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O impacto do uso do erlotinibe em pacientes portadores de neoplasia de pulmão de não pequenas células tratados em um hospital geral de referência e clínica particular de oncologia no período de 2005 a 2011

RESUMO

Objetivo:

Relatar as características demográficas e a evolução de pacientes com neoplasia de pulmão de não pequenas células que receberam erlotinibe em qualquer linha de tratamento.

Métodos:

Coletamos retrospectivamente dados de pacientes portadores de neoplasia de pulmão de não pequenas células que receberam erlotinibe em qualquer linha de tratamento em um hospital geral de referência e em uma clínica particular de oncologia em São Paulo, no período de 2005 a 2011. Foi realizada a análise estatística e foram avaliados aspectos demográficos e resposta ao tratamento estabelecido, correlacionando os resultados dessa primeira coorte publicada no Brasil com resultados da literatura vigente.

Resultados:

Foram avaliados 44 pacientes, dos quais 65,9% eram portadores de adenocarcinoma e 63,6% tinham doença metastática. A média de idade foi de 63,3 anos. O seguimento mediano foi de 47,9 meses. A pesquisa de mutação do receptor do fator de crescimento epidérmico foi realizada em 22,7% dos pacientes (n=10), resultando positiva em 30% dos avaliados. A sobrevida global mediana foi de 46,3 meses, e observou-se uma probabilidade maior de sobrevida em 60 meses para o grupo feminino, quando comparado ao grupo masculino (29,4% versus 15,8%; p=0,042). As demais variáveis não apresentaram diferença estatística significativa.

Conclusão:

Coletamos a maior sequência de pacientes com neoplasia de pulmão de não pequenas células que fizeram uso de erlotinibe no Brasil até a data vigente e demonstramos que a evolução dos pacientes tratados no período avaliado teve resultados concordantes com os da literatura vigente em pacientes semelhantes.

Descritores:
Carcinoma pulmonar de células não pequenas; Genes erbB-1; Receptor do fator de crescimento epidérmico; Inibidores de proteínas quinases; Antineoplásicos

ABSTRACT

Objective:

To report the demographic data and clinical outcomes of non-small-cell lung cancer patients exposed to erlotinib in any line of treatment.

Methods:

This was a retrospective cohort study of nonsmall-cell lung cancer patients from a reference general hospital and a private oncology clinic, who received erlotinib from 2005 to 2011. Statistical analysis was performed and we evaluated demographic data and response to treatment, by correlating the results of this first cohort published in Brazil with results of current literature.

Results:

A total of 44 patients were included; 65.9% were diagnosed with adenocarcinoma, and 63.6% had metastatic disease. The mean age was 63.3 years. The median follow-up was 47.9 months. Epidermal growth factor receptor mutation screening was performed in 22.7% of patients (n=10), with mutation present in 30% of patients. The median overall survival was 46.3 months, and there was a higher probability of survival at 60 months for females compared to males (29.4% versus 15.8%; p=0.042). The other variables did not present significant statistical difference.

Conclusion:

We collected the largest cohort of patients with non-small-cell lung cancer who have used erlotinib in Brazil to date, and demonstrated that outcomes of patients treated at our clinic during the study period were consistent with the results of current literature in similar patients.

Keywords:
Carcinoma, non-small cell lung; Genes, erbB-1; Receptor, epidermal growth factor; Protein kinase inhibitors; Antineoplastic agents

INTRODUÇÃO

A neoplasia de pulmão é a principal causa de morte por câncer no mundo em homens e mulheres.(11. Parkin DM, Bray F, Ferlay J, Pisani P. Global cancer statistics, 2002. CA Cancer J Clin. 2005;55(2):74-108.) No Brasil, estimou-se em torno de 16.400 casos novos de câncer de pulmão em homens em 2014. Em 2011, a taxa de mortalidade bruta por neoplasia de pulmão no país foi de 14,54 por 100 mil homens.(22. Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA). Coordenação de Prevenção e Vigilância. Estimativa 2014: Incidência de Câncer no Brasil. Rio de Janeiro: INCA; 2014.) O câncer de pulmão de não pequenas células (CPNPC) compreende 80% das neoplasias pulmonares, e a classificação da Organização Mundial da Saúde divide em diferentes tipos histológicos, e adenocarcinoma, carcinoma de células escamosas e carcinoma de grandes células são os principais.(33. Beasley MB, Brambilla E, Travis WD. The 2004 World Health Organization classification of lung tumors. Semin Roentgenol. 2005;40(2):90-7. Review.)

