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Análise socioclínica do contexto do trabalho e sua relação com o adoecimento mental de policiais militares do Distrito Federal

Análisis socioclínico del contexto laboral y su relación con la enfermedad mental de policías militares en el Distrito Federal

Resumo

Transtornos mentais e comportamentais apresentam-se como a terceira maior causa de incapacidade para o trabalho policial. Esta pesquisa objetiva analisar, por meio da Sociologia Clínica e da Análise de Discurso Crítica, o contexto do trabalho da Polícia Militar do Distrito Federal e sua relação com o adoecimento mental dos policiais. Esta investigação foi realizada por intermédio do estudo etnográfico. Notas de observação participante e entrevistas contribuíram para a coleta de dados e a formação do corpus. A análise explorou o significado representacional dos discursos, utilizando as categorias transitividade, representação de atores sociais e seleção lexical. Os resultados apontam a organização do trabalho; os conflitos interpessoais; a fragilização dos laços sociais e os abusos de poder como os principais desencadeadores do adoecimento psíquico. Atentar para os cuidados com a saúde mental do policial deve ser ação contínua da corporação, bem como compor a pauta da agenda do Distrito Federal com o fomento de iniciativas de proteção dos profissionais e, consequentemente, da sociedade.

Palavras-chave:
Contexto do trabalho; Adoecimento psíquico; Policiais militares; Sociologia Clínica

Resumen

Los trastornos mentales y del comportamiento son la tercera causa de incapacidad para el trabajo policial. Esta investigación tiene como objetivo analizar, a través de la Sociología Clínica y el análisis crítico del discurso, el contexto de trabajo de la Policía Militar del Distrito Federal y su relación con la enfermedad mental de los policías. Se llevó a cabo a través de un estudio etnográfico. Las notas de observación de los participantes y las entrevistas contribuyeron a la recopilación de datos y la formación del corpus. El análisis exploró el significado representacional de los discursos, utilizando las siguientes categorías: transitividad, representación de actores sociales y selección léxica. Los resultados destacan la organización del trabajo, los conflictos interpersonales, el debilitamiento de los lazos sociales y el abuso de poder como los principales desencadenantes de la enfermedad psíquica. La atención al cuidado de la salud mental del policía debe ser una acción continua de la corporación y formar parte de la agenda del Distrito Federal, promoviendo iniciativas para proteger a los profesionales y, consecuentemente, a la sociedad.

Palabras clave:
Contexto de trabajo; Enfermedad psíquica; Policía militar; Sociología Clínica

Abstract

Mental and behavioral disorders are the third leading cause of incapacity in police work. This research analyzes, through Clinical Sociology and Critical Discourse Analysis, the context of the work of the Military Police of the Federal District and its relationship with the mental illness of police officers. This was an ethnographic study. Participant observation notes and interviews contributed to data collection and corpus formation. The analysis explored the representational meaning of the discourses using the following categories: transitivity, representation of social actors, and lexical selection. The results point to the organization of work, interpersonal conflicts, weakening social bonds, and abuse of power as the main triggers of mental illness. Paying attention to the mental health care of police officers must be a continuous action of the corporation and part of the Federal District’s agenda, promoting initiatives to protect professionals and, consequently, the safety of society.

Keywords:
Work context; Mental illness; Military police; Clinical Sociology

INTRODUÇÃO

É expressivo o número de denúncias da violência policial no Brasil, o que merece o incremento de políticas públicas no campo. Não obstante, também é grande o número de policiais que se afastam do trabalho em virtude de várias modalidades de transtornos psicológicos, evidenciando-se a necessidade de se estudar a relação do trabalho desenvolvido em organizações militares e a deterioração da saúde mental. Em relação à população em geral, a literatura nacional aponta que policiais militares integram a classe profissional mais vulnerável e suscetível ao acometimento por sofrimentos psíquicos associados a fatores como risco, inclusive de morte; pressões; tensões e cobranças institucionais (Dias, 2020; R. O. B. Santos, Hauer, & Furtado, 20l9; Winter, & Alf, 2019Winter, L. E., & Alf, A. M. (2019). A profissão do policial militar: vivências de prazer e sofrimento no trabalho. Rev. Psicologia Organizações e Trabalho, 19(3), 671-678. Recuperado dehttp://dx.doi.org/10.17652/rpot/2019.3.13214
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).

Suicídios e tentativas de suicídio entre profissionais de segurança pública avolumam as estatísticas de morte de policiais dentro e fora das corporações (Dombroski, 2017Dombroski, M. (2017). Changing police culture: raising awareness of the importance of mental health (Dissertação de mestrado). University of Alaska Fairbanks. University of Alaska, Fairbanks, Alaska.; M. A. Silva & Bueno, 2017Silva, M. A., & Bueno, H. P. V. (2017). O suicídio entre policiais militares na Polícia Militar do Paraná: esforços para prevenção. Revista de Ciências Policiais da APMG, 1 (1), 5-23.; Violanti, Owens, McCanlies, Fekedulegn, & Andrew, 2019Violanti, J. M., Owens, S. L., McCanlies, E., Fekedulegn, D., & Andrew, M. E. (2019), Law enforcement suicide: a review. Policing: an International Journal, 42(2), 141-164. Recuperado dehttps://doi.org/10.1108/PIJPSM-05-2017-0061
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). Consumo de drogas lícitas e ilícitas; transtorno de ansiedade; transtorno de humor; transtorno de estresse pós-traumático; depressão e estresse também figuram entre os registros clínicos na saúde mental de policiais militares (R. O. B. Santos et al., 2019Santos, R. O. B., Hauer, R. D., & Furtado, T. M. G. (2019). O sofrimento psíquico de policiais militares em decorrência de sua profissão: revisão de literatura. Revista Gestão & Saúde, 20(2), 14-27.). Adicionalmente, Portela e Bughay (2007Portela, A., & Bughay, A. Filho. (2007). Nível de estresse de policiais militares: comparativo entre sedentários e praticantes de atividade física. Lecturas: Educación Física y Deportes, 11(106), 13.) relatam insônia; dor de cabeça; falência na memória; apatia; agressividade e mau humor como manifestações frequentes na literatura sobre o trabalho policial militar.

Omitir-se diante dessa realidade significa forte risco social. Isso porque negligenciá-la é permitir que um policial psicologicamente desequilibrado possa, em situações de conflito, cometer excessos e agir violentamente. Na verdade, o transtorno mental fragiliza a capacidade de elaboração psíquica desses profissionais, pois compromete a mobilização de recursos que permite encontrar alternativas que se distanciem da agressividade e da violência vividas no cotidiano da profissão.

Diante de tal contexto, buscamos nos ancorar teoricamente em um campo de estudo que: a) tivesse preocupação tanto social quanto psíquica, para que conseguisse sustentar o estudo e b) colocasse o sujeito no centro do palco da análise realizada. Nesse sentido, recorremos à Sociologia Clínica para nos amparar nesta pesquisa. A Sociologia Clínica s estuda os fenômenos sociais com base no concreto do trabalho, das formas singulares em que os sujeitos constroem, significam e relacionam a realidade social (Gaulejac, 2007Gaulejac, V. (2007). Gestão como doença social. Aparecida, SP: Ideias e Letras.; Lhuilier, 2006Lhuilier, D. (2006). Cliniques du travail. Nouvelle Revue de Psychosociologie, 1(1), 179-193. Recuperado dehttps://doi.org/10.3917/nrp.001.0179
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; Pagès, Bonetti, Gaulejac, & Descendre, 2006Pagès, M., Bonetti, M., Gaulejac, V., & Descendre, D. (2006). O poder das organizações: a dominação das multinacionais sobre indivíduos. São Paulo, SP: Atlas.). Aqui o trabalho é responsável pela constituição individual e social do ser, objeto de investimento libidinal, alvo de amor e reconhecimento (Enriquez, 1991Enriquez, E. (1991). Da horda ao estado: psicanálise do vínculo social. Rio de Janeiro, RJ: Zahar.; Gaulejac, 2007Gaulejac, V. (2007). Gestão como doença social. Aparecida, SP: Ideias e Letras.; Hanique, 2009Hanique, F. (2009). Enjeux théoriques et méthodologiques de la sociologie clinique. Informations Sociales, 156(6), 32-40.), que retoma “as dimensões singulares dos destinos individuais ao posto de determinismo social” (Hanique, 2009Enriquez, E. (1997). A organização em análise. Petrópolis, RJ: Vozes., p. 32). Diante disto, a subjetividade da dimensão existencial do sujeito e suas significações psicossociológicas se tornam o objeto central da escuta clínica, a partir do qual o pesquisador busca retratar o universo próprio desse sujeito, especialmente na relação que ele mantém com seu trabalho.

