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Avaliação de dor e qualidade de vida de pacientes com fibromialgia

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

Sabe-se que a fibromialgia é uma síndrome musculoesquelética caracterizada por dor crônica e generalizada. Considerando que a dor é um sintoma que traz implicações diretas na vida dos pacientes acometidos, o objetivo deste estudo foi avaliar a dor e a qualidade de vida de pacientes com fibromialgia para melhor compreender a correlação entre essas variáveis.

MÉTODOS:

Estudo transversal com 45 mulheres, com idade entre 30 e 55 anos, em tratamento estável no último mês que antecedeu a seleção, sendo excluídas as que estavam em tratamento fisioterapêutico, faziam uso de recursos auxiliares da marcha e/ ou tinham doenças reumatológicas autoimunes ou relevantes comorbidades sem controle. A avaliação foi realizada através de ficha de entrevista, Questionário de Impacto da Fibromialgia, Índice de Dor Generalizada e escala analógica visual. Os dados foram analisados através dos testes de Correlação de Pearson e t de Student, aceitando-se níveis de significância estatística acima de 95%.

RESULTADOS:

foram observados elevados valores no Questionário de Impacto da Fibromialgia, Índice de Dor Generalizada e escala analógica visual além de uma correlação linear entre os índices de dor e qualidade de vida.

CONCLUSÃO:

A dor está associada à diminuição da qualidade de vida de fibromiálgicos.

Descritores:
Avaliação; Dor; Fibromialgia; Qualidade de vida

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVES:

It is known that fibromyalgia is a musculoskeletal syndrome characterized by chronic and widespread pain. Considering that pain has direct implications on affected patients' lives, this study aimed at evaluating pain and quality of life of fibromyalgia patients to better understand the correlation between such variables.

METHODS:

Cross-sectional study with 45 females aged between 30 and 55 years, in stable treatment in the month previous to selection, being excluded those under physiotherapeutic treatment, using walking aids and/or with autoimmune rheumatologic diseases or relevant uncontrolled comorbidities. Patients were evaluated with interview records, Fibromyalgia Impact Questionnaire, Widespread Pain Index and visual analog scale. Data were analyzed by Pearson Correlation and Student t tests, with statistical significance above 95%.

RESULTS:

There have been high scores in Fibromyalgia Impact Questionnaire, Widespread Pain Index and visual analog scale, in addition to linear correlation between pain scores and quality of life.

CONCLUSION:

Pain is associated to impaired quality of life of fibromyalgia patients.

Keywords:
Evaluation; Fibromyalgia; Pain; Quality of life

INTRODUÇÃO

A fibromialgia (FM) é uma síndrome musculoesquelética que, de acordo com os critérios diagnósticos de 1990 do American College of Rheumatology (ACR) pode ser identificada em indivíduos com dor crônica difusa com mais de três meses de duração e caracterizada por dor ao exame de pontos dolorosos específicos ao exame físico (tender points)11 Cavalcante AB, Sauer JF, Chalot SD, Assumpção A, Lage LV, Matsutani LA, et al. A prevalência de fibromialgia: uma revisão de literatura. Rev Bras Reumatol. 2006;46(1):40-8.. Acomete cerca de 2,5% da população mundial, sendo considerada a segunda causa mais frequente de consultas em ambulatórios de reumatologia11 Cavalcante AB, Sauer JF, Chalot SD, Assumpção A, Lage LV, Matsutani LA, et al. A prevalência de fibromialgia: uma revisão de literatura. Rev Bras Reumatol. 2006;46(1):40-8.,22 Choy EH, Arnold LM, Clauw DJ, Crofford LJ, Glass JM, Simon LS, et al. Content and criterion validity of the preliminary core dataset for clinical trials in fibromyalgia syndrome. J Rheumatol. 2009;36(10):2330-4.. A população fibromiálgica é composta, em sua maioria, por mulheres, numa proporção de 6-10:1, atingindo principalmente pacientes entre 30 e 55 anos33 Saltareli S, Pedrosa DF, Hortense P, Sousa FA. Avaliação de aspectos quantitativos e qualitativos da dor na fibromialgia. Rev Bras Reumatol. 2008;48(3):151-6.,44 Senna ER, De Barros AL, Silva EO, Costa IF, Pereira LV, Ciconelli RM, et.al. Prevalence of rheumatic diseases in Brazil: a study using the COPCORD approach. J Rheumatol. 2004;31(3):594-7..