O tratamento padrão de CPNPC avançadas (estágio clínico IIIb ou maior) se baseia em quimioterapia com platina (combinações de duas drogas), ou drogas-alvo, dependendo da presença ou não de mutações presentes na célula neoplásica.(44. Azzoli CG, Temin S, Aliff T, Baker S Jr, Brahmer J, Johnson DH, Laskin JL, Masters G, Milton D, Nordquist L, Pao W, Pfister DG, Piantadosi S, Schiller JH, Smith R, Smith TJ, Strawn JR, Trent D, Giaccone G; American Society of Clinical Oncology. 2011 Focused Update of 2009 American Society of Clinical Oncology Clinical Practice Guideline Update on Chemotherapy for Stage IV Non-Small-Cell Lung Cancer. J Clin Oncol. 2011;29:(28)3825-31. Erratum in: J Clin Oncol. 2011;29(35):4725.66. Leighl NB, Rekhtman N, Biermann WA, Huang J, Mino-Kenudson M, Ramalingam SS, et al. Molecular testing for selection of patients with lung cancer for epidermal growth factor receptor and anaplastic lymphoma kinase tyrosine kinase inhibitors: American Society of Clinical Oncology endorsement of the College of American Pathologists/International Association for the study of lung cancer/association for molecular pathology guideline. J Clin Oncol. 2014;32(32):3673-9.)

O receptor celular do fator de crescimento epidérmico (EGFR -epidermal growth factor receptor) tem ação sobre a tirosinoquinase e regula a apoptose, a angiogênese e a adesão celular. A superexpressão ou expressão aberrante do EGFR (HER1) pode ser encontrada alguns casos de CPNPC, sendo mais comumente encontrada em pacientes não fumantes com adenocarcinoma.(77. Pao W, Miller V, Zakowski M, Doherty J, Politi K, Sarkaria I, et al. EGF receptor gene mutations are common in lung cancers from “never smokers” and are associated with sensitivity of tumors to gefitinib and erlotinib. Proc Natl Acad Sci U S A. 2004;101(36):13306-11.99. Tsao AS, Tang XM, Sabloff B, Xiao L, Shugematsu H, Roth J, et al. Clinicopathologic characteristics of the EGFR gene mutation in non-small cell lung cancer. J Thorac Oncol. 2006;1(3):231-9.)

O erlotinibe é um inibidor de tirosina quinase seletivo de EGFR. Ele reduz a autofosforilação do EGFR em células tumorais intactas e a proliferação da célula EGFR-dependente, bloqueando o ciclo celular na fase G1. Foi aprovado pelo Food and Drug Administration para o tratamento de CPNPC localmente avançado ou metastático em 2004. A monoterapia com essa droga mostrou-se eficaz e mais ativa para pacientes portadores de CPNPC com EGFR mutado.(1010. Marks JL, Broderick S, Zhou Q, Chitale D, Li AR, Zakowski MF, et al. Prognostic and therapeutic implications of EGFR and KRAS mutations in resected lung adenocarcinoma. J Thorac Oncol. 2008;3(2):111-6.1212. Rosell R, Carcereny E, Gervais R, Vergnenegre A, Massuti B, Felip E, Palmero R, Garcia-Gomez R, Pallares C, Sanchez JM, Porta R, Cobo M, Garrido P, Longo F, Moran T, Insa A, De Marinis F, Corre R, Bover I, Illiano A, Dansin E, de Castro J, Milella M, Reguart N, Altavilla G, Jimenez U, Provencio M, Moreno MA, Terrasa J, Muñoz-Langa J, Valdivia J, Isla D, Domine M, Molinier O, Mazieres J, Baize N, Garcia-Campelo R, Robinet G, Rodriguez-Abreu D, Lopez-Vivanco G, Gebbia V, Ferrera-Delgado L, Bombaron P, Bernabe R, Bearz A, Artal A, Cortesi E, Rolfo C, Sanchez-Ronco M, Drozdowskyj A, Queralt C, de Aguirre I, Ramirez JL, Sanchez JJ, Molina MA, Taron M, Paz-Ares L; Spanish Lung Cancer Group in collaboration with Groupe Français de Pneumo-Cancérologie and Associazione Italiana Oncologia Toracica. Erlotinib versus standard chemotherapy as first-line treatment for European patients with advanced EGFR mutation-positive non-small-cell lung cancer (EURTAC): a multicentre, open-label, randomised phase 3 trial. Lancet Oncol. 2012;13(3):239-46.)