A apropriação do conceito de clínica faz alusão à aproximação do indivíduo que fala, privilegiando sua compreensão da realidade social sem nenhuma pretensão de uma explicação causal (Lhuilier, 2006Lhuilier, D. (2006). Cliniques du travail. Nouvelle Revue de Psychosociologie, 1(1), 179-193. Recuperado dehttps://doi.org/10.3917/nrp.001.0179
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). A Sociologia Clínica coloca em primeiro plano o sujeito existencial, tanto em nível teórico quanto prático (Rhéaume, 2009Rhéaume, J. (2009). La sociologie clinique comme pratique de recherche en institution. Le cas d’un centre de santé et services sociaux. Sociologie et Sociétés, 41(1), 195-215. Recuperado dehttps://doi.org/10.7202/037913ar
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), ajudando-o a entender melhor as fontes de suas ações dentro das organizações (Moreau, 2014Moreau, D. B. (2014). Pour une sociologie utile: la sociologie d’intervention. Annales des Mines - Gérer et comprendre, 115(1), 64-73. Recuperado dehttps://doi.org/10.3917/geco.115.0064
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).

Estudar o trabalho sob o prisma da Sociologia Clínica é uma tentativa de compreender a realidade com base nas interações do trabalhador e na estrutura social entre ele e a sociedade, entre o sujeito social e o sujeito existencial (Nunes & P. H. I. Silva, 2018Nunes, C. G. F., & Silva, P. H. I. (2018). A sociologia clínica no Brasil. Revista Brasileira de Sociologia, 6(12), 181-99. Recuperado dehttps://doi.org/10.20336/rbs.239
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). É conhecer o macro levando em conta o micro, é compreender o organizacional alicerçado nas práticas cotidianas do sujeito no trabalho.

Segundo a análise do contexto do trabalho, visto como a integração da organização do trabalho, as condições em que ele se realiza e as relações socioprofissionais existentes, identificou-se que o trabalho policial é atravessado por dois importantes dispositivos de controle: a racionalidade do poder burocrático e a subjetividade da ideologia gerencialista. A associação desses elementos tende a exercer forte pressão sobre o psicológico dos sujeitos, afetando sua saúde mental.

Atentar para as especificidades e os riscos psicossociais das atividades laborais é demanda de primeira necessidade tanto para as instituições militares quanto para a sociedade como um todo, para ampliar, de um lado, a segurança e, de outro, garantir a prática ética no trabalho realizado. Entretanto, apesar das iniciativas de atenção psicossocial nas instituições policiais militares, vê-se o aumento do número de adoecimentos, afastamentos, uso inadequado da força e suicídios de policiais por motivos psicológicos (Bhatia & Pandit, 2017Bhatia, K. M., & Pandit, N. (2017). Prevalence of chronic morbidity and sociodemographic profile of police personnel - a study from Gujarat. Journal of Clinical and Diagnostic Research: JCDR, 11(9), LC06-LC09. Recuperado dehttps://doi.org/10.7860/JCDR/2017/27435.10586
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; Dombroski, 2017Dombroski, M. (2017). Changing police culture: raising awareness of the importance of mental health (Dissertação de mestrado). University of Alaska Fairbanks. University of Alaska, Fairbanks, Alaska.; Edwards & Kotera, 2021Edwards, A., & Kotera, Y. (2021). Mental health in the UK Police Force: a qualitative investigation into the stigma with mental illness. International Journal of Mental Health and Addiction, 19, 1116-34. Recuperado dehttps://doi.org/10.1007/s11469-019-00214-x
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; M. A. Silva & Bueno, 2017Silva, M. A., & Bueno, H. P. V. (2017). O suicídio entre policiais militares na Polícia Militar do Paraná: esforços para prevenção. Revista de Ciências Policiais da APMG, 1 (1), 5-23.; Violanti et al., 2019Violanti, J. M., Owens, S. L., McCanlies, E., Fekedulegn, D., & Andrew, M. E. (2019), Law enforcement suicide: a review. Policing: an International Journal, 42(2), 141-164. Recuperado dehttps://doi.org/10.1108/PIJPSM-05-2017-0061
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; Winter & Alf, 2019Winter, L. E., & Alf, A. M. (2019). A profissão do policial militar: vivências de prazer e sofrimento no trabalho. Rev. Psicologia Organizações e Trabalho, 19(3), 671-678. Recuperado dehttp://dx.doi.org/10.17652/rpot/2019.3.13214
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).

Considerando esses apontamentos, este estudo questiona: como o contexto do trabalho policial militar contribui para o adoecimento psíquico dos policiais na Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF)? Para tanto, o objetivo consiste em analisar, por meio da Sociologia Clínica e da Análise de Discurso Crítica (ADC), o contexto do trabalho da PMDF e sua relação com o adoecimento mental desses trabalhadores.

Balizado pela episteme própria da Sociologia Clínica, este estudo enfoca os aspectos subjetivos, tanto em nível individual quanto coletivo, que envolvem a relação trabalho e adoecimento mental. Há, assim, a pretensão de romper com o caráter meramente instrumental e tecnicista, com vistas a contribuir o repensar crítico das práticas organizacionais. Afastar-se desse olhar pode ajudar na compreensão e no desenvolvimento de mecanismos capazes de colaborar com o entendimento da realidade organizacional, sob uma perspectiva crítica, de forma a promover novos conhecimentos e soluções. A pouca ocorrência de estudos dessa natureza, sobre transtornos mentais na área policial, que se afastam da tradição e ortodoxia positivista, pode ensejar achados capazes de gerar novas aplicações à realidade organizacional e, por sua vez, alterações que repercutam uma visão mais humanizada daqueles que exercem a profissão policial militar.

PERCURSO ONTOEPISTEMOLÓGICO: DELINEANDO CONCEITOS E PERSPECTIVAS DE ANÁLISE

Ao problematizar o contexto de trabalho como fonte do adoecimento mental de policiais, à luz da Sociologia Clínica, esta pesquisa assume uma perspectiva teórico-crítica ao afastar-se da visão hegemônica utilitarista, que tem predominância nos estudos organizacionais. Analisar as organizações apoiado na Sociologia Clínica é fundamentar-se em uma epistemologia de pesquisa do sentido, levando em conta a dinâmica social da intersubjetividade do sujeito. Envolve uma abordagem individual ou coletiva de sujeitos ou de uma organização às voltas com um sofrimento, em que a escuta realizada percebe o sujeito na sua singularidade, vivo, desejante (Hanique, 2009Hanique, F. (2009). Enjeux théoriques et méthodologiques de la sociologie clinique. Informations Sociales, 156(6), 32-40.). O objeto de pesquisa é desvelado segundo significações advindas das experiências dos próprios sujeitos e suas realidades (Grasseli & Salomone, 2012Grasseli, F., & Salomone, M. J. (2012, dezembro). La perspectiva teórico-metodológica de la sociología clínica: aportes para debate. Prisma Social: Revista de Investigación Social, 9, 83-109.), o que é essencial em âmbito da Sociologia Clínica.

Tal campo de estudo se ocupa do assujeitamento do indivíduo ao emprego, que se transformou em sinônimo exclusivo do que é trabalho, fomenta o conformismo, a passividade, a docilidade e a necessidade de se manter empregado (Lhuilier, 2006Lhuilier, D. (2006). Cliniques du travail. Nouvelle Revue de Psychosociologie, 1(1), 179-193. Recuperado dehttps://doi.org/10.3917/nrp.001.0179
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, 2013Lhuilier, D. (2013). Trabalho. Psicologia & Sociedade, 25(3), 483-92. Recuperado dehttps://doi.org/10.1590/S0102-71822013000300002
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). O trabalho, que deve ser compreendido com base em uma perspectiva dicotômica (do positivo e do negativo), do que é crescimento e também exploração e dor, torna-se “fator de mediação, que enriquece o mundo das coisas e empobrece a vida interior” (Tragtenberg, 2006Tragtenberg, M. (2006). Burocracia e ideologia. São Paulo, SP: Ática., p. 69). É nesse contexto que consideramos que as organizações definem as prioridades, os valores e a própria existência dos indivíduos, ancoradas na dependência econômica, psíquica e social (Franco, Druck, & Seligmann-Silva, 2010Franco, T., Druck, G., & Seligmann-Silva, E. (2010). As novas relações de trabalho, o desgaste mental do trabalhador e os transtornos mentais no trabalho precarizado. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, 35(122), 229-248. Recuperado dehttps://doi.org/10.1590/S0303-76572010000200006
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; Gaulejac, 2011Gaulejac, V. (2011). Travail, les raisons de la colère. Paris, Le Seuil: Économie humaine.).

