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Aneurisma de artéria esplênica corrigido por embolização com molas

Splenic artery aneurysm treated by coil embolization

Resumos

O aneurisma da artéria esplênica é uma entidade clínica rara, embora seja o mais frequente entre os aneurismas viscerais, sendo encontrado em 0,8% da população. Apresenta-se mais frequentemente em mulheres, na proporção de 4:1, e raramente provoca sintomas ou sinais clínicos. Desenvolve-se de forma assintomática e, na maioria dos casos, é diagnosticado por meio de exames indicados para elucidar queixas clínicas decorrentes de outras doenças ou quando apresenta complicações por vezes fatais, como a rotura. A possibilidade de rotura dos aneurismas de artéria esplênica com diâmetro inferior a 2 cm é baixa; entretanto, os que apresentam diâmetro igual ou maior que 3 cm são usualmente encaminhados para tratamento cirúrgico, devido ao alto risco de rotura. O tratamento eletivo é indicado nos casos não complicados, sendo a embolização com molas um método interessante por evitar o tratamento cirúrgico convencional.

Artéria esplênica; doenças vasculares; embolização terapêutica


The splenic artery aneurysm is an uncommon clinical entity, but is the most frequent among visceral aneurysms and is present in 0.8% of the population. It is more common in women, with a ratio of 4:1, and rarely causes symptoms or signs. It develops asymptomatically and, in most cases, is diagnosed by tests indicated to elucidate clinical complaints subsequent to other diseases or when there are fatal complications such as rupture. The possibility of rupture of splenic artery aneurysms with a diameter less than 2 cm is low; however, those with a diameter equal to or greater than 3 cm are usually referred for surgical treatment due to the high risk of rupture. The elective treatment is indicated for non complicated cases, and the coil embolization is an interesting method, since it avoids conventional surgical treatment.

Splenic artery; vascular diseases; embolization


RELATO DE CASO

Aneurisma de artéria esplênica corrigido por embolização com molas

Splenic artery aneurysm treated by coil embolization

Rafaele Maria Araújo de Sena PinoI; Eduardo Alexandre Souza GoisI; Larissa Gouveia AragãoI; Ângelo Mário de Sá Bomfim FilhoII; David Campos WanderleyI

IAcadêmicos de Medicina da Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas (Uncisal), Maceió (AL), Brasil

IIMédico; Radiologista Intervencionista da Fundação Hospital da Agro-Indústria do Açúcar e do Álcool de Alagoas, Maceió (AL), Brasil

Correspondência Correspondência: Rafaele Maria Araújo de Sena Pino Rua Antonio Menezes de Araujo Lemos, nº 39 – Gruta de Lourdes CEP 57052-725 – Maceió (AL), Brasil E-mail: faele.sena@hotmail.com

RESUMO

O aneurisma da artéria esplênica é uma entidade clínica rara, embora seja o mais frequente entre os aneurismas viscerais, sendo encontrado em 0,8% da população. Apresenta-se mais frequentemente em mulheres, na proporção de 4:1, e raramente provoca sintomas ou sinais clínicos. Desenvolve-se de forma assintomática e, na maioria dos casos, é diagnosticado por meio de exames indicados para elucidar queixas clínicas decorrentes de outras doenças ou quando apresenta complicações por vezes fatais, como a rotura. A possibilidade de rotura dos aneurismas de artéria esplênica com diâmetro inferior a 2 cm é baixa; entretanto, os que apresentam diâmetro igual ou maior que 3 cm são usualmente encaminhados para tratamento cirúrgico, devido ao alto risco de rotura. O tratamento eletivo é indicado nos casos não complicados, sendo a embolização com molas um método interessante por evitar o tratamento cirúrgico convencional.

Palavras-chave: Artéria esplênica; doenças vasculares; embolização terapêutica.

ABSTRACT

The splenic artery aneurysm is an uncommon clinical entity, but is the most frequent among visceral aneurysms and is present in 0.8% of the population. It is more common in women, with a ratio of 4:1, and rarely causes symptoms or signs. It develops asymptomatically and, in most cases, is diagnosed by tests indicated to elucidate clinical complaints subsequent to other diseases or when there are fatal complications such as rupture. The possibility of rupture of splenic artery aneurysms with a diameter less than 2 cm is low; however, those with a diameter equal to or greater than 3 cm are usually referred for surgical treatment due to the high risk of rupture. The elective treatment is indicated for non complicated cases, and the coil embolization is an interesting method, since it avoids conventional surgical treatment.

