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O papel das relações raciais no mercado de trabalho brasileiro: processos de recrutamento e seleção em foco

Resumo

O objetivo é analisar como as relações raciais presentes na sociedade brasileira interseccionam gênero e classe social, e têm influência na inserção no mercado de trabalho formal de mulheres negras e brancas, por meio dos discursos de estudantes e de recrutadores brasileiros que atuam para suas próprias empresas ou para outras nacionais e internacionais. O estudo adota abordagem qualitativa e utiliza o corpus de 26 discursos que englobam os fatores linguístico-textual-discursivos imbricados no processo de referência e na construção de significados, emprestados do dialogismo Bakhtiniano e do Círculo. As metanarrativas dos responsáveis das empresas enfatizam as relações raciais no mercado de trabalho, em consonância com o mito da democracia racial, da meritocracia e da baixa escolaridade das mulheres. As alunas destacam o racismo, o sexismo e a classe social como barreira para conseguir um emprego no mercado privado.

Palavras-chave:
Racismo; Mulheres negras; Interseccionalidade; Sexismo

Abstract

The aim is analyzing the race relations present in Brazilian society intersect gender and social class, and have an influence on the insertion in the formal labor market of black and white women through discourses of female students, and agents of Brazilian companies which capture professionals for their own company or for national and international other companies. The study adopts the qualitative approach. It uses the corpus of 26 discourses that encompass the linguistic-textual-discursive factors imbricated in the referencing process and in the construction of meanings, borrowed from Bakhtinian dialogism and Circle. The metanarratives of the agents of the companies emphasize race relations in the labor market, in line with the myth of racial democracy, meritocracy and the low schooling of women. The female students argue racism, sexism and social class as barrier to get a job in private labor market.

Keywords:
Racism; Black women; Intersectionality; Sexism

Resumen

El objetivo es analizar cómo las relaciones raciales presentes en la sociedad brasileña interseccionan género y clase social, e influyen en la inserción en el mercado de trabajo formal de mujeres negras y blancas, a través de los discursos de estudiantes y agentes de empresas brasileñas que captan profesionales para su propia empresa o para otras empresas nacionales e internacionales. El estudio adopta el enfoque cualitativo y utiliza el corpus de 26 discursos que abarcan los factores lingüístico-textuales-discursivos imbricados en el proceso de referencia y en la construcción de significados, tomados del dialogismo bajtiniano y del Círculo. Las metanarrativas de los agentes de las empresas hacen hincapié en las relaciones raciales en el mercado laboral, en línea con el mito de la democracia racial, la meritocracia y la baja escolaridad de las mujeres. Las estudiantes destacan el racismo, el sexismo y la clase social como barreras para conseguir trabajo en el mercado privado.

Palabras clave:
Racismo; Mujeres negras; Interseccionalidad; Sexismo

INTRODUÇÃO

O presente estudo examina a inserção de estudantes do sexo feminino no mercado de trabalho privado, a partir da escuta das falas dessas estudantes e de recrutadores que atuam para empresas nacionais e internacionais, observando a primeira fase do processo de recrutamento e seleção. O objetivo é analisar as relações raciais presentes na sociedade brasileira que perpassam gênero e classe social e influenciam a inserção de mulheres negras e brancas no mercado de trabalho formal.

O atual contexto brasileiro no campo da gestão mostra que ainda há resquícios do período da escravidão no país. O sistema patriarcal está na base da sociedade brasileira e o racismo estrutural dificulta a inserção e inclusão de mulheres negras nas empresas, o que justifica na prática, a adoção de medidas antirracistas nas organizações - quando há alguma estratégia de gestão de pessoas.

As relações raciais na sociedade brasileira interseccionam gênero e classe social e influenciam a inserção no mercado de trabalho. Mulheres negras e brancas enfrentam barreiras devido às subjetividades do machismo e do racismo; entretanto, a situação se agrava no caso das mulheres negras dada sua posição na estratificação social. Os estudos mostram que tal discriminação ocorre desde o recrutamento (Acker, 2006Acker, J. (2006). Inequality regimes: gender, class, and race in organizations. Gender & Society, 20(4),441-464. Retrieved from https://doi.org/10.1177/0891243206289499
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) e a seleção (Acker, 2006; Paim & Pereira, 2011Paim, A. S., & Pereira, M. E. (2011). Aparência física, estereótipos e discriminação racial. Ciências & Cognição, 16(1), 002-018., 2018), ou seja, desde o momento em que essas mulheres têm o primeiro contato com a organização.

A crescente internacionalização dos negócios desde a década de 1990 (Fleury, 2000Fleury, M. T. L. (2000). Gerenciando a diversidade cultural: experiências de empresas brasileiras. Revista de Administração de Empresas, 40(3), 18-25. Retrieved fromhttps://doi.org/10.1590/S0034-75902000000300003
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) trouxe mudanças a partir da instalação de subsidiárias de empresas americanas no Brasil. Independentemente da existência dos dispositivos legais - como os que as matrizes nos EUA e no Canadá estavam habituadas a seguir - as subsidiárias brasileiras buscaram trazer a diversidade da força de trabalho para o contexto organizacional, evitando a discriminação no ambiente de trabalho e como estratégia para diminuir barreiras culturais. Uma das formas de eliminar a discriminação nas empresas foi a incorporação interna e externa da diversidade cultural (Fleury, 2000), uma vez que o mercado de trabalho é o local onde as relações de poder são mais acirradas e excludentes (Kang & Kaplan, 2019Kang, S. K., & Kaplan, S. (2019). Working toward gender diversity and inclusion in medicine: myths and solutions. The Lancet, 393(10171), 579-586. Retrieved from https://doi.org./10.1016/S0140-6736(18)33138-6
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).

Porém, a diversidade cultural no Brasil não incorporou equitativamente as pessoas negras e outros grupos considerados minoritários, além de não ter reduzido a desigualdade social e racial. Ferreira e Nunes (2020Ferreira. C. A. A., & Nunes, S. C. (2020). Mulheres negras: um marcador da desigualdade racial. Revista da Associação Brasileira de pesquisadores/As Negros/As, 12(33), 508-534. Retrieved from https://doi.org/10.31418/2177-2770.2020.v12.n.33.p508-534
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) apontam que as mulheres negras ainda sofrem discriminação devido ao seu fenótipo, principalmente por causa do cabelo e da cor da pele, uma vez que o padrão de beleza são mulheres brancas de cabelos lisos.

O presente estudo baseia-se no referencial analítico da interseccionalidade (Cho, Crenshaw, & McCall, 2013Cho, S., Crenshaw, K. W., & McCall, L. (2013). Intersectionality: Theorizing power, empowering theory. Signs: Journal of Women in Culture and Society, 38(4),785-810. Retrieved from https://doi.org/10.1086/669608
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; Crenshaw, 1991). Para Lewis (2018Lewis, J. A. (2018). From modern sexism to gender microaggressions: Understanding contemporary forms of sexism and their influence on diverse women. In C. B.Travis, J. W. White, A. Rutherford, W. S. Williams, S. L. Cook, & K. F. Wyche (Eds.), APA Handbook of the psychology of women: History, theory, and battlegrounds (pp. 381-397). Washington, DC: American Psychological Association. Retrieved from https://doi.org/10.1037/0000059-019
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), a interseccionalidade permeia o machismo, o racismo e a classe social, mostrando que essa estrutura cultural ainda forma os opressores das mulheres na sociedade contemporânea. A narrativa da raça funciona como uma metalinguagem para justificar todas as desigualdades de poder e posição social (Carroll, 2017Carroll, T. W. (2017). Intersectionality and identity politics: cross-identity coalitions for progressive social change. Signs: Journal of Women in Culture and Society, 42(3), 600-607. Retrieved from https://doi.org/10.1086/689625
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).