Atentos a essas percepções da Sociologia Clínica no contexto do trabalho militar, verifica-se que este é marcado tanto pela racionalidade do poder burocrático quanto pela subjetividade da ideologia gerencialista. Associados às mudanças sociais e ao contexto do trabalho, esses elementos contribuem para o desencadeamento de problemas de saúde mental desses sujeitos.

A racionalidade burocrática, vista como um sistema de dominação e de controle de condutas (Ramos, 2006Ramos, A. G. (2006). A sociologia de Max Weber: sua importância para a teoria e a prática da administração. Revista do Serviço Público, 57(2), 267-82.; Tragtenbert, 2006Tragtenberg, M. (2006). Burocracia e ideologia. São Paulo, SP: Ática.), se materializa nas corporações militares por meio da racionalização das relações sociais que nela se reproduzem, evidenciando uma relação de submissão e subserviência, legal e tacitamente adotada e obedecida, em função de uma rígida hierarquia, divisão do trabalho, formalização de regras e procedimentos, ordem, disciplina e comando (Motta, 1981Motta, F. C. P. (1981). O poder disciplinar das organizações formais. Revista de Administração de Empresas, 21(4), 33-41. Recuperado dehttps://doi.org/10.1590/S0034-75901981000400003
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; Ramos, 2006Ramos, A. G. (2006). A sociologia de Max Weber: sua importância para a teoria e a prática da administração. Revista do Serviço Público, 57(2), 267-82.; Tragtenberg, 2006Tragtenberg, M. (2006). Burocracia e ideologia. São Paulo, SP: Ática.). A prescrição de normas e regulamentos tem a capacidade de instrumentalizar operadores, relações sociais de dependência e de controle (Lhuilier, 2013Lhuilier, D. (2013). Trabalho. Psicologia & Sociedade, 25(3), 483-92. Recuperado dehttps://doi.org/10.1590/S0102-71822013000300002
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).

A ideologia gerencialista, por sua vez, se manifesta com base na utilização de formas de controle mais subjetivas, que, longe da neutralidade, atuam em função do domínio físico, psicológico e afetivo dos seus membros (Enriquez, 1991Enriquez, E. (1991). Da horda ao estado: psicanálise do vínculo social. Rio de Janeiro, RJ: Zahar., 1997Enriquez, E. (1997). A organização em análise. Petrópolis, RJ: Vozes.; Pagès et al., 2006Pagès, M., Bonetti, M., Gaulejac, V., & Descendre, D. (2006). O poder das organizações: a dominação das multinacionais sobre indivíduos. São Paulo, SP: Atlas.). Essa ideologia encontra campo fértil no modelo militar de organização dada sua capacidade de fomentar idealizações e fantasias do desejo narcísico, visto na ilusão da superpotência, do vigor heroico e do poder simbólico percebidos pelos seus membros. Esse conjunto de fatores provoca um contínuo processo de silenciamento, introjeção do sofrimento, sensação de abandono e individualização.

CONTEXTO DO TRABALHO POLICIAL E COMPROMETIMENTO PSICOLÓGICO: REVISITANDO ESTUDOS SOBRE POLICIAIS MILITARES

A Sociologia Clínica caracteriza-se tanto pela criticidade - ao inspirar-se tanto na primeira geração da Escola de Frankfurt quanto na sociologia pragmática de Luc Boltanski - quanto pela clínica, em que se tem uma atenção muito próxima do outro. Sua ação volta-se para estar do lado do sujeito, promovendo sua fala e provendo a escuta. Assim, nesta pesquisa, o policial militar foi colocado no centro do palco e, com base no concreto do trabalho, ou seja, daquilo que ele vivência, foi possível identificar o contexto de trabalho desses profissionais, a organização do trabalho à qual ele está submetido, as relações socioprofissionais ali estabelecidas, sem se esquecer das condições de trabalho. São categorias que auxiliam a sistematizar os resultados da pesquisa, obtidos com as vivências do sujeito, os aspectos subjetivos que ocupam um espaço ímpar. O homem é analisado no vivido. É colocado em ação, analisado em suas contradições, confrontado e chamado à reflexão sistematizada.

A organização do trabalho militar fundamenta-se em dois pilares: a disciplina e a hierarquia (Minayo, E. R. Souza, & Constantino, 2008Minayo, M. C. S., Souza, E. R., & Constantino, P. (2008). Missão prevenir e proteger: condições de vida, trabalho e saúde dos policiais militares do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ: Fiocruz.; Owen, 2016Owen, O. (2016). Government properties: the Nigeria Police Force as total institution? Africa, 86(1), 37-58. Recuperado dehttps://doi.org/10.1017/S0001972015000790
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). O poder desses elementos é explicitado em rituais, mitos, símbolos e insígnias corporativas, que dizem aos seus membros o que é, como funciona, quem manda e quem obedece na estrutura militar. Lhuilier (2013Lhuilier, D. (2013). Trabalho. Psicologia & Sociedade, 25(3), 483-92. Recuperado dehttps://doi.org/10.1590/S0102-71822013000300002
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, p. 488), sob uma perspectiva socioclínica, chama atenção para o fato de que, mais do que técnicas e instrumentais, as normas carregam em si “a marca de conotações sociais e de cargas simbólicas em termos de poder hierárquico e de assujeitamento às lógicas da organização” (Lhuilier, 2013, p. 488). Os trabalhos de Antunes (2019Antunes, E. J. F. (2019). A hierarquia na Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro: uma análise crítica de seus impactos na saúde (Dissertação de mestrado). Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, RJ.), Miranda e Guimarães (2016Miranda, D., & Guimarães, T. (2016). O suicídio policial: o que sabemos? Dilemas: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social, 9(1), 1-18.) e de Spode e Merlo (2006Spode, C. B., & Merlo, & A. R. C. (2006). Trabalho policial e saúde mental: uma pesquisa junto aos capitães da Polícia Militar. Psicologia: Reflexão e Crítica, 19(3), 362-70. Recuperado dehttps://doi.org/10.1590/S0102-79722006000300004
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) ilustram os reflexos das relações hierárquicas e disciplinares no contexto do trabalho policial e o adoecimento mental.

No que se refere às relações socioprofissionais, entre os pares, elas são frágeis e os afetos são marcados, em sua maioria, por silenciamento, comunicação precária, descrédito, perseguições e inequidades na aplicação do regulamento. Nas relações sociais, o policial se vê limitado a ser, a todo tempo, o homem da lei, inibido e limitado a se permitir ir além das formalidades prescritas e expectativas, condicionado a ser exigente e temido. Antunes (2019Antunes, E. J. F. (2019). A hierarquia na Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro: uma análise crítica de seus impactos na saúde (Dissertação de mestrado). Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, RJ.), Gershon, Lin, e Li (2002Gershon, R. R. M., Lin, S., & Li, X. (2002). Work stress in aging police officers. Journal of Occupational and Environmental Medicine, 44(2), 160-167. Recuperado dehttps://doi.org/10.1097/00043764-200202000-00011
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), Mattos (2012Mattos, M. J. S. (2012). Reconhecimento, identidade e trabalho sujo na PMDF (Dissertação de Mestrado). Universidade de Brasília, Brasília, DF.), Winter e Alf (2019Winter, L. E., & Alf, A. M. (2019). A profissão do policial militar: vivências de prazer e sofrimento no trabalho. Rev. Psicologia Organizações e Trabalho, 19(3), 671-678. Recuperado dehttp://dx.doi.org/10.17652/rpot/2019.3.13214
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) comentam os efeitos deletérios das relações socioprofissionais do trabalho militar.

