de resultados, o que resultou em uma amostra de 185 empresas para 2011, 202 para 2012 e 201 para 2013. A partir da Tabela 1, apresentam-se a população e a amostra do estudo.

Tabela 1
População e amostra da pesquisa

Observa-se, pela Tabela 1, que é considerável a participação dos membros dos conselhos de administração em mais de uma empresa. Das 358 empresas não financeiras, 246 possuem em seus conselhos um ou mais membros pertencentes a conselhos de administração de outras empresas, ou seja, aproximadamente 68% das empresas não financeiras listadas na BM&FBOVESPA possuem características de formação de board interlocking.

Percebe-se que o setor com maior prática de interlocking é o setor de utilidade pública, sendo representado por quase 83%, em que 61 empresas foram identificadas com características de conselhos interconectados. Por outro lado, o setor de menor proporção na amostra é o de tecnologia da informação, apresentando percentual de 33% das empresas.

3.2 Variáveis da Pesquisa

Para a realização da pesquisa utilizou-se o modelo de regressão de dados em painel representado pela regressão descrita na equação 1. As variáveis, tanto dependente como independentes, foram obtidas a partir de cada empresa (i) e para cada ano analisado (t).

A variável dependente ACDit (accruals discricionários da empresa i no ano t) é encontrada por meio da equação 2 (Modelo KS).

em que ATit = accruals totais da empresa i no período t, ponderados pelos ativos totais no final do período t-1; Rit = receitas líquidas da empresa i no período t, ponderadas pelos ativos totais no final do período t-1; Dit = montante dos custos e despesas operacionais da empresa i no período t, excluídas as despesas com depreciação e amortização, ponderadas pelos ativos totais no final do período t-1; PPEit = saldo das contas do ativo imobilizado (bruto) da empresa i no final do período t, ponderadas pelos ativos totais no final do período t-1; δ1,it = CRi,t-1/Ri,t-1 ; δ2,it = (INVi,t-1 + DespAnteci,t-1 + CPi,t-1)/Di,t-1 ; δ3,it = Depri,t-1/PPEi,t-1 ; CRi,t-1 = saldo da conta duplicatas a receber (clientes) da empresa i no período t-1; Ri,t-1 = receitas líquidas da empresa i no período t-1; INVi,t-1 = saldo da conta estoques da empresa i no período t-1; DespeAnteci,t-1 = saldo da conta despesas antecipadas da empresa i, no período t-1; CPi,t-1 = saldo das contas a pagar no curto prazo da empresa i no período t-1; Depri,t-1 = montante de despesas com depreciação e amortização da empresa i no período t-1; PPEi,t-1 = saldo das contas do ativo imobilizado e ativo diferido (bruto) empresa i no final do período t-1; ϕ0, ϕ1, ϕ2 e ϕ3 = coeficientes estimados da regressão; εit = erro da regressão (resíduos = gerenciamento de resultado).

Para melhor operacionalização das variáveis independente mencionadas na equação 1, elaborou-se um constructo (Tabela 2) com as respectivas variáveis utilizadas e a operacionalização das mesmas.

Tabela 2
Constructo da pesquisa

3.3 Coleta e Análise dos Dados

A coleta de dados para as variáveis das equações 1 e 2 ocorreu por meio do Formulário de Referência e da consulta à base de dados da Economática®. Especificamente para a identificação do conselho de administração, utilizaram-se as informações contidas nos Formulários de Referência disponibilizados no site da BM&FBOVESPA. Consultaram-se, em cada Formulário de Referência de cada empresa, os membros efetivos do conselho de administração de cada ano pesquisado, a fim de possibilitar a identificação da formação das redes das empresas por meio do interlocking de seus membros. Posteriormente, com auxílio de planilha eletrônica, foram criadas matrizes quadráticas, auxiliando na identificação das conexões entre empresas. Em seguida à criação das matrizes, utilizou-se o software UCINET®6 na formação das redes sociais e identificação do grau de centralidade e de intermediação das empresas.