Keywords: Splenic artery; vascular diseases; embolization, therapeutic.

Introdução

O aneurisma da artéria esplênica é de ocorrência rara, embora seja o mais frequente entre os aneurismas viscerais1. Sua prevalência na população é em torno de 0,8%2. O mecanismo de formação desse aneurisma ainda é desconhecido. Em relação ao seu diagnóstico, é frequentemente acidental e feito por meio de exames de imagem, solicitados para o diagnóstico de outras doenças. O tratamento cirúrgico eletivo está indicado para aneurismas a partir de 2 cm de diâmetro, que tenham crescimento rápido, ou caso se tornem sintomáticos no acompanhamento clínico, ou ainda quando associados com pancreatite e pseudocisto pancreático1.

Relato de caso

Mulher, 70 anos, hipertensa, procurou o serviço de nefrologia com queixa de infecção urinária de repetição. Após realização de uma tomografia computadorizada de abdômen, foi constatada a presença de três dilatações aneurismáticas em artéria mesentérica superior, renal direita e esplênica. A paciente foi encaminhada ao serviço de Angiologia. Foi realizada uma angiotomografia de abdômen, que também demonstrou dilatações aneurismáticas em artéria mesentérica superior, renal direita e esplênica (Figuras 1, 2 e 3). Realizou-se uma angiografia pré-operatória por cateterismo femoral retrógrado, destacando-se os seguintes achados: artéria mesentérica superior pérvia, opacificando as artérias gastroduodenal e hepática através da arcada pancreática, onde se observou pequeno aneurisma sacular, parcialmente calcificado, com sua porção pérvia medindo cerca de 0,4 cm (Figura 4); artéria renal direita pérvia, notando-se a presença de aneurisma sacular de colo largo, ao nível da sua bifurcação, medindo cerca de 1 cm; artéria renal esquerda pérvia, dentro da normalidade; artéria esplênica pérvia, exibindo volumoso aneurisma parcialmente calcificado, de colo largo, em seu terço distal (extraparenquimatoso), medindo cerca de 2 cm. O procedimento cirúrgico para correção do aneurisma foi marcado para três semanas após a realização da angiografia. Realizou-se punção femoral direita com cateterismo seletivo do tronco celíaco através de cateter Simons 2 e microcateterismo do aneurisma da artéria esplênica com microcateter Excelsior SL1018 (Boston Scientific, Natick, MA, USA), embolizado com 12 molas destacáveis de Guglielmi (GDC, do inglês Guglielmi detachable coils). As imagens de controle evidenciaram exclusão do aneurisma e perviedade dos demais ramos. Para os demais aneurismas, a conduta foi expectante, sendo acompanhados a cada seis meses para, se necessário, realizar o procedimento cirúrgico corretivo. A paciente recebeu alta hospitalar três dias após a realização do procedimento cirúrgico, permanecendo assintomática até o presente momento.





Discussão

O aneurisma da artéria esplênica (AAE) é uma entidade clínica rara, mas ainda assim é o terceiro entre as artérias abdominais e o mais frequente aneurisma visceral, correspondendo a 60% dos casos. É o mais frequente dos aneurismas esplâncnicos, sendo a prevalência na população ao redor de 0,8%2, apresentando risco de ruptura aumentado em pacientes grávidas (devido ao aumento do fluxo esplênico e à alteração da elastina dos vasos) e em casos de hipertensão portal.

O mecanismo preciso da dilatação aneurismática da artéria esplênica é desconhecido. Ainda é atual a afirmação de Trimble e Hill3, que relataram dois fatores determinantes: fragilidade preexistente da parede arterial e aumento da pressão sanguínea.

Várias são as afecções relacionadas com o desenvolvimento de aneurismas da artéria esplênica, como aterosclerose, multiparidade, hipertensão portal, processos inflamatórios intra-abdominais, traumas abdominais, doenças do tecido conjuntivo, aneurismas congênitos ou êmbolos micóticos4-6.

Esse tipo de aneurisma é mais comum em mulheres, na proporção de 4:1. A maioria localiza-se no terço distal da artéria esplênica, podendo estar associado a outros aneurismas na mesma artéria ou em outros vasos5. A maioria dos aneurismas esplênicos é sacular e localiza-se próximo às bifurcações arteriais, podendo estar presente a calcificação parietal.