O diagnóstico é eminentemente clínico, não existindo alteração de exames laboratoriais ou radiológicos. Em 2010, o ACR publicou novos critérios para o diagnóstico de FM. Avalia-se a contagem das áreas corporais dolorosas Widespread Pain Index (WPI) que pode variar de 0 a 19, e a gravidade dos sintomas fadiga, sono não reparador, aspectos cognitivos e adicionados à intensidade/quantidade dos sintomas somáticos Symptom Severity (SS), Scale Score (SS), que resulta num escore de 0 a 12. Segundo esses critérios, para ser classificado como portador de FM, o paciente deve apresentar WPI ≥ 7 e SS scale score ≥ 5 ou WPI de 3 a 6 com SS scale score ≥922 Choy EH, Arnold LM, Clauw DJ, Crofford LJ, Glass JM, Simon LS, et al. Content and criterion validity of the preliminary core dataset for clinical trials in fibromyalgia syndrome. J Rheumatol. 2009;36(10):2330-4.,33 Saltareli S, Pedrosa DF, Hortense P, Sousa FA. Avaliação de aspectos quantitativos e qualitativos da dor na fibromialgia. Rev Bras Reumatol. 2008;48(3):151-6..

Dentre os possíveis sintomas físicos e mentais, o paciente pode apresentar fadiga generalizada, distúrbios do sono, rigidez matinal, sensação de dispneia, ansiedade, depressão e alteração da função cognitiva55 Fietta P, Fietta P, Manganelli P. Fibromyalgia and psychiatric disorders. Acta Biomed. 2007;78(2):88-95.. Nesse contexto, merece destaque a dor, como um sinal de alerta para busca de tratamento e considerada um fator limitante para realização das atividades de vida diária e profissionais66 Provenza JR, Pollak DF, Martinez JE, Paiva ES, Helfenstein M, Heymann R, et al. Fibromialgia. Revista AMRIGS. 2005;49(3):202-11.,77 Santos LC, Kruel LF. Síndrome de fibromialgia: fisiopatologia, instrumentos de avaliação e efeitos do exercício. Motriz Rev Educ Fís. 2009;15(2):436-48..

Segundo a Associação Internacional para o Estudo da Dor, a dor pode ser definida como uma experiência sensorial e emocional desagradável, associada a uma lesão real ou potencial dos tecidos, ou descrita em termos desta88 Crofford LK, Appleton BE. Complementary and alternative therapies for fibromyalgia. Curr Rheumatol Reports. 2001;3:147-56.. O controle do quadro álgico é descrito como principal objetivo do tratamento interdisciplinar da FM, voltado basicamente para reestruturação da capacidade funcional e melhora da qualidade de vida (QV) do paciente99 Smarr KL, Parker JC, Wright GE, Stucky-Ropp RC, Buckelew SP, Hoffman RW, et al. The importance of enhancing self-efficacy in rheumatoid arthritis. Arthritis Care Res. 1997;10(1):18-26..

Devido ao desconhecimento da etiopatogenia da FM, a adoção de estratégias globais de abordagem ao paciente muitas vezes encontra-se limitada. Compreender as características clínicas da síndrome contribui para o surgimento de novas terapias, farmacológicas e não farmacológicas, e fortalecimento de técnicas já existentes99 Smarr KL, Parker JC, Wright GE, Stucky-Ropp RC, Buckelew SP, Hoffman RW, et al. The importance of enhancing self-efficacy in rheumatoid arthritis. Arthritis Care Res. 1997;10(1):18-26.,1010 Busch AJ, Webber SC, Brachaniec M, Bidonde J, Bello-Haas VD, Danyliw AD, et al. Exercise therapy for fibromyalgia. Curr Pain Headache Rep. 2011;15(5):358-67..

A escolha de instrumentos de medida para quantificação de sintomas deve ser cuidadosa para que seja possível a obtenção da informação desejada. O instrumento deve ser sensível a mudanças e clinicamente mensurável, além de ter alta confiabilidade e validade. Destaca-se, também, a aplicabilidade, praticidade e clareza da ferramenta escolhida77 Santos LC, Kruel LF. Síndrome de fibromialgia: fisiopatologia, instrumentos de avaliação e efeitos do exercício. Motriz Rev Educ Fís. 2009;15(2):436-48.,1111 Ubago Linares Mdel C, Ruiz-Pérez I, Bermejo Pérez M, Olry de Labry-Lima A, Hernández-Torres E, Plazaola-Castaño J. Analysis of the impact of fibromyalgia on quality of life: associated factors. Clin Rheumatol. 2008;27(5):613-9..

