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Introdução à Física do Monopolo Magnético: uma abordagem clássica

Introduction to the Physics of the Magnetic Monopole: a classical approach

Resumos

Neste trabalho apresentaremos uma introdução à Física do Monopolo Magnético no regime não – relativístico. O tratamento clássico de um sistema composto por uma partícula pontual eletricamente carregada na presence de um monopolo magnético na origem, com suas equações de movimento e o estudo do potencial vetor de Dirac, será desenvolvido ao longo do presente trabalho. A questão das singularidades e as transformações de calibre serão também tratadas. Ao final, listaremos alguns modelos análogos ao monopolo magnético, utilizando outros sistemas físicos.

Palavras-chave:
Monopolo magnético; potencial vetor de Dirac; transformações de calibre; simetria dual


In this work we will present an introduction to the Physics of the Magnetic Monopole in the non – relativistic regime. The classical treatment of a system composed of an electrically charged point particle in the presence of a magnetic monopole at the origin, with its equations of motion and the study of the Dirac vector potential, will be developed throughout the present work. The issue of singularities and gauge transformations will also be addressed. At the end, we will list some models analogous to the magnetic monopole, using other physical systems.

Keywords:
Magnetic monopole; Dirac vector potential; gauge transformations; dual symmetry


1. Introdução

O Eletromagnetismo Clássico certamente está entre as mais belas disciplinas da Física e pode-se dizer que é uma das grandes construções do gênero humano no campo das Ciências Naturais. É notável que quase1 1 Uma ampla discussão sobre o limite de validade do Eletromagnetismo Maxwelliano pode ser encontrada em [1]. todos os fenômenos eletromagnéticos observados até o momento, envolvendo os conhecidos campos elétricos E e magnéticos B, possam ser previstos e compreendidos a partir de um conjunto de equações envolvendo esses dois campos e suas fontes, bem como a relação entres esses campos. Estas equações são chamadas equações de Maxwell, onde a formulação mais comum encontrada nos textos de Física é a utilizando cálculo vetorial, a qual apresenta um conjunto de quatro equações [2[2] D.J. Griffiths, Introduction to Electrodynamics (Cambridge University Press, Cambridge, 2017), 4 ed., 3[3] J.D. Jackson, Classical Electrodynamics (John Wiley & Sons, New York, 1998), 3 ed., 4[4] M. Alonso e E. Finn, Física – Um curso Universitário – Campos e Ondas (Blucher, São Paulo, 2015), v. 2, 2 ed., 5[5] H.M. Nussenzveig, Curso de Física Básica: Eletromagnetismo (Blucher, São Paulo, 2015), v. 3, 2 ed.]. Vamos considerar o caso especial dos campos elétricos e magnéticos estacionários (que não variam com o tempo), esses dois campos vetoriais são descritos em termos de suas fontes (cargas em repouso) por duas das equações de Maxwell, a saber: a lei de Gauss para o campo elétrico e a lei de Gauss para o campo magnético respectivamente. A lei de Gauss para o campo elétrico estabelece que a fonte, a qual chamamos carga elétrica, produz um fluxo de campo elétrico através de uma superfície fechada envolvendo a carga.2 2 Esta é a forma integral da Lei de Gauss para o campo elétrico. Por outro lado a mesma lei, agora estabelecida para o campo magnético, não incorpora uma fonte, ou seja, uma carga magnética. A lei de Gauss para o campo magnético diz que o fluxo total através de uma superfície fechada é zero.3 3 Esta lei é escrita na forma local como ∇→⋅B→=0. Aqui aparentemente existe uma assimetria nessas equações: onde estariam as cargas magnéticas? Cargas elétricas podem ser encontradas isoladas na natureza e se apresentam sempre em dois tipos diferentes, os quais se convencionou chamar carga positiva ou negativa. A menor carga elétrica livre encontrada na natureza (carga elementar) é a carga atribuída ao elétron (negativa) ou ao próton (positiva). Na magnetostática, uma das fontes clássicas de um campo magnético estacionário é o ímã. Um ímã sempre apresenta dois pólos e nesse caso convencionou se chamar pólo norte e sul. Se tentarmos separar os dois pólos de um ímã, por exemplo partindo este ímã ao meio, outros dois pólos serão imediatamente criados, ou seja, em todas as tentativas não conseguiremos separar o pólo norte do pólo sul em um ímã. Esta inexistência de cargas magnéticas isoladas na natureza é um dos grandes mistérios da Física. A lei de Gauss para o campo magnético representa matematicamente essa afirmação. Assim, apesar de grandes esforços, até hoje não foi observada nenhuma carga magnética legítima (isolada), nem na natureza, nem em experimentos realizados (comentaremos sobre algumas dessas buscas no próximo parágrafo). Em suma:

Monopolo magnético é definido como uma partícula hipotética possuindo uma carga magnética (um pólo norte ou sul) isolada.

O monopolo magnético clássico foi primeiramente conjecturado em 1894 por P. Currie [6[6] M.P. Currie, em: Séances de la Société Française de Physique (Société Française de Physique, Paris, 1894).]. A primeira tentativa experimental para a detecção de um monopolo magnético em um raio cósmico foi realizada em 1975 por P. B. Price e colaboradores, utilizando um detector Cherenkov4 4 Tal detector utiliza a radiação Cherenkov emitida pelas partículas em detecção. e placas com emulsões nucleares colocadas em um balão a uma grande altitude [7[7] P.B. Price, E.K. Shirk, W.Z. Osborne e L.S. Pinsky, Phys. Rev. Lett. 35, 487 (1975).]. O experimento levou os autores a acreditarem na detecção de um monopolo magnético de carga magnética g=137e (sendo e a carga elétrica elementar) e massa m>200mp, (sendo mp a massa de repouso do próton) o que mais tarde foi descartado. Bendtz e colaboradores iniciaram uma busca por monopolos magnéticos reais, analisando rochas vulcânicas originadas das regiões árticas e antárticas [10[10] K. Bendtz, D. Milstead, H.-P. Hächler, A.M. Hirt, P. Mermod, P. Michael, T. Sloan, C. Tegner e S.B. Thorarinsson, Phys. Rev. Lett. 110, 121803 (2013).], entretanto não foram encontradas quaisquer evidências de cargas magnéticas isoladas nesta investigação. Uma estimativa para a massa do monopolo magnético foi realizada independentemente pelos físicos G. ’t Hooft e A. Polyakov em 1976, no contexto da Teoria da Grande Unificação (GUT) [11[11] G. ’t Hooft, Nucl. Phys. B 79, 276 (1974).], e o valor estimado para essa massa foi extremamente alto (em torno de 137 vezes a massa do bóson vetorial W na teoria eletrofraca). Investigações recentes preveem para a massa do monopolo magnético um valor compreendido no intervalo entre 0,7 Gev/c2 e 9,0 Gev/c2[8[8] O. Gould e A. Rajantie, Phys. Rev. Lett. 119, 241601 (2017)., 9[9] K.A. Milton, Rep. Prog. Phys. 69, 1637 (2006).]. O alto valor previsto para a massa do monopolo magnético torna hoje extremamente difícil a produção destas partículas em laboratório, levando-se em conta as escalas de energia disponíveis nos experimentos. Assim, a existência ou não de monopolos magnéticos é uma das grandes questões em aberto na física e apesar de sua não observação na natureza até o momento, é notável que o tema, embora de longa data, ainda desperte tanto interesse no meio acadêmico, levando a diversos trabalhos envolvendo desde a Física da Matéria Condensada até Física de Altas Energias, passando por Cosmologia e Teoria Quântica de Campos [12[12] B. Acharya, J. Alexandre, P. Benes, B. Bergman, S. Bertolucci, A. Bevan, H. Branzas, P. Burian, M. Campbell, Y.M. Cho et al., Nature 602, 63 (2022)., 13[13] S.H. Mazharimousavi, Phys. Scr. 97, 095205 (2022)., 14[14] R. Abbasi, M. Ackermann, J. Adams, J.A. Aguilar, M. Ahlers, M. Ahrens, C. Alispach, A.A. Alves Jr., N.M. Amin, R. An et al., Phys. Rev. Lett. 128, 051101 (2022)., 15[15] Y. Bai, S. Lu e N. Orlofsky, Phys. Rev. Lett. 127, 101801 (2021)., 16[16] M.C. Diamantini, C.A. Trugenberger e V.M. Vinokur, Commun. Phys. 4, 25 (2021)., 17[17] N.E. Mavromatos e V.A. Mitsou, Int. J. of Modern Phys. A 35, 2030012 (2020)., 18[18] H. Arava, E.Y. Vedmedenko, J. Cui, J. Vijayakumar, A. Kleibert e L.J. Heyderman, Phys. Rev. B 102, 144413 (2020)., 19[19] O. Gould, D.L.-J. Ho e A. Rajantie, Phys. Rev. D 100, 015041 (2019)., 20[20] G. Marmo, E. Scardapane, A. Stern, F. Ventriglia e P. Vitale, Phys. Rev. D 100, 085007 (2019)., 21[21] D. Bazeia, M.A. Marques e R. Menezes, Phys. Rev. D 97, 105024 (2018)., 22[22] A.C. Chavez, A. Barra e G.P. Carman, J. Phys. D. Appl. Phys. 51, 234001 (2018)., 23[23] V.V. Burdyuzha, J. Exp. Theor. Phys. 127, 638 (2018).]. A não observação de um monopolo magnético não impediu que se acumulasse uma grande quantidade de informações e conhecimentos teóricos ao seu respeito. Uma das justificativas para a existência do monopolo magnético veio de um trabalho monumental do Físico Inglês P. Dirac, publicado em 1931 [24[24] P.A.M. Dirac, Proc. Roy. Soc. A 133, 60 (1931).], onde a quantização da carga elétrica5 5 A condição de quantização de Dirac estabelece que a quantização da carga elétrica seria explicada pela existência de pelo menos um monopolo magnético. A expressão para esta condição é e⁢g=n⁢ℏ2, onde n é um número inteiro. foi explicada considerando a existência dessas cargas magnéticas isoladas [25[25] F.A.B. Rangel, G.T.C. da Silva e J. A. Helayël-Neto, Braz. J. Phys. 42, 120 (2012).].

Um conceito muito importante que aparecerá neste trabalho é o conceito de grupo. Basicamente um grupo é uma estrutura algébrica composta por um conjunto e uma operação binária entre os elementos desse conjunto, além de três condições a serem satisfeitas: associatividade, elemento neutro e elemento inverso, com respeito à operação de grupo [26[26] J.M.F. Bassalo e M.S.D. Cattani, Teoria dos Grupos (Editora Livraria da Física, São Paulo, 2008), 2 ed.]. Se a operação de grupo é comutativa, o grupo em questão é chamado abeliano, do contrário é chamado não-abeliano. Um grupo bastante interessante é aquele onde os seus elementos são matrizes quadradas invertíveis e a operação de grupo é a multiplicação usual de matrizes (grupo matricial). Dentro dessa categoria de grupos, aquele composto por matrizes quadradas, complexas, especiais e unitárias,6 6 Especial significa ter determinante igual a 1, unitária significa que a matriz inversa é igual a transposta conjugada. chamado SU(n) (onde n é a ordem da matriz) é bastante importante dentro da teoria dos monopolos magnéticos. Em particular, o grupo U(1), que é aquele composto por números complexos de módulo unitário, é o único grupo comutativo (ou abeliano) entre os SU(n) (e o único caso onde omitimos a letra S da notação do grupo, visto que é trivial neste caso o determinante igual a 1). Este grupo é o grupo de simetria associado com o monopolo magnético estudado nesta revisão, que recebe então a classificação de monopolo magnético abeliano, conforme discutiremos mais detalhadamente adiante.

Neste artigo será apresentada a Física Clássica básica, no regime não – relativístico, do monopolo magnético abeliano, que é aquele cujo potencial vetor A é invariante por uma transformação de calibre com grupo de simetria U(1) (grupo especial unitário). O monopolo magnético associado com esse potencial vetor é chamado monopolo magnético de Dirac. Ao longo deste trabalho, várias características do potencial vetor, como a não – singularidade ao longo de uma linha (a chamada corda de Dirac) e a transformação para outros tipos de potenciais (transformações na corda) serão apresentadas. Este trabalho não tem a pretensão de cobrir todo o assunto, que é bastante vasto. O objetivo aqui é oferecer somente uma revisão introdutória, de forma didática, para estudantes de graduação, pós-graduação ou para qualquerum que simplesmente tenha interesse no tema. Assim, firmamos o compromisso de apresentar neste trabalho somente os conceitos básicos, bem como alguns resultados importantes envolvendo o monopolo magnético clássico, abeliano e não-relativístico. A principal bibliografia utilizada neste trabalho foi o livro do Yakov M. Shnir, ”Magnetic Monopoles” [27[27] Y.M. Shnir, Magnetic Monopoles, (Springer-Verlag, Berlin, 2005).], que é referência na área e que deixamos como sugestão caso o leitor queira se aprofundar no tema.