Os primeiros relatos sugeriram um risco de ruptura em torno de 10%. Atualmente, os estudos sugerem que esse risco foi superestimado e que as taxas de ruptura são em torno de 2 a 3%7-10. De qualquer forma, a ruptura ocorre e é mais comum em certos grupos de risco. Cerca de 50% das rupturas ocorrem durante a gravidez11-13 e outros 20%, em pacientes com hipertensão portal.

O AAE raramente provoca sintomas ou sinais clínicos, principalmente quando seu diâmetro não ultrapassa 2 cm14. É incomum o aparecimento de dor no quadrante superior esquerdo do abdome ou na região epigástrica. Entretanto, alguns pacientes relatam dor epigástrica crônica, inespecífica ou dor no hipocôndrio esquerdo. O aparecimento de dor aguda no quadrante superior esquerdo indica que a ruptura do aneurisma pode ter ocorrido, especialmente se estão presentes sinais de hipovolemia15.

Esse tipo de aneurisma não possui sinais clínicos característicos. É capaz de apresentar manifestações que, ocasionalmente, podem ser atribuídas a outras enfermidades – como é o caso dos sopros, que, quando presentes, possivelmente são correlacionados ao fluxo turbilhonar na aorta. O mesmo pode ocorrer no caso da presença de massa palpável no quadrante superior esquerdo, o que também pode ser devido a aneurisma esplênico; porém, é mais comum sua relação com uma esplenomegalia.

Por conta disso, a maioria dos casos não é diagnosticada até apresentar complicações por vezes fatais, nos casos das rupturas; o diagnóstico também é realizado por meio de exames indicados para pesquisa de outras doenças. A radiografia simples de abdome pode demonstrar a calcificação descrita como "anel de sinete", sugestivo desse aneurisma. Outros exames subsidiários também fazem o diagnóstico, como a ultrassonografia, a tomografia computadorizada ou a ressonância nuclear magnética16.

Embora o mapeamento dúplex seja um exame não invasivo, com mínimo risco para o paciente, é sabidamente examinador-dependente na visualização do AAE, e o exame radiológico com contraste acaba sendo necessário para confirmar o diagnóstico16. A tomografia computadorizada pode indicar o diagnóstico, sobretudo com uso de contraste iodado venoso; entretanto, a angiografia ainda é o método mais utilizado para diagnóstico e avaliação do AAE, além de avaliar melhor possíveis aneurismas de outras artérias viscerais17. Os recentes avanços da angiografia por ressonância magnética e tomografia computadorizada helicoidal auxiliarão no diagnóstico clínico mais acurado do AAE17.

O fácil acesso a exames pouco invasivos, como ultrassonografia, ressonância nuclear magnética e tomografia, vem aumentando o diagnóstico eletivo e incidental dos AAE18. Com o emprego crescente da arteriografia visceral, mapeamento dúplex e tomografia computadorizada, essas lesões estão sendo detectadas com maior frequência17.

A possibilidade de ruptura é bastante baixa para aneurismas com diâmetro inferior a 2 ou 3 cm, exceção feita a gestantes e pacientes com hipertensão portal submetidos a procedimentos cirúrgicos como shunts portossistêmicos ou transplante hepático4-6.

O tratamento para aneurisma de artéria esplênica deve ser realizado quando se considera haver maior risco de rotura (diâmetro superior a 2 cm), em doentes sintomáticos, transplantados, associados a processos inflamatórios e em mulheres em idade fértil ou grávidas19. Pacientes com AAE maiores que 3 cm são usualmente encaminhados para tratamento cirúrgico devido à possibilidade de ruptura, que aumenta com o diâmetro do mesmo4.

Existem várias abordagens cirúrgicas para o tratamento do aneurisma da artéria esplênica: ressecção, com ou sem reparação vascular, ligadura simples efetuada por via aberta ou laparoscópica e procedimentos endovasculares, como embolização. A via clássica, aberta ou por laparotomia, é um método de eficácia comprovada14. A via laparoscópica é uma alternativa excelente e pouco agressiva; entretanto, requer um cirurgião hábil em cirurgia endoscópica. O tratamento endovascular traz como dificuldades a colocação do próprio stent, pelo fato de a artéria esplênica ser tortuosa.