Quanto às condições de trabalho, Bhatia e Pandit (2017Bhatia, K. M., & Pandit, N. (2017). Prevalence of chronic morbidity and sociodemographic profile of police personnel - a study from Gujarat. Journal of Clinical and Diagnostic Research: JCDR, 11(9), LC06-LC09. Recuperado dehttps://doi.org/10.7860/JCDR/2017/27435.10586
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) mencionam que estas são marcadas por jornadas extensivas, hábitos alimentares irregulares, sono inadequado, escalas indefinidas e vida familiar e lazer que não são priorizados. Acrescentam-se ainda precarização e falta de material necessário para exercer, de forma adequada, as funções (Antunes, 2019Antunes, E. J. F. (2019). A hierarquia na Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro: uma análise crítica de seus impactos na saúde (Dissertação de mestrado). Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, RJ.); horários de trabalho irregulares, em condições climáticas nem sempre favoráveis e em posições geralmente desconfortáveis (Davey, Obst, & Sheehan, 2000Davey, J. D., Obst, P. L., & Sheehan, M. C. (2000). Work demographics and officers perceptions of the work environment which add to the prediction of at risk alcohol consumption within an Australian police sample. Policing: An International Journal of Police Strategies& Management, 23(1), 69-81. Recuperado dehttps://doi.org/10.1108/13639510010314625
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); instalações, material de trabalho e uniformes inadequados, especialmente para as policiais mulheres (Bezerra, Minayo, & Constantino, 2013Bezerra, C. M., Minayo, M. C. S., & Constantino, P. (2013). Estresse ocupacional em mulheres policiais. Ciência & Saúde Coletiva, 18(3), 657-66. Recuperado dehttps://doi.org/10.1590/S1413-81232013000300011
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) e sobrecarga de trabalho, por causa da falta de recursos humanos (Winter & Alf, 2019Winter, L. E., & Alf, A. M. (2019). A profissão do policial militar: vivências de prazer e sofrimento no trabalho. Rev. Psicologia Organizações e Trabalho, 19(3), 671-678. Recuperado dehttp://dx.doi.org/10.17652/rpot/2019.3.13214
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).

Cotidianamente, o policial está exposto à violência e a eventos desafiadores e perigosos (Jenkins, Allison, Innes, Violanti, & Andrew, 2018Jenkins, E. N., Allison, P., Innes, K., Violanti, J. M., & Andrew, M. E. (2018). Depressive Symptoms Among Police Officers: Associations with Personality and Psychosocial Factors. J Police Crim Psychol., 34(1), 66-77. Recuperado dehttps://doi.org/10.1007/s11896-018-9281-1
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), o que o obriga a se manter em estado de alerta permanente, sob intenso encargo emocional (Ferreira, M. A. F. Santos, Paula, Mendonça, & Carneiro, 2017Ferreira, L. B., Santos, M. A. F., Paula, K. M., Mendonça, J. M. B., & Carneiro, A. F. (2017). Riscos de adoecimento no trabalho entre policiais militares de um batalhão de Brasília. Gestão e Sociedade, 11(29), 1804-1829. Recuperado dehttps://doi.org/10.21171/ges.v11i29.2150
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). A expectativa é de que eles cumpram suas obrigações, submetidos aos requisitos legais que lhe cabem, sem perder a compostura e a sensibilidade, com controle emocional completo, como se isso fosse possível. Contudo, não se pode omitir que a negação das emoções tem consequências danosas ao sistema imunológico, comprometendo a saúde física e psicológica. E as emoções, assim como os afetos, são primordiais no âmbito da Sociologia Clínica, que são resultado de uma imbricação do social com o psíquico. Assim, nesse campo de estudo, as emoções, as crenças, os afetos e as paixões têm lugar privilegiado na análise. E o policial militar vivencia uma contradição geradora de conflito à medida que ele é instigado a controlar ao máximo seus afetos e emoções.

Diante dessa situação, verifica-se que o trabalho militar atribui aos policiais um posicionamento paradoxal, ora membros comuns da sociedade, ora agentes de regulação da ordem social. Nessa relação, o policial acaba ocupando um “não lugar” ao representar o poder público para a regulação da sociedade em caráter ininterrupto e, ao mesmo tempo, ser parte desse coletivo (J. H. R. Silva, 2009Silva, J. H. R. (2009). Estudo sobre o trabalho do policial e suas implicações na saúde mental (Dissertação de Mestrado). Universidade de São Paulo, São Paulo, SP.). Essa dualidade, associada aos demais elementos que compõem o contexto do trabalho, também pode comprometer a saúde mental dos policiais e, consequentemente, a segurança pública. O que pode ser observado em estudos que afirmam que o contexto do trabalho expõe os policiais a episódios psicologicamente agressivos, que comprometem a saúde mental e desencadeiam vários tipos de transtorno (Barreto, Kusterer, & Carvalho, 2019Barreto, C. R., Kusterer, L. L., & Carvalho, F. M. (2019). Work ability of military police officers. Rev. Saúde Pública, 53(30), 1-9. Recuperado dehttps://doi.org/10.11606/s1518-8787.2019053001014
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; Dombroski, 2017Dombroski, M. (2017). Changing police culture: raising awareness of the importance of mental health (Dissertação de mestrado). University of Alaska Fairbanks. University of Alaska, Fairbanks, Alaska.; Edwards & Kotera, 2021Edwards, A., & Kotera, Y. (2021). Mental health in the UK Police Force: a qualitative investigation into the stigma with mental illness. International Journal of Mental Health and Addiction, 19, 1116-34. Recuperado dehttps://doi.org/10.1007/s11469-019-00214-x
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; Winter & Alf, 2019Winter, L. E., & Alf, A. M. (2019). A profissão do policial militar: vivências de prazer e sofrimento no trabalho. Rev. Psicologia Organizações e Trabalho, 19(3), 671-678. Recuperado dehttp://dx.doi.org/10.17652/rpot/2019.3.13214
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).

O doping pode ser visto como recurso dos policiais para melhorar o desempenho e se adaptar ao trabalho (Crespin, Lhuilier, & Lutz, 2017Crespin, R., Lhuilier, D., & Lutz, G. (2017). Se doper pour travailler? Toulouse, France: Eres.). Bhatia e Pandit (2017Bhatia, K. M., & Pandit, N. (2017). Prevalence of chronic morbidity and sociodemographic profile of police personnel - a study from Gujarat. Journal of Clinical and Diagnostic Research: JCDR, 11(9), LC06-LC09. Recuperado dehttps://doi.org/10.7860/JCDR/2017/27435.10586
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) e Gershon et al. (2002Gershon, R. R. M., Lin, S., & Li, X. (2002). Work stress in aging police officers. Journal of Occupational and Environmental Medicine, 44(2), 160-167. Recuperado dehttps://doi.org/10.1097/00043764-200202000-00011
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) apontam que a ocupação policial apresenta maior risco de morbimortalidade. Com o tempo, os problemas psicofisiológicos tendem a aumentar, pois são acompanhados de hábitos de enfrentamento nocivos que contribuem para a autodeterioração do indivíduo. Simpson, Byrne, Gabbay, e Rannard (2015Simpson, G. W., Byrne, P., Gabbay, M. B., & Rannard, A. (2015). Understanding illness experiences of employees with common mental health disorders. Occupational Medicine,65(5), 367-72. Recuperado dehttps://doi.org/10.1093/occmed/kqv047
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) advertem que eventos perturbadores no trabalho têm o potencial de ameaçar o senso de si mesmo e a identidade de um indivíduo. Nesse sentido, Dombroski (2017Dombroski, M. (2017). Changing police culture: raising awareness of the importance of mental health (Dissertação de mestrado). University of Alaska Fairbanks. University of Alaska, Fairbanks, Alaska.), Miranda e Guimarães (2016Miranda, D., & Guimarães, T. (2016). O suicídio policial: o que sabemos? Dilemas: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social, 9(1), 1-18.) e M. A. Silva e Bueno (2017Silva, M. A., & Bueno, H. P. V. (2017). O suicídio entre policiais militares na Polícia Militar do Paraná: esforços para prevenção. Revista de Ciências Policiais da APMG, 1 (1), 5-23.) relatam o aumento no número de suicídios e ideações entre policiais, justificados por fatores sociodemográficos, institucionais, organizacionais, relacionais e individuais.