Uma partícula possuindo simultaneamente carga elétrica e magnética, a qual recebe o nome de dyon, foi postulada inicialmente por J. Schwinger [28[28] J. Schwinger, Science 165, 3895 (1969).] e possui muitas propriedades interessantes, entretanto não trataremos dela neste trabalho. Monopolos magnéticos não-abelianos7 7 Estes monopolos são associados a grupos de simetrias onde os elementos não comutam com relação à operação de grupo. foram introduzidos por ’t Hooft e Polyakov, em uma investigação das equações de Yang-Mills [29[29] P. Rossi, Phys. Rep. 86, 317 (1982).]. Em monopolos magnéticos não-abelianos, grupos de simetra como os grupos SU(2) e SU(3) são utilizados. Não trataremos desses tipos de monopolos magnéticos aqui.

Por questões de simplicidade, daqui em diante sempre nos referiremos a uma partícula pontual clássica com carga elétrica q simplesmente como carga e a uma partícula pontual clássica com uma carga magnética isolada g (o que chamamos de monopolo magnético) simplesmente como monopolo (nas seções 5 e 6, esta convenção será relaxada). Um sistema composto por essas duas partículas pontuais interagindo a uma certa distância (não infinita) será chamado sistema carga-monopolo. Neste trabalho utilizaremos sempre as unidades8 8 A título de curiosidade, no SI o monopolo magnético possui duas unidades: o Weber (Wb) e o Ampère-metro (A⋅m). Ambas as unidades estão relacionadas por: gW⁢b=μ0⁢gA⋅m. Gaussianas com c=1.