O uso do erlotinibe comprovou-se eficaz no tratamento de CPNPC com EGFR mutado, despertando, assim, grande interesse sobre fatores de melhor resposta e maior sobrevida. Diversos fatores foram estudados em relação à maior ou menor eficácia da medicação. A presença de mutações como EGFR e Kirsten rat sarcoma viral oncogene, conhecido pela sigla KRAS, bem como de rash cutâneo ao iniciar a medicação em pacientes com EGFR não mutado, fatores demográficos como a raça asiática, e presença ou ausência de tabagismo são considerados fatores independentes para a resposta ao erlotinibe.(1313. Pérez-Soler R, Chachoua A, Hammond LA, Rowinsky EK, Huberman M, Karp D, et al. Determinants of tumor response and survival with erlotinib in patients with non––small-cell lung cancer. J Clin Oncol. 2004 15;22(16):3238-47.1515. Mok TS, Wu YL, Thongprasert S, Yang CH, Chu DT, Saijo N, et al. Gefitinib or carboplatin–paclitaxel in pulmonary adenocarcinoma. N Engl J Med. 2009;361(10):947-57.)

Pacientes com mutações ativadoras do EGFR, como L858R no éxon 21 e deleções no éxon 19, apresentam melhora dos sintomas e maior taxa de resposta com o uso do erlotinibe. A pesquisa da mutação do EGFR é essencial para a decisão de iniciar o erlotinibe, sendo a ausência dela justificável somente pela impossibilidade de sua realização, como, por exemplo, por escassez de material. Essa mutação foi encontrada com maior frequência em pacientes não fumantes e com subtipo histológico adenocarcinoma que, em estudo realizado, apresentaram maior sensibilidade a gefitinibe e erlotinibe.(55. Schiller JH, Harrington D, Belani CP, Langer C, Sandler A, Krook J, Zhu J,Johnson DH; Eastern Cooperative Oncology Group. Comparison of four chemotherapy regimens for advanced non-small-cell lung cancer. N Engl J Med. 2002;346(2):92-8.,77. Pao W, Miller V, Zakowski M, Doherty J, Politi K, Sarkaria I, et al. EGF receptor gene mutations are common in lung cancers from “never smokers” and are associated with sensitivity of tumors to gefitinib and erlotinib. Proc Natl Acad Sci U S A. 2004;101(36):13306-11.,88. Eberhard DA, Johnson BE, Amler LC, Goddard AD, Heldens SL, Herbst RS, et al. Mutations in the epidermal growth factor receptor and in KRAS are predictive and prognostic indicators in patients with non-small-cell lung cancer treated with chemotherapy alone and in combination with erlotinib. J Clin Oncol. 2005;23(25):5900-9.,1010. Marks JL, Broderick S, Zhou Q, Chitale D, Li AR, Zakowski MF, et al. Prognostic and therapeutic implications of EGFR and KRAS mutations in resected lung adenocarcinoma. J Thorac Oncol. 2008;3(2):111-6.,1515. Mok TS, Wu YL, Thongprasert S, Yang CH, Chu DT, Saijo N, et al. Gefitinib or carboplatin–paclitaxel in pulmonary adenocarcinoma. N Engl J Med. 2009;361(10):947-57.,1616. Ellison G, Zhu G, Moulis A, Dearden S, Speake G, McCormack R. EGFR mutation testing in lung cancer: a review of available methods and their use for analysis of tumour tissue and cytology samples. J Clin Pathol. 2013;66(2):79-89. Review.)