Mattos (2012Mattos, M. J. S. (2012). Reconhecimento, identidade e trabalho sujo na PMDF (Dissertação de Mestrado). Universidade de Brasília, Brasília, DF.) também identifica a falta de reconhecimento social e o estigma como agravantes psicológicos da categoria, seja pela invisibilidade, pelo repúdio, seja pelas generalizações relacionadas com a imagem negativa socialmente construída dos policiais. Minayo, J. R. A. Souza, Cavalcante, e Mangas (2012Souza, E. R., Minayo, M. C. S., Silva, J. G., & Pires, T. O. (2012). Fatores associados ao sofrimento psíquico de policiais militares da cidade do Rio de Janeiro. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 28 (7), 1297-311. Recuperado dehttps://doi.org/10.1590/S0102-311X2012000700008
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) acrescentam que o estresse desses trabalhadores assume relação direta com a organização hierárquica, com as condições de trabalho e com a falta de reconhecimento. No que se refere ao reconhecimento, cabe mencionar o fenômeno identificado por Gaulejac (2006Gaulejac, V. (2006). As origens da vergonha. São Paulo, SP: Via Lettera.), da “luta por um lugar ao sol”. O autor fala, antes de tudo, da busca pelo reconhecimento de si mesmo pelo outro. Na verdade, tanto os sociólogos do trabalho quanto os sociólogos clínicos insistem na importância do reconhecimento como fator fundamental para a saúde mental do trabalhador.

MÉTODO

O caráter teórico-metodológico desta pesquisa assume natureza qualitativa e uso do método etnográfico-discursivo, proposto por Magalhães (2016Magalhães, I. (2016). Crítica social e discurso. In R. Ferreira, & K. Rajagopalan(Eds.), Um mapa da crítica nos estudos da linguagem e do discurso (Vol. 1, pp. 225-253). Campinas, SP: Pontes.) e Magalhães, Martins, e Resende (2017). Utilizou-se a Análise de Discurso Crítica (ADC) (Chouliaraki & Fairclough, 1999Chouliaraki, L., & Fairclough, N. (1999). Discourse in late modernity: rethinking Critical Discourse Analisy. Edinburgh, UK: Edinburgh University Press.; Fairclough, 2003; Resende & Ramalho, 2004), que se fundamenta no delineamento dos princípios que a definem como teoria e como método. Isso permitiu maior profundidade da realidade, dispensando “numerar ou medir unidades ou categorias homogêneas” (Richardson, J. A. S. Peres, Wanderley, Correia, & M. H. M. Peres, 2015Richardson, R. J., Peres, J. A. S., Wanderley, J. C. V., Correia, L. M., & Peres, M. H. M. (2015). Pesquisa social: métodos e técnicas. São Paulo, SP: Atlas., p. 79). Voltou-se para o universo dos significados das ações humanas, para as motivações, as crenças, os valores, as atitudes, as metáforas, as características e as aspirações dos pesquisados (Flick, 2009Flick, U. (2009). Qualidade na pesquisa qualitativa. Porto Alegre, RS: Artmed.), com a análise de “como as pessoas constroem o mundo à sua volta, o que estão fazendo ou o que está lhes acontecendo em termos que tenham sentido e que ofereçam uma visão rica” (Flick, 2009Flick, U. (2009). Qualidade na pesquisa qualitativa. Porto Alegre, RS: Artmed., p. 8).

O método etnográfico-discursivo, visto como um processo reflexivo, foi o modo sob o qual se procedeu à coleta dos dados, baseada em observações, apontamentos escritos e entrevistas. Seu diferencial está na utilização da etnografia para o estudo do discurso como prática social, tendo como princípios a reflexividade dos pesquisadores e a comparação constante “entre indivíduos e situações, registrando como os atores sociais localizam-se em grupos em que se constroem identidades, e em relação a instituições formais” (Magalhães et al., 2017Magalhães, I, Martins, A. R., & Resende, V. M. (2017). Análise de discurso crítica: um método de pesquisa qualitativa. Brasília, DF: Editora Universidade de Brasília., p. 117).

A utilização da ADC valorizou o potencial teórico e metodológico, que sustenta o debate tanto ontológico quanto epistemológico deste estudo. Essa escolha permitiu articular as propriedades linguísticas dos textos como eventos discursivos, que permitem a compreensão das práticas sociais e o desvelamento de aspectos como poder hegemônico, ideologias dominantes, identificações e identidades. A ADC permite descortinar ideologias subjacentes aos discursos (Chouliaraki & Fairclough, 1999Chouliaraki, L., & Fairclough, N. (1999). Discourse in late modernity: rethinking Critical Discourse Analisy. Edinburgh, UK: Edinburgh University Press.), possibilitando “produzir e apresentar conhecimento crítico que capacite os seres humanos a emanciparem-se de formas de dominação mediante a autorreflexão” (Wodak, 2009Wodak, R. (2009). What CDA is about: a summary of its history, important concepts and its developments. In R. Wodak, & M. Meyer (Orgs.), Methods of Critical Discourse Analysis. Londres, UK: Sage., p. 7).

Para a coleta e geração de dados durante a pesquisa de campo, foram realizadas notas de observação participante e entrevistas. As notas foram geradas durante seis meses de incursão no Centro de Promoção e Qualidade de Vida (CPQV), unidade do sistema de saúde da PMDF dedicada ao apoio psicológico e assistencial dos policiais. O estudo foi iniciado após resposta positiva dos gestores da instituição a pedido protocolado em que foram apresentados o escopo, o delineamento, os objetivos do estudo, bem como os quesitos éticos. As atividades desenvolvidas incluíram: reuniões de discussão de casos, oficinas, eventos sociais e conversas informais com policiais e especialistas. As entrevistas, gravadas sob consentimento, basearam-se em um roteiro semiestruturado, que permitiu flexibilidade para o aprofundamento das questões, de acordo com a fluência das informações e suas contribuições para a pesquisa (Flick, 2009Flick, U. (2009). Qualidade na pesquisa qualitativa. Porto Alegre, RS: Artmed.). Foram totalizadas quase 23 horas de gravação. Ao final de cada entrevista, foram feitos apontamentos em caderno de campo, com observações do comportamento e da responsividade do entrevistado. Essas notas foram utilizadas como recursos secundários de análise, levando em conta a interação dos pesquisadores com o campo e as leituras pertinentes à investigação (Magalhães et al., 2017Magalhães, I, Martins, A. R., & Resende, V. M. (2017). Análise de discurso crítica: um método de pesquisa qualitativa. Brasília, DF: Editora Universidade de Brasília.).

A seleção dos participantes deu-se por meio da observação e do acompanhamento das atividades de atenção do serviço prestado por profissionais do CPQV e segundo suas indicações (Bola de Neve). Foram entrevistados 4 mulheres e 17 homens, com idade entre 29 e 51 anos e atuação na polícia entre 5 e 30 anos. Para preservar a imagem dos participantes, foram utilizados nomes fictícios. O número de respondentes foi condicionado à saturação das informações referentes ao estudo (Morse, 2015Morse, J. M. (2015). “Data were saturated…”. Qualitative Health Research, 25(5), 587-588. Recuperado dehttps://doi.org/10.1177/1049732315576699
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).

De acordo com os pressupostos metodológico da ADC, depois da transcrição das entrevistas, a construção do corpus de análise integrou três etapas: leitura do material coletado para familiarização com os textos que revelariam os aspectos profundos da prática social do policial militar; leitura orientada à seleção de recortes para reduzir o volume de material às especificidades das questões de pesquisa (Fairclough, 2003Fairclough, N. (2003). Analysing discourse: textual analysis for social research. London, UK: Routledge.); leitura com codificação em cores para identificar os grupos relevantes para a análise, tornando-os mais “legíveis” ou “analisáveis”. Isso permitiu a atribuição de representações e significados de classes linguístico-discursivas relacionadas com o modo como os aspectos físicos e sociais do mundo são representados pelos atores sociais (Fairclough, 2003). A escolha desse significado deu-se em função da resposta aos objetivos propostos, bem como da frequência e da recorrência das categorias que os evidenciam no texto.