Para compor as variáveis utilizadas no Modelo KS (equação 2) de gerenciamento de resultados, todas as variáveis foram coletadas do banco de dados Economática® e, das variáveis de controle, analisaram-se os Formulário de Referência, banco de dados Economática® e site da BM&FBOVESPA. A Tabela 3 especifica o item analisado para cada variável de controle.

Tabela 3
Coleta de dados das variáveis de controle

Para análise de regressão de dados em painel, duas etapas foram realizadas. A primeira foi a aplicação da regressão linear múltipla para a métrica do Modelo KS de gerenciamento de resultados a fim de se identificar o nível dos accruals das empresas em cada ano do estudo, utilizando-se o software SPSS® 21.0. Na segunda etapa, a partir da identificação do interlocking dos membros do conselho de administração das 246 empresas, utilizou-se o software UCINET®6 para a caracterização das redes e identificação das medidas de centralidade de grau e de intermediação. Após essas duas etapas realizou-se a regressão de dados em painel, para o qual se utilizou o software Stata®13.0.

4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Esta seção apresenta os resultados da influência do gerenciamento de resultados e as medidas de centralidades a partir da técnica estatística de regressão de dados em painel. O método de análise regressão de dados em painel é semelhante ao utilizado por Carrera (2013Carrera, N. (2013). Audit committees’ interlocks and financial reporting Quality. In 36º Annual Congress European Accounting Association, Paris, France.), Mendes-Da-Silva, Rossoni, Martin e Martelanc (2008Mendes-Da-Silva, W., Rossoni, L., Martin, D. M. L., & Martelanc, R. (2008). A influência das redes de relações corporativas no desempenho das empresas do Novo Mercado da BOVESPA. Revista Brasileira de Finanças, 6(3), 337-358.) e Ribeiro e Colauto (2016Ribeiro, F., & Colauto, R. D. (2016). A relação entre board interlocking e as práticas de suavização de resultados. Revista Contabilidade & Finanças, 27(70), 55-66.).

A fim de possibilitar a realização de duas regressões e identificar da melhor forma a influência do interlocking e o gerenciamento de resultados, foram separados os resultados dos accruals positivos dos negativos, por ano e por setor de atuação, sendo que no acumulado dos três anos têm-se 261 empresas com identificação de accruals positivos e 327 com accruals negativos, totalizando 588 observações no período de análise, como observado na Tabela 4.

Tabela 4
Accruals discricionários segregados em positivos e negativos

Ao observar a Tabela 4 em relação ao ano de 2011, nota-se que os setores de construção e transportes e consumo cíclico apresentam maior número de empresas com accruals positivos. Em 2012, inclui-se o setor de consumo não cíclico, no qual as empresas também apresentaram tendência a gerenciamento positivo de resultados. Ao analisar o ano de 2013, observa-se que o resultado é o mesmo encontrado em 2011, em que os setores de construção e transporte e consumo cíclico apresentaram maior número de empresas com gerenciamento de resultados positivos observados por meio dos accruals discricionários.

Dessa forma, verifica-se que os setores de construção e transporte e consumo cíclico foram os setores que mantiveram a prática de gerenciamento de resultados positivos ao longo do período analisado.

Quando se observa a prática de gerenciamentos de resultados negativos, resultado semelhante com a prática de gerenciamento de resultados positivos é encontrado no que se refere aos setores. Em 2011, o setor de utilidade pública figura com maior número de empresas com práticas de gerenciamento de resultados negativos, seguido pelos de construção e transporte e consumo. Tal cenário se repete em 2012. Porém, para 2013 mantêm-se os setores de utilidade pública e construção e transporte e tem-se o setor de consumo não cíclico com um dos setores com maior prática de gerenciamento de resultados negativos.

De maneira geral, nota-se que, independente do setor de atuação, por meio do Modelo KS, as empresas gerenciam seus resultados de um ano para outro; porém a Tabela 4 mostra que, nos três anos analisados, as empresas buscaram reportar mais prejuízos, gerenciando negativamente seus resultados.