Vale observar que, até poucos anos atrás, os estudos organizacionais na área de diversidade silenciavam sobre a questão de raça e branquitude (Nkomo & Al Ariss, 2014Nkomo, S. M., & Al Ariss, A. (2014). The historical origins of ethnic (white) privilege in US organizations. Journal of Managerial Psychology, 29(4), 389-404. Retrieved from https://doi.org/10.1108/JMP-06-2012-0178
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; Plaut, Thomas, Hurd, & Romano, 2018Plaut, V. C., Thomas, K. M., Hurd, K., & Romano, C. A. (2018). Do color blindness and multiculturalism remedy or foster discrimination and racism? Current Directions in Psychological Science, 27(3), 200-206. Retrieved fromhttps://doi.org/10.1177/0963721418766068
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; Rosa, 2014Rosa, A. R. (2014). Relações raciais e estudos organizacionais no Brasil. Revista de Administração Contemporânea, 18(3), 240-260. Retrieved from https://doi.org/10.1590/1982-7849rac20141085
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). Havia muitos estudos sobre gênero, mas não se abordavam relações de poder, como no caso da raça (Liu, 2017Liu, H. (2017). Undoing whiteness: the Dao of anti-racist diversity practice. Gender, Work and Organization, 24(5), 457-471. Retrieved fromhttps://doi.org/10.1111/gwao.12142
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). Para Dar (2018Dar, S. (2018). The masque of blackness: Or, performing assimilation in the white academe. Organization, 26(3), 432-446. Retrieved from https://doi.org/10.1177/1350508418805280
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), o termo “diversidade” não é suficientemente acurado na “academia branca” uma vez que ele “não reconhece a política de branquitude que estrutura um espectro de assimilação pelo qual os acadêmicos de cor são posicionados”.

A presente pesquisa cobre uma lacuna na literatura acadêmica e sobre o mercado de trabalho ao trazer depoimentos de estudantes do sexo feminino e de recrutadores de profissionais. Ainda, o estudo ratifica a questão de gênero, raça e classe social nas relações raciais no Brasil.

As condições das mulheres negras são mais desafiadoras principalmente porque suas vozes são escondidas ou silenciadas pela preponderância masculina (Bourdieu, 2002aBourdieu, P. (2002a). A dominação masculina(2a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Bertrand Brasil.; Spivak, 2010Spivak, G. (2010). Pode o subalterno falar? Belo Horizonte, MG: Editora UFMG.), e também em virtude de aspectos sociais, políticos, econômicos, culturais e sanitários. Falar de raça no Brasil remete à fala das pessoas negras, e raça atualmente é vista como um fenômeno indicativo de segregação e desigualdade social (Teixeira, J. S. Oliveira, & Carrieri, 2020Teixeira, J. C., Oliveira, J. S., & Carrieri, A. P. (2020). Por que falar sobre Raça nos Estudos Organizacionais no Brasil? Da discussão biológica à dimensão política. Perspectivas Contemporâneas, 15(1), 46-70.).

Dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE, 2021) referentes ao segundo trimestre de 2021 mostram que apenas 1,9% das mulheres negras ocupavam cargos de gerência/direção, enquanto as brancas ocupavam 5,0%. No caso dos homens, 2,2% eram negros e 6,4% brancos. A renda média, em reais (R$), para as mulheres negras foi de R$ 1.617,00 e para as brancas, R$ 2.674,00, enquanto para os homens negros foi de R$ 1.968,00 e para os brancos, R$ 3.471,00. Em termos de escolaridade, a taxa de conclusão do ensino médio entre as mulheres negras foi de 67,6% e as brancas, 81,6%, indicando que as mulheres negras têm mais dificuldade para estudar e concluir o ensino médio do que as brancas (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [IBGE], 2018). Esses dados mostram a presença do machismo e do racismo na sociedade brasileira e reforçam a justificativa para a realização do presente estudo.

DO FEMINISMO NEGRO À INTERSECIONALIDADE

Diversos estudos têm discutido o racismo estrutural no Brasil (Gurgel & Colaço, 2020Gurgel, L. L., & Colaço, V. F. R. (2020). Sistema de cotas para entrada no Ensino Superior: perspectivas de jovens negros de Fortaleza. Psico, 51(1),1-13. Retrieved from https://doi.org/10.15448/1980-8623.2020.1.29823
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; Teixeira, J. S. Oliveira, Diniz, & Marcondes, 2021Teixeira, J. C., Oliveira, J. S., Diniz, A., & Marcondes, M. M. (2021). Inclusão e diversidade na administração: manifesta para o futuro-presente. RAE-Revista de Administração de Empresas, 61(3), 1-11. Retrieved fromhttps://doi.org/10.1590/S0034-759020210308
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) e na América do Norte. Para Yancy (2018Yancy, G. (2018). Backlash: what happens when we talk honestly about racism in America. Lanham, MD: Rowman & Littlefield Publishers.), o racismo estrutural é uma praga que dizima direta e indiretamente populações negras, excluindo-as do acesso a princípios universais e comprometendo sua identidade social por meio de estereótipos racistas negativos (Gaertner & McLaughin, 1983Gaertner, S., & McLaughlin, J. (1983). Racial stereotypes: associations and ascriptions of positive and negative characteristics. Social Psychology Quarterly, 46(1), 23-30. Retrieved fromhttps://doi.org/10.2307/3033657
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; Goffman, 2004Goffman, E. (2004). Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. São Paulo, SP: LTC.; E. M. Souza, 2019aSouza, E. M. (2019a). Ações afirmativas e estereótipos sociais: Desconstruindo o mito da inferioridade cotista. Arquivos Analíticos de Políticas Educativas, 27(75),1-27. Retrieved fromhttps://doi.org/10.14507/epaa.27.3615
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). Como um ramo do racismo estrutural, o racismo institucional (Avery, Volpone, & Holmes, 2018Avery, D. R., Volpone, S. D., & Holmes, I. V. O. (2018). Racial discrimination in organizations. In A. J. Colella, & E. B. King (Eds.), Oxford handbook of workplace discrimination(pp. 1-26). New York, NY: Oxford University Press.; Rotondano, 2019Rotondano, R. (2019). Brazilian apartheid: racism and segregation in Salvador, Brazil. International Journal of Sociology and Social Policy, 39(11/12), 950-961. Retrieved from https://doi.org/10.1108/IJSSP-12-2018-0228
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) é percebido no Brasil e nos EUA, e foi discutido no estudo de Burgard et al. (2017Burgard, S., Castiglione, D. P., Lin, K. Y., Nobre, A. A., Aquino, E. M. L., Pereira, A. C., ... Chor, D. (2017). Differential reporting of discriminatory experiences in Brazil and the United States. Cadernos de Saúde Pública, 33(1),1-14. Retrieved from https://doi.org/10.1590/0102-311x00110516
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), que mostra que a população negra sofre maior discriminação em ambos os países.

A questão do preconceito é diferente no Brasil em nos EUA (Costa, 2009Costa, R. G. (2009). Mestiçagem, racialização e gênero. Sociologias, 11(21), 94-120. Retrieved fromhttps://doi.org/10.1590/S1517-45222009000100006
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; Rosa, 2014Rosa, A. R. (2014). Relações raciais e estudos organizacionais no Brasil. Revista de Administração Contemporânea, 18(3), 240-260. Retrieved from https://doi.org/10.1590/1982-7849rac20141085
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). Enquanto no Brasil predomina o preconceito de marca, cujo ponto crítico é a estética do negro, nos EUA predomina o preconceito de origem, vinculado à ascendência negra e à etnia ancestral. O resultado nos dois países é uma população negra marginalizada, subordinada e com dificuldades de inserção no mercado de trabalho formal.