O presente trabalho está organizado da seguinte forma: na Seção2 2. Monopolo Clássico: Equações do Movimento Nesta seção obteremos as equações do movimento de uma carga na presença de um monopolo na origem, em coordenadas esféricas (r,θ,ϕ), bem como suas soluções exatas (funções horárias das coordenadas com o tempo). Esse problema é um dos mais simples para abordar dentro da física do monopolo clássico, para o qual podemos lançar mão do arquabouço teórico da Mecânica e do Eletromagnetismo Clássicos. Como veremos neste trabalho, há diferenças importantes entre o caso Coulombiano do espalhamento entre duas cargas (uma fixa) e o presente caso. Por exemplo, não há estados ligados9 na interação carga-monopolo; no espalhamento carga-carga, a trajetória da carga espalhada está contida sempre em um plano e no caso carga – monopolo (monopolo fixo na origem), tal trajetória não está contida em nenhum. Vamos começar então analisando o sistema carga-monopolo obtendo a equação radial para o movimento da carga espalhada. 2.1. Equação radial do movimento O campo magnético do monopolo, aqui colocado na origem, é radial e Coulombiano. A expressão para esse tipo de campo vetorial não é muito diferente do caso envolvendo uma carga pontual (lei de Coulomb) e pode ser escrita como, (1) B → = g ⁢ r → r 3 , onde g é a carga magnética do monopolo (um pólo norte ou sul isolado).10 A equação do movimento pode ser obtida da segunda lei de Newton para a força magnética, (2) F → = m ⁢ d 2 ⁢ r → d ⁢ t 2 = q ⁢ ( v → × B → ) , onde m é a massa da carga (aqui sempre consideraremos a massa reduzida da carga,11 mantendo o símbolo m) e q, o valor da carga. Escrevendo explicitamente v→=d⁢r→/d⁢t e utilizando (1) obtemos, (3) d 2 ⁢ r → d ⁢ t 2 = q ⁢ g m ⁢ r 3 ⁢ ( d ⁢ r → d ⁢ t × r → ) . Que é a equação radial da carga q se movendo na presença de um monopolo g na origem. Por simplicidade sempre consideraremos neste trabalho q⁢g>0. A solução exata desta equação será tratada na próxima subseção. 2.2. Solução da equação radial A solução para a equação radial (3) pode ser obtida da seguinte maneira: realizando o produto escalar de ambos os lados da respectiva equação por r→ à esquerda, obtemos, (4) r → ⋅ d 2 ⁢ r → d ⁢ t 2 = q ⁢ g m ⁢ r 3 ⁢ r → ⋅ ( d ⁢ r → d ⁢ t × r → ) ⏟ 0 = 0 , visto que o produto misto r→⋅(v→×r→), que surge no lado direito de (3) após a multiplicação escalar por r→, possui dois vetores iguais e consequentemente se anula (pela definição deste produto). Vamos também utilizar o seguinte resultado, (5) d d ⁢ t ⁢ ( r → ⋅ d ⁢ r → d ⁢ t ) = r → ⋅ d 2 ⁢ r → d ⁢ t 2 + d ⁢ r → d ⁢ t ⋅ d ⁢ r → d ⁢ t ⏟ v 2 , onde v=|v→|. Podemos combinar os resultados (4) e (5) para chegar na seguinte igualdade, (6) d d ⁢ t ⁢ ( r → ⋅ d ⁢ r → d ⁢ t ) - v 2 = 0 . Temos assim uma equação para a coordenada radial em função do tempo. Prosseguindo então com a integração desta equação, (7) d ⁢ ( r → ⋅ d ⁢ r → d ⁢ t ) = v 2 ⁢ d ⁢ t , r → ⋅ d ⁢ r → d ⁢ t = ∫ v 2 ⁢ d t = v 2 ⁢ t + C , onde a constância do módulo v (idem para v2) da velocidade v→ da carga na presença do monopolo será demonstrada mais adiante, na subseção2.11. Prossenguindo então com a separação das variáveis no resultado (7) e integrando novamente, (8) r → ⋅ d ⁢ r → = ( v 2 ⁢ t + C ) ⁢ d ⁢ t , ∫ r → ⋅ d r → = v 2 ⁢ t 2 2 + C ⁢ t + D , como o vetor r→ é paralelo a d⁢r→ (campo radial), temos r→⋅d⁢r→=r⁢d⁢r. Considerando então este novo integrando, realizamos uma integração simples do lado esquerdo e redefinimos as constantes C e D do lado direito de (8), sendo estas constantes reescritas agora como, (9) C = C ′ 2 , D = D ′ 2 , após essas ações, a igualdade (8) assume a seguinte expressão, (10) r 2 = v 2 ⁢ t 2 + C ′ ⁢ t + D ′ , no problema carga-monopolo, temos uma aproximação mínima entre ambas as partículas, chamada parâmetro de impacto b (a ser definido mais adiante). Esta informação precisa estar presente na solução radial. Na ausência do monopolo, a carga possui movimento retilíneo e uniforme (passando pela origem). Estes comportamentos só são obtidos se escolhermos as constantes C′ e D′ tal que C′=0 e D′=b2. Assim, chegamos ao resultado desejado, (11) r = v 2 ⁢ t 2 + b 2 . Que é a nossa solução radial da equação (3). A solução (11) representa um cone circular, em cujo vértice está o monopolo. Conforme já mencionado a pouco, podemos perceber a presença de um parâmetro b, chamado parâmetro de impacto do espalhamento. Esta grandeza é definida como a aproximação mínima entre a carga espalhada e o centro espalhador, em um problema clássico de espalhamento [30]. No nosso caso, b é a distância mínima de aproximação12 entre a carga e o monopolo situado na origem (para t=0, a carga se encontra a esta distância). A carga, vindo do infinito, atinge essa distância mínima e sofre o espalhamento, retornando para o infinito (efeito espelho magnético) se movendo sobre a superfície de um cone circular (a equação da trajetória da carga será obtida mais adiante). Podemos verificar que para b=0, a solução radial (11) se reduz à função horária de uma partícula em movimento retilíneo e uniforme, passando pela origem (ausência de monopolo). 2.3. Energia cinética da carga na presençado monopolo Vamos investigar aqui a energia cinética de uma carga na presença do monopolo na origem. Tomando o produto escalar da equação radial (1) por v→, verificamos facilmente que, (12) v → ⋅ d 2 ⁢ r → d ⁢ t 2 = v → ⋅ d ⁢ v → d ⁢ t = q ⁢ g m ⁢ r 3 ⁢ v → ⋅ ( v → × r → ) ⏟ 0 = 0 , já que novamente temos um produto misto com dois vetores iguais. Podemos escrever também, (13) v → ⋅ d ⁢ v → d ⁢ t = 1 2 ⁢ d d ⁢ t ⁢ ( v → ⋅ v → ) = 1 2 ⁢ d d ⁢ t ⁢ v 2 = d d ⁢ t ⁢ ( 1 2 ⁢ v 2 ) = 0 . Multiplicando ambos os lados do resultado (13) pela massa m da carga, obtemos a derivada temporal da energia cinética, (14) d d ⁢ t ⁢ ( m ⁢ v 2 2 ) = d d ⁢ t ⁢ E c = 0 → E c = K . Onde K é uma constante. Assim, a energia cinética Ec da carga interagindo com o monopolo é uma constante no tempo. 2.4. Momento angular orbital Vamos investigar o momento angular da carga na presença do monopolo. Partimos da expressão clássica para o momento angular de uma partícula de massa m e velocidade v→, a saber, (15) L → = r → × m ⁢ v → , calculando a derivada temporal de L→, (16) d ⁢ L → d ⁢ t = r → × d ⁢ ( m ⁢ v → ) d ⁢ t + d ⁢ r → d ⁢ t × m ⁢ v → = r → × m ⁢ d 2 ⁢ r → d ⁢ t 2 , sendo v→×m⁢v→=0. Substituindo então (1) em (16) e realizando algumas simplificações, podemos chegar no seguinte resultado, (17) d ⁢ L → d ⁢ t = r → × q ⁢ g m ⁢ r 3 ⁢ ( m ⁢ d ⁢ r → d ⁢ t × r → ) = q ⁢ g m ⁢ r 3 ⁢ ( r → × m ⁢ d ⁢ r → d ⁢ t × r → ) = q ⁢ g m ⁢ r 3 ⁢ ( r → × m ⁢ v → × r → ) = q ⁢ g m ⁢ r 3 ⁢ ( L → × r → ) . O resultado não-nulo indica que o vetor momento angular L→ não é uma constante no tempo. Vamos determinar agora a derivada temporal do módulo do vetor L→ fazendo, (18) d d ⁢ t ⁢ | L → | 2 = d d ⁢ t ⁢ ( L → ⋅ L → ) = L → ⋅ d ⁢ L → d ⁢ t + d ⁢ L → d ⁢ t ⋅ L → , Utilizando (17) na expressão anterior, temos, (19) d d ⁢ t ⁢ | L → | 2 = L → ⋅ q ⁢ g m ⁢ r 3 ⁢ ( L → × r → ) + q ⁢ g m ⁢ r 3 ⁢ ( L → × r → ) ⋅ L → = 0 . Visto que as duas parcelas no lado direito da expressão anterior são produtos mistos, que no nosso caso são determinantes com duas linhas iguais. Assim, o módulo |L→| (daqui em diante escreveremos L por simplicidade) do vetor momento angular L→ é uma constante do movimento. Como tanto o módulo de L→ como o módulo da velocidade v→ da carga são constantes no tempo, podemos determinar o valor do módulo de L→ utilizando r=b (sendo b a distância mínima de aproximação entre a carga e o monopolo), neste caso teremos o ângulo entre o vetor v→ e b→ valendo 90º (ponto de retorno). Assim, pela definição do módulo de um produto vetorial, temos paraL, (20) L = m ⁢ v ⁢ b . A trajetória da carga na presença do monopolo será obtida e mostrada na subseção2.9. 2.5. Momento angular total Vamos obter a expressão para o momento angular total J→ de uma carga se movendo na presença de um monopolo na origem. Podemos deduzir tal expressão partindo de (1) e tomando o produto vetorial de ambos os lados desta equação por r→ à esquerda, (21) r → × d 2 ⁢ r → d ⁢ t 2 = q ⁢ g m ⁢ r 3 ⁢ r → × ( v → × r → ) , o triplo produto vetorial que surgiu do lado direito de (21) será desenvolvido utilizando a identidade vetorial A→×(B→×C→)=B→⁢(A→⋅C→)-C→⁢(A→⋅B→). Realizando as substituições apropriadas, temos, (22) r → × ( v → × r → ) = r 2 ⁢ v → - r → ⁢ ( r → ⋅ v → ) = r 2 ⁢ d ⁢ r → d ⁢ t - r → ⁢ ( r → ⋅ d ⁢ r → d ⁢ t ) , substituindo o resultado anterior em (21) e seguindo com as seguintes simplificações, (23) r → × d 2 ⁢ r → d ⁢ t 2 = q ⁢ g m ⁢ r 3 ⁢ [ r 2 ⁢ d ⁢ r → d ⁢ t - r → ⁢ ( r → ⋅ d ⁢ r → d ⁢ t ) ] = q ⁢ g m ⁢ r 2 ⁢ [ r ⁢ d ⁢ r → d ⁢ t - r → ⁢ ( r ^ ⋅ d ⁢ r → d ⁢ t ) ] = q ⁢ g m ⁢ r 2 ⁢ ( r ⁢ d ⁢ r → d ⁢ t - r → ⁢ d ⁢ r d ⁢ t ) = q ⁢ g m ⁢ d d ⁢ t ⁢ ( r → r ) , podemos ainda aplicar o seguinte truque no lado esquerdo da equação, (21), (24) r → × d 2 ⁢ r → d ⁢ t 2 = r → × d 2 ⁢ r → d ⁢ t 2 + d ⁢ r → d ⁢ t × d ⁢ r → d ⁢ t ⏟ 0 = d d ⁢ t ⁢ ( r → × d ⁢ r → d ⁢ t ) , igualando os resultados obtidos em (23) e (24), temos, (25) d d ⁢ t ⁢ ( r → × d ⁢ r → d ⁢ t ) = d d ⁢ t ⁢ ( q ⁢ g m ⁢ r → r ) , reunindo ambos os termos no lado esquerdo e simplificando, chegamos à seguinte igualdade, (26) d d ⁢ t ⁢ ( r → × m ⁢ v → - q ⁢ g ⁢ r → r ) = 0 , como L→=r→×m⁢v→ e r^=r→r, podemos escrever uma expressão mais compacta, (27) d d ⁢ t ⁢ ( L → - q ⁢ g ⁢ r ^ ) = 0 . É imediato verificar que o vetor dentro do parênteses, o qual chamaremos de J→, é uma constante no tempo (d⁢J→/d⁢t=0). Este vetor é definido como o momento angular total do sistema carga -monopolo, ou seja, (28) J → = L → - q ⁢ g ⁢ r ^ , este vetor está na direção do eixo z na Figura 1. Este resultado é importantíssimo dentro da física do monopolo. O módulo de J→ pode ser obtido utilizando a lei dos cossenos. O ângulo α entre os vetores L→ e q⁢g⁢r^ vem da definição do produto interno, Figura 1: Diagrama vetorial com os momentos angulares envolvidos no sistema carga-monopolo (relacionado à escolha q⁢g>0). Os vetores L→ e -q⁢g⁢r^ precessionam em torno da soma J→, que é uma constante no tempo. (29) cos ⁡ α = L → ⋅ q ⁢ g ⁢ r ^ L ⁢ q ⁢ g = ( r → × v → ) ⋅ r ^ v ⁢ b = 0 , ou seja, os vetores L→ e q⁢g⁢r^ são perpendiculares. Como resultado, o módulo de J→ é simplesmente, (30) J = ( m ⁢ v ⁢ b ) 2 + ( q ⁢ g ) 2 . Como um comentário final que pode ser útil ao leitor, no livro do Shnir [27], que usamos como referência principal, o vetor momento angular orbital L→ é escrito como L ~ e o vetor momento angular total J→ é escrito como L. 2.6. Ângulo entre os vetores momento angulartotal e a direção radial Vamos determinar o ângulo entre o momento angular total J→ e o vetor unitário radial r^ inicialmente realizando o produto interno entre esses dois vetores, ou seja, (31) J → ⋅ r ^ = ( L → - q ⁢ g ⁢ r ^ ) ⋅ r ^ = ( r → × m ⁢ v → ) ⋅ r ^ ⏟ 0 - q ⁢ g = - q ⁢ g , utilizando agora a expressão para o produto interno entre dois vetores, em termos dos seus módulos e do ângulo entre eles, e usando (31), temos, (32) cos ⁡ θ = J → ⋅ r ^ | r ^ | ⁢ | J → | = - q ⁢ g | J → | = - q ⁢ g L 2 + ( q ⁢ g ) 2 , como o módulo de L→ é constante (L=m⁢v⁢b), o ângulo entre J→ e r^ consequentemente é constante (θ=θ0) e determinado pela seguinte expressão, (33) θ 0 = arccos ⁡ ( - q ⁢ g ( m ⁢ v ⁢ b ) 2 + ( q ⁢ g ) 2 ) . Que pela definição é a metade do ângulo de abertura da superfície cônica (cone circular com eixo ao longo de J→) sobre a qual a carga se movimenta. Os vetores -q⁢g⁢r^ e L→ precessionam em torno de um eixo fixo (normalmente escolhido o eixo z), de modo a manter a soma de ambos (que é J→, ao longo do eixo z) constante no tempo. A combinação desses vetores pode ser vizualizada na Figura 1. 2.7. Equações angulares do movimento A equação angular para a coordenada polar θ é trivial, pois esta coordenada é uma constante no tempo (conforme vimos na última subseção), consequentemente o torque τ associado com essa coordenada é, (34) τ → θ = 0 , a equação para a coordenada azimutal ϕ é escrita na forma usual, (35) τ → ϕ = I ⁢ d 2 ⁢ ϕ d ⁢ t 2 ⁢ u ^ , onde 0≤ϕ<2⁢π, I é o momento de inércia da carga (I=m⁢r2) e u^ está na direção do eixo z13 (Figura 1). Utilizando a definição clássica de torque e a equação radial3, temos, (36) τ → = r → × F → = r ⁢ r ^ × q ⁢ g m ⁢ r 3 ⁢ ( d ⁢ r → d ⁢ t × r ⁢ r ^ ) = 0 , como a componente τ→θ e o torque total τ→=τ→θ+τ→ϕ são nulos, a componente τ→ϕ consequentemente também é nula, assim temos, (37) m ⁢ r 2 ⁢ d 2 ⁢ ϕ d ⁢ t 2 ⁢ u ^ = m ⁢ r 2 ⁢ d d ⁢ t ⁢ ( d ⁢ ϕ d ⁢ t ⁢ u ^ ) = 0 , o que significa que a expressão dentro do parênteses é uma constante e igual a velocidade angular ω→ da carga. Como temos uma grandeza vetorial constante no tempo para o sistema carga-monopolo, que é o momento angular total J→ visto em 30, então podemos escrever a equação angular para ϕ, a qual chamaremos equação azimutal, como, (38) d ⁢ ϕ d ⁢ t = J m ⁢ r 2 . onde colocamos o momento de inércia m⁢r2 para manter a equação dimensionalmente correta (podemos reconhecer aqui a clássica expressão para o momento angular em termos da velocidade angular J=I⁢ω). A próxima subseção vamos apresentar a solução exata da equação azimutal (38) do movimento de uma carga na presença do monopolo. 