As articulações discursivas foram analisadas utilizando-se as categorias transitividade, representação de atores sociais e seleção lexical. O sistema de transitividade foi utilizado como grupos de análise mais preponderantes. A representação de atores sociais partiu da identificação de inclusões/exclusões destes nos discursos. As maneiras como os eles são apresentados revelam o modo como se envolvem no processo de adoecimento mental. A seleção lexical levou em consideração a forma como as falas marcam os aspectos particulares do mundo dos policiais, ou seja, os modos de lexicalizar as entidades que o constituem (Fairclough, 2003Fairclough, N. (2003). Analysing discourse: textual analysis for social research. London, UK: Routledge.). Essas categorias permitiram observar as diferentes maneiras de representar os aspectos do adoecimento mental no contexto do trabalho policial. Ao reconhecer que nem sempre é possível uma separação exclusiva entre as classes do significado do discurso, algumas vezes, foi analisada as categorias modalidade (recurso discursivo para aproximar ou afastar o entrevistado da sua responsabilidade com aquilo que diz) e metáfora (vista como uma maneira particular de o sujeito expressar particularidades do mundo que o identificam).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A construção teórica levantada mostra que diferentes fontes, em áreas distintas do conhecimento, identificam a organização do trabalho policial como origem de adoecimento mental dos seus trabalhadores. Os resultados aqui apresentados corroboram essa realidade. Ao analisar os discursos dos policiais, identificou-se, na categoria seleção lexical, que o vocábulo “pressão”, às vezes seguida do qualificador “psicológica”, foi selecionada por diversos entrevistados para representar o modo como o trabalho compromete a saúde mental dos policiais militares. Resende e Ramalho (2004Resende, V. M., & Ramalho, V. C. V. S. (2004). Análise de discurso crítica, do modelo tridimensional à articulação entre práticas: implicações teórico-metodológicas. Linguagem em (Dis)curso, 5(1), 185-207.) descrevem que aspectos do texto e suas semioses podem encobrir ideologias, que se revelam segundo os sentidos das palavras, metáforas ou pressuposições. As falas demonstram a predominância do vocábulo em diferentes articulações.

O vocábulo “pressão” assume diferentes significados, como sinônimo de força exercida sobre alguma coisa, ato de comprimir ou pressionar ou unidade de medida. Seu sentido figurado está associado à capacidade de alguém influenciar, coagir, constranger ou forçar outra pessoa a fazer alguma coisa (Priberam, 2020). Na organização do trabalho policial militar, o acionamento do vocábulo nos discursos analisados sugere a ocorrência de um tipo de controle ideológico, que se materializa nas relações de trabalho entre oficiais e praças. Como na ideologia gerencialista, a pressão advinda da organização do trabalho não se relaciona com aspectos estritamente físicos, mas também psicológicos, atuando como uma ameaça no imaginário do policial.

Na fala de Criso (excerto 1), soldado de 34 anos, cinco deles dedicados à PMDF, o vocábulo “pressão” apresenta-se como representação da organização do trabalho e como desencadeador de transtornos. Questionado sobre como o trabalho afeta a saúde mental dos policiais, ele responde:

Excerto 1: É muita pressão. Pressão de que você tem que ser, você tem que ser […] basicamente um super-herói, né? Muita cobrança, cobrança de tudo, de todos os arredores.

A análise da categoria transitividade, observada na oração inicial do excerto 1, “É muita pressão”, opera por meio de um processo relacional reforçado pelo intensificador “muito”, em que a pressão no contexto do trabalho é responsável pelo comprometimento da saúde mental. Ela é identificada como existente sem que haja ação a ser exercida nem atores ativos que a exerçam. Dar ao discurso essa natureza semântica isenta o policial de qualquer comprometimento com sua fala. Na sequência do excerto, verifica-se a modalização, tanto em relação ao afastamento do ator, no emprego do pronome “você”, quanto da obrigação, realizada por meio do processo relacional “tem que ser”. Nesse processo, o advérbio “basicamente” é utilizado para determinar o mínimo daquilo que um policial representa, um “super-herói”.

A metáfora do “super-herói” é acionada como pressão à identidade que o sujeito tem que assumir. A dimensão simbólica e imaginária fantasia os desejos do sujeito e joga com a sua subjetividade (Siqueira, 2009Siqueira, M. V. S. (2009). Gestão de pessoas e discurso organizacional. Curitiba, PR: Juruá.). Essa cooptação do inconsciente maneja a identificação do policial que vê no trabalho a oportunidade de ser superior. Ao manejar esse desejo, a organização do trabalho se desresponsabiliza pela pressão, pois é o desejo narcísico do sujeito que vai levá-lo a se desdobrar para ser referência, construindo um imaginário social e uma doença de idealização (Enriquez, 1997Enriquez, E. (1997). A organização em análise. Petrópolis, RJ: Vozes.). Conseguir ser “super-herói” assegura o reconhecimento como sujeito que promove a ordem social. Todavia, com o passar do tempo, a frustração da expectativa acaba desfazendo a “síndrome do super-homem” e favorecendo o desencadeamento dos transtornos mentais e o sofrimento psicológico.

Nesse processo, a pressão sai do campo dos mecanismos disciplinares e passa a operar no psiquismo, criando um sistema de controle que parte da obsessão de que há “muita cobrança, cobrança de tudo, de todos os arredores”. O vocábulo “cobrança”, assume relação semântica com a representação da organização do trabalho como “pressão”, nesse caso, estendida para a maior quantidade de coisas, pessoas e lugares. Embora não haja um verbo que expresse um processo existencial, a colocação sequencial dos pronomes “tudo” e “todos” e do substantivo “arredores” dá ao vocábulo o caráter de algo que naturalmente existe.

No excerto 2, o soldado Espartacus, 34 anos, cinco anos de PMDF, reforça o modo como a organização do trabalho compromete a saúde mental.

Excerto 2: Alguns são em gota a gota e o copo é grande. Então, ele nunca vai chegar no topo. Ele vai chegar ao fim da carreira e o copo chegou só na metade, 70%. Mas é pouco provável que um policial chegue ao final da sua carreira sem uma carga de estresse que vai gerar resquícios. [...] Mas eu acho que a instituição interfere diretamente na questão psicológica. Eu não acho que seja tanto a violência, a criminalidade.

A metáfora “gota a gota” em um “copo grande” é usada em referência ao processo de adoecimento. Ela alude a um desgaste gradativo, de longo prazo. A analogia é compatível com as observações de Gershon et al. (2002Gershon, R. R. M., Lin, S., & Li, X. (2002). Work stress in aging police officers. Journal of Occupational and Environmental Medicine, 44(2), 160-167. Recuperado dehttps://doi.org/10.1097/00043764-200202000-00011
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) e Minayo et al. (2008Minayo, M. C. S., Souza, E. R., & Constantino, P. (2008). Missão prevenir e proteger: condições de vida, trabalho e saúde dos policiais militares do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ: Fiocruz.) ao identificarem que o adoecimento na polícia é resultado de um longo processo de insatisfação e frustração.

A referência que Espartacus faz ao policial “no final da sua carreira” assume forte conexão com o estudo de Pagès et al. (2006Pagès, M., Bonetti, M., Gaulejac, V., & Descendre, D. (2006). O poder das organizações: a dominação das multinacionais sobre indivíduos. São Paulo, SP: Atlas.). A seleção lexical do verbete “resquícios” faz alusão ao resultado da carreira militar. Na organização semântica da frase, o sintagma “uma carga de estresse” não é usado como elemento que vai “deixar” “resquícios”; o seu emprego, seguido do processo material da categoria transitividade “vai gerar”, implica que o resquício é o próprio policial, o resto, é aquilo que sobra do homem.

No discurso que atribui à instituição a responsabilidade pelo agravo psicológico, nesse caso o “estresse”, por meio da conjunção adversativa “mas”, o ator notifica, categoricamente, que “a instituição interfere diretamente na questão psicológica”. Atenta-se para o fato de que, embora a tentativa de modalizar subjetivamente a fala por meio do processo mental “acho”, o ator apodera-se do processo material transformativo “interfere” para evidenciar a modificação na realidade do sujeito, o que é reforçado pela circunstância “diretamente”.

O discurso de Espartacus revela que não é a exposição à “violência” e à “criminalidade” que compromete “a questão psicológica”. É a organização do trabalho e suas relações, nomeada pela representação da “instituição” como ator social, o que reafirma as pesquisas de Edwards e Kotera (2021Edwards, A., & Kotera, Y. (2021). Mental health in the UK Police Force: a qualitative investigation into the stigma with mental illness. International Journal of Mental Health and Addiction, 19, 1116-34. Recuperado dehttps://doi.org/10.1007/s11469-019-00214-x
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) e Miranda e Guimarães (2016Miranda, D., & Guimarães, T. (2016). O suicídio policial: o que sabemos? Dilemas: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social, 9(1), 1-18.).