O rash cutâneo também apresentou relação direta com resposta à medicação, aumentando a resposta objetiva e maior sobrevida em pacientes sem mutação EGFR, mas não em pacientes com mutações. Pacientes idosos também se beneficiam do uso do erlotinibe, porém às custas de maior toxicidade, ainda que tolerável na maioria das vezes.(1313. Pérez-Soler R, Chachoua A, Hammond LA, Rowinsky EK, Huberman M, Karp D, et al. Determinants of tumor response and survival with erlotinib in patients with non––small-cell lung cancer. J Clin Oncol. 2004 15;22(16):3238-47.,1717. Bezjak A, Tu D, Seymour L, Clark G, Trajkovic A, Zukin M, Ayoub J, Lago S, de Albuquerque Ribeiro R, Gerogianni A, Cyjon A, Noble J, Laberge F, Chan RT, Fenton D, von Pawel J, Reck M, Shepherd FA; National Cancer Institute of Canada Clinical Trials Group Study BR.21. Symptom improvement in lung cancer patients treated with erlotinib: quality of life analysis of the National Cancer Institute of Canada Clinical Trials Group Study BR.21. J Clin Oncol. 2006;24(24):3831-7. Erratum in: J Clin Oncol. 2007;25(1):167.2121. Kim ES, Hirsh V, Mok T, Socinski MA, Gervais R, Wu YL, et al. Gefitinib versus docetaxel in previously treated non-small-cell lung cancer (INTEREST): a randomised phase III trial. Lancet. 2008;372(9652):1809–18.)

O subgrupo de pacientes que potencialmente têm maior benefício da medicação inclui aqueles com maior prevalência de mutações do EGFR: pacientes asiáticos, do sexo feminino, com subtipo adenocarcinoma e não tabagistas.(77. Pao W, Miller V, Zakowski M, Doherty J, Politi K, Sarkaria I, et al. EGF receptor gene mutations are common in lung cancers from “never smokers” and are associated with sensitivity of tumors to gefitinib and erlotinib. Proc Natl Acad Sci U S A. 2004;101(36):13306-11.1010. Marks JL, Broderick S, Zhou Q, Chitale D, Li AR, Zakowski MF, et al. Prognostic and therapeutic implications of EGFR and KRAS mutations in resected lung adenocarcinoma. J Thorac Oncol. 2008;3(2):111-6.,1313. Pérez-Soler R, Chachoua A, Hammond LA, Rowinsky EK, Huberman M, Karp D, et al. Determinants of tumor response and survival with erlotinib in patients with non––small-cell lung cancer. J Clin Oncol. 2004 15;22(16):3238-47.,2222. Herbst RS, Prager D, Hermann R, Fehrenbacher L, Johnson BE, Sandler A, Kris MG, Tran HT, Klein P, Li X, Ramies D, Johnson DH, Miller VA; TRIBUTE Investigator Group. TRIBUTE: a phase III Trial of erlotinib hydrochloride (OSI-774) combined with carboplatin and paclitaxel chemotherapy in advanced non-small-cell lung cancer. J Clin Oncol. 2005;23(25):5892-9.2424. Zhou C, Wu YL, Chen G, Feng J, Liu XQ, Wang C, et al. Erlotinib versus chemotherapy as first-line treatment for patients with advanced EGFR mutation-positive non-small-cell lung cancer (OPTIMAL, CTONG-0802): a multicentre, open-label, randomised, phase 3 study. Lancet Oncol. 2011;(8):735-42.)

A mutação do gene KRAS mostrou correlação inversa com a resposta ao erlotinibe, e também com a não coexistência com mutação do EGFR. O tratamento com erlotinibe em pacientes com KRAS mutado resultou em pior sobrevida, em comparação ao grupo controle, sugerindo uma possível redução da responsividade ao erlotinibe na presença de tal mutação.(88. Eberhard DA, Johnson BE, Amler LC, Goddard AD, Heldens SL, Herbst RS, et al. Mutations in the epidermal growth factor receptor and in KRAS are predictive and prognostic indicators in patients with non-small-cell lung cancer treated with chemotherapy alone and in combination with erlotinib. J Clin Oncol. 2005;23(25):5900-9.,1010. Marks JL, Broderick S, Zhou Q, Chitale D, Li AR, Zakowski MF, et al. Prognostic and therapeutic implications of EGFR and KRAS mutations in resected lung adenocarcinoma. J Thorac Oncol. 2008;3(2):111-6.,1919. Pao W, Wang TY, Riely GJ, Miller VA, Pan Q, Ladanyi M, et al. KRAS mutations and primary resistance of lung adenocarcinomas to gefitinib or erlotinib. PLoS Med. 2005;2(1):e17.)

OBJETIVO

Analisar e descrever dados de uma série de pacientes portadores de câncer de pulmão de não pequenas células tratados com erlotinibe, em período prévio à obrigatoriedade de pesquisa da mutação do receptor celular do fator de crescimento epidérmico para o uso desta medicação, incluindo dados retrospectivos de sobrevida global desde o diagnóstico da metástase, características histológicas e características demográficas do grupo.