O racismo institucional leva a discriminação em base a educação, experiência e condição de trabalho das pessoas (como o trabalho autônomo ou o trabalho informal, sem contrato) (Frio & Fontes, 2018Frio, G. S., & Fontes, L. F. C. (2018). Diferenças salariais devido à raça entre 2002 e 2014 no Brasil: evidências de uma decomposição quantílica. Organizações & Sociedade, 25(87), 568-588. Retrieved from https://doi.org/10.1590/1984-9250872
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). Essa forma de racismo está apoiada no mito da democracia racial que exclui as pessoas negras da possibilidade de obter boa formação educacional e as considera como um grupo que precisa de ações afirmativas como cotas de acesso a educação superior (Machado, Bazanini, & Mantovani, 2018Machado, C. Jr., Bazanini, R., & Mantovani, D. M. N. (2018). O mito da democracia racial no mercado de trabalho: análise crítica da participação dos afrodescendentes nas empresas brasileiras. Organizações & Sociedade, 25(87), 632-655. Retrieved fromhttps://doi.org/10.1590/1984-9250875
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; Silva, 2018Silva, T. D. (2018). Ação afirmativa para ingresso de negros no ensino superior: formação multinível da agenda governamental. Revista do Serviço Público, 69(2), 07-34. Retrieved from https://doi.org/10.21874/rsp.v69i2.1771
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). É um racismo que se mostra por meio de normas, práticas e atitudes discriminatórias, que foram se naturalizando ao longo do tempo no contexto do trabalho e em outros ambientes, suscitando ignorância, desatenção, preconceito ou estereótipos racistas.

O racismo está encoberto pelo mito da democracia racial e encontra-se no processo de inserção no mercado de trabalho, podendo ser observado em anúncios de vaga que mencionam: “precisa-se de alguém com boa aparência” (K. C. Oliveira & Pimenta, 2016Oliveira, K. C., & Pimenta, S. M. O. (2016). O racismo nos anúncios de emprego do século XX”, Linguagem em (Dis)curso, 16(3), 381-399. Retrieved from https://doi.org/10.1590/1982-4017-160301-4615
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, p. 397). Essa exigência torna-se uma barreira para a seleção de mulheres negras, uma vez que seus corpos não são considerados um padrão de boa aparência do ponto de vista do empregador no mercado.

A discriminação é frequente entre pessoas de maior educação uma vez que o discurso meritocrático ainda prevalece diante de condições sociais, emocionais, morais e econômicas tão desiguais (Fernandes, 2016Fernandes, A. D. (2016). The black genre: notes on gender, feminism and negritude. Revista Estudos Feministas, 24(3), 691-713. Retrieved fromhttps://doi.org/10.1590/1806-9584-2016v24n3p691
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; A. A. Souza & Dias, 2018Souza, A. A., & Dias, R. C. P. (2018). Mérito não é para qualquer um: a percepção de gerentes negros sobre o seu processo de ascensão profissional. Organizações & Sociedade, 25(87), 551-567. Retrieved from https://doi.org/10.1590/1984-9250871
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). Portanto, sexo e raça são fatores determinantes de desigualdades sociais, sendo as mulheres negras uma boa parcela da população que se encontra nas classes mais baixas (Mariano & Carloto, 2009Mariano, S. A., & Carloto, C. M. (2009). Gênero e combate à pobreza: programa bolsa família. Revista de Estudos Feministas, 17(3), 901-908. Retrieved from https://doi.org/10.1590/S0104-026X2009000300018
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). E. M. Souza (2019b) corrobora Machado et al. (2018Machado, C. Jr., Bazanini, R., & Mantovani, D. M. N. (2018). O mito da democracia racial no mercado de trabalho: análise crítica da participação dos afrodescendentes nas empresas brasileiras. Organizações & Sociedade, 25(87), 632-655. Retrieved fromhttps://doi.org/10.1590/1984-9250875
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) e Silva (2018Silva, T. D. (2018). Ação afirmativa para ingresso de negros no ensino superior: formação multinível da agenda governamental. Revista do Serviço Público, 69(2), 07-34. Retrieved from https://doi.org/10.21874/rsp.v69i2.1771
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) ao enfatizar que diferenças raciais se reduzem diante da questão da classe social.

Isso significa que a questão racial ficou resumida a classe social, o que favorece a negação do racismo estrutural e causa desigualdades alimentadas pelo mito da democracia racial (E. M. Souza, 2019bSouza, E. M. (2019b). Intersections between race and class: a postcolonial analysis and implications for organizational leaders. BAR − Brazilian Administration Review, 16(1), 1-27. Retrieved from https://doi.10.1590/1807-7692bar2019180062
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; Teixeira et al., 2020Teixeira, J. C., Oliveira, J. S., & Carrieri, A. P. (2020). Por que falar sobre Raça nos Estudos Organizacionais no Brasil? Da discussão biológica à dimensão política. Perspectivas Contemporâneas, 15(1), 46-70.) e pelo fato dos lugares privilegiados na sociedade serem ocupados por pessoas brancas (Gurgel & Colaço, 2020Gurgel, L. L., & Colaço, V. F. R. (2020). Sistema de cotas para entrada no Ensino Superior: perspectivas de jovens negros de Fortaleza. Psico, 51(1),1-13. Retrieved from https://doi.org/10.15448/1980-8623.2020.1.29823
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). De acordo com Lemos e Fraga (2021Lemos, A. H. C., & Fraga, A. M. (2021). Sidinei Rocha-de-Oliveira: densidade, ternura e entusiasmo no labor científico. Cadernos EBAPE.BR, 19(4), 824-828. Retrieved from https://doi.org/10.1590/1679-395120210214
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), a classe social é uma estrutura excludente em que as pessoas conseguem superar a condição de baixa renda por meio de muito esforço e da educação.

O domínio das classes sociais que ofusca a questão do racismo estrutural ocorre devido a uma estrutura social multidimensional que consiste em três dimensões: a estrutura de capital existente, o volume desse capital e sua evolução ao longo do tempo. Essas dimensões formam três tipos de capitais estruturais - capital econômico, cultural e social - e uma forma de capital estruturante - capital simbólico. A soma desses diferentes capitais define a probabilidade de ganho em cada campo em um determinado momento. Os grupos sociais e os espaços ocupados pelas pessoas são delimitados pelos diferentes capitais que elas acessam e pelos seu habitus, já que o mundo social é um sistema simbólico (Bourdieu, 2002bBourdieu, P. (2002b). Espaço social e gênese das classes. In P. Bourdieu (Ed.), O poder simbólico (pp.107-120). Rio de Janeiro, RJ: Bertrand Brasil., 2005Bourdieu, P. (2005). Condição de classe e posição de classe. In P. Bourdieu (Ed.), A economia das trocas simbólicas(pp.27-78). São Paulo, SP: Perspectiva.).

O Feminismo Negro oferece as contribuições teóricas adequadas para o estudo das condições das mulheres negras. O movimento se preocupou em trazer a questão da raça-etnia para as discussões de gênero, denunciar o racismo, enfrentar os temas raciais nas relações de gênero e humanizar as mulheres negras para questionar o feminismo universal por sua abordagem que desconsidera raça e classe social (Hill-Collins, 2000Hill-Collins, P. H. (2000), Black feminist thought. Knowledge, consciousness, and the politics of empowerment (2a ed.). New York, NY: Routledge., 2016).