Entre os questionários de avaliação de pacientes com FM, destacam-se os Critérios de Avaliação da Fibromialgia do ACR, o Questionário de Impacto da Fibromialgia (FIQ), o Questionário de Qualidade de Vida SF-36, Escala de Depressão de Beck (DBI), Escala de Ansiedade Traço-Estado, Escala Analógica Visual (EAV) e Questionário de Dor de McGill, por fornecerem informações clínicas relevantes e serem de fácil aplicabilidade e baixo custo77 Santos LC, Kruel LF. Síndrome de fibromialgia: fisiopatologia, instrumentos de avaliação e efeitos do exercício. Motriz Rev Educ Fís. 2009;15(2):436-48.,1111 Ubago Linares Mdel C, Ruiz-Pérez I, Bermejo Pérez M, Olry de Labry-Lima A, Hernández-Torres E, Plazaola-Castaño J. Analysis of the impact of fibromyalgia on quality of life: associated factors. Clin Rheumatol. 2008;27(5):613-9.,1212 Leite AC, Rodrigues WO, Pagliuca LM. Application of the McGill Questionnaire in women with fibromyalgia and low back pain: a comparative study. Rev Enferm UFPE online. 2009;3(4):875-81..

Então, reconhecendo a importância da avaliação, tanto para monitorar a efetividade de condutas terapêuticas, quanto para o desenvolvimento de pesquisas, o objetivo do presente estudo foi avaliar a dor e QV de pacientes portadoras de FM atendidas em hospital universitário da cidade do Recife.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo analítico transversal, em que foram selecionadas 45 mulheres com FM atendidas no Serviço de Reumatologia de um Hospital Universitário do Recife, com idade entre 30 e 55 anos e em tratamento estável no último mês que antecedeu a seleção. Foram excluídas as pacientes que estavam em tratamento fisioterapêutico, as que faziam uso de recursos auxiliares da marcha e aquelas que tinham doenças reumatológicas autoimunes associadas ou apresentavam relevantes comorbidades sem controle.

Após a seleção, as pacientes foram devidamente esclarecidas quanto ao objetivo da pesquisa, sendo convidadas a assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) caso concordassem em participar do estudo. Em seguida, foi preenchida uma ficha de entrevista para coleta de dados sócio-demográficos e as pacientes foram avaliadas avaliadas por meio do FIQ, do Índice de Dor Generalizada (IDG) e da EAV22 Choy EH, Arnold LM, Clauw DJ, Crofford LJ, Glass JM, Simon LS, et al. Content and criterion validity of the preliminary core dataset for clinical trials in fibromyalgia syndrome. J Rheumatol. 2009;36(10):2330-4.,1313 Marques AP, Santos AM, Assumpção A, Matsutani LA, Lage LV, Pereira CA. Validação da versão brasileira do Fibromyalgia impact questionaire (FIQ). Rev Bras Reumatol. 2006;46(1):24-31.,1414 Viel E. O diagnóstico cinesioterapêutico: concepção, realização e tratamento da prática clínica e hospitalar. São Paulo: Manole; 2001..

O FIQ consiste em um instrumento específico para avaliar a QV em pacientes com FM, englobando aspectos relacionados à capacidade funcional, situação profissional, distúrbios psicológicos e sintomas físicos. É composto por 19 questões, organizadas em 10 itens. Sua pontuação varia de zero a 100 e quanto mais alto for o valor, pior é a QV do avaliado1313 Marques AP, Santos AM, Assumpção A, Matsutani LA, Lage LV, Pereira CA. Validação da versão brasileira do Fibromyalgia impact questionaire (FIQ). Rev Bras Reumatol. 2006;46(1):24-31.,1414 Viel E. O diagnóstico cinesioterapêutico: concepção, realização e tratamento da prática clínica e hospitalar. São Paulo: Manole; 2001..