Posterior a essa análise, foram realizadas duas regressões de dados em painel, em que a primeira refere-se aos accruals positivos e a segunda aos accruals negativos, ambas se relacionando ao board interlocking e às demais variáveis de controle, a fim de testar as hipóteses estabelecidas no estudo. Os resultados dessas regressões estão demonstrados na Tabela 5.

Tabela 5
Gerenciamento de resultados: dados em painel de accruals positivos e negativos

Na Tabela 5, observa-se estatisticamente que os accruals são influenciados pelas variáveis de centralidade de grau (accruals positivos), centralidade de intermediação (accruals positivos e negativos), tamanho do ativo (accruals negativos), independência (accruals positivos), tamanho do conselho (accuals positivos e negativos) e número de reuniões do conselho (accruals positivos). Além desses resultados, com intuito de dar maior robustez aos achados (Wooldridge, 2010Wooldridge, J. M. (2010). Econometric analysis of cross section and panel data (2a. ed.). Cambridge, MA: The MIT Press.), os testes de pressupostos foram verificados para ambos os modelos de regressão. Os resultados apontaram para a confirmação de todos os pressupostos de normalidade dos resíduos, homoscedasticidade, autocorrelação serial e multicolinearidade. Destaca-se também que nenhuma variável é fortemente correlacionada com as medidas de accruals, confirmando, assim, que o modelo de estimação dos parâmetros é robusto e fundamenta os resultados da pesquisa.

Como esperado e semelhante ao resultado de Carrera (2013Carrera, N. (2013). Audit committees’ interlocks and financial reporting Quality. In 36º Annual Congress European Accounting Association, Paris, France.), nota-se pela Tabela 5 que as centralidades de grau (DEGREE_C) e de intermediação (BTWN_C) exercem influência sobre a prática de gerenciamento de resultados, tanto para accruals positivos quanto para negativos. Em relação aos accruals positivos, a centralidade de grau (DEGREE_C) apresenta-se estatisticamente significativa (= 0,0365; p < 0,05), ensejando que quanto maior a centralidade de grau, maior o gerenciamento positivo de resultados, o que significa que as empresas mais centrais, por meio de seus membros do conselho de administração, buscam gerenciar positivamente seus lucros. Isso sugere que as empresas têm suas práticas de gerenciamento de resultados positivos perpetuados diretamente a outras empresas por meio dos membros dos conselhos de administração. Para Carrera (2013), quanto maior a centralidade de grau (DEGREE_C), maior o nível de variação de accruals e, de acordo com os resultados da pesquisa, à medida que aumenta a centralidade de grau, há probabilidade de as empresas gerenciarem de forma positiva os seus resultados.

Quanto à centralidade de intermediação, a mesma apresenta-se estatisticamente significativa ( = 0,2231 and = 0,3029; p < 0,01) em relação ao gerenciamento positivo e negativo de resultados, indicando que laços indiretos entre as empresas, originados a partir dos membros do conselho de administração, influenciam na qualidade do resultado das empresas. Nesse caso, denota-se que práticas de gerenciamento de resultados positivos e negativos são perpetuadas indiretamente entre empresas por meio de um conselheiro comum entre membros de conselhos de administração de empresas distintas. Os resultados se assemelham ao estudo de Ribeiro e Colauto (2016Ribeiro, F., & Colauto, R. D. (2016). A relação entre board interlocking e as práticas de suavização de resultados. Revista Contabilidade & Finanças, 27(70), 55-66.), que também identificaram relação estatisticamente positiva entre a centralidade de intermediação dos membros do conselho de administração e a prática de suavização de resultados e, a partir disso, a probabilidade de as empresas estarem gerenciando seus resultados.

É importante destacar, como limitação deste estudo, a possível presença de endogeneidade na relação observada entre as variáveis de board interlocking e gerenciamento de resultados, visto que características dos conselhos de administração, como a presença de investidores institucionais, grandes bancos e do próprio governo, por exemplo, poderiam estar influenciando tanto nas práticas de gerenciamento de resultado como nas conexões do board. Tais características dos membros dos conselhos não foram investigadas no presente estudo, constituindo-se em uma oportunidade de pesquisa.