A identidade política é uma das formas usadas pelas mulheres para ganhar visibilidade na sociedade. É considerada uma forma de pressão, a exemplo de outras concepções dominantes de justiça social (Gonzalez,1984Gonzalez, L. (1984). Racismo e sexismo na cultura brasileira. In L. A. Silva (Org.), Movimentos sociais, urbanos, memórias étnicas e outros estudos (Revista Ciência Sociais Hoje, n. 2, pp. 223-244). Brasília, DF: Anpocs.; Hill-Collins, 2000Hill-Collins, P. H. (2000), Black feminist thought. Knowledge, consciousness, and the politics of empowerment (2a ed.). New York, NY: Routledge.; Hooks, 2000Hooks, B. (2000). Feminism is for everybody. Cambridge, UK: South End Press.; Palmer, 2020Palmer, L. A. (2020). Diane Abbott, misogynoir and the politics of Black British feminism’s anticolonial imperatives: ‘In Britain too, it’s as if we don’t exist’. The Sociological Review, 68(3) 508-523. Retrieved fromhttps://doi.org10.1177/0038026119892404
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). Mason-John (1995Mason-John, V. (1995) Talking black: Lesbians of African and Asian descent speak out. New York, NY: Cassell.) enfatiza que as mulheres negras homossexuais estiveram na vanguarda do Feminismo Negro e se organizaram separadamente devido à exclusão. Entretanto, esse grupo permaneceu invisível.

Raça, gênero e outras categorias identitárias têm sofrido violência e exclusão por décadas, e ainda se encontram à margem dos discursos liberais (Crenshaw, 1991Crenshaw, K. W. (1991, July). Mapping the margins: intersectionality, identity politics and violence against women of color. Stanford Law Review, 46(6),1241-1299. Retrieved from https://doi.org/10.2307/1229039
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). Nesse contexto, o presente estudo baseia-se na interseccionalidade como categoria analítica (Crenshaw, 1991; Cho et al., 2013Cho, S., Crenshaw, K. W., & McCall, L. (2013). Intersectionality: Theorizing power, empowering theory. Signs: Journal of Women in Culture and Society, 38(4),785-810. Retrieved from https://doi.org/10.1086/669608
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) para vislumbrar os cruzamentos de classe, raça/etnia, gênero.

Para Crenshaw (2002Crenshaw, K. W. (2002). Documento para o encontro de especialistas em aspectos da discriminação racial relativos ao gênero. Revista de Estudos Feministas, 10(1),171-188. Retrieved fromhttps://doi.org/10.1590/S0104-026X2002000100011
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), as mulheres estão subordinadas à discriminação de gênero e a outros fatores como classe, raça, casta, cor, etnia, religião, nacionalidade, e orientação sexual, que são “diferenças que fazem diferença” (Crenshaw, 2002, p. 173, tradução nossa). A autora argumenta que a associação de fatores de subordinação leva a outras formas de discriminação - como é o caso da dupla jornada ou da tripla discriminação - e que essas subordinações são invisíveis. Assim, a interseccionalidade é capaz de captar as consequências estruturais e dinâmicas da sociedade ao conectar dois ou mais fatores aos quais as mulheres estão sujeitas. As mulheres negras estão frequentemente sujeitas ao racismo e a xenofobia, e em uma posição onde as questões de classe e gênero criam desigualdades básicas (Crenshaw, 2002).

A interseccionalidade entre gênero, raça e classe social é considerada como um marcador de diferença social (Hendricks, Deal, A. J. Mills, & J. H. Mills, 2021Hendricks, K., Deal, N., Mills, A. J., & Mills, J. H. (2021). Interseccionality as a matter of time. Management decision, 59(11), 2567-2582. Retrieved from https://doi.org/10.1108/MD-02-2019-0264
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; Lugar et al., 2020Lugar, C. W., Garrett-Scott, S., Novicevic, M. M., Popoola, I. T., Humphreys, J. H, & Mills, A. J. (2020). The historic emergence of intersectional leadership: Maggie Lena Walker and the independent order of St. Luke. Leadership, 16(2), 220-240. Retrieved from https://doi.org/10.1177/1742715019870375
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; Mirza, 2018Mirza, H. S. (2018). Decolonizing higher education: black feminism and the intersectionality of race and gender. Journal of Feminist Scholarship, 7(Fall), 1-12. Retrieved fromhttps://digitalcommons.uri.edu/jfs/vol7/iss7/3
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). Além disso, devido a questões estéticas, mulheres negras sofrem mais com o racismo estrutural do que homens negros no Brasil (Lage & E. M. Souza, 2017Lage, M. L. C., & Souza, E. M. (2017). Da Cabeça aos pés: racismo e sexismo no Ambiente Organizacional. Revista de Gestão Social e Ambiental, 11(Especial), 55-72. Retrieved from https://doi.org/10.24857/rgsa.v0i0.1378
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; Ferreira & Nunes, 2020Ferreira. C. A. A., & Nunes, S. C. (2020). Mulheres negras: um marcador da desigualdade racial. Revista da Associação Brasileira de pesquisadores/As Negros/As, 12(33), 508-534. Retrieved from https://doi.org/10.31418/2177-2770.2020.v12.n.33.p508-534
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).

Para Mirza (2018Mirza, H. S. (2018). Decolonizing higher education: black feminism and the intersectionality of race and gender. Journal of Feminist Scholarship, 7(Fall), 1-12. Retrieved fromhttps://digitalcommons.uri.edu/jfs/vol7/iss7/3
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, p. 2, tradução nossa), o relacionamento entre o Feminismo Negro e a interseccionalidade surge porque o Feminismo Negro “reconfigura as complexidades da marginalidade feminina negra e etnicizada” em uma análise onde “divisões sociais são teorizadas como realidades vividas”. A autora reforça que a interseccionalidade oferece uma linha de raciocínio que dá apoio as narrativas e a luta simbólica das mulheres negras. É uma ontologia complexa do “conhecimento realmente útil” que revela o cotidiano dessas mulheres, “posicionadas em múltiplas estruturas de dominação e poder como “outras” colonizadas e sexualizadas, categorizadas por gênero, raça e classe (Mirza, 2018, p. 2, tradução nossa).

PROCEDIMENTO METODOLÓGICO

O presente estudo está ancorado na matriz hermenêutica da lógica interpretativa, uma vez que oferece uma visão mais profunda dos sujeitos e das organizações como processos que surgem das ações intencionais das pessoas, individualmente ou em consonância com outras estruturas de poder social (Paes de Paula, 2016Paes de Paula, A. P. (2016). Para além dos paradigmas nos Estudos Organizacionais: o Círculo das Matrizes Epistêmicas. Cadernos EBAPE.BR, 14(1), 24-46. Retrieved from https://doi.org/10.1590/1679-395131419
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). A pesquisa adota uma abordagem qualitativa (Merriam, 2002Merriam, S. B. A. (2002), Qualitative research in practice: Examples for discussion and analysis. San Francisco, CA: Jossey-Bass.) e uma perspectiva analítica interacionista, produzindo sentidos. Ainda, o estudo encontra inspiração no dialogismo Bakhtiniano e do círculo (Lopes, 2004Lopes, M. A. P. T. (2004). Referenciação e gênero textual - atividades sócio - discursivas em interação. In I. L. Machado, & R. Mello (Orgs.), Gêneros: reflexão em análise do discurso (pp. 205-219), Belo Horizonte, MG: UFMG.).

Sujeitos de pesquisa e pesquisa de campo

A pesquisa contou com 22 entrevistas conduzidas com estudantes (11 mulheres negras e 11 mulheres brancas), alunas de variados cursos de graduação da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas) - Campus Coração Eucarístico. O estudo incluiu ainda entrevistas conduzidas com quatro profissionais de recrutamento e seleção atuando no setor privado na cidade de Belo Horizonte (3 mulheres e 1 homem). O Quadro 1 mostra detalhes dessas quatro entrevistas.