Os recentes avanços no diagnóstico por imagem têm fornecido subsídios fundamentais aos critérios anatômicos na escolha da técnica operatória a ser utilizada, e esta dependerá da localização anatômica do aneurisma e da anatomia vascular. Quando o aneurisma está localizado na porção distal da artéria, a correção pode ser realizada por operação aberta com ligadura, podendo ser necessária a esplenectomia19.

A embolização com coil é desaconselhável nos aneurismas gigantes pela ineficiência na oclusão do aneurisma, pelo intenso processo inflamatório que ocorre e pela possibilidade de embolização19. Apesar disso, a embolização percutânea com molas de Gianturco e gelfoam® (Pfizer, Inc.) tem sido relatada com resultados favoráveis. O método pode, muitas vezes, tornar desnecessária a intervenção cirúrgica ou ser associado ao tratamento cirúrgico, promovendo controle temporário das lesões, especialmente pseudoaneurismas, enquanto se alcança uma melhora das condições gerais do paciente que será submetido à cirurgia. A embolização pode ser especialmente vantajosa para pacientes que apresentam sangramento de aneurismas viscerais após drenagem cirúrgica de pseudocisto pancreático4 e para pacientes com alto risco operatório devido à presença de comorbidades associadas20. Assim, a embolização seletiva – como primeira escolha terapêutica para o aneurisma sacular de artéria esplênica – vem se mostrando uma opção factível, devido à máxima preservação do parênquima esplênico com mínima morbidade21 e um período de internação hospitalar breve22. A técnica apresenta um sucesso na exclusão aneurismática de aproximadamente 85%20.

Como todo procedimento invasivo, a embolização não é isenta de complicações. A técnica está associada a um risco de oclusão do lúmen vascular com infarto esplênico e à recanalização da embolização, reportada em 4% dos casos20. Até 25% dos pacientes submetidos ao procedimento podem apresentar áreas de infarto esplênico, sendo esse risco maior quanto mais distal for a embolização22.

O tratamento eletivo do aneurisma de artéria esplênica é recomendado nos casos diagnosticados sem rotura. Deve-se levar em conta o risco cirúrgico da exérese, que deve ser menor que 0,5%. Caso o risco operatório seja elevado, pode-se considerar a possibilidade de embolização percutânea do aneurisma ou mesmo a ligadura por via laparoscópica17,20. Embora alguns autores recomendem apenas correção do aneurisma nos doentes de baixo risco operatório23, estudos mais recentes concluem que um tratamento é determinado pelas dimensões do aneurisma, anatomia, risco de rotura e clínica apresentada pelo doente19.

A história natural dos aneurismas de artéria esplênica não é conhecida, pelo fato de serem assintomáticos e mais frequentemente diagnosticados na investigação de outra doença abdominal ou por ocasião da rotura, com alta mortalidade perioperatória. Por isso, apesar de serem pouco frequentes, devem ser tratados ao serem diagnosticados, desde que apresentem diâmetro superior a 2 cm ou estejam associados a condições agravantes: mulher em idade fértil, na gestação antes do terceiro trimestre, em doentes com hipertensão arterial sistêmica ou aneurisma em expansão.

Submetido em: 26.10.2009 Aceito em: 08.12.2010

Contribuições dos autores:

Concepção e desenho do estudo: AMSBF, EASG, RMASP e LGA

Análise e interpretação dos dados: RMASP e LGA

Coleta de dados: RMASP, LGA e DCW

Redação do artigo: EASG

Revisão crítica do texto: AMSBF e EASG

Aprovação final do artigo*: RMASP, EASG, AMSBF, LGA e DCW

Análise estatística: N/A

Responsabilidade geral pelo estudo: RMASP, EASG, AMSGF e LGA

*Todos os autores leram e aprovaram a versão final submetida ao J Vasc Bras.

Trabalho realizado na Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas (Uncisal), Maceió (AL), Brasil.

Não foram declarados conflitos de interesse associados à publicação deste artigo.

Fonte de fomento: nenhuma.

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  • Correspondência:

    Rafaele Maria Araújo de Sena Pino
    Rua Antonio Menezes de Araujo Lemos, nº 39 – Gruta de Lourdes
    CEP 57052-725 – Maceió (AL), Brasil
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Fev 2011
    • Data do Fascículo
      Dez 2010

    Histórico

    • Recebido
      26 Out 2009
    • Aceito
      08 Dez 2010
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