A variação positiva de accruals, como se apresenta na Tabela 5, é influenciada estatisticamente ( = 0,6139 and = -0,0067; p < 0,05) pela independência (INDEP) e pelo tamanho do conselho de administração (SIZE), respectivamente. Em relação à independência do conselho, nota-se que quanto maior sua independência, maior a variação positiva de accruals, já que essa não está estatisticamente relacionada com a variação negativa dos accruals.

Quanto ao tamanho do conselho (SIZE), os resultados expostos indicam que, à medida que seu tamanho diminui, há indícios de gerenciamento positivo de resultados e que o aumento no número de conselheiros está estatisticamente (= 0,0935; p < 0,01) relacionado a uma variação negativa de resultados. Semelhante a Chiu et al. (2013Chiu, P. C., Teoh, S. H., & Tian, F. (2013). Board interlocks and earnings management contagion. The Accounting Review, 88(3), 915-944.) e Ribeiro e Colauto (2016Ribeiro, F., & Colauto, R. D. (2016). A relação entre board interlocking e as práticas de suavização de resultados. Revista Contabilidade & Finanças, 27(70), 55-66.), os resultados apontam que a redução ou aumento no número de membros no conselho de administração estão estatisticamente relacionados com a prática do gerenciamento de resultados.

Ainda sobre a variação positiva de accruals, verifica-se, por meio da Tabela 5, que o número de reuniões do conselho de administração (MEET) está estatisticamente ( = -0,0157; p < 0,01) relacionado à prática de gerenciamento positivo de resultados. De acordo com Elouaer-Mrizak e Chastand (2013Elouaer-Mrizak, S., & Chastand, M. (2013). Detecting communities within French intercorporate network.Procedia-Social and Behavioral Sciences, 79, 82-100. ), as reuniões são o momento em que membros em comum de um conselho de administração têm para conversas face a face. Para Carrera (2013Carrera, N. (2013). Audit committees’ interlocks and financial reporting Quality. In 36º Annual Congress European Accounting Association, Paris, France.), o número de reuniões do conselho tem impacto positivo sobre a qualidade dos resultados. Nesse sentido, em que se tem a centralidade de grau exercendo influência sobre os accruals positivos e a centralidade de intermediação relacionada à variação positiva e negativa, acredita-se que a partir do board interlocking as práticas contábeis e informações privadas valiosas possam estar sendo compartilhadas (Carrera, 2013Carrera, N. (2013). Audit committees’ interlocks and financial reporting Quality. In 36º Annual Congress European Accounting Association, Paris, France.).

Quanto à variação negativa de accruals, tem-se que a variável tamanho do ativo relaciona-se estatisticamente ( = 0,0590; p < 0,01) com a variação negativa de resultado. Os resultados indicam semelhança com os resultados de Carrera (2013Carrera, N. (2013). Audit committees’ interlocks and financial reporting Quality. In 36º Annual Congress European Accounting Association, Paris, France.), Chiu et al. (2013Chiu, P. C., Teoh, S. H., & Tian, F. (2013). Board interlocks and earnings management contagion. The Accounting Review, 88(3), 915-944.) e Ribeiro e Colauto (2016Ribeiro, F., & Colauto, R. D. (2016). A relação entre board interlocking e as práticas de suavização de resultados. Revista Contabilidade & Finanças, 27(70), 55-66.), que o gerenciamento negativo de resultados está relacionado com o tamanho das empresas, medido pelo seu ativo.