Quadro 1
Entrevistas com os recrutadores

Sobre o perfil das 22 estudantes entrevistadas, a idade média das estudantes negras foi de 22,7 anos e a das estudantes brancas 23,4. As entrevistadas foram selecionadas em base a sua idade (17 anos ou mais) e por sua vontade de participar no estudo, por meio do conhecimento de um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

A abordagem junto as entrevistadas foi realizada nos diversos espaços do campus universitário (refeitórios, salas de aula e corredores) e durante os intervalos das aulas. Além disso, a técnica de amostragem em “bola de neve” (Nardi, 2018Nardi, P. M. (2018). Doing Survey Research: A Guide to Quantitative Methods (4a ed.). New York, NY: Routledge.) foi utilizada dada a dificuldade de acesso às entrevistadas. Nesse caso, as estudantes negras foram solicitadas a recomendar outras estudantes negras da mesma universidade para participar da pesquisa.

As entrevistas foram realizadas em salas de aulas desocupadas ou em outro lugar indicado pelas entrevistadas, como uma lanchonete ou outras áreas do campus próximas as salas de aula. O tempo somado de todas as entrevistas com estudantes foi de 684,9 minutos. As participantes são identificadas nesse artigo considerando a raça: entrevistadas negras são identificadas como EN1, EN2, ..., EN11; entrevistadas brancas são EB1, EB2, …, EB11.

Procedimentos

O roteiro da entrevista semiestruturada (Berg, 2009Berg, B. (2009). Qualitative Research Methods for the Social Sciences. Boston, MA: Allyn & Bacon.) continha 16 perguntas para os recrutadores e 18 para as alunas. Para Berg (2009), esse tipo de roteiro oferece o máximo de comunicação entre as ideias do pesquisador e as do respondente. Para Amossy (2011Amossy, R. (2011). Argumentação e análise do discurso perspectivas teóricas e recortes disciplinares. Revista Eletrônica de Estudos Integrados em Discurso e Argumentação, 1(1), 129-144., p. 139, tradução nossa) “o estudo da entrevista mostra a co-construção da imagem do autor na dinâmica do diálogo”. Antes de iniciar a entrevista, os participantes foram instruídos sobre o objetivo e propósito do estudo. As entrevistas foram conduzidas individualmente e gravadas com o consentimento dos entrevistados, sendo cuidadosamente transcritas em um segundo momento. Os entrevistados tiveram a oportunidade de revisar as transcrições para garantir que refletiram o conteúdo da entrevista. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da PUC Minas, CAAE: 09517719.9.0000.5137. Por fim, o estudo adotou técnicas padrão da pesquisa qualitativa como a validade do constructo, confiabilidade e validade interna (Castro & Rezende, 2018Castro, J. M., & Rezende, S. F. L. (2018). Validade e confiabilidade de estudos de casos qualitativos em gestão publicados em periódicos nacionais. Organizações em contexto, 14(28), 29-42. Retrieved from https://doi.org/10.15603/1982-8756/roc.v14n28p29-52
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).

O corpus foi constituído por trechos das 26 entrevistas individuais que abordaram o tema central das mulheres negras para a construção de sentidos. O “corpus” aqui refere-se ao princípio para a coleta de dados qualitativos, e é amplamente aplicado nas Ciências Sociais (Bauer & Aarts, 2002Bauer, M. W., & Aarts, B. (2002). A construção do corpus: um princípio para a coleta de dados qualitativos. In M. W. Bauer, & G. Gaskell(Eds.), Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: um manual prático (pp. 39-63), Petrópolis, RJ: Vozes.). O estudo é um gênero discursivo primário porque consiste em comunicações verbais espontâneas (Bakhtin, 2000Bakhtin, M. M. (2000). Os gêneros do Discurso. In M. M. Bakhtin (Ed.), Estética da criação verbal(3a ed., pp. 277-326), São Paulo, SP: Martins Fontes.).

O roteiro continha temas centrais que geraram outros tópicos, entre os quais as relações raciais e escolaridade. Para Brown e Yule (1983Brown, G., & Yule, G. (1983). Discourse analysis. Cambridge, UK: Cambridge University Press.), esses novos tópicos surgem do discurso manifesto e são evidências da assimilação do conhecimento compartilhado nas conversas. Esses são tópicos que ocupam uma posição central - que Fávero (2003Fávero, L. L. (2003). O tópico discursivo. In D. Preti(Orgs), Análises de Textos Orais (pp. 40-63). São Paulo, SP: USP.) reconhece como reflexo do discurso sobre algo utilizando referentes implícitos ou possíveis de serem inferidos - e que se desdobram em outros novos temas ao longo da conversa.

Análise

A estratégia de análise dos dados foi o processo de referenciamento, sob a perspectiva interacionista-discursiva, considerando as dimensões pragmática, textual e linguística da produção de sentidos, em base ao dialogismo Bakhtiniano e do Círculo (Lopes, 2004Lopes, M. A. P. T. (2004). Referenciação e gênero textual - atividades sócio - discursivas em interação. In I. L. Machado, & R. Mello (Orgs.), Gêneros: reflexão em análise do discurso (pp. 205-219), Belo Horizonte, MG: UFMG.). Essa escolha se dá uma vez que o discurso se constrói por meio de recursos linguísticos pré-existentes e permite descrever a constituição da linguagem - que é uma fissura da tradição linguística e constitui uma via direta para crenças ou eventos reais, uma reflexão sobre como os fatos acontecem - desde os mais simples até os mais complexos fenômenos. O discurso é também uma forma de ação, uma convicção na organização eloquente da fala, uma prática social que visa interpretar o contexto e, portanto, é sempre contingente (Gill, 2003Gill, R. (2003). Análise de Discurso. In M. W. Bauer, & G. Gaskell (Eds.), Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: um manual prático (3a ed.). Petrópolis, RJ: Vozes.).

Segundo Volóchinov (2017Volóchinov, V. (2017). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais dos métodos sociológicos na ciência da linguagem. São Paulo, SP: Editora 34.), qualquer afirmação real, em maior ou menor grau e de uma forma ou de outra, nega ou concorda com algo. Todo enunciado responde a algo e se orienta para uma resposta, sendo apenas um elo na cadeia ininterrupta dos discursos verbais. Finalmente, a situação social mais próxima e o ambiente social mais amplo decidem completamente a estrutura do enunciado, de dentro para fora.

Todo posicionamento ideológico reflete e retrata a realidade que está fora dos limites naturais e sociais. Portanto, tudo o que é ideológico tem um sentido, representa e substitui algo que está fora. É um signo, e onde há signo, há ideologia. Portanto, o corpo negro e os signos raciais remetem à estigmatização (Sales, 2006Sales, R. Jr. (2006). Democracia racial: o não-dito racista. Tempo social, 18(2), 229-258. Retrieved from https://doi.org/10.1590/S0103-20702006000200012
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).

Um sujeito é qualquer agente capaz não apenas de “apropriar-se da linguagem” em sua ação (Benveniste, 1989Benveniste, E. (1989). Problemas de Linguística geral ll. Campinas, SP: Pontes.; Lopes, 2004Lopes, M. A. P. T. (2004). Referenciação e gênero textual - atividades sócio - discursivas em interação. In I. L. Machado, & R. Mello (Orgs.), Gêneros: reflexão em análise do discurso (pp. 205-219), Belo Horizonte, MG: UFMG.), mas também de se constituir como sujeito por meio da linguagem (Bronckart, 1999Bronckart, J. P. (1999). Atividade de linguagem, textos e discursos. In Bronckart, J. P. (Ed.), Atividade de linguagem, textos e discursos - por um interacionismo sócio-discursivo (pp. 31-49). São Paulo, SP: EDUC.; Lopes, 2004; Possenti, 1993Possenti, S. (1993). Discurso, Estilo e Subjetividade, São Paulo, SP: Martins Fontes.). Os sujeitos constroem versões públicas do mundo na análise dos processos constitutivos de referenciação, por meio de práticas discursivas e cognitivas, social e culturalmente situadas. Essas versões do mundo sofrem transformações segundo os diferentes contextos (Bronckart, 1999; Lopes, 2004; Possenti, 1993).