2.8. Solução da equação azimutal Para obtermos a solução da equação azimutal (38) vamos utilizar a solução da equação radial dada em (1). Substituindo então a solução radial no denominador do lado direito da equação azimutal, (39) d ⁢ ϕ d ⁢ t = J m ⁢ ( v 2 ⁢ t 2 + b 2 ) , integrando e considerando ϕ=0 para t=0, (40) ϕ = J m ⁢ ∫ 0 t d ⁢ t ( v 2 ⁢ t 2 + b 2 ) , vamos trocar a variável de integração, fazendo x=v⁢t e d⁢x=v⁢d⁢t. A integral (40) assume então uma forma mais simples, (41) ϕ = J m ⁢ v ⁢ ∫ 0 x d ⁢ x ( x 2 + b 2 ) , utilizando técnicas usuais de integração, obtemos facilmente de (41) a solução para a equação (38), cuja expressão é, (42) ϕ = J m ⁢ v ⁢ b ⁢ arctan ⁡ ( v ⁢ t b ) . Onde Jm⁢v⁢b=csc⁡θ. Terminamos assim a subseção obtendo a solução exata para a equação azimutal dada em (38). 2.9. Equação da trajetória Para obtermos a equação da trajetória de uma carga na presença do monopolo na origem, basta eliminarmos t nas funções horárias (11) e (42) (lembrando que a função horária para θ é uma constante). Usando iniciamente (42) e isolando t, (43) t = b v ⁢ tan ⁡ ( m ⁢ v ⁢ b ⁢ ϕ J ) , podemos utilizar essa expressão para eliminar agora o t em (11), o que resulta em, (44) r 2 = b 2 ⁢ ( 1 + tan 2 ⁡ [ m ⁢ v ⁢ b ⁢ ϕ J ] ) , r 2 = b 2 ⁢ sec 2 ⁡ ( m ⁢ v ⁢ b ⁢ ϕ J ) , tomando a raiz quadrada de ambos os lados do resultado anterior, obtemos a equação da trajetória de uma carga na presença de um monopolo na origem, (45) r b = sec ⁡ ( m ⁢ v ⁢ b ⁢ ϕ J ) . Uma verificação na Figura 2 deixa claro que a trajetória da carga na presença do monopolo não é fechada, o que indica que esse sistema não forma estados ligados. A carga vem do infinito com velocidade v→, interage com o monopolo descrevendo uma trajetória aproximadamente espiral (contida na superfície de um cone de abertura 2⁢θ0), alcança uma distância mínima b e retorna para o infinito. Figura 2: Trajetória da carga na presença do monopolo, representado pelo ponto vermelho no vértice do cone. A trajetória é contida na superfície de um cone circular de abertura 2⁢θ0. Aqui utilizamos b=0,5 e m=v=1. 2.10. Velocidade da carga na presençado monopolo As componentes angular e radial da velocidade v→ da carga que interage com o monopolo, ao longo de sua trajetória contida na superfície cônica, podem ser obtidas como segue: realizando o produto vetorial do momento angular total J→ à direita por r→ e utilizando a identidade vetorial (A→×B→)×C→=B→⁢(A→⋅C→)-A→⁢(B→⋅C→), temos, (46) J → × r → = m ⁢ ( r → × v → ) × r → - q ⁢ g ⁢ r ^ × r → ⏟ = 0 = m ⁢ [ v → ⁢ ( r → ⋅ r → ) - r → ⁢ ( v → ⋅ r → ) ] = m ⁢ r 2 ⁢ v → - m ⁢ r 2 ⁢ r → r 2 ⁢ ( v → ⋅ r → ) = m ⁢ r 2 ⁢ [ v → - r ^ r ⁢ ( d ⁢ r → d ⁢ t ⋅ r → ) ] , utilizando o resultado (7) e isolando v→, temos, (47) v → = 1 m ⁢ r 2 ⁢ ( J → × r → ) + v ⁢ ( v ⁢ t r ) ⁢ r ^ , utilizando agora (11) em (47)e considerando que, (48) ω → = J → m ⁢ r 2 , chegamos ao seguinte resultado, (49) v → = J → m ⁢ ( v 2 ⁢ t 2 + b 2 ) × r → + v ( 1 + ( b / v ⁢ t ) 2 ) ⁢ r ^ = ( ω → × r → ) + v r ⁢ r ^ , onde ω→×r→=ω⁢r⁢sin⁡θ⁢ϕ^ é a velocidade tangencial (na direção ϕ^). Temos então as nossas velocidades angular ω→ e radial v→r, cujos módulos são, respectivamente, (50) ω = ( m ⁢ v ⁢ b ) 2 + ( q ⁢ g ) 2 m ⁢ ( v 2 ⁢ t 2 + b 2 ) , v r = v ( 1 + ( b / v ⁢ t ) 2 ) , na posição onde a carga atinge a distância mínima b de aproximação do monopolo (t=0), os módulos das velocidades angular e radial são, respectivamente, (51) ω = ( m ⁢ v ⁢ b ) 2 + ( q ⁢ g ) 2 m ⁢ b 2 , v r = 0 , por outro lado, para um tempo t→±∞, os módulos das velocidades angular e radial da carga são, respectivamente, (52) lim t → ± ∞ ⁡ ω = 0 , lim t → ± ∞ ⁡ v r = v . Como era de se esperar, a uma distâcia infinita do monopolo a carga possui movimento retilíneo uniforme. A mesma situação ocorreria se tivéssemos g=0 (ausência do monopolo) e consequentemente b=0 (neste caso para qualquer tempo t). 2.11. Constância do módulo da velocidadeda carga Nesta subseção iremos mostrar que o módulo da carga na presença do monopolo é uma constante no tempo. Vamos utilizar a equação (49) para obter o módulo ao quadrado v2, (53) v → ⋅ v → = v 2 = [ ( ω → × r → ) + v r ⁢ r ^ ] ⋅ [ ( ω → × r → ) + v r ⁢ r ^ ] = ( ω → × r → ) ⋅ ( ω → × r → ) + 2 ⁢ v r ⁢ r ^ ⋅ ( ω → × r → ) ⏟ 0 + v r 2 = ( ω → ⋅ ω → ) ⁢ ( r → ⋅ r → ) - ( ω → ⋅ r → ) ⁢ ( ω → ⋅ r → ) + v r 2 = ω 2 ⁢ r 2 - ( ω → ⋅ r → ) 2 + v r 2 , onde usamos a identidade vetorial (A→×B→)⋅(C→×D→)=(A→⋅C→)⁢(B→⋅D→)-(A→⋅D→)⁢(B→⋅C→) e o fato do produto misto ser nulo por conter dois vetores radiais proporcionais. Pelo resultado (31), o termo (ω→⋅r→) é constante, isto é, (54) ( ω → ⋅ r → ) = 1 m ⁢ r ⁢ ( J → ⋅ r ^ ) = - q ⁢ g m ⁢ r , prosseguindo com os cálculos, (55) v 2 = ω 2 ⁢ r 2 - ( q ⁢ g ) 2 m 2 ⁢ r 2 + v r 2 = m 2 ⁢ r 4 ⁢ ω 2 - ( q ⁢ g ) 2 m 2 ⁢ r 2 + v r 2 = J 2 - ( q ⁢ g ) 2 m 2 ⁢ r 2 + v r 2 = m 2 ⁢ v 2 ⁢ b 2 m 2 ⁢ r 2 + v r 2 = v 2 ⁢ b 2 r 2 + v r 2 , utilizando a expressão para o módulo de vr e realizando as simplificações necessárias, (56) v 2 = v 2 ⁢ b 2 r 2 + v 2 ⁢ v 2 ⁢ t 2 r 2 = v 2 ⁢ ( b 2 + v 2 ⁢ t 2 r 2 ) , o que resulta em, (57) ( v 2 ⁢ t 2 + b 2 r 2 ) = 1 → r 2 = v 2 ⁢ t 2 + b 2 . Isto é, recuperamos a solução radial14 (11). Este resultado indica não ser possível verificar a constância do módulo de v→ partindo diretamente das expressões (47) ou (49), pois pelo resultado visto em (57), teríamos que primeiro isolar v2 na solução radial (11), o que cairia numa expressão envolvendo o próprio r2, resultando numa identidade com a derivada temporal de v em ambos os lados da igualdade. Para demonstrarmos a constância do módulo de v→, seguiremos por outro caminho. Vamos partir da equação radial do movimento (3), realizando nela o produto escalar à esquerda por v→, (58) v → ⋅ d ⁢ v → d ⁢ t = q ⁢ g m ⁢ r 3 ⁢ v → ⋅ ( d ⁢ r → d ⁢ t × r → ) = q ⁢ g m ⁢ r 3 ⁢ v → ⋅ ( v → × r → ) ⏟ 0 = 0 , o produto misto possui dois vetores iguais e consequentemente se anula. Assim, o produto escalar da velocidade com a sua derivada temporal é zero.15 Vamos utilizar a seguinte identidade vetorial, (59) d d ⁢ t ⁢ v 2 = d d ⁢ t ⁢ ( v → ⋅ v → ) = v → ⋅ d ⁢ v → d ⁢ t + d ⁢ v → d ⁢ t ⋅ v → = 2 ⁢ v → ⋅ d ⁢ v → d ⁢ t , ou seja, podemos escrever, (60) v → ⋅ d ⁢ v → d ⁢ t = 1 2 ⁢ d d ⁢ t ⁢ v 2 , utilizando o resultado (58) na igualdade (60), podemos concluir que, (61) v → ⋅ d ⁢ v → d ⁢ t = 1 2 ⁢ d d ⁢ t ⁢ v 2 = v ⁢ d ⁢ v d ⁢ t = 0 , para o caso onde v≠0, a derivada temporal de v necessariamente deverá ser, (62) d ⁢ v d ⁢ t = 0 . Ou seja, o módulo v da velocidade da carga é uma constante no tempo. Este resultado foi obtido por meio de uma identidade vetorial oriunda da segunda lei de Newton, sendo esta última representada em nosso trabalho pela equação16 (3), de onde obtemos também a solução radial(11) e a expressão (49) para a velocidade da carga na presença do monopolo. apresentaremos a física básica de uma carga interagindo com um monopolo na origem, incluindo a obtenção do momento angular orbital, momento angular total e as equações do movimento em coordenadas esféricas, bem como as soluções exatas dessas equações; na Seção3 3. Potencial Vetor de Dirac Para o Monopolo Nesta seção iremos construir o potencial vetor de Dirac A→ para o monopolo. Podemos iniciar esta tarefa partindo da expressão para o campo magnético radial B→, tipo Coulombiano, dado em (1). Um campo magnético radial é o campo esperado para um monopolo pontual e precisa ser definido como o rotacional de um potencial vetor A→, isto é, (63) B → = ∇ → × A → , considerando a lei de Gauss, o resultado para o fluxo do campo magnético de um monopolo com carga magnética g deveria ser, (64) Φ = ∮ S B → ⋅ n ^ ⁢ d S = 4 ⁢ π ⁢ g , onde S é a área da superfície Gaussiana envolvendo o monopolo g, n^ é o versor normal a esta área e B→, o campo magnético radial do monopolo. Por outro lado, utilizando (63) concluímos também que, (65) Φ = ∇ → ⋅ B → = ∇ → ⋅ ( ∇ → × A → ) = 0 , o que contraria (65), logo temos um problema na definição inicial para o campo B→ do monopolo, o que leva a um paradoxo! Podemos contudo contornar esta situação considerando um termo extra no campo radial B→, este termo é o campo magnético associado com a chamada corda de Dirac e será definido matematicamente como [27], (66) B → c = - 4 ⁢ π ⁢ g ⁢ θ ⁢ ( z ) ⁢ δ ⁢ ( x ) ⁢ δ ⁢ ( y ) ⁢ n ^ , onde θ⁢(z) é a função degrau e δ⁢(x), δ⁢(y) são as funções delta de Dirac. A corda de Dirac é definida como um conjunto de pontos singulares, geralmente pertencentes a uma curva contínua, com uma das extremidades no monopolo. Podemos vizualizar a corda de Dirac como um solenóide finíssimo e semi-infinito. Se o outro extremo desse solenóide está infinitamente distante, observaríamos um monopolo e não um dipolo magnético, ou seja, o pólo que não se encontra no infinito é o nosso monopolo. Dentro dessa idéia, um monopolo então seria a extremidade de um solenóide muito fino e semi-infinito. Um ilustração pictórica desta corda é mostrada na Figura 3. Após a introdução do conceito de corda de Dirac, o campo magnético calculado a partir do potencial vetor A→ deverá ser, (67) B → s = ∇ → × A → = B → + B → c , Figura 3: Representação pictórica do campo magnético radial B→ do monopolo (à direita), construído a partir de uma combinação entre o campo B→s associado com o potencial vetor de Dirac A→ (à esquerda) e o campo B→c associado com a chamada corda de Dirac (centro). um cálculo relativamente simples mostra que o campo magnético B→s obedece à condição (65), isto é, (68) Φ = ∮ S ( B → + B → c ) ⋅ n ^ ⁢ d S = 4 ⁢ π ⁢ g - 4 ⁢ π ⁢ g ⁢ θ ⁢ ( 0 ) = 0 . Desta forma, o campo magnético radial B→ de um monopolo é dado por B→=B→s-B→c e pode se mostrar facilmente que tal campo obedece à condição (64). O potencial vetor A→ é então associado ao campo B→s e não ao campo B→. Uma representação pictórica do campo magnético B→ do monopolo como sendo a combinação do campo B→s (associado ao potencial vetor A→) com o campo B→c (associado com a corda de Dirac) é mostrada na Figura 3. Vamos partir agora para a construção da expressão do potencial vetor A→. Como o campo B→s é radial e vem de um produto vetorial, podemos fazer algumas hipóteses acerca de A→: 1. A→ depende do ângulo polar θ. 2. A→ aponta na direção do gradiente de ϕ⁢(x,y), que é o ângulo azimutal em função de x e y. Assim, uma forma conveniente para A→ seria, (69) A → = A ⁢ ( θ ) ⁢ ∇ → ⁢ ϕ ⁢ ( x , y ) , a função ϕ⁢(x,y) pode ser obtida das relações entre coordenadas esféricas e cartesianas, então, (70) tan ⁡ ϕ = y x → ϕ ⁢ ( x , y ) = arctan ⁡ ( y x ) , o gradiente de ϕ é (após escrever as coordenadas x e y em termo de (r,θ,ϕ) na expressão final), (71) ∇ → ⁢ ϕ = - sin ⁡ ϕ r ⁢ sin ⁡ θ ⁢ x ^ + cos ⁡ ϕ r ⁢ sin ⁡ θ ⁢ y ^ , uma proposta conveniente para a função A⁢(θ) (ansatz) seria, (72) A ⁢ ( θ ) = g ⁢ ( 1 - cos ⁡ θ ) , onde a constante g será associada com a carga magnética do monopolo (poderíamos ter utilizado o ansatz A⁢(θ)=-g⁢(1+cos⁡θ), o que não mudaria a física do problema). Substituindo a expressão (71) em (69) e utilizando nosso ansatz, temos, (73) A → = - g ⁢ ( 1 - cos ⁡ θ ) ⁢ sin ⁡ ϕ r ⁢ sin ⁡ θ ⁢ x ^ + g ⁢ ( 1 - cos ⁡ θ ) ⁢ cos ⁡ ϕ r ⁢ sin ⁡ θ ⁢ y ^ , utilizando as relações entre os vetores de base x^ e y^ e os vetores de base r^, θ^ e ϕ^, isto é, (74) x ^ = sin ⁡ θ ⁢ cos ⁡ ϕ ⁢ r ^ + cos ⁡ θ ⁢ cos ⁡ ϕ ⁢ θ ^ - sin ⁡ ϕ ⁢ ϕ ^ y ^ = sin ⁡ θ ⁢ sin ⁡ ϕ ⁢ r ^ + cos ⁡ θ ⁢ sin ⁡ ϕ ⁢ θ ^ + cos ⁡ ϕ ⁢ ϕ ^ , substituindo estas relações em (73) e efetuando as simplificações necessárias, chegamos na seguinte expressão, (75) A → = g ⁢ ( 1 - cos ⁡ θ ) ⁢ sin ⁡ ϕ r ⁢ sin ⁡ θ ( - sin ϕ sin θ cos ϕ + cos ϕ sin θ sin ϕ ) r ^ + g ⁢ ( 1 - cos ⁡ θ ) ⁢ cos ⁡ ϕ r ⁢ sin ⁡ θ × ( - sin ⁡ ϕ ⁢ cos ⁡ θ ⁢ cos ⁡ ϕ + cos ⁡ ϕ ⁢ cos ⁡ θ ⁢ sin ⁡ ϕ ) ⁢ θ ^ + g ⁢ ( 1 - cos ⁡ θ ) ⁢ cos ⁡ ϕ r ⁢ sin ⁡ θ ⁢ ( sin 2 ⁡ ϕ + cos 2 ⁡ ϕ ) ⁢ ϕ ^ , os primeiros dois termos entre parênteses são nulos (aqueles multiplicando r^ e θ^), o termo multiplicando ϕ^, pela relação fundamental da trigonometria, é igual a 1. Logo, temos o nosso resultado final para o potencial vetor A→, (76) A → = g ⁢ ( 1 - cos ⁡ θ ) r ⁢ sin ⁡ θ ⁢ ϕ ^ . Com r≠0. Este é o chamado potencial vetor de Dirac para o monopolo, tal expressão define assim o chamado monopolo de Dirac. A expressão (76) pode ser compreendida mais corretamente como uma distribuição do que como uma função. O domínio de (76) possui um conjunto de singularidades em θ=π, ao longo do semi-eixo z negativo, que é a chamada corda de Dirac. A posição da corda no espaço é arbitrária e duas cordas em posições diferentes são relacionadas por uma simples transformação de calibre. 3.1. Transformações de calibre O potencial vetor de Dirac pode também ser escrito da seguinte maneira, (77) A → = g ⁢ ( 1 - cos ⁡ θ ) ⁢ ∇ → ⁢ ϕ = ( 1 - cos ⁡ θ ) ⁢ i q ⁢ U - 1 ⁢ ∇ → ⁢ U , onde o elemento U é, (78) U = e - i ⁢ q ⁢ g ⁢ ϕ . Que é um elemento do grupo de calibre U⁢(1). Assim, podemos reconhecer o potencial vetor A→ como uma transformação de calibre pura (pure gauge) e sendo o grupo de calibre U⁢(1) associado abeliano, o monopolo de Dirac é dito ser um monopolo abeliano. 