A representação feita por Espartacus ecoa como uma grande preocupação social a ser tratada pela PMDF. Ao colocar o policial no centro do palco e promover sua escuta é latente a demanda por uma readequação da gestão da PMDF, da forma como o trabalho é organizado, fundamentado em um sujeito que busca construir sua história apesar de todos os determinismos sociais e registros psíquicos advindos do trabalho. As práticas de gestão, entretanto, inviabilizam o processo emancipatório, não dando respostas nem auxílio quanto aos inúmeros conflitos vivenciados com base nas contradições existentes no cotidiano de trabalho da PMDF.

Para o sargento Alexandrino (excerto 3), 47 anos, 26 deles dedicados à PMDF, alguns elementos da organização do trabalho colaboram para o adoecimento mental dos policiais.

Excerto 3: Eu acredito, assim, que o excesso de fiscalização e o excesso de […] de […] de escalas, que a gente concorre, a escala normal ordinária, a escala especial, a escala de serviço voluntário e a escala virtual, que você pode ser acionado a qualquer momento. Que, querendo ou não, se você está escalado você tem que estar ali.

Assumindo forte compromisso com a verdade ao se posicionar diante daquilo que diz “eu”, Alexandrino usa a transitividade, por meio do processo mental cognitivo “acredito”, para apontar dois fatores que ele pensa contribuir para o adoecimento mental na PMDF: “o excesso de fiscalização” e “o excesso de escalas”. O pensamento quanto à fiscalização coaduna outros discursos apresentados. Já o excesso de escalas evidencia a representação da obrigatoriedade disciplinar devida à organização do trabalho, que ignora a vontade dos policiais e se faz valer.

Ao descrever as diferentes escalas, o entrevistado se importa em nomear cada uma delas. A intenção interposta sugere a necessidade de levar o espectador a perceber também a ocorrência do “excesso”. O detalhamento da “escala virtual” dá a ela uma representação especial no discurso. Subentendida na fala, observa-se a forma como a obrigatoriedade da disciplina legitima o poder da corporação sobre o policial. A instituição regulariza o controle, define os valores e garante a obediência (Motta, 1981Motta, F. C. P. (1981). O poder disciplinar das organizações formais. Revista de Administração de Empresas, 21(4), 33-41. Recuperado dehttps://doi.org/10.1590/S0034-75901981000400003
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; Ramos, 2006Ramos, A. G. (2006). A sociologia de Max Weber: sua importância para a teoria e a prática da administração. Revista do Serviço Público, 57(2), 267-82.; Tragtenberg, 2006Tragtenberg, M. (2006). Burocracia e ideologia. São Paulo, SP: Ática.).

O processo relacional, característico da transitividade, explícito na fala “tem que estar ali”, descreve a escala como algo impositivo, independente do desejo do policial, o que é reforçado pela frase “querendo ou não”. Essa forma de imposição pode ser caracterizada como mecanismo de controle, e que a privação dos desejos do policial permite a legitimação do poder institucional da corporação sobre seus membros.

No excerto 4, a subtenente Jade, 47 anos, 20 de atuação na PMDF, descreve o tratamento dado aos policiais como uma “coisa desumana” que os leva ao adoecimento psíquico.

Excerto 4: Eu acho que essa coisa desumana de tratamento faz com que as pessoas adoeçam. Esse tratamento de mandar, um superior mandar você fazer alguma coisa e você (pausa). Não saber o sacrifício que você tem para fazer e se você, às vezes, tem alguma dificuldade, eles não entendem. Você tem que cumprir a qualquer custo, como se o militar fosse um super-herói, e não é assim. O militar é um ser humano, que tem família, tem filho, tem responsabilidades em casa também. […] você pede para ir a um médico, fala: “estou precisando” e: “não, agora não pode […]”.

A representação do trabalho policial como contribuinte para o adoecimento mental é marcada pela seleção lexical “coisa desumana”. O caráter desumano se refere tanto ao tratamento dos superiores, marcado pela repressão, autoridade e desconfiança, quanto ao papel de “super-herói”, acionado, posteriormente, para representar a imagem social do policial. A categoria modalidade, observada no uso do pronome “você”, é usada como estratégia discursiva para diminuir o comprometimento com aquilo que a policial revela. Essa modalização parece funcionar como recurso para dissimular o medo de revelar a representação social atribuída ao trabalho na PMDF.

No excerto 4, a categoria transitividade pode ser observada no uso dos termos “mandar”, “fazer”, “cumprir” e “ir”, que operam como materializadores do poder hierárquico que, investido pela burocracia, estabelece uma relação de dominação e sujeição da policial. A submissão é reiterada na categoria representação de atores sociais, em que “um superior” é apresentado como agente do processo, ocupando uma posição ativa na ação, “manda”, enquanto a policial é colocada em posição de subserviência, “tem que cumprir”. A inclusão desse ator tonifica o vínculo de controle e dominação que perfaz as relações sociais do trabalho. Por meio de regimentos, normatizações e treinamentos, a organização do trabalho não regula apenas as tarefas, mas também a conduta dos membros. Sob o vigor da burocracia, o mal-estar se instaura e contribui para o adoecimento.

A circunstância “a qualquer custo” reforça a escolha lexical “sacrifício”. No imaginário social, “sacrifício” pode assumir duas representações: o sofrimento de ser vítima e o gozo de ser reconhecido como herói. Nessa representação, o primeiro significado acaba dissimulando o segundo. Ao mencionar o “não saber”, com a inclusão do ator social de forma indeterminada “eles”, induzindo a generalização do comportamento dos superiores, verifica-se que mais do que o sacrifício, a demanda da policial também é a de reconhecimento. Ao contrapor sacrifício e reconhecimento, observa-se que, ao mesmo tempo em que a oferta da vida elimina o sujeito por abrir mãos de si, ela também enseja o gozo de ser reconhecida. Essa propriedade pulsional “visa ao outro como aquele que pode reconhecer o desejo ou responder ao desejo de reconhecimento” (Enriquez, 1991Enriquez, E. (1991). Da horda ao estado: psicanálise do vínculo social. Rio de Janeiro, RJ: Zahar., p. 17).

O discurso emerge o humano da policial, explícito no processo relacional da categoria transitividade “é um ser humano”. O dito é reforçado pela apelação discursiva que recorre à inclusão dos atores sociais “família”, “filhos” e “médico”. A inclusão desses atores revela os atravessamentos do trabalho nas relações sociais e na humanidade da policial, evidenciando o trabalho como “a cena onde se confrontam, simultânea e dialeticamente, a relação consigo, a relação com o outro e a relação ao real” (Lhuilier, 2013Lhuilier, D. (2013). Trabalho. Psicologia & Sociedade, 25(3), 483-92. Recuperado dehttps://doi.org/10.1590/S0102-71822013000300002
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, p. 484).

O excerto 4 também revela uma relação de “desconfiança” quanto ao adoecimento. Essa representação é exibida tanto na escolha lexical “desconfiança”, que se reafirma na expressão “eles não acreditam”, quanto na interdiscursividade, com a inclusão da voz de outro ator. Jade articula sua voz à de um sujeito suprimido no texto, sugerindo alguém hierarquicamente superior que nega a sua demanda. Nesse sentido, salienta-se que a questão de gênero como fator de pressão adicional não deve ser ignorada na análise do trabalho policial militar, majoritariamente ocupado por homens.

Segundo Ametista (excerto 5), sargento, 44 anos, há 17 na PMDF, o contínuo estado de alerta a que os policiais são submetidos vai desgastando o sujeito e tirando-o do “estado normal de pessoa”. Quando questionada sobre porque considerava que o trabalho policial adoecia mentalmente seus profissionais, Ametista diz:

Excerto 5: Por conta desse desgaste do dia a dia, de você estar o tempo todo, como eu falei, estar atento, porque o tempo todo pode acontecer algo. […] Você tem que estar olhando tudo à sua volta. É um serviço de observação, e isso exige muito da sua mente. Você não pode ficar parado ou ficar batendo papo, olhando o celular, porque, a qualquer momento, pode acontecer algo. […] A postura, as pessoas estão te observando e vão exigir de você, lógico, que você aja como policial militar, então isso desgasta.

O processo relacional “estar” e “é” e as circunstâncias “o tempo todo”, “pode acontecer algo”, “olhando tudo à sua volta” e “um serviço de observação” são usados para explicar por que o “desgaste” de ter que “estar atento” opera como desencadeador dos transtornos, pois essas situações “exigem muito da sua mente”.