Toda palavra tem duas faces, uma delas se dá no fato de vir de alguém e a outra no fato de ser dirigida a alguém. A palavra mostra o produto da interação do falante e do ouvinte, e cada palavra serve de expressão para um em relação ao outro. Pela palavra, o indivíduo se define em relação ao outro, ou seja, em relação ao coletivo. “A palavra é uma espécie de ponte lançada entre mim e os outros” (Bakhtin & Volochínov, 2009Bakhtin, M. M., & Volochinov, V. N. (2009). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico da linguagem (13a ed). São Paulo, SP: Hucitec ., p. 117).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os tópicos extraídos durante o estudo e que se pautam pelas relações raciais no Brasil exploraram o mito da democracia racial e a influência do nível de escolaridade para inserção no mercado de trabalho, e foram obtidos a partir das narrativas dos quatro agentes e 22 alunas que participaram da pesquisa.

Relações raciais no mercado de trabalho no Brasil

Os entrevistados não afirmaram explicitamente que a democracia racial é um mito, como pode ser observado nas falas a seguir: A4: “deve haver nas empresas premiar a meritocracia e a competência. Difícil afirmar tanto que há quanto que não há democracia racial, pois acredito que esteja ligado ao gestor/estilo de gestão, mas acredito estamos caminhando para que haja democracia racial nas empresas”; A1: “pensando que a gente está na parte inicial de recrutamento, tem sim. É igual para todo mundo”; A3: “Acredito que a diversidade e a questão racial têm melhorado nestes últimos anos. ” Por sua vez, A2 faz um contraponto aos demais agentes: “não, claro que não. Empresa nenhuma é democrática. Não existe democracia... [...]... equidade... não, nunca é.… chegaremos lá... é com tempo...”.

A diversidade enfatizada por A3 é uma metanarrativa de uma estratégia para mitigar o mito da democracia racial que vem sendo gradativamente introduzido nas empresas, visando reduzir a discriminação por raça e etnia.

Para a EN1 e a EN2, existe sim discriminação. EN1: “sim. Diretos. Preconceitos raciais, [...] tem padrão de beleza; [...] dependendo do cargo, a gente vê assim o cenário de pessoas que trabalham atualmente. Ainda tem as pessoas gordas, com algum tipo de deficiência, não só negros, [...] os cargos mais altos não são ocupados por essas pessoas [...]”; EN2: “sim. [...] (risos). Oh, gênero, raça, aparência física, tem preconceito também contra universidade”. Isso mostra a complexidade do conceito de diversidade nas empresas porque é uma variável sujeita a significados e valores culturais e muitas vezes se trata de uma medida para fins puramente comerciais (Ferreira, I. L. Oliveira, Nunes, & Castro, 2020Ferreira. C. A. A., & Nunes, S. C. (2020). Mulheres negras: um marcador da desigualdade racial. Revista da Associação Brasileira de pesquisadores/As Negros/As, 12(33), 508-534. Retrieved from https://doi.org/10.31418/2177-2770.2020.v12.n.33.p508-534
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). Além disso, evidencia-se como os estigmas são impedimentos à ascensão a cargos de alto escalão nas organizações.

A democracia racial propagada com a ideologia da meritocracia favorece os brancos e dificulta o combate ao racismo, por isso a importância dos movimentos negros que lutam por políticas sociais de reparação pela violência sofrida em mais de três séculos de escravidão (1550 a 1888) no Brasil. Essa democracia não proporciona às mulheres negras as mesmas oportunidades de inserção e crescimento profissional, falhando em combater estereótipos negativos (Paim & Pereira, 2011Paim, A. S., & Pereira, M. E. (2011). Aparência física, estereótipos e discriminação racial. Ciências & Cognição, 16(1), 002-018., 2018) ou estigmas (Goffman, 2004Goffman, E. (2004). Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. São Paulo, SP: LTC.; Santos & Scopinho, 2011Santos, E. F., & Scopinho, R. A. (2011). Fora do jogo? Jovens negros no mercado de trabalho. Arquivos Brasileiro de Psicologia, 63(spe), 26-37.) e deixando-as marginalizadas na sociedade brasileira. O corpo negro na semiótica racial ainda remete ao lugar predeterminado de subordinação e exclusão e os signos raciais remetem à estigmatização (Sales, 2006Sales, R. Jr. (2006). Democracia racial: o não-dito racista. Tempo social, 18(2), 229-258. Retrieved from https://doi.org/10.1590/S0103-20702006000200012
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).

Influência da escolaridade para inserção no mercado de trabalho: inserção e seleção

No discurso dos quatro recrutadores, as mulheres negras têm as mesmas oportunidades que as mulheres brancas para conseguir um emprego. Entretanto, o recrutador A4 reconhece que as mulheres negras são minoria no processo seletivo para a função de docente em cursos de graduação. Os quatro recrutadores enfatizam que seu foco de análise na seleção está nas habilidades comportamentais e de relacionamento, além da experiência observada na carteira de trabalho. A4 reforça esse discurso na fala: “[mulheres negras] são minoria nos processos seletivos, talvez pela menor escolaridade delas, já que se trata de seleção de docentes para graduação”. Para o A1: “vamos focar naquelas competências comportamentais, além da experiência, naquela carteira de trabalho que a pessoa traz, nos empregos anteriores, a seleção vai focar nas competências que ela apresenta, nas habilidades de relacionamento, tudo igual, não tem restrição não”.

A desigualdade é uma barreira principalmente para as estudantes negras:

EN3: Eu acredito que sim, porque [...] um jovem que frequentou a vida inteira uma escola particular, cursinho, tem acesso a curso de inglês, curso de computação, está sempre ali, às vezes, só no cursinho e na escola. E na escola pública, o que eu via bastante na minha realidade, eram pessoas assim que tinham que trabalhar, depois da escola tinha que trabalhar. Ninguém nunca fez um cursinho de inglês, ninguém nunca fez um cursinho de informática, poucos tinham feito informática.

Nessa direção, os discursos mostram como a desigualdade social pode interferir na escolha do emprego e na ascensão ao poder. Para a EN1, “todas as pessoas que sofrem com a desigualdade racial, elas só não se ascendem socialmente mais do que tem acontecido, porque tudo tem uma influência direta tipo, educação, saúde, alimentação (risos) ”. Isso também é confirmado pela EN8, “Sim dificulta. Pelo fato [...] de haver preconceito contra as classes de menor poder aquisitivo, de achar que eles vão ser menos inteligentes, menos qualificados pela condição financeira”.

EB3: Eu acho que a desigualdade no nosso país não é só social, é intelectual, é cultural, ela dificulta tudo, eu tenho acesso a vários bens e serviços. Eu tenho acesso, isso é só para mim saber, não para eu conseguir usufruir, então existe, sim, mais diferença, que isso acaba afetando muito, mas principalmente, a população excluída, porque eu jamais, se não fosse um programa social, eu jamais estaria aqui, se não fosse um programa social, eu teria passado fome com meus filhos, então assim, numa exclusão.

Dias e Pinto (2019Dias, E., & Pinto, F. C. F. (2019). Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas em Educação. Educação e Sociedade, 27(104), 449-454. Retrieved from https://doi.org/10.1590/s0104-40362019002801080001
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) apontam que por meio da educação surge uma nova realidade social, configurando-se como uma ferramenta de transformação. O IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2019), indica a importância da educação no mercado de trabalho e mostra que a taxa de desemprego para a população branca, que também apresenta um maior nível de escolaridade, foi de 9.5%. Já essa taxa no caso da população negra - uma parte da população que possui baixa escolaridade - foi de 14,1%. Por isso, o acesso à educação superior é um caminho para reduzir a desigualdade.