3.2. Transformações na corda: tipos demonopolos abelianos O potencial de Dirac se submete a uma transformação de calibre usual, que para grupos de simetria abelianos é escrita como, (79) A ′ → = A → - i q ⁢ U - 1 ⁢ ∇ → ⁢ U , considerando um elemento U do grupo U⁢(1), (80) U = e i ⁢ q ⁢ g ⁢ λ , onde λ=λ⁢(r,θ,ϕ). Podemos modificar o potencial A→ por uma simples transformação de calibre, escolhendo uma forma conveniente para a função λ. No final, os potenciais estarão associados ao mesmo campo magnético radial B→ do monopolo. 3.2.1. Mudança da corda no monopolo de Dirac Para exemplificar o que foi discutido anteriormente, vamos considerar a escolha λ=-2⁢ϕ, então, (81) A ′ → = g ⁢ ( 1 - cos ⁡ θ ) r ⁢ sin ⁡ θ ⁢ ϕ ^ - i q ⁢ e 2 ⁢ i ⁢ q ⁢ g ⁢ ϕ ⁢ ∇ → ⁢ e - 2 ⁢ i ⁢ q ⁢ g ⁢ ϕ = g ⁢ ( 1 - cos ⁡ θ ) r ⁢ sin ⁡ θ ⁢ ϕ ^ - 2 ⁢ g ⁢ ∇ → ⁢ ϕ = g ⁢ ( 1 - cos ⁡ θ ) r ⁢ sin ⁡ θ ⁢ ϕ ^ - 2 ⁢ g r ⁢ sin ⁡ θ ⁢ ϕ ^ = - g ⁢ ϕ ^ - g ⁢ cos ⁡ θ ⁢ ϕ ^ r ⁢ sin ⁡ θ = - g ⁢ ( 1 + cos ⁡ θ ) r ⁢ sin ⁡ θ ⁢ ϕ ^ . Assim, o potencial A→, que tem a corda ao longo do semi-eixo negativo z (ao longo da linha θ=π) se transforma em outro potencial A′→, que tem a corda ao longo do semi-eixo z positivo. Logo, o elemento U associado com λ=-2⁢ϕ muda a corda de um semi-eixo para outro. Esta última escolha do potencial vetor é a utilizada no livro do Shnir [27]. Dependendo do λ, podemos ter ainda alguns potenciais de monopolo particulares, como os dois exemplos dados a seguir. 3.2.2. Monopolo de Schwinger O potencial vetor de Schwinger para o monopolo [31] pode ser obtido do potencial vetor de Dirac por meio de (79) usando λ=-ϕ e realizando um cálculo semelhante ao apresentado em (70), a expressão final para o potencial vetor é, (82) A → S ⁢ c ⁢ h = - g ⁢ cos ⁡ θ r ⁢ sin ⁡ θ ⁢ ϕ ^ , este potencial vetor define o chamado monopolo de Schwinger. A justificativa para essa expressão, segundo Schwinger, era de que o mesmo acreditava ser mais apropriada para teorias de campo relativísticas. O potencial vetor de Schwinger também pode ser reconhecido como a soma de dois potenciais vetores de Dirac, cujas cordas diferem por θ=π, (83) A → S ⁢ c ⁢ h = g 2 ⁢ r ⁢ ( ( 1 - cos ⁡ θ ) sin ⁡ θ - ( 1 + cos ⁡ θ ) sin ⁡ θ ) ⁢ ϕ ^ = 1 2 ⁢ A → + 1 2 ⁢ A ′ → . Pode-se verificar facilmente que a expressão anterior recai na expressão (82). 3.2.3. Monopolo de Banderet O potencial vetor de Banderet para o monopolo [32] pode ser obtido considerando λ=(1-cos⁡θ)⁢ϕ. A expressão para este potencial vetor é, (84) A → B = - g ⁢ ϕ ⁢ sin ⁡ θ r ⁢ ϕ ^ . Este potencial vetor define o chamado monopolo de Banderet. O potencial vetor de Banderet para o monopolo possui a singularidade em todos os pontos do plano x≥0, y≥0. 3.3. Monopolo de Wu-Yang e a eliminação dacorda de Dirac Observando a expressão (76) podemos concluir que este potencial vetor não é definido em todos os pontos do espaço. Existe um conjunto de pontos, passando pela origem, que compõe a tal corda de Dirac (já mencionada acima) e que se constitui em um conjunto de singularidades. Assim, seria mais adequado afirmar que não podemos considerar o potencial vetor de Dirac uma função, e sim uma distribuição. No caso da expressão (76), a corda de Dirac se encontra no semi-eixo z negativo, isto é, para o ângulo θ=π. Uma maneira de se contornar a singularidade que aparece nesta teoria foi apresentada por T. T. Wu e C. N. Yang em 1975 [33, 34], utilizando elementos da geometria diferencial, da teoria das variedades diferenciáveis17 e dos espaços fibrados [35]. A construção de Wu-Yang para o monopolo de Dirac abre mão da tradicional parametrização do espaço ℝ3, no qual o monopolo está situado, e propõe no lugar desta uma separação do ambiente em dois hemisférios, os quais chamaremos hemisférios norte N e sul S. Estes serão parametrizados por um conjunto particular de coordenadas, seguindo a ideia das coordenadas na chamada projeção estereográfica. Assim, o potencial vetor A→ será dividido em duas expressões, uma definida para cada hemisfério, as quais chamaremos A→N para o hemisfério norte e A→S para o hemisfério sul. Em seus respectivos hemisférios, os potenciais não contém singularidades em seus domínios e na região do equador, os dois hemisférios possuem uma interseção ϵ. As expressões para os potenciais em cada hemisfério e seus respectivos domínios são dados por, (85) { A → N = g ⁢ ( 1 - cos ⁡ θ ) r ⁢ sin ⁡ θ ⁢ ϕ ^ 0 ≤ θ < π 2 + ϵ 2 A → S = - g ⁢ ( 1 + cos ⁡ θ ) r ⁢ sin ⁡ θ ⁢ ϕ ^ π 2 - ϵ 2 < θ ≤ π . Na região de interseção N∩S ambos os potenciais são bem-definidos e podemos conectá-los por uma transformação de calibre, (86) A → N = A → S - i q ⁢ e ( - 2 ⁢ i ⁢ q ⁢ g ⁢ ϕ ) ⁢ ∇ → ⁢ e 2 ⁢ i ⁢ q ⁢ g ⁢ ϕ , onde q é a carga elétrica e g, a magnética. Assim, Wu e Yang compreenderam corretamente o problema da singularidade e apresentaram uma solução, introduzindo dois potenciais vetoriais relacionados por uma transformação de calibre. Desta forma, Wu e Yang eliminaram a corda de Dirac simplesmente redefinindo a parametrização do espaço em torno da carga magnética. O monopolo magnético com o potencial vetor A→ dado pela construção de Wu-Yang é chamado monopolo magnético de Wu-Yang abeliano, pois o grupo de simetria associado ainda é o grupo unitário U⁢(1). Uma construção semelhante, porém utilizando o potencial vetor de Banderet, foi proposta por Shnir e Tolkachev no início dos anos 90 [36]. 3.4. Equações de Maxwell e a simetria dual Nesta subseção vamos apresentar as conhecidas equações de Maxwell incorporando agora a ideia do monopolo. Considerando densidades de carga magnética (isolada), as respectivas equações, na forma local, assumem o seguinte aspecto, (87) { ∇ → ⋅ E → = 4 ⁢ π ⁢ ρ e ∇ → ⋅ B → = 4 ⁢ π ⁢ ρ g - ∇ → × E → = 4 ⁢ π ⁢ j → g + ∂ ⁡ B → ∂ ⁡ t ∇ → × B → = 4 ⁢ π ⁢ j → e + ∂ ⁡ E → ∂ ⁡ t onde ρe e ρg são as densidades de carga elétrica e magnética, e j→e e j→g são as densidades de corrente elétrica e magnética, respectivamente. Podemos observar que a lei de Gauss para o campo magnético agora incorpora uma fonte ρg (comentamos sobre isso na introdução deste trabalho). As equações de Maxwell então assumem uma forma mais simétrica, considerando a existência de cargas magnéticas isoladas. Vamos considerar agora um quadrivetor corrente jμ=(ρ,j→), onde o índice μ corre de 0 a 3 (a densidade de carga ρ é associada com o valor μ=0). Uma nova simetria surge nas equações de Maxwell quando consideramos a existência de cargas magnéticas isoladas. Chamamos esta nova simetria de simetria dual (ou invariância dual )[27, 37]. As equações (87) são invariantes sob as seguintes transformações nos campos E→ e B→, bem como nas fontes jeμ e jgμ, (88) ( E → B → ) → ( cos ⁡ φ - sin ⁡ φ sin ⁡ φ cos ⁡ φ ) ⁢ ( E → B → ) , (89) ( j e μ j g μ ) → ( cos ⁡ φ - sin ⁡ φ sin ⁡ φ cos ⁡ φ ) ⁢ ( j e μ j g μ ) , onde o ângulo φ é o chamado ângulo dual da transformação. As matrizes quadradas 2×2 da transformação dual, com a multiplicação usual de matrizes, formam o grupo de rotação ortogonal O⁢(2). Pode-se mostrar também que a energia e o momento do campo eletromagnético são invariantes pela ação deste grupo. Considerando como exemplo φ=π/2, temos para os campos E→ e B→, (90) E → → - B → , B → → E → , e para as densidades de carga, (91) j e μ → - j g μ , j g μ → j e μ , a relação entre o ângulo dual φ e as cargas g e q é, (92) tan ⁡ φ = g q . Onde o elemento neutro I2 do grupo de transformação dual é associado com o valor g=0. apresentaremos o potencial vetor de Dirac para o monopolo, o conceito de corda de Dirac, as transformações de calibre e as equações de Maxwell considerando a existência de cargas magnéticas isoladas; na Seção4 4. Fibrado de Hopf e o Monopolo de Dirac Fora do escopo desta revisão, porém não menos interessante, é a relação entre monopolo de Dirac e Geometria diferencial. Esta relação foi descoberta na década de 70 do século passado quando os físicos perceberam que a matemática das teorias de calibre é um ramo da Geometria Diferencial que estuda objetos como os fibrados (fiber bundles), conexões e suas curvaturas. Nesta seção faremos uma sucinta discussão sobre o assunto e referimos o leitor a [27, 35] para maiores detalhes. Um Fibrado é basicamente um espaço topológico18 que localmente é um produto cartesiano com a topologia do produto. O fibrado complexo de Hopf S1→S3→S2 é um fibrado onde o espaço total é a 3 esfera S3 e localmente é o produto S2×S1 onde S2 é chamado espaço base e S1 é chamado de fibra. Quando a fibra também possui a estrutura de grupo de Lie como S1 e uma ação a direita no espaço base, este fibrado é chamado de fibrado principal. Toda teoria de calibre envolve um fibrado principal onde o grupo de simetria da teoria é o grupo dado pela fibra, a física do monopolo de Dirac é descrita matematicamente pelo fibrado de Hopf, onde o potencial vetor localmente definido é identificado com a conexão natural neste fibrado. A teoria das classes caracteristicas, uma generalização do teorema de Gauss-Bonnet da geometria diferencial, ainda fornece uma explicação topológica para a quantização da carga elétrica, resultado que foi obtido por Dirac na descrição de uma partícula quântica carregada na presença do monopolo [24]. apresentaremos a relação entre o monopolo de Dirac e o fibrado de Hopf; na Seção5 5. Monopolo Magnético: Modelos Análogos Nesta seção vamos listar alguns modelos análogos ao monopolo magnético, isto é, sistemas físicos que se comportam exatamente como monopolos magnéticos sob determinadas condições. Embora o presente trabalho trate somente do monopolo clássico, alguns modelos análogos quânticos serão também apresentados nesta seção, com o objetivo de motivar o leitor para um possível aprofundamento no tema, buscando outras referências. Não entraremos em muitos detalhes sobre os modelos análogos apresentados aqui. A Física do monopolo magnético foi reproduzida em diversos sistemas: Tiurev, Kuopanportti e Mottonen realizaram experimentalmente a criação de um par monopolo-antimonopolo de Dirac em um condensado de Bose-Einstein com spin 1 [38]. Monopolos magnéticos foram reproduzidos experimentalmente em gelos de spin (spin ice), que são certos materiais onde podemos reproduzir quasipartículas19 de monopolo em um gás livre a uma temperatura abaixo de 1⁢K [39, 40, 41, 42]. Monopolos magnéticos também foram reproduzidos em campos magnéticos sintéticos [43], em ímas quirais [44], usando metamateriais [45] e também em campos quânticos [46]. Um modelo experimental clássico análogo a um monopolo magnético foi criado por Béché e colaboradores, usando uma agulha magnética finíssima em escala nanoscópica [47]. Modelos análogos ao monopolo (e também ao dyon) utilizando sistemas quânticos com massa efetiva variável (abreviados como sistemas PDM), via mapeamento, foram estudados por dois dos autores deste trabalho e podem ser reunidos na Tabela 1. Embora os monopolos magnéticos ainda não tenham sido observados na natureza, pela grande quantidade de informações a respeito de seu comportamento, inúmeros modelos análogos teóricos e experimentais (tanto clássicos como quânticos) podem ser obtidos. Tabela 1: Sumário de sistemas alvos envolvendo monopolo e dyon, que foram modelados utilizando sistemas quânticos PDM. O ano de publicação e a referência também são apresentados. Sistema alvo Autores/ano Carga-monopolo Schmidt, Jesus/2018 [48] Carga-dyon Jesus, Schmidt/2019 [49] Carga-monopolo relativístico Jesus, Schmidt/2019 [49] Carga-monopolo com spin-1/2 Jesus, Schmidt/2019 [50] listaremos alguns modelos análogos aos monopolos, tanto teóricos quanto experimentais; finalmente, na Seção6 6. Conclusões Neste artigo apresentamos uma revisão introdutória à Fisica do Monopolo Magnético, clássico, investigando a dinâmica não-relativística de uma partícula pontual eletricamente carregada (abreviada como carga) na presença de uma partícula pontual na origem, possuindo uma carga magnética, ou um monopolo magnético (abreviada como monopolo). O estudo deste sistema carga-monopolo levou às equações clássicas do movimento em coordenadas esféricas, bem como na obtenção de suas soluções exatas. Um estudo do potencial vetor para o monopolo abeliano, conhecido como monopolo de Dirac, e a questão da corda de Dirac, foram abordados e através de uma transformação de calibre apropriada, mostramos que partindo do potencial vetor de Dirac, outros potenciais vetores associados com monopolos diversos podem ser obtidos, todos diferindo apenas pela posição da corda. A questão da eliminação da corda de Dirac foi investigada inicialmente por Wu e Yang, e a maneira apresentada para esta realização foi dividir topologicamente o espaço em dois setores, associados com dois potenciais vetores de Dirac, regulares em todos os pontos daquele setor. Apresentamos também brevemente as equações de Maxwell, considerando a existência de monopolos magnéticos, o que leva a uma nova simetria nessas equações chamada simetria dual. Uma breve seção também foi dedicada a um tema mais avançado, relacionando o monopolo magnético de Dirac com a topologia dos espaços fibrados. Para finalizar, listamos alguns modelos análogos para o monopolo magnético, utilizando outros sistemas físicos, como sistemas PDM, e tanto modelos teóricos quanto experimentais foram apresentados. No campo experimental a utilização de certos materias conhecidos como gelo de spin foi bem sucedida em reproduzir o comportamento do monopolo magnético em um gás livre nesses materiais. , apresentaremos as conclusões deste trabalho.