O IDG diz respeito à contagem das áreas corporais dolorosas, que correspondem à mandíbulas, ombros, braços, antebraços, quadris, coxas, pernas, região cervical, abdômen, região dorsal e lombar, representando um total de 19 áreas dolorosas22 Choy EH, Arnold LM, Clauw DJ, Crofford LJ, Glass JM, Simon LS, et al. Content and criterion validity of the preliminary core dataset for clinical trials in fibromyalgia syndrome. J Rheumatol. 2009;36(10):2330-4.,33 Saltareli S, Pedrosa DF, Hortense P, Sousa FA. Avaliação de aspectos quantitativos e qualitativos da dor na fibromialgia. Rev Bras Reumatol. 2008;48(3):151-6.. Enquanto que a EAV é uma ferramenta que avalia o grau de dor autopercebida e apresenta graduação de zero a 10, onde zero significa ausência absoluta de dor e 10 a dor máxima1414 Viel E. O diagnóstico cinesioterapêutico: concepção, realização e tratamento da prática clínica e hospitalar. São Paulo: Manole; 2001..

Análise estatística

Após a coleta, os dados foram tabulados em planilha Excel e analisados estatisticamente, utilizando-se o programa SPSS 17.0. Os dados categóricos foram resumidos por meio de frequência absoluta e frequência relativa percentual. Os dados numéricos foram resumidos através da média aritmética, desvio padrão e valores mínimo e máximo. Para verificar associação entre as variáveis foram utilizados os testes de Correlação de Pearson e o t de Student. As informações foram apresentadas em forma de tabelas para melhor visualização, sendo aceitos níveis de significância estatística acima de 95%.

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa institucional e registrado sob o CAAE 00701512.7.0000.5208/2012.

RESULTADOS

As características sócio-demográficas da população em estudo encontram-se descritas na tabela 1. Verificou-se que a maioria das voluntárias possuía emprego (48,9%), apresentava ensino fundamental incompleto (37,8%) ou ensino médio completo (37,8%) e era sedentária (80%). Observou-se, também, que a média de idade das participantes era de 46,15 anos.

Tabela 1
Distribuição de frequência de características sócio-demográficas e clínicas das pacientes do estudo (n=45)

A tabela 2 demonstra as limitações funcionais avaliadas pelo FIQ, bem como o escore do Nível de Dor das pacientes com Fibromialgia através da EAV e do IDG. Dos 10 domínios avaliados pelo FIQ, 7 apresentaram pontuações maiores que 8, revelando má QV nesses aspectos. O escore total do FIQ, que varia de 0 a 100, apresentou um valor de 75,9, detectando baixo índice de QV.

Tabela 2
Descrição das principais limitações funcionais e nível de dor de pacientes com fibromialgia (n=45)

A figura 1 apresenta uma relação linear entre a EAV e o FIQ, indicando que quanto maior o valor obtido pela EAV maior é o escore do FIQ. Em outras palavras, quanto maior a dor relatada pela paciente, mais prejudicada será sua QV. Com relação à contagem das áreas dolorosas, a dor foi relatada pelas pacientes em aproximadamente 14 segmentos corporais.

Figura 1
Demonstração da relação estatisticamente significativa entre o nível de dor e a qualidade de vida de pacientes com fibromialgia

DISCUSSÃO

Analisando os dados sócio-demográficos, pode-se confirmar que a média de idade das mulheres avaliadas (46,15 anos) corresponde a uma faixa etária socioeconomicamente ativa, como também pode ser observado no estudo de Lorena et al.1515 Lorena SB, Lima MC, Ranzolin A, Duarte AL. Efeitos dos exercícios de alongamento muscular no tratamento da fibromialgia: uma revisão sistemática. Rev Bras Reumatol. 2015;55(2):167-73.. Embora se levante a hipótese de piora ou até do surgimento de sintomas relacionado ao trabalho, não existe comprovação científica de que a FM tenha origem ocupacional1616 Helfenstein Jr M, Goldenfum MA, Siena CA. [Fibromyalgia: clinical and occupational aspects]. Rev Assoc Med Bras. 2012;58(3):358-65. English, Portuguese..

Quanto ao grau de escolaridade, os percentuais do grupo analisado apresentaram-se heterogêneos. No entanto, pesquisas discutem a inexistência de associação entre o aspecto clínico da FM e o nível de escolaridade1515 Lorena SB, Lima MC, Ranzolin A, Duarte AL. Efeitos dos exercícios de alongamento muscular no tratamento da fibromialgia: uma revisão sistemática. Rev Bras Reumatol. 2015;55(2):167-73.,1717 Martinez JE, Panossian C, Gavioli F. Estudo comparativo das características clínicas e abordagem de pacientes com fibromialgia atendidos em serviço público de reumatologia e em consultório particular. Rev Bras Reumatol. 2006;46(1):32-6..