MÉTODOS

Coletamos retrospectivamente dados de pacientes portadores de CPNPC que receberam erlotinibe em qualquer linha de tratamento em um hospital geral de referência particular e em uma clínica particular de oncologia em São Paulo, no período de 2005 a 2011.

A amostra foi composta por 44 pacientes. Este foi um estudo de coorte retrospectivo, com seguimento mediano de 47,9 meses.

Os pacientes foram selecionados de acordo com os seguintes critérios de inclusão: pacientes portadores de CPNPC com confirmação histológica tratados em um hospital geral de referência particular e em clínica particular de oncologia em São Paulo no período de 1º de janeiro de 2005 a 31 de dezembro de 2011; ter 18 anos de idade ou mais; usar erlotinibe por pelo menos 1 dia; receber erlotinibe em qualquer linha de tratamento.

A pesquisa da mutação do EGFR não foi critério para o uso do erlotinibe, pois, à época do estudo, essa mutação não era mandatória para o uso da medicação. A pesquisa foi realizada de acordo com avaliação pessoal de cada médico assistente de cada paciente.

Os critérios de exclusão do estudo compreenderam: pacientes com menos de 18 anos de idade; pacientes portadores de outras neoplasias em atividade, exceto neoplasia de pele não melanoma; paciente cujo médico responsável pelo prontuário não exercia mais atividades nos estabelecimentos ou não tivesse autorizado a revisão dos mesmos.

O critério de progressão de doença, doença estável ou resposta completa ou parcial foi baseado na avaliação pessoal de cada médico assistente de cada paciente.

Análise estatística

Foi realizada análise estatística da amostra por meio de frequências absolutas e relativas, medidas de tendência central (média e mediana) e dispersão (desvio padrão, mínimo e máximo).

Para análise da sobrevida global em 60 meses, foi utilizado o teste de Kaplan-Meier e a comparação entre as curvas foi realizada pelo teste de log-rank. A sobrevida global foi calculada entre a data do diagnóstico de metástases até o último status (vivo ou óbito).

Para análises estatísticas, foi utilizado o programa Statistical Package for Social Sciences, versão 17, para Windows.

Assumiu-se um nível descritivo de 5% (p≤0,050) para a significância estatística.

RESULTADOS

Foram avaliados 44 pacientes, dos quais 65,9% eram portadores de adenocarcinoma, e a maioria dos pacientes (63,6%) tinha neoplasias com estádio IV no primeiro encontro. As características do paciente, do tumor e do primeiro tratamento estão listadas na tabela 1. Todos os pacientes foram tratados em serviço particular.

Tabela 1
Características demográficas e clínicas

Os antecedentes neoplásicos encontrados em cinco pacientes foram câncer de tireoide (papilífero), em um paciente; neoplasia de pulmão-subtipo bronquíolo-alveolar, em um paciente; neoplasia do colo do útero, em uma paciente; e câncer de mama e cólon, em uma paciente.

A média de idade desses pacientes foi de 63,3 anos (desvio padrão de 11,3 anos), mediana de 61,1; mínimo de 43,5 e máximo de 86,5 anos. O seguimento mediano foi de 47,9 meses, variando de 6,78 a 95,69 meses, a contar da data do estudo anatomopatológico até o status final. Na análise de sobrevida global, o tempo mediano foi de 46,3 meses, variando de 6,6 a 144,8 meses.

Na análise de sobrevida global, observou-se uma diferença estatisticamente significativa entre os sexos (Tabela 2). Houve uma probabilidade maior de sobrevida em 60 meses para o grupo feminino, quando comparado ao masculino (29,4% versus 15,8%; p=0,042). As demais variáveis não apresentaram diferença estatística significativa (Figuras 1 e 2).

Tabela 2
Sobrevida global acumulada, segundo características demográficas e clínicas
Figura 1
Sobrevida global acumulada (%) em meses. Teste de Kaplan-Meier
Figura 2
Sobrevida global acumulada (%) em meses, segundo sexo. Teste de Kaplan-Meier

A pesquisa de mutação do EGFR foi realizada em apenas 22,7% dos pacientes (n=10), resultando positiva em 30% dos pacientes avaliados, como visto na tabela 3.