Os resultados deste estudo apontam não haver relação estatisticamente significativa do gerenciamento de resultados com as variáveis de remuneração do conselho (COMPENS) e setor de atuação, semelhante à Carrera (2013Carrera, N. (2013). Audit committees’ interlocks and financial reporting Quality. In 36º Annual Congress European Accounting Association, Paris, France.), bem como em relação à dualidade do CEO (Shi et al., 2013Shi, L., Dharwadkar, R., & Harris, D. (2013). Board interlocks and earnings quality [Working Paper]. Social Science Research Network. Recuperado de http://www1.american.edu/academic.depts/ksb/finance_realestate/mrobe/Seminar/dharwakar.pdf.
http://www1.american.edu/academic.depts/...
) e nível de governança (GOV) (Erfhuth & Bezerra, 2013Erfhuth, A. E., & Bezerra, F. A. (2013). Gerenciamento de resultados nos diferentes níveis de governança corporativa.Revista Base (Administração e Contabilidade) da UNISINOS, 10(1), 32-42.).

5. CONCLUSÃO

O objetivo deste estudo foi verificar a influência do board interlocking no gerenciamento de resultados das empresas listadas na BM&FBOVESPA. O interlocking dos conselheiros de administração foi medido por meio da centralidade de grau e centralidade de intermediação. Realizou-se pesquisa descritiva, documental e quantitativa, com amostra constituída de 185 empresas em 2011, 202 em 2012 e 201 em 2013, que variou mediante a disponibilidade de dados. Os resultados indicam que o gerenciamento de resultados pode ser influenciado pelo interlocking dos membros do conselho de administração.

O gerenciamento de resultados, medido por meio do Modelo KS (1995), indicou comportamento de gerenciamento positivo ou negativo dos resultados. Constatou-se que quanto maior a rede social estabelecida diretamente entre os membros do conselho de administração, maior o gerenciamento de resultado positivo, o que corrobora os achados de Carrera (2013Carrera, N. (2013). Audit committees’ interlocks and financial reporting Quality. In 36º Annual Congress European Accounting Association, Paris, France.).

O comportamento de gerenciamento de resultados positivos e também negativos pode ser observado por meio da centralidade de intermediação, ou seja, quando tais comportamentos de gerenciamento são propagados indiretamente entre empresas por meio de um conselheiro comum entre os membros de conselhos de administração de empresas distintas. Esses resultados se assemelham aos de Ribeiro e Colauto (2016Ribeiro, F., & Colauto, R. D. (2016). A relação entre board interlocking e as práticas de suavização de resultados. Revista Contabilidade & Finanças, 27(70), 55-66.), que identificaram associação positiva entre a centralidade de intermediação e a suavização de resultados em empresas do Novo Mercado. Os resultados apontam que, apesar de a centralidade de intermediação influenciar no gerenciamento de resultados positivo e negativo, a maior variação ocorreu em relação ao gerenciamento negativo de resultados.

Além das influências no gerenciamento de resultados constatado pelo board interlocking, verificou-se que os accruals são influenciados também pelo tamanho do ativo (accruals negativos), independência (accruals positivos), tamanho do conselho (accruals positivos e negativos) e número de reuniões do conselho (accruals positivos).

Destaca-se, dessa forma, que quanto maior a independência do conselho de administração, maior a variação positiva dos accruals, alinhando-se aos achados de Bruére (2010Bruére, A. J. (2010). Influência do board interlocking no valor e desempenho financeiro das empresas listadas na BMFBovespa (Dissertação de Mestrado). Administração, Faculdade Boa Viagem, Recife.), Carrera (2013Carrera, N. (2013). Audit committees’ interlocks and financial reporting Quality. In 36º Annual Congress European Accounting Association, Paris, France.) e Mizruchi (1996Mizruchi, M. S. (1996). Cohesion, structural equivalence, and similarity of behavior: an approach to the study of corporate political power. Sociological Theory, 22, 271-298.). Quando se observa o tamanho do conselho de administração, os resultados indicam que quando há redução de tamanho, há indicações de gerenciamento positivo de resultados. Por outro lado, quando o tamanho do conselho aumenta, tem-se variação negativa de resultados. Tais resultados da variável tamanho do conselho assemelham-se aos resultados de Chiu et al. (2013Chiu, P. C., Teoh, S. H., & Tian, F. (2013). Board interlocks and earnings management contagion. The Accounting Review, 88(3), 915-944.). O número de reuniões também possui relação com o gerenciamento de resultados, pois identificou-se que a redução do número de reuniões aumenta os accruals positivos, convergente com Carrera (2013Carrera, N. (2013). Audit committees’ interlocks and financial reporting Quality. In 36º Annual Congress European Accounting Association, Paris, France.).