2. Monopolo Clássico: Equações do Movimento

Nesta seção obteremos as equações do movimento de uma carga na presença de um monopolo na origem, em coordenadas esféricas (r,θ,ϕ), bem como suas soluções exatas (funções horárias das coordenadas com o tempo). Esse problema é um dos mais simples para abordar dentro da física do monopolo clássico, para o qual podemos lançar mão do arquabouço teórico da Mecânica e do Eletromagnetismo Clássicos. Como veremos neste trabalho, há diferenças importantes entre o caso Coulombiano do espalhamento entre duas cargas (uma fixa) e o presente caso. Por exemplo, não há estados ligados9 9 Estados ligados são aqueles onde a energia potencial do sistema é negativa e no caso clássico, são relacionados com órbitas fechadas. Exemplo: sistema terra-lua. na interação carga-monopolo; no espalhamento carga-carga, a trajetória da carga espalhada está contida sempre em um plano e no caso carga – monopolo (monopolo fixo na origem), tal trajetória não está contida em nenhum. Vamos começar então analisando o sistema carga-monopolo obtendo a equação radial para o movimento da carga espalhada.

2.1. Equação radial do movimento

O campo magnético do monopolo, aqui colocado na origem, é radial e Coulombiano. A expressão para esse tipo de campo vetorial não é muito diferente do caso envolvendo uma carga pontual (lei de Coulomb) e pode ser escrita como,

(1) B = g r r 3 ,

onde g é a carga magnética do monopolo (um pólo norte ou sul isolado).10 10 Associaremos o sinal positivo ao pólo norte e o sinal negativo ao pólo sul. A equação do movimento pode ser obtida da segunda lei de Newton para a força magnética,

(2) F = m d 2 r d t 2 = q ( v × B ) ,

onde m é a massa da carga (aqui sempre consideraremos a massa reduzida da carga,11 11 O conceito de massa reduzida é muito útil em um sistemas de duas partículas, pois reduz a um problema onde um único corpo se move, com uma massa menor do que sua massa original. mantendo o símbolo m) e q, o valor da carga. Escrevendo explicitamente v=dr/dt e utilizando (1) obtemos,

(3) d 2 r d t 2 = q g m r 3 ( d r d t × r ) .

Que é a equação radial da carga q se movendo na presença de um monopolo g na origem. Por simplicidade sempre consideraremos neste trabalho qg>0. A solução exata desta equação será tratada na próxima subseção.

2.2. Solução da equação radial

A solução para a equação radial (3) pode ser obtida da seguinte maneira: realizando o produto escalar de ambos os lados da respectiva equação por r à esquerda, obtemos,

(4) r d 2 r d t 2 = q g m r 3 r ( d r d t × r ) 0 = 0 ,

visto que o produto misto r(v×r), que surge no lado direito de (3) após a multiplicação escalar por r, possui dois vetores iguais e consequentemente se anula (pela definição deste produto). Vamos também utilizar o seguinte resultado,

(5) d d t ( r d r d t ) = r d 2 r d t 2 + d r d t d r d t v 2 ,

onde v=|v|. Podemos combinar os resultados (4) e (5) para chegar na seguinte igualdade,

(6) d d t ( r d r d t ) - v 2 = 0 .

Temos assim uma equação para a coordenada radial em função do tempo. Prosseguindo então com a integração desta equação,

(7) d ( r d r d t ) = v 2 d t , r d r d t = v 2 d t = v 2 t + C ,

onde a constância do módulo v (idem para v2) da velocidade v da carga na presença do monopolo será demonstrada mais adiante, na subseção2.11 2.11. Constância do módulo da velocidadeda carga Nesta subseção iremos mostrar que o módulo da carga na presença do monopolo é uma constante no tempo. Vamos utilizar a equação (49) para obter o módulo ao quadrado v2, (53) v → ⋅ v → = v 2 = [ ( ω → × r → ) + v r ⁢ r ^ ] ⋅ [ ( ω → × r → ) + v r ⁢ r ^ ] = ( ω → × r → ) ⋅ ( ω → × r → ) + 2 ⁢ v r ⁢ r ^ ⋅ ( ω → × r → ) ⏟ 0 + v r 2 = ( ω → ⋅ ω → ) ⁢ ( r → ⋅ r → ) - ( ω → ⋅ r → ) ⁢ ( ω → ⋅ r → ) + v r 2 = ω 2 ⁢ r 2 - ( ω → ⋅ r → ) 2 + v r 2 , onde usamos a identidade vetorial (A→×B→)⋅(C→×D→)=(A→⋅C→)⁢(B→⋅D→)-(A→⋅D→)⁢(B→⋅C→) e o fato do produto misto ser nulo por conter dois vetores radiais proporcionais. Pelo resultado (31), o termo (ω→⋅r→) é constante, isto é, (54) ( ω → ⋅ r → ) = 1 m ⁢ r ⁢ ( J → ⋅ r ^ ) = - q ⁢ g m ⁢ r , prosseguindo com os cálculos, (55) v 2 = ω 2 ⁢ r 2 - ( q ⁢ g ) 2 m 2 ⁢ r 2 + v r 2 = m 2 ⁢ r 4 ⁢ ω 2 - ( q ⁢ g ) 2 m 2 ⁢ r 2 + v r 2 = J 2 - ( q ⁢ g ) 2 m 2 ⁢ r 2 + v r 2 = m 2 ⁢ v 2 ⁢ b 2 m 2 ⁢ r 2 + v r 2 = v 2 ⁢ b 2 r 2 + v r 2 , utilizando a expressão para o módulo de vr e realizando as simplificações necessárias, (56) v 2 = v 2 ⁢ b 2 r 2 + v 2 ⁢ v 2 ⁢ t 2 r 2 = v 2 ⁢ ( b 2 + v 2 ⁢ t 2 r 2 ) , o que resulta em, (57) ( v 2 ⁢ t 2 + b 2 r 2 ) = 1 → r 2 = v 2 ⁢ t 2 + b 2 . Isto é, recuperamos a solução radial14 (11). Este resultado indica não ser possível verificar a constância do módulo de v→ partindo diretamente das expressões (47) ou (49), pois pelo resultado visto em (57), teríamos que primeiro isolar v2 na solução radial (11), o que cairia numa expressão envolvendo o próprio r2, resultando numa identidade com a derivada temporal de v em ambos os lados da igualdade. Para demonstrarmos a constância do módulo de v→, seguiremos por outro caminho. Vamos partir da equação radial do movimento (3), realizando nela o produto escalar à esquerda por v→, (58) v → ⋅ d ⁢ v → d ⁢ t = q ⁢ g m ⁢ r 3 ⁢ v → ⋅ ( d ⁢ r → d ⁢ t × r → ) = q ⁢ g m ⁢ r 3 ⁢ v → ⋅ ( v → × r → ) ⏟ 0 = 0 , o produto misto possui dois vetores iguais e consequentemente se anula. Assim, o produto escalar da velocidade com a sua derivada temporal é zero.15 Vamos utilizar a seguinte identidade vetorial, (59) d d ⁢ t ⁢ v 2 = d d ⁢ t ⁢ ( v → ⋅ v → ) = v → ⋅ d ⁢ v → d ⁢ t + d ⁢ v → d ⁢ t ⋅ v → = 2 ⁢ v → ⋅ d ⁢ v → d ⁢ t , ou seja, podemos escrever, (60) v → ⋅ d ⁢ v → d ⁢ t = 1 2 ⁢ d d ⁢ t ⁢ v 2 , utilizando o resultado (58) na igualdade (60), podemos concluir que, (61) v → ⋅ d ⁢ v → d ⁢ t = 1 2 ⁢ d d ⁢ t ⁢ v 2 = v ⁢ d ⁢ v d ⁢ t = 0 , para o caso onde v≠0, a derivada temporal de v necessariamente deverá ser, (62) d ⁢ v d ⁢ t = 0 . Ou seja, o módulo v da velocidade da carga é uma constante no tempo. Este resultado foi obtido por meio de uma identidade vetorial oriunda da segunda lei de Newton, sendo esta última representada em nosso trabalho pela equação16 (3), de onde obtemos também a solução radial(11) e a expressão (49) para a velocidade da carga na presença do monopolo. . Prossenguindo então com a separação das variáveis no resultado (7) e integrando novamente,

(8) r d r = ( v 2 t + C ) d t , r d r = v 2 t 2 2 + C t + D ,

como o vetor r é paralelo a dr (campo radial), temos rdr=rdr. Considerando então este novo integrando, realizamos uma integração simples do lado esquerdo e redefinimos as constantes C e D do lado direito de (8), sendo estas constantes reescritas agora como,

(9) C = C 2 , D = D 2 ,

após essas ações, a igualdade (8) assume a seguinte expressão,

(10) r 2 = v 2 t 2 + C t + D ,

no problema carga-monopolo, temos uma aproximação mínima entre ambas as partículas, chamada parâmetro de impacto b (a ser definido mais adiante). Esta informação precisa estar presente na solução radial. Na ausência do monopolo, a carga possui movimento retilíneo e uniforme (passando pela origem). Estes comportamentos só são obtidos se escolhermos as constantes C e D tal que C=0 e D=b2. Assim, chegamos ao resultado desejado,

(11) r = v 2 t 2 + b 2 .

Que é a nossa solução radial da equação (3). A solução (11) representa um cone circular, em cujo vértice está o monopolo. Conforme já mencionado a pouco, podemos perceber a presença de um parâmetro b, chamado parâmetro de impacto do espalhamento. Esta grandeza é definida como a aproximação mínima entre a carga espalhada e o centro espalhador, em um problema clássico de espalhamento [30[30] H. Goldstein, C. Poole e J. Safco, Classical Mechanics (Pearson, São Francisco, 2001), 3 ed.]. No nosso caso, b é a distância mínima de aproximação12 12 Para b>0 (o que equivale a g≠0), temos r>0. entre a carga e o monopolo situado na origem (para t=0, a carga se encontra a esta distância). A carga, vindo do infinito, atinge essa distância mínima e sofre o espalhamento, retornando para o infinito (efeito espelho magnético) se movendo sobre a superfície de um cone circular (a equação da trajetória da carga será obtida mais adiante). Podemos verificar que para b=0, a solução radial (11) se reduz à função horária de uma partícula em movimento retilíneo e uniforme, passando pela origem (ausência de monopolo).