Tabela 3
Pacientes com teste para mutação de receptor celular do fator de crescimento epidérmico

Na análise do tempo até falência do tratamento, verificou-se uma média de 169,3 dias (desvio padrão de 144,9), mediana de 125 dias, com tempo mínimo de 19 e máximo de 533 dias. Em relação ao uso de erlotinibe em diferentes linhas, não houve diferença estatística significativa (p=0,745) da sobrevida. As probabilidades de sobrevida em 60 meses foram, para a primeira, segunda, terceira e quarta linhas, respectivamente, de 17,1%, 41,6%, 29,6% e 37,5% (Tabela 4).

Tabela 4
Pacientes que fizeram uso de erlotinibe, segundo linhas de tratamento e suas respectivas sobrevidas

DISCUSSÃO

Realizamos um estudo retrospectivo em pacientes portadores de CPNPC submetidos ao uso de erlotinibe, tratados em um hospital geral de referência particular e uma clínica particular de oncologia em São Paulo no período de janeiro de 2004 a dezembro de 2011, com seguimento mediano de 47,9 meses.

Encontramos, em nosso estudo, uma maior probabilidade de sobrevida em 60 meses para pacientes do sexo feminino, quando comparada ao grupo masculino (29,4% versus 15,8%; p=0,042). A pesquisa do EGFR foi realizada numa pequena parcela dos pacientes (n=10; 22,7%), e a mutação estava presente em 6,8% do total de pacientes (n=3; 30%). O uso do erlotinibe se deu em pacientes não selecionados quanto ao status do EGFR na maioria dos pacientes, já que essa pesquisa não era comprovadamente necessária para o uso dessa medicação naquele momento.

Encontramos cinco pacientes com antecedentes pessoais de neoplasia. Uma hipótese para tal número elevado é a de que os estabelecimentos onde o estudo foi realizado são de referência para o tratamento de neoplasias, sendo esperado encontrar pacientes com histórico pessoal e familiar de neoplasia.(2525. Lynch HT, Rubinstein WS, Locker GY. Cancer in Jews: introduction and overview. Fam Cancer. 2004;3(3-4):177-92. Review.)

Observamos, nestes pacientes, sobrevida mediana de 46,3 meses, variando de 6,6 a 144,8 meses, ou seja, um pouco acima da mediana encontrada na literatura em pacientes com CPNPC em uso de erlotinibe não selecionados quanto ao EGFR.(1515. Mok TS, Wu YL, Thongprasert S, Yang CH, Chu DT, Saijo N, et al. Gefitinib or carboplatin–paclitaxel in pulmonary adenocarcinoma. N Engl J Med. 2009;361(10):947-57.) Observamos também uma diferença estatisticamente significativa entre os sexos, com maior probabilidade de sobrevida em 60 meses para o grupo feminino, (29,4% versus 15,8%; p=0,042). Devemos ressaltar que tais resultados incluem pacientes não selecionados quanto ao status da mutação do EGFR, já que essa pesquisa não havia se provado essencial para o uso da medicação no período em que os pacientes foram tratados.

O uso do erlotinibe em diferentes linhas não apresentou, em nosso estudo, diferença estatística significativa (p=0,745) da sobrevida. Mais pacientes realizaram o uso na segunda linha ou linhas subsequentes, pois o uso em primeira linha foi estabelecido após o início da comercialização do erlotinibe. A aparente maior sobrevida em segunda linha, em comparação à primeira, não teve significado estatístico pelo baixo número de pacientes.

Apesar dos achados, nosso estudo teve limitações relacionadas à sua natureza retrospectiva e ao pequeno número de pacientes, impedindo uma maior significância estatística. É importante salientar a falta de informação sobre o status da mutação do EGFR na maioria dos pacientes, que muito influencia na resposta ao tratamento em questão.

CONCLUSÃO

Nosso estudo incluiu a maior sequência de pacientes com câncer de pulmão de não pequenas células que fizeram uso de erlotinibe publicada no Brasil até a o momento e pôde demonstrar que a evolução dos pacientes tratados em nossa clínica e hospital, no período avaliado, teve resultados concordantes com os da literatura vigente em pacientes semelhantes.

Dada a importância dos dados apresentados e das limitações, planejamos realizar novo seguimento destes e de novos pacientes que utilizaram erlotinibe para neoplasia de pulmão de não pequenas células nos anos seguintes, pois teremos um número crescente de pacientes que fizeram uso desta medicação nos anos seguintes, quando a medicação esteve mais amplamente presente no país.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Apr-Jun 2015

Histórico

  • Recebido
    02 Fev 2015
  • Aceito
    23 Abr 2015
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