A situação do estado de alerta permanente é discutida por E. R. Souza, Minayo, J. H. Silva, e Pires (2012Souza, E. R., Minayo, M. C. S., Silva, J. G., & Pires, T. O. (2012). Fatores associados ao sofrimento psíquico de policiais militares da cidade do Rio de Janeiro. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 28 (7), 1297-311. Recuperado dehttps://doi.org/10.1590/S0102-311X2012000700008
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) ao descreverem que policiais que sofreram algum tipo de vitimização apresentam maiores chances de desenvolver sofrimento psíquico. Embora possa haver policiais mais resilientes, alguns acabam desenvolvendo uma série de sintomas, entre os quais o estado de alerta permanente, que antecede o estresse cumulativo. Os trabalhos de Ferreira et al. (2017Ferreira, L. B., Santos, M. A. F., Paula, K. M., Mendonça, J. M. B., & Carneiro, A. F. (2017). Riscos de adoecimento no trabalho entre policiais militares de um batalhão de Brasília. Gestão e Sociedade, 11(29), 1804-1829. Recuperado dehttps://doi.org/10.21171/ges.v11i29.2150
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) e Jenkins et al. (2018Jenkins, E. N., Allison, P., Innes, K., Violanti, J. M., & Andrew, M. E. (2018). Depressive Symptoms Among Police Officers: Associations with Personality and Psychosocial Factors. J Police Crim Psychol., 34(1), 66-77. Recuperado dehttps://doi.org/10.1007/s11896-018-9281-1
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) também sugerem relações entre adoecimento mental e estado de alerta permanente, uma vez que as condições de trabalho impõem aos policiais um engajamento ininterrupto.

Ao mencionar a possibilidade de algum entretenimento que possa distrair ou dispersar a atenção, a policial faz uso da modalidade deôntica de alto grau, afirmando que “não pode”, de forma a reforçar, sem se comprometer, que o trabalho policial é imprevisível “porque a qualquer momento pode acontecer algo”. Consoante o trabalho de Spode e Merlo (2006Spode, C. B., & Merlo, & A. R. C. (2006). Trabalho policial e saúde mental: uma pesquisa junto aos capitães da Polícia Militar. Psicologia: Reflexão e Crítica, 19(3), 362-70. Recuperado dehttps://doi.org/10.1590/S0102-79722006000300004
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), embora haja distinção das esferas de poder, é possível que, também na PMDF, parte das vivências de sofrimento de policiais seja decorrente, embora não apenas, dos mecanismos organizacionais de controle que mantêm pressões constantes e balizam as condutas pessoais dos policiais por meio do rigor prescritivo.

A transitividade é observada ainda no processo material “exige”, que também funciona como representação do trabalho policial como desgastante. Essa exigência é apresentada em três situações, sejam: “[…] isso exige muito da sua mente”; “[…] exige muito, é uma pressão muito grande […]” e “as pessoas estão te observando e vão exigir de você”. Por duas vezes, a exigência é intensificada pela circunstância “muito”. Discursivamente, as duas primeiras articulações sugerem uma relação direta com as condições de trabalho no que se refere à exigência do grau de concentração e ao estado de alerta que a função exige. O fato de saber que “estão te observando” faz com que a policial assuma uma “postura” e insinua a existência de uma maneira correta do ser e agir, provocando uma autovigilância constante sobre a imagem, diante do olhar da instituição, no papel dos superiores, que vigiam em função da disciplina e do comprimento das normas e do olhar da sociedade, que espera um comportamento idealizado pela imagem do que acredita ser polícia.

A vigilância atua sem que a policial tenha acesso a quem de fato a vigia, interiorizando o sentimento de estar sendo permanentemente observada, condicionando à autovigilância. No contexto do adoecimento mental, Franco et al. (2010Franco, T., Druck, G., & Seligmann-Silva, E. (2010). As novas relações de trabalho, o desgaste mental do trabalhador e os transtornos mentais no trabalho precarizado. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, 35(122), 229-248. Recuperado dehttps://doi.org/10.1590/S0303-76572010000200006
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) descrevem que essas características levam o trabalhador a se sentir em constante ameaça e isolamento.

Por fim, a categoria seleção lexical “postura” associada à apresentação corporal (Holanda, 2020) admite relação direta com o arquétipo do policial militar. Nesse sentido, o adoecimento do policial não se vincula apenas à pressão psíquica, mas também à exigência de manter o controle do corpo em condições nem sempre favoráveis (Bezerra et al., 2013Bezerra, C. M., Minayo, M. C. S., & Constantino, P. (2013). Estresse ocupacional em mulheres policiais. Ciência & Saúde Coletiva, 18(3), 657-66. Recuperado dehttps://doi.org/10.1590/S1413-81232013000300011
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; Davey et al. 2000Davey, J. D., Obst, P. L., & Sheehan, M. C. (2000). Work demographics and officers perceptions of the work environment which add to the prediction of at risk alcohol consumption within an Australian police sample. Policing: An International Journal of Police Strategies& Management, 23(1), 69-81. Recuperado dehttps://doi.org/10.1108/13639510010314625
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). À luz da psicologia clínica, verifica-se aqui a apelação da policial para as limitações do corpo, visto como primeira inscrição de identidade e guia das relações do sujeito com os outros e com o mundo, dimensão vital da realidade humana, sob a qual as funções psíquicas se baseiam (Lhuilier, 2006Lhuilier, D. (2006). Cliniques du travail. Nouvelle Revue de Psychosociologie, 1(1), 179-193. Recuperado dehttps://doi.org/10.3917/nrp.001.0179
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). Incomodar-se com o desconforto do corpo é enunciar incômodos da psique.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise do material coletado apontou que os elementos que mais contribuem para o adoecimento mental dos policiais envolvem pressão psicológica, regime disciplinar e inexistência de meios de vazão. Tal qual a literatura, o estudo mostra que impotente de reação e condicionada à obediência total e irrestrita dos ditames organizacionais, a organização do trabalho policial militar condiciona os modos de ser, pensar e agir.

O contínuo estado de alerta, a rigidez físicopostural, as adversidades próprias do trabalho policial militar, em especial para as mulheres, são fatores que contribuem para o sentimento de falta de domínio do próprio corpo, de privação de liberdade, de tensão e frustração. As relações socioprofissionais se sobrepõem aos demais elos relacionais dos policiais. Os laços sociais são enfraquecidos diante das imposições e exigências da profissão e as relações com a sociedade são afetadas pelo imaginário social construído para o “ser policial”.

Ponderadas as contribuições deste estudo, duas limitações admitem caráter essencial. Houve grande volume de dados cuja análise focou a tentativa de desvelar as sutilidades relacionadas com as formas de dominação e sujeição no trabalho policial militar. Por óbvio, há diferentes enfoques que poderiam ser adotados, além de outras variáveis avaliadas. Além disso, evidentemente, há contrapontos às percepções da amostra de entrevistados.

Salienta-se, entretanto, que a pesquisa etnográfica foi abordagem ímpar para a compreensão da cultura na qual estão inseridos os policiais militares do Distrito Federal. Com ela foi possível compreender, de certa forma, os elementos subjetivos que compõem o imaginário organizacional e, a partir daí, entender os efeitos percebidos nos sujeitos na relação que eles mantêm com o trabalho. É nesse sentido que estabelecer a escuta desses sujeitos, paralelamente à vivência ali realizada, acabou possibilitando tanto o aprofundamento quanto o refinamento do que foi percebido e do que foi analisado. Apesar dos estudos já existentes, esta análise contribui, no que se refere ao grau de aprofundamento da investigação realizada do discurso, para uma imersão no campo da linguística, assim como na abordagem socioclínica utilizada.

Questões relacionadas com as alternativas de cuidado com a saúde mental do policial; a negligência; a violência moral institucionalizada; o uso inapropriado e abusivo do poder e os fatores incentivadores dos conflitos interpessoais, entre outras temáticas que emergiram deste estudo, apresentam-se como importantes aspectos a serem trabalhados em estudos futuros. É possível que a integração dos resultados de pesquisas dessa natureza tenda a revelar a disparidade na percepção dos agentes, fomentando novas possibilidades para a mudança social.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Mar 2023
  • Data do Fascículo
    Jan-Feb 2023

Histórico

  • Recebido
    08 Abr 2022
  • Aceito
    29 Jun 2022
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