2.3. Energia cinética da carga na presençado monopolo

Vamos investigar aqui a energia cinética de uma carga na presença do monopolo na origem. Tomando o produto escalar da equação radial (1) por v, verificamos facilmente que,

(12) v d 2 r d t 2 = v d v d t = q g m r 3 v ( v × r ) 0 = 0 ,

já que novamente temos um produto misto com dois vetores iguais. Podemos escrever também,

(13) v d v d t = 1 2 d d t ( v v ) = 1 2 d d t v 2 = d d t ( 1 2 v 2 ) = 0 .

Multiplicando ambos os lados do resultado (13) pela massa m da carga, obtemos a derivada temporal da energia cinética,

(14) d d t ( m v 2 2 ) = d d t E c = 0 E c = K .

Onde K é uma constante. Assim, a energia cinética Ec da carga interagindo com o monopolo é uma constante no tempo.

2.4. Momento angular orbital

Vamos investigar o momento angular da carga na presença do monopolo. Partimos da expressão clássica para o momento angular de uma partícula de massa m e velocidade v, a saber,

(15) L = r × m v ,

calculando a derivada temporal de L,

(16) d L d t = r × d ( m v ) d t + d r d t × m v = r × m d 2 r d t 2 ,

sendo v×mv=0. Substituindo então (1) em (16) e realizando algumas simplificações, podemos chegar no seguinte resultado,

(17) d L d t = r × q g m r 3 ( m d r d t × r ) = q g m r 3 ( r × m d r d t × r ) = q g m r 3 ( r × m v × r ) = q g m r 3 ( L × r ) .

O resultado não-nulo indica que o vetor momento angular L não é uma constante no tempo. Vamos determinar agora a derivada temporal do módulo do vetor L fazendo,

(18) d d t | L | 2 = d d t ( L L ) = L d L d t + d L d t L ,

Utilizando (17) na expressão anterior, temos,

(19) d d t | L | 2 = L q g m r 3 ( L × r ) + q g m r 3 ( L × r ) L = 0 .

Visto que as duas parcelas no lado direito da expressão anterior são produtos mistos, que no nosso caso são determinantes com duas linhas iguais. Assim, o módulo |L| (daqui em diante escreveremos L por simplicidade) do vetor momento angular L é uma constante do movimento. Como tanto o módulo de L como o módulo da velocidade v da carga são constantes no tempo, podemos determinar o valor do módulo de L utilizando r=b (sendo b a distância mínima de aproximação entre a carga e o monopolo), neste caso teremos o ângulo entre o vetor v e b valendo 90º (ponto de retorno). Assim, pela definição do módulo de um produto vetorial, temos paraL,

(20) L = m v b .

A trajetória da carga na presença do monopolo será obtida e mostrada na subseção2.9 2.9. Equação da trajetória Para obtermos a equação da trajetória de uma carga na presença do monopolo na origem, basta eliminarmos t nas funções horárias (11) e (42) (lembrando que a função horária para θ é uma constante). Usando iniciamente (42) e isolando t, (43) t = b v ⁢ tan ⁡ ( m ⁢ v ⁢ b ⁢ ϕ J ) , podemos utilizar essa expressão para eliminar agora o t em (11), o que resulta em, (44) r 2 = b 2 ⁢ ( 1 + tan 2 ⁡ [ m ⁢ v ⁢ b ⁢ ϕ J ] ) , r 2 = b 2 ⁢ sec 2 ⁡ ( m ⁢ v ⁢ b ⁢ ϕ J ) , tomando a raiz quadrada de ambos os lados do resultado anterior, obtemos a equação da trajetória de uma carga na presença de um monopolo na origem, (45) r b = sec ⁡ ( m ⁢ v ⁢ b ⁢ ϕ J ) . Uma verificação na Figura 2 deixa claro que a trajetória da carga na presença do monopolo não é fechada, o que indica que esse sistema não forma estados ligados. A carga vem do infinito com velocidade v→, interage com o monopolo descrevendo uma trajetória aproximadamente espiral (contida na superfície de um cone de abertura 2⁢θ0), alcança uma distância mínima b e retorna para o infinito. Figura 2: Trajetória da carga na presença do monopolo, representado pelo ponto vermelho no vértice do cone. A trajetória é contida na superfície de um cone circular de abertura 2⁢θ0. Aqui utilizamos b=0,5 e m=v=1. .

2.5. Momento angular total

Vamos obter a expressão para o momento angular total J de uma carga se movendo na presença de um monopolo na origem. Podemos deduzir tal expressão partindo de (1) e tomando o produto vetorial de ambos os lados desta equação por r à esquerda,

(21) r × d 2 r d t 2 = q g m r 3 r × ( v × r ) ,

o triplo produto vetorial que surgiu do lado direito de (21) será desenvolvido utilizando a identidade vetorial A×(B×C)=B(AC)-C(AB). Realizando as substituições apropriadas, temos,

(22) r × ( v × r ) = r 2 v - r ( r v ) = r 2 d r d t - r ( r d r d t ) ,

substituindo o resultado anterior em (21) e seguindo com as seguintes simplificações,

(23) r × d 2 r d t 2 = q g m r 3 [ r 2 d r d t - r ( r d r d t ) ] = q g m r 2 [ r d r d t - r ( r ^ d r d t ) ] = q g m r 2 ( r d r d t - r d r d t ) = q g m d d t ( r r ) ,

podemos ainda aplicar o seguinte truque no lado esquerdo da equação, (21),

(24) r × d 2 r d t 2 = r × d 2 r d t 2 + d r d t × d r d t 0 = d d t ( r × d r d t ) ,

igualando os resultados obtidos em (23) e (24), temos,

(25) d d t ( r × d r d t ) = d d t ( q g m r r ) ,

reunindo ambos os termos no lado esquerdo e simplificando, chegamos à seguinte igualdade,

(26) d d t ( r × m v - q g r r ) = 0 ,

como L=r×mv e r^=rr, podemos escrever uma expressão mais compacta,

(27) d d t ( L - q g r ^ ) = 0 .

É imediato verificar que o vetor dentro do parênteses, o qual chamaremos de J, é uma constante no tempo (dJ/dt=0). Este vetor é definido como o momento angular total do sistema carga -monopolo, ou seja,

(28) J = L - q g r ^ ,

este vetor está na direção do eixo z na Figura 1. Este resultado é importantíssimo dentro da física do monopolo. O módulo de J pode ser obtido utilizando a lei dos cossenos. O ângulo α entre os vetores L e qgr^ vem da definição do produto interno,

Figura 1:
Diagrama vetorial com os momentos angulares envolvidos no sistema carga-monopolo (relacionado à escolha qg>0). Os vetores L e -qgr^ precessionam em torno da soma J, que é uma constante no tempo.

(29) cos α = L q g r ^ L q g = ( r × v ) r ^ v b = 0 ,

ou seja, os vetores L e qgr^ são perpendiculares. Como resultado, o módulo de J é simplesmente,

(30) J = ( m v b ) 2 + ( q g ) 2 .

Como um comentário final que pode ser útil ao leitor, no livro do Shnir [27[27] Y.M. Shnir, Magnetic Monopoles, (Springer-Verlag, Berlin, 2005).], que usamos como referência principal, o vetor momento angular orbital L é escrito como L ~ e o vetor momento angular total J é escrito como L.

2.6. Ângulo entre os vetores momento angulartotal e a direção radial

Vamos determinar o ângulo entre o momento angular total J e o vetor unitário radial r^ inicialmente realizando o produto interno entre esses dois vetores, ou seja,

(31) J r ^ = ( L - q g r ^ ) r ^ = ( r × m v ) r ^ 0 - q g = - q g ,

utilizando agora a expressão para o produto interno entre dois vetores, em termos dos seus módulos e do ângulo entre eles, e usando (31), temos,

(32) cos θ = J r ^ | r ^ | | J | = - q g | J | = - q g L 2 + ( q g ) 2 ,

como o módulo de L é constante (L=mvb), o ângulo entre J e r^ consequentemente é constante (θ=θ0) e determinado pela seguinte expressão,

(33) θ 0 = arccos ( - q g ( m v b ) 2 + ( q g ) 2 ) .

Que pela definição é a metade do ângulo de abertura da superfície cônica (cone circular com eixo ao longo de J) sobre a qual a carga se movimenta. Os vetores -qgr^ e L precessionam em torno de um eixo fixo (normalmente escolhido o eixo z), de modo a manter a soma de ambos (que é J, ao longo do eixo z) constante no tempo. A combinação desses vetores pode ser vizualizada na Figura 1.

2.7. Equações angulares do movimento

A equação angular para a coordenada polar θ é trivial, pois esta coordenada é uma constante no tempo (conforme vimos na última subseção), consequentemente o torque τ associado com essa coordenada é,

(34) τ θ = 0 ,

a equação para a coordenada azimutal ϕ é escrita na forma usual,

(35) τ ϕ = I d 2 ϕ d t 2 u ^ ,

onde 0ϕ<2π, I é o momento de inércia da carga (I=mr2) e u^ está na direção do eixo z13 13 Na nossa convenção, u^=-z^. (Figura 1). Utilizando a definição clássica de torque e a equação radial3, temos,

(36) τ = r × F = r r ^ × q g m r 3 ( d r d t × r r ^ ) = 0 ,

como a componente τθ e o torque total τ=τθ+τϕ são nulos, a componente τϕ consequentemente também é nula, assim temos,

(37) m r 2 d 2 ϕ d t 2 u ^ = m r 2 d d t ( d ϕ d t u ^ ) = 0 ,

o que significa que a expressão dentro do parênteses é uma constante e igual a velocidade angular ω da carga. Como temos uma grandeza vetorial constante no tempo para o sistema carga-monopolo, que é o momento angular total J visto em 30, então podemos escrever a equação angular para ϕ, a qual chamaremos equação azimutal, como,

(38) d ϕ d t = J m r 2 .

onde colocamos o momento de inércia mr2 para manter a equação dimensionalmente correta (podemos reconhecer aqui a clássica expressão para o momento angular em termos da velocidade angular J=Iω). A próxima subseção vamos apresentar a solução exata da equação azimutal (38) do movimento de uma carga na presença do monopolo.

2.8. Solução da equação azimutal

Para obtermos a solução da equação azimutal (38) vamos utilizar a solução da equação radial dada em (1). Substituindo então a solução radial no denominador do lado direito da equação azimutal,

(39) d ϕ d t = J m ( v 2 t 2 + b 2 ) ,

integrando e considerando ϕ=0 para t=0,

(40) ϕ = J m 0 t d t ( v 2 t 2 + b 2 ) ,

vamos trocar a variável de integração, fazendo x=vt e dx=vdt. A integral (40) assume então uma forma mais simples,

(41) ϕ = J m v 0 x d x ( x 2 + b 2 ) ,

utilizando técnicas usuais de integração, obtemos facilmente de (41) a solução para a equação (38), cuja expressão é,

(42) ϕ = J m v b arctan ( v t b ) .

Onde Jmvb=cscθ. Terminamos assim a subseção obtendo a solução exata para a equação azimutal dada em (38).

2.9. Equação da trajetória

Para obtermos a equação da trajetória de uma carga na presença do monopolo na origem, basta eliminarmos t nas funções horárias (11) e (42) (lembrando que a função horária para θ é uma constante). Usando iniciamente (42) e isolando t,

(43) t = b v tan ( m v b ϕ J ) ,

podemos utilizar essa expressão para eliminar agora o t em (11), o que resulta em,

(44) r 2 = b 2 ( 1 + tan 2 [ m v b ϕ J ] ) , r 2 = b 2 sec 2 ( m v b ϕ J ) ,

tomando a raiz quadrada de ambos os lados do resultado anterior, obtemos a equação da trajetória de uma carga na presença de um monopolo na origem,

(45) r b = sec ( m v b ϕ J ) .

Uma verificação na Figura 2 deixa claro que a trajetória da carga na presença do monopolo não é fechada, o que indica que esse sistema não forma estados ligados. A carga vem do infinito com velocidade v, interage com o monopolo descrevendo uma trajetória aproximadamente espiral (contida na superfície de um cone de abertura 2θ0), alcança uma distância mínima b e retorna para o infinito.

Figura 2:
Trajetória da carga na presença do monopolo, representado pelo ponto vermelho no vértice do cone. A trajetória é contida na superfície de um cone circular de abertura 2θ0. Aqui utilizamos b=0,5 e m=v=1.