Constatou-se que a maioria das pacientes desta pesquisa (80%) referiu não praticar nenhum tipo de atividade física, no entanto, a prática de exercícios parece representar um papel importante na modulação da síndrome. De acordo com Cardoso et al.1818 Cardoso FS, Curtolo M, Natour J, Lombardi Júnior I. Avaliação da qualidade de vida, força muscular e capacidade funcional em mulheres com fibromialgia. Rev Bras Reumatol. 2011;51(4):338-50., o sedentarismo pode ser um possível fator agravante do surgimento da FM em indivíduos com probabilidade genética.

Autores também relatam que a inatividade física de pacientes com FM contribui para o surgimento de limitações funcionais. No estudo de Aparicio et al.1919 Aparicio V, Ortega FB, Heredia JM, Carbonell-Baeza A, Sjöström M, Delgado-Fernandez M. Handgrip strength test as a complementary tool in the assessment of fibromyalgia severity in women. Arch Phys Med Rehabil. 2011;92(1):83-8., o FIQ indica que uma deterioração da capacidade física pode estar relacionada a um maior nível de dor, piorando gravemente a QV das mulheres que sofrem com hipersensibilidade à dor. No presente estudo, também se verificou demasiada sensibilidade à dor, muito próximo ao escore máximo de 10, comprometendo, dessa forma, o bem estar das participantes.

Legitimando, estudo comparativo entre 16 mulheres com FM e 15 mulheres sem o diagnóstico mostrou que as mulheres com FM apresentam impacto negativo na QV com redução da capacidade funcional, aumento da dor e piora do estado geral de saúde1818 Cardoso FS, Curtolo M, Natour J, Lombardi Júnior I. Avaliação da qualidade de vida, força muscular e capacidade funcional em mulheres com fibromialgia. Rev Bras Reumatol. 2011;51(4):338-50.. Pacientes fibromiálgicas apresentam níveis mais altos de dor, o que acarreta limitações funcionais e físicas, menor flexibilidade, fadiga muscular, falta de condicionamento aeróbico e menor capacidade para realizar atividades de vida diária2020 Martins MR, Polvero LO, Rocha CE, Foss MH, Santos Júnior R. Uso de questionários para avaliar a multidimensionalidade e a qualidade de vida do fibromiálgico. Rev Bras Reumatol. 2011;52(1):16-26.,2121 Salvador JP, Silva QF, Zirbes MC. Hidrocinesioterapia no tratamento de mulheres com fibromialgia: estudo de caso. Fisioter Pesq. 2005;11(1):27-36..

Fadiga muscular, rigidez e dor musculoesquelética contínua e difusa são frequentemente relatadas pelas pacientes, sendo cada um desses distúrbios as causas e, concomitantemente, as consequências da piora do quadro sintomático e da capacidade para trabalho e exercício nas mulheres com FM2020 Martins MR, Polvero LO, Rocha CE, Foss MH, Santos Júnior R. Uso de questionários para avaliar a multidimensionalidade e a qualidade de vida do fibromiálgico. Rev Bras Reumatol. 2011;52(1):16-26.,2121 Salvador JP, Silva QF, Zirbes MC. Hidrocinesioterapia no tratamento de mulheres com fibromialgia: estudo de caso. Fisioter Pesq. 2005;11(1):27-36., como constatado no presente estudo.

É válido ressaltar que a prática da atividade física já foi considerada fator positivo na QV de pessoas com FM. Em ensaio clínico randomizado com 42 portadoras dessa síndrome, os resultados confirmaram que a combinação em longo prazo de exercício aeróbico, fortalecimento e flexibilidade melhora o estado de saúde psicológico e a QV dessas pacientes2222 Sañudo B, Galiano D, Carrasco L, de Hoyo M, McVeigh JG. Effects of a prolonged exercise program on key health outcomes in women with fibromyalgia: a randomized controlled trial. J Rehabil Med. 2011;43(6):521-6..