Os discursos meritocráticos insinuam que todos têm a mesma oportunidade (A. A. Souza & Dias, 2018Souza, A. A., & Dias, R. C. P. (2018). Mérito não é para qualquer um: a percepção de gerentes negros sobre o seu processo de ascensão profissional. Organizações & Sociedade, 25(87), 551-567. Retrieved from https://doi.org/10.1590/1984-9250871
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). Fernandes (2016Fernandes, A. D. (2016). The black genre: notes on gender, feminism and negritude. Revista Estudos Feministas, 24(3), 691-713. Retrieved fromhttps://doi.org/10.1590/1806-9584-2016v24n3p691
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) aponta que essa ideologia está relacionada ao universalismo, ao sexismo e ao racismo, e meritocracia produz atitudes discriminatórias de racismo e machismo. O mito da democracia racial exclui os negros de alcançar uma boa educação e leva à necessidade de políticas sociais, como a lei de cotas para acesso ao ensino superior (Machado et al., 2018Machado, C. Jr., Bazanini, R., & Mantovani, D. M. N. (2018). O mito da democracia racial no mercado de trabalho: análise crítica da participação dos afrodescendentes nas empresas brasileiras. Organizações & Sociedade, 25(87), 632-655. Retrieved fromhttps://doi.org/10.1590/1984-9250875
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; Silva, 2018Silva, T. D. (2018). Ação afirmativa para ingresso de negros no ensino superior: formação multinível da agenda governamental. Revista do Serviço Público, 69(2), 07-34. Retrieved from https://doi.org/10.21874/rsp.v69i2.1771
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).

Um dos recrutadores discorda da igualdade de oportunidades, dizendo que é raro ter candidatos negros para vagas que atendam às demandas do cargo. O recrutador declarou não saber quantos dos profissionais negros que foram enviados para as empresas - depois da primeira parte do processo de seleção - foram de fato contratados, e acredita que o preconceito é um desafio:

A2: grande questão é, de fato, a escolaridade. [...] raramente tem candidatas negras para as vagas [...] porque as vagas exigem...muitas, a grande maioria, exige uma escolaridade “X” que raramente as negras chegam até lá. Mas tem mudado [...] hoje você já vê algum protagonismo de mulheres e vê mais negras no processo. Na agência, a seleção é por competência, mas na empresa “lá dentro a gente não sabe.... Não sei o quanto tem entrado de fato, [...] eu acho: :(reforço no discurso) que esbarra no preconceito, porque é quando o gestor tem que escolher, inconsciente ou conscientemente, ele exclui...”.

As pessoas negras participam no mercado de trabalho em uma condição de maior vulnerabilidade e desequilíbrio em comparação com as pessoas brancas. No caso das mulheres negras, há menos oportunidades para que elas mostrem sua competência e valor. As pesquisas têm mostrado que o racismo, a desigualdade racial e a estética da mulher negra tornaram-se importantes barreiras para sua inserção no mercado de trabalho.

A4: Sim. Embora não seja na minha empresa um critério para admissão, acredito que a menor escolaridade é um limitador para essa inserção [no mercado de trabalho], pois cada vez mais o processo tecnológico exige dos colaboradores capacidades e habilidades que, por vezes, são construídas a partir da realização de cursos de aperfeiçoamento e de mais anos de educação formal e é possível inferir que a mulher negra tem menos tempo de educação formal e de nível educacional, como graduação e posterior.

E A3 afirma: “no nosso caso, não há nenhuma distinção de raça, então não vejo desafios quanto a isso”. Com diferentes efeitos de sentido, formam-se as seguintes narrativas:

A1: Muitos. Acho que é muito desafiador... acho que a mulher tem muitos desafios, a mulher negra mais ainda, porque acho que a gente tem que ficar se provando o tempo todo... acho que isso é muito difícil...você se provar...é muito difícil, de se fazer invisível na aparência e só visível na competência...é um grandessíssimo desafio...então acho que é a questão de superar alguma deficiência de escolaridade que porventura exista.

A2: Como mostrar competência se eu não tenho a oportunidade? Então acho que é muito difícil. Acho que essa questão da rede de relacionamento, para você ter essas indicações...ela é crítica. [...] A mulher negra, [...] não precisa ser trabalhada...ela precisa, sim, ser capacitada...capacitada...então, assim, a busca de capacitação, ela é importante...ela tem, sim, que se colocar capaz, mas uma vez ela estando apta, não é ela que eu tenho que trabalhar, é o outro lado.

As metanarrativas dos agentes sobre o processo de inserção no mercado de trabalho são baseadas na competência comportamental e técnica, sexismo/estereótipos, alocação profissional, natureza da posição a ser preenchida, e a dificuldade de dar iguais oportunidades para as mulheres. A seleção ocorre por competência, indicação (interna, externa), aparência pessoal e custo do processo de recrutamento e seleção. Essas afirmações são congruentes com as práticas racistas que os EUA têm exportado e que são ainda hoje adotadas no Brasil (Alves & Galeão-Silva, 2004Alves, M. A., & Galeão-Silva, L. G. (2004). A crítica da gestão da diversidade nas organizações. RAE-Revista de Administração Eletrônica, 44(3), 20-29. Retrieved from https://doi.org/10.1590/S0034-75902004000300003
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).

A classe social a que a mulher negra pertence ou pertenceu é um fator limitante. Essa mulher dificilmente tem acesso à educação de qualidade desde sua socialização primária e luta pela permanência na escola - que é um espaço privilegiado de construção de conhecimento. Portanto, a mulher negra é privada de capital cultural, aquele oriundo da educação formal e que dá base ao indivíduo e acesso a mercados qualificados (Bourdieu, 2002bBourdieu, P. (2002b). Espaço social e gênese das classes. In P. Bourdieu (Ed.), O poder simbólico (pp.107-120). Rio de Janeiro, RJ: Bertrand Brasil., 2005Bourdieu, P. (2005). Condição de classe e posição de classe. In P. Bourdieu (Ed.), A economia das trocas simbólicas(pp.27-78). São Paulo, SP: Perspectiva.). É importante notar que o capital social qualifica a posição relativa das pessoas na estrutura (Bourdieu, 2005Bourdieu, P. (2005). Condição de classe e posição de classe. In P. Bourdieu (Ed.), A economia das trocas simbólicas(pp.27-78). São Paulo, SP: Perspectiva.) e o capital cultural influencia o social devido à probabilidade de confiança e conexão com outras pessoas de status mais elevado (Bourdieu, 2002bBourdieu, P. (2002b). Espaço social e gênese das classes. In P. Bourdieu (Ed.), O poder simbólico (pp.107-120). Rio de Janeiro, RJ: Bertrand Brasil.).