Como nova contribuição do artigo para a área do estudo, destaca-se a convergência dos resultados com estudos internacionais, sobretudo ao utilizar o Modelo KS de gerenciamento de resultados, o que ainda não foi verificado no contexto brasileiro. Outros estudos encontram tal relação entre o board interlocking e o gerenciamento de resultado sob outras métricas de gerenciamento, como o modelo de Jones modificado (Carrera, 2013Carrera, N. (2013). Audit committees’ interlocks and financial reporting Quality. In 36º Annual Congress European Accounting Association, Paris, France.) e de suavização de resultados (Ribeiro & Colauto, 2016Ribeiro, F., & Colauto, R. D. (2016). A relação entre board interlocking e as práticas de suavização de resultados. Revista Contabilidade & Finanças, 27(70), 55-66.). Esse resultado reforça que o comportamento de gerenciamento de resultados pode se perpetuar por meio dos membros que compõem o conselho de administração de diferentes empresas.

Destaca-se que essa perpetuação de comportamento por meio dos membros do conselho de administração pode reforçar práticas de gerenciamento de resultados no que concerne a motivações vinculadas ao mercado de capitais, motivações contratuais celebradas entre empresa e stakeholders, a regulamentação governamental (Healy & Wahlen, 1999Healy, P. M., & Wahlen, J. M. (1999). A review of the earnings management literature and its implications for standard setting. Accounting Horizons, 13(4), 365-383.) e custos políticos (Martinez, 2001Martinez, A. L. (2001). Gerenciamento dos resulta dos contábeis: estudo empírico das companhias abertas brasileiras (Tese de Doutorado). Ciências Contábeis, Universidade de São Paulo, São Paulo.). Isso pode ter implicações regulatórias que inibam o efeito desse compartilhamento de informações pela centralidade que um conselheiro exerce em uma rede de relacionamento, com alguma regulamentação que restrinja o número em que um conselheiro possa participar concomitantemente em diferentes conselhos de administração. Nesse sentido, o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (2010Instituto Brasileiro de Governança Corporativa. (2010). Código das melhores práticas de governança corporativa (4a. ed.). São Paulo, SP: IBGC.) orienta que essas participações em diferentes conselhos devam ser analisadas sob a perspectiva de evitar conflitos de interesse e de verificar se o conselheiro dispõe de tempo suficiente para exercer adequadamente suas atividades.

Como limitação do estudo, aponta-se a possível existência de endogeneidade entre as variáveis de board interlocking e gerenciamento de resultados, uma vez que a presença de investidores institucionais, grandes bancos e do próprio governo nos conselhos poderia influenciar tanto as motivações para a prática de GR como a própria configuração das conexões do board¸ configurando-se em uma oportunidade de pesquisa.

Ainda para futuras pesquisas, sugere-se a aplicação de outros modelos de gerenciamento de resultados identificados pela literatura, podendo ser aplicados em diferentes países, como por exemplo, o modelo de Jones modificado (Dechow, Sloan, & Sweeney, 1995Dechow, P. M., Sloan, R. G., & Sweeney, A. P. (1995). Detecting earnings management. The Accounting Review, 70(2), 193-225.), bastante utilizado na literatura internacional. Recomenda-se, ainda, que a partir do constructo desta pesquisa é possível a utilização de outras medidas estatísticas para medir a relação do board interlocking e o gerenciamento de resultados. A utilização de clusters e de ranqueamento são algumas das medidas possíveis de serem utilizadas.

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    Trabalho apresentado no IX Congresso Associação Nacional de Programas de Pós-Graduação em Ciências Contábeis, Curitiba, PR, Brasil, junho de 2015

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Mar 2017
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2017

Histórico

  • Recebido
    12 Maio 2015
  • Aceito
    10 Dez 2016
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