2.10. Velocidade da carga na presençado monopolo

As componentes angular e radial da velocidade v da carga que interage com o monopolo, ao longo de sua trajetória contida na superfície cônica, podem ser obtidas como segue: realizando o produto vetorial do momento angular total J à direita por r e utilizando a identidade vetorial (A×B)×C=B(AC)-A(BC), temos,

(46) J × r = m ( r × v ) × r - q g r ^ × r = 0 = m [ v ( r r ) - r ( v r ) ] = m r 2 v - m r 2 r r 2 ( v r ) = m r 2 [ v - r ^ r ( d r d t r ) ] ,

utilizando o resultado (7) e isolando v, temos,

(47) v = 1 m r 2 ( J × r ) + v ( v t r ) r ^ ,

utilizando agora (11) em (47)e considerando que,

(48) ω = J m r 2 ,

chegamos ao seguinte resultado,

(49) v = J m ( v 2 t 2 + b 2 ) × r + v ( 1 + ( b / v t ) 2 ) r ^ = ( ω × r ) + v r r ^ ,

onde ω×r=ωrsinθϕ^ é a velocidade tangencial (na direção ϕ^). Temos então as nossas velocidades angular ω e radial vr, cujos módulos são, respectivamente,

(50) ω = ( m v b ) 2 + ( q g ) 2 m ( v 2 t 2 + b 2 ) , v r = v ( 1 + ( b / v t ) 2 ) ,

na posição onde a carga atinge a distância mínima b de aproximação do monopolo (t=0), os módulos das velocidades angular e radial são, respectivamente,

(51) ω = ( m v b ) 2 + ( q g ) 2 m b 2 , v r = 0 ,

por outro lado, para um tempo t±, os módulos das velocidades angular e radial da carga são, respectivamente,

(52) lim t ± ω = 0 , lim t ± v r = v .

Como era de se esperar, a uma distâcia infinita do monopolo a carga possui movimento retilíneo uniforme. A mesma situação ocorreria se tivéssemos g=0 (ausência do monopolo) e consequentemente b=0 (neste caso para qualquer tempo t).

2.11. Constância do módulo da velocidadeda carga

Nesta subseção iremos mostrar que o módulo da carga na presença do monopolo é uma constante no tempo. Vamos utilizar a equação (49) para obter o módulo ao quadrado v2,

(53) v v = v 2 = [ ( ω × r ) + v r r ^ ] [ ( ω × r ) + v r r ^ ] = ( ω × r ) ( ω × r ) + 2 v r r ^ ( ω × r ) 0 + v r 2 = ( ω ω ) ( r r ) - ( ω r ) ( ω r ) + v r 2 = ω 2 r 2 - ( ω r ) 2 + v r 2 ,

onde usamos a identidade vetorial (A×B)(C×D)=(AC)(BD)-(AD)(BC) e o fato do produto misto ser nulo por conter dois vetores radiais proporcionais. Pelo resultado (31), o termo (ωr) é constante, isto é,

(54) ( ω r ) = 1 m r ( J r ^ ) = - q g m r ,

prosseguindo com os cálculos,

(55) v 2 = ω 2 r 2 - ( q g ) 2 m 2 r 2 + v r 2 = m 2 r 4 ω 2 - ( q g ) 2 m 2 r 2 + v r 2 = J 2 - ( q g ) 2 m 2 r 2 + v r 2 = m 2 v 2 b 2 m 2 r 2 + v r 2 = v 2 b 2 r 2 + v r 2 ,

utilizando a expressão para o módulo de vr e realizando as simplificações necessárias,

(56) v 2 = v 2 b 2 r 2 + v 2 v 2 t 2 r 2 = v 2 ( b 2 + v 2 t 2 r 2 ) ,

o que resulta em,

(57) ( v 2 t 2 + b 2 r 2 ) = 1 r 2 = v 2 t 2 + b 2 .

Isto é, recuperamos a solução radial14 14 As subseções2.10 e 2.11 poderiam vir antes da seção2.2. A presente organização foi só uma escolha dos autores. (11). Este resultado indica não ser possível verificar a constância do módulo de v partindo diretamente das expressões (47) ou (49), pois pelo resultado visto em (57), teríamos que primeiro isolar v2 na solução radial (11), o que cairia numa expressão envolvendo o próprio r2, resultando numa identidade com a derivada temporal de v em ambos os lados da igualdade. Para demonstrarmos a constância do módulo de v, seguiremos por outro caminho. Vamos partir da equação radial do movimento (3), realizando nela o produto escalar à esquerda por v,

(58) v d v d t = q g m r 3 v ( d r d t × r ) = q g m r 3 v ( v × r ) 0 = 0 ,

o produto misto possui dois vetores iguais e consequentemente se anula. Assim, o produto escalar da velocidade com a sua derivada temporal é zero.15 15 Lembrando que por se tratar de vetores, o resultado nulo não indica necessariamente que os vetores são nulos e sim que podem ser ortogonais. Vamos utilizar a seguinte identidade vetorial,

(59) d d t v 2 = d d t ( v v ) = v d v d t + d v d t v = 2 v d v d t ,

ou seja, podemos escrever,

(60) v d v d t = 1 2 d d t v 2 ,

utilizando o resultado (58) na igualdade (60), podemos concluir que,

(61) v d v d t = 1 2 d d t v 2 = v d v d t = 0 ,

para o caso onde v0, a derivada temporal de v necessariamente deverá ser,

(62) d v d t = 0 .

Ou seja, o módulo v da velocidade da carga é uma constante no tempo. Este resultado foi obtido por meio de uma identidade vetorial oriunda da segunda lei de Newton, sendo esta última representada em nosso trabalho pela equação16 16 Segunda lei de Newton para o movimento de translação. No caso de rotação, esta lei é representada na equação (35). (3), de onde obtemos também a solução radial(11) e a expressão (49) para a velocidade da carga na presença do monopolo.

3. Potencial Vetor de Dirac Para o Monopolo

Nesta seção iremos construir o potencial vetor de Dirac A para o monopolo. Podemos iniciar esta tarefa partindo da expressão para o campo magnético radial B, tipo Coulombiano, dado em (1). Um campo magnético radial é o campo esperado para um monopolo pontual e precisa ser definido como o rotacional de um potencial vetor A, isto é,

(63) B = × A ,

considerando a lei de Gauss, o resultado para o fluxo do campo magnético de um monopolo com carga magnética g deveria ser,

(64) Φ = S B n ^ d S = 4 π g ,

onde S é a área da superfície Gaussiana envolvendo o monopolo g, n^ é o versor normal a esta área e B, o campo magnético radial do monopolo. Por outro lado, utilizando (63) concluímos também que,

(65) Φ = B = ( × A ) = 0 ,

o que contraria (65), logo temos um problema na definição inicial para o campo B do monopolo, o que leva a um paradoxo! Podemos contudo contornar esta situação considerando um termo extra no campo radial B, este termo é o campo magnético associado com a chamada corda de Dirac e será definido matematicamente como [27[27] Y.M. Shnir, Magnetic Monopoles, (Springer-Verlag, Berlin, 2005).],

(66) B c = - 4 π g θ ( z ) δ ( x ) δ ( y ) n ^ ,

onde θ(z) é a função degrau e δ(x), δ(y) são as funções delta de Dirac. A corda de Dirac é definida como um conjunto de pontos singulares, geralmente pertencentes a uma curva contínua, com uma das extremidades no monopolo. Podemos vizualizar a corda de Dirac como um solenóide finíssimo e semi-infinito. Se o outro extremo desse solenóide está infinitamente distante, observaríamos um monopolo e não um dipolo magnético, ou seja, o pólo que não se encontra no infinito é o nosso monopolo. Dentro dessa idéia, um monopolo então seria a extremidade de um solenóide muito fino e semi-infinito. Um ilustração pictórica desta corda é mostrada na Figura 3. Após a introdução do conceito de corda de Dirac, o campo magnético calculado a partir do potencial vetor A deverá ser,

(67) B s = × A = B + B c ,

Figura 3:
Representação pictórica do campo magnético radial B do monopolo (à direita), construído a partir de uma combinação entre o campo Bs associado com o potencial vetor de Dirac A (à esquerda) e o campo Bc associado com a chamada corda de Dirac (centro).

um cálculo relativamente simples mostra que o campo magnético Bs obedece à condição (65), isto é,

(68) Φ = S ( B + B c ) n ^ d S = 4 π g - 4 π g θ ( 0 ) = 0 .

Desta forma, o campo magnético radial B de um monopolo é dado por B=Bs-Bc e pode se mostrar facilmente que tal campo obedece à condição (64). O potencial vetor A é então associado ao campo Bs e não ao campo B. Uma representação pictórica do campo magnético B do monopolo como sendo a combinação do campo Bs (associado ao potencial vetor A) com o campo Bc (associado com a corda de Dirac) é mostrada na Figura 3.

Vamos partir agora para a construção da expressão do potencial vetor A. Como o campo Bs é radial e vem de um produto vetorial, podemos fazer algumas hipóteses acerca de A:

  1. 1.

    A depende do ângulo polar θ.

  2. 2.

    A aponta na direção do gradiente de ϕ(x,y), que é o ângulo azimutal em função de x e y.

Assim, uma forma conveniente para A seria,

(69) A = A ( θ ) ϕ ( x , y ) ,

a função ϕ(x,y) pode ser obtida das relações entre coordenadas esféricas e cartesianas, então,

(70) tan ϕ = y x ϕ ( x , y ) = arctan ( y x ) ,

o gradiente de ϕ é (após escrever as coordenadas x e y em termo de (r,θ,ϕ) na expressão final),

(71) ϕ = - sin ϕ r sin θ x ^ + cos ϕ r sin θ y ^ ,

uma proposta conveniente para a função A(θ) (ansatz) seria,

(72) A ( θ ) = g ( 1 - cos θ ) ,

onde a constante g será associada com a carga magnética do monopolo (poderíamos ter utilizado o ansatz A(θ)=-g(1+cosθ), o que não mudaria a física do problema). Substituindo a expressão (71) em (69) e utilizando nosso ansatz, temos,

(73) A = - g ( 1 - cos θ ) sin ϕ r sin θ x ^ + g ( 1 - cos θ ) cos ϕ r sin θ y ^ ,

utilizando as relações entre os vetores de base x^ e y^ e os vetores de base r^, θ^ e ϕ^, isto é,

(74) x ^ = sin θ cos ϕ r ^ + cos θ cos ϕ θ ^ - sin ϕ ϕ ^ y ^ = sin θ sin ϕ r ^ + cos θ sin ϕ θ ^ + cos ϕ ϕ ^ ,

substituindo estas relações em (73) e efetuando as simplificações necessárias, chegamos na seguinte expressão,

(75) A = g ( 1 - cos θ ) sin ϕ r sin θ ( - sin ϕ sin θ cos ϕ + cos ϕ sin θ sin ϕ ) r ^ + g ( 1 - cos θ ) cos ϕ r sin θ × ( - sin ϕ cos θ cos ϕ + cos ϕ cos θ sin ϕ ) θ ^ + g ( 1 - cos θ ) cos ϕ r sin θ ( sin 2 ϕ + cos 2 ϕ ) ϕ ^ ,

os primeiros dois termos entre parênteses são nulos (aqueles multiplicando r^ e θ^), o termo multiplicando ϕ^, pela relação fundamental da trigonometria, é igual a 1. Logo, temos o nosso resultado final para o potencial vetor A,

(76) A = g ( 1 - cos θ ) r sin θ ϕ ^ .

Com r0. Este é o chamado potencial vetor de Dirac para o monopolo, tal expressão define assim o chamado monopolo de Dirac. A expressão (76) pode ser compreendida mais corretamente como uma distribuição do que como uma função. O domínio de (76) possui um conjunto de singularidades em θ=π, ao longo do semi-eixo z negativo, que é a chamada corda de Dirac. A posição da corda no espaço é arbitrária e duas cordas em posições diferentes são relacionadas por uma simples transformação de calibre.

3.1. Transformações de calibre

O potencial vetor de Dirac pode também ser escrito da seguinte maneira,

(77) A = g ( 1 - cos θ ) ϕ = ( 1 - cos θ ) i q U - 1 U ,

onde o elemento U é,

(78) U = e - i q g ϕ .

Que é um elemento do grupo de calibre U(1). Assim, podemos reconhecer o potencial vetor A como uma transformação de calibre pura (pure gauge) e sendo o grupo de calibre U(1) associado abeliano, o monopolo de Dirac é dito ser um monopolo abeliano.

3.2. Transformações na corda: tipos demonopolos abelianos

O potencial de Dirac se submete a uma transformação de calibre usual, que para grupos de simetria abelianos é escrita como,

(79) A = A - i q U - 1 U ,

considerando um elemento U do grupo U(1),

(80) U = e i q g λ ,

onde λ=λ(r,θ,ϕ). Podemos modificar o potencial A por uma simples transformação de calibre, escolhendo uma forma conveniente para a função λ. No final, os potenciais estarão associados ao mesmo campo magnético radial B do monopolo.

3.2.1. Mudança da corda no monopolo de Dirac

Para exemplificar o que foi discutido anteriormente, vamos considerar a escolha λ=-2ϕ, então,

(81) A = g ( 1 - cos θ ) r sin θ ϕ ^ - i q e 2 i q g ϕ e - 2 i q g ϕ = g ( 1 - cos θ ) r sin θ