No entanto, pessoas com FM geralmente necessitam de um período maior e de mais esforço pessoal para adaptar-se a programas de exercício, por isso, a progressão da carga deve ser mais lenta que o habitual nos exercícios de força muscular2323 McCain GA, Bell DA, Mai FM, Halliday PD. A controlled study of the effects of a supervised cardiovascular fitness training program on the manifestations of primary fibromyalgia. Arthritis Rheum. 1988;31(9):1135-41.. Treinos de curta duração não demonstraram melhora na QV2424 Buckelew SP, Conway R, Parker J, Deuser WE, Read J, Witty TE, et al. Biofeedback/relaxation training and exercise interventions for fibromyalgia: a prospective trial. Arthritis Care Res. 1998;11(3):196-209., enquanto que em programas de treinamentos mais longos, com duração maior que 15 semanas, foram observadas melhoras em vários aspectos, inclusive na QV2525 Mannerkorpi K, Nyberg B, Ahlmén M, Ekdahl C. Pool exercise combined with an education program for patients with fibromyalgia syndrome: a prospective, randomized study. J Rheumatol. 2000;27(10):2473-81.,2626 Van Santen M, Bolwijn P, Verstappen F, Bakker C, Hidding A, Houben H, et al. A randomized clinical trial comparing fitness and biofeedback training versus basic treatment in patients with fibromyalgia. J Rheumatol. 2002;29(3):575-81.. Exercícios de flexibilidade e atividades leves ou de recreação, principalmente quando feitos de forma coletiva, ou mesmo realização de leitura, escutar músicas, ioga, entre outras formas de relaxamento, também são associados à melhora de alguns pacientes2727 Rooks DS, Katz JN. Use of exercise in the management of fibromyalgia. J Musculoskelet Med. 2002;19:439-48.. Os exercícios físicos, portanto, podem auxiliar no tratamento da dor crônica2828 Souza JB, Potvin S, Goffaux P, Charest J, Marchand S. The deficit of pain inhibition in fibromyalgia is more pronounced in patients with comorbid depressive symptoms. Clin J Pain. 2009;25(2):123-7..

No presente estudo observaram-se indícios de diminuição da qualidade do sono, por meio do FIQ (dados não demonstrados numericamente). Autores revelam que quando a qualidade do sono é beneficiada, também há melhora da dor e da fadiga2929 Mascarenhas CH, Santos LS. Avaliação da dor e da capacidade funcional em indivíduos com lombalgia crônica. J Health Sci Inst. 2011;29(3):205-8.. Marques et al.1313 Marques AP, Santos AM, Assumpção A, Matsutani LA, Lage LV, Pereira CA. Validação da versão brasileira do Fibromyalgia impact questionaire (FIQ). Rev Bras Reumatol. 2006;46(1):24-31. sugerem a diminuição da dor de portadores de FM pela melhora da qualidade do sono, conforme o presente estudo.

Importante frisar que esses pacientes tendem a ter seu sintoma piorado quando apresentam distúrbios psicológicos associados. Um estudo realizado no Brasil constatou que 30% dos pacientes fibromiálgicos exibiram depressão grave e 34%, depressão moderada; nesse mesmo estudo foi verificado que 70% dos pacientes com FM apresentaram traço de ansiedade significativa e 88% exibiram um estado de ansiedade alta3030 Helfenstein M, Feldman D. Prevalência da síndrome da fibromialgia em pacientes diagnosticados como portadores de lesões por esforços repetitivos (LER). Rev Bras Reumatol. 1998;38(1):71-7..

Portanto, cabe aos profissionais de saúde que atendem essa clientela conhecer o quadro de dor e as modificações funcionais desses pacientes, procedendo à avaliação completa que contribua para o diagnóstico e tratamento das alterações que causam desconforto, com o intuito de melhorar a QV dessas pessoas2020 Martins MR, Polvero LO, Rocha CE, Foss MH, Santos Júnior R. Uso de questionários para avaliar a multidimensionalidade e a qualidade de vida do fibromiálgico. Rev Bras Reumatol. 2011;52(1):16-26.

CONCLUSÃO

O presente estudo ressalta os altos índices dolorosos de pacientes com FM e a presença de limitações nos aspectos físicos, mentais e emocionais desses portadores. A partir dos resultados, conclui-se que a dor representa um importante fator causal para diminuição da QV de pacientes fibromiálgicos.

  • Fontes de fomento: não há.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2016

Histórico

  • Recebido
    23 Set 2015
  • Aceito
    19 Jan 2016
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