A classe social é um fator condicionante para as mulheres negras interseccionando gênero e raça (Crenshaw, 1991Crenshaw, K. W. (1991, July). Mapping the margins: intersectionality, identity politics and violence against women of color. Stanford Law Review, 46(6),1241-1299. Retrieved from https://doi.org/10.2307/1229039
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, 2002Crenshaw, K. W. (2002). Documento para o encontro de especialistas em aspectos da discriminação racial relativos ao gênero. Revista de Estudos Feministas, 10(1),171-188. Retrieved fromhttps://doi.org/10.1590/S0104-026X2002000100011
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; Cho et al., 2013Cho, S., Crenshaw, K. W., & McCall, L. (2013). Intersectionality: Theorizing power, empowering theory. Signs: Journal of Women in Culture and Society, 38(4),785-810. Retrieved from https://doi.org/10.1086/669608
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), dificultando o acesso dessas mulheres a uma educação de qualidade, a diversificação de suas habilidades para atender as necessidades do mercado de trabalho, e a obtenção de empregos compatíveis com as suas competências. Ressalta-se que o racismo nas organizações se materializa com o preconceito de marca negando a identidade da mulher negra (Ferreira & Nunes, 2020Ferreira. C. A. A., & Nunes, S. C. (2020). Mulheres negras: um marcador da desigualdade racial. Revista da Associação Brasileira de pesquisadores/As Negros/As, 12(33), 508-534. Retrieved from https://doi.org/10.31418/2177-2770.2020.v12.n.33.p508-534
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), dados os estereótipos negativos relacionados ao seu cabelo e cor da pele (Goffman, 2004Goffman, E. (2004). Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. São Paulo, SP: LTC.; Paim & Pereira, 2011Paim, A. S., & Pereira, M. E. (2011). Aparência física, estereótipos e discriminação racial. Ciências & Cognição, 16(1), 002-018., 2018Paim, A. S., &Pereira, M. E. (2018). O julgamento da boa aparência em seleção de pessoal. Organizações & Sociedade, 25(87), 656-675. Retrieved from https://doi.org/10.1590/1984-9250876
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). Assim, é fundamental quebrar as estruturas racistas nas empresas para avançar na inserção da mulher negra no mercado e diminuir a desigualdade racial e social, evitando que sejam levadas a aproximarem-se dos estereótipos de branquitude.

O racismo institucional é proeminente nas organizações que não dão importância a diversidade em suas práticas. Elas subestimam os empregados negros e seus processos de recrutamento e políticas salariais e de promoção são afetados por estereótipos que levam ao preconceito contra esses profissionais. O processo de recrutamento e seleção é desenhado em base a gênero, raça, e separação de classes (como gerentes e trabalhadores), gerando categorias de funcionários com salários diferenciados. Tanto as interações quanto os comportamentos são afetados pelos construtos raça, gênero e classe social, mostrando a invisibilidade da desigualdade (Acker, 2006Acker, J. (2006). Inequality regimes: gender, class, and race in organizations. Gender & Society, 20(4),441-464. Retrieved from https://doi.org/10.1177/0891243206289499
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) e a interseccionalidade de gênero, raça e classe social como um desafio para as mulheres negras se realizarem profissionalmente (Crenshaw, 2002Crenshaw, K. W. (2002). Documento para o encontro de especialistas em aspectos da discriminação racial relativos ao gênero. Revista de Estudos Feministas, 10(1),171-188. Retrieved fromhttps://doi.org/10.1590/S0104-026X2002000100011
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; Cho et al., 2013Cho, S., Crenshaw, K. W., & McCall, L. (2013). Intersectionality: Theorizing power, empowering theory. Signs: Journal of Women in Culture and Society, 38(4),785-810. Retrieved from https://doi.org/10.1086/669608
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).

Os signos de linguagem obtidos a partir do discurso dos 26 entrevistados mostram a situação social das mulheres negras em relação as questões educacionais para o mercado de trabalho. Esses signos mostram os tons apreciativos percebidos e constituem traços de enunciação (Bakhtin & Volóchinov, 1995Bakhtin, M. M., & Volochinov, V. N. (1995). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico da linguagem (7a ed.). São Paulo, SP: Hucitec.). A estratificação social é uma forma de acabar com os sujeitos por meio de signos raciais no sistema capitalista. Qualquer signo é visto como associação de um significante e de um significado (Ducrot, 1984Ducrot, O. (1984). Referente. In Imprensa Nacional, & Casa da Moeda (Eds.), Enciclopédia Einaudi: linguagem e enunciação (pp. 418-438). Lisboa, Portugal: Author.), e os discursos trazem sentidos potenciais, realizados somente na produção do discurso de exclusão por seus signos e classe social.

O discurso é o espaço de privilégio da organização na sociedade (Marcuschi, 2004Marcuschi, L. A. (2004). O léxico: lista, rede ou cognição social?In M. J. Foltran (Org.), Sentido e significação: em torno da obra de Rodolfo Ilari(pp. 263-284), São Paulo, SP: Contexto.). Portanto, a análise dos processos constitutivos de referenciação mostra como os sujeitos adotam as práticas discursivas e cognitivas, social e culturalmente situadas, para construir versões públicas do mundo, que se transformam de acordo com os diferentes contextos (Lopes, 2004Lopes, M. A. P. T. (2004). Referenciação e gênero textual - atividades sócio - discursivas em interação. In I. L. Machado, & R. Mello (Orgs.), Gêneros: reflexão em análise do discurso (pp. 205-219), Belo Horizonte, MG: UFMG.).

Na análise linguística, percebe-se o pensamento de profissionais e estudantes em associação com sua externalidade social, representada pelas ações de linguagem que dão forma ao social. Segundo Bronckart (1997Bronckart, J. P. (1997). Activité langagière, textes et discours. Pour un interactionisme socio-discurs. Paris, France: Delachaux et Niestlé., p. 13), essas ações são capacidades de ação e intenção de poder fazer e querer fazer. O ser humano, ao se comunicar por meio da fala ou da escrita, desenvolve ações que denotam sua intenção e, ao mesmo tempo, sua experiência e o modo como foi influenciado por ela (Saussure, 1972Saussure, F. (1972). A natureza do signo linguístico. In F. Saussure (Ed.), Curso de linguística geral (pp. 79-84). São Paulo, SP: Cultrix.).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo do presente estudo foi analisar as relações raciais presentes na sociedade brasileira que interseccionam gênero e classe social e influenciam a inserção de mulheres negras e brancas no mercado de trabalho formal, utilizando-se de discursos de estudantes do sexo feminino e de recrutadores de empresas brasileiras. O discurso moderno da sociedade capitalista usa o argumento da meritocracia para mostrar democracia racial, como se em algum momento houvesse igualdade racial no Brasil. A prática das experiências de estudantes negras - e aquela apontada por estudantes brancas - denunciam a interseccionalidade de gênero, raça e classe, com tripla discriminação, contrariando o discurso de alguns dos recrutadores entrevistados.

A baixa participação de mulheres negras nas empresas, independentemente do nível educacional, é condicionada pelas subjetividades dos gestores. Portanto, é possível que a gestão estratégica de pessoas seja capaz de interromper o recrutamento e seleção discriminatórios, permitindo que se alcance nas empresas - na prática - a diversidade de gênero, racial e outras. É fundamental apontar como a interseccionalidade das opressões e também dos privilégios inviabiliza o discurso meritocrático em processos seletivos. Fica evidente a diferença entre o discurso pró-diversidade (durante os processos de seleção) e a realidade atual das contratações (vide o perfil médio dos empreendedores no Brasil). O presente estudo aponta a necessidade de políticas afirmativas para a população negra, especialmente para as mulheres, devido à tripla discriminação a que estão sujeitas na sociedade brasileira.

Limitações e sugestões: A pesquisa entrevistou apenas recrutadores que trabalham em organizações localizadas em Belo Horizonte, Brasil. O método de análise deixa claro que os depoimentos refletem o contexto social e histórico dos sujeitos entrevistados, sugerindo que outras estudantes e recrutadores, em outros contextos, podem apresentar diferentes impressões. Outros estudos devem explorar relações raciais em outros países americanos utilizando a interseccionalidade, uma vez que essa perspectiva denuncia como as relações raciais influenciam a vida das mulheres negras.

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  • [Artigo traduzido]

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Mar 2023
  • Data do Fascículo
    Jan-Feb 2023

Histórico

  • Recebido
    16 Fev 2022
  • Aceito
    09 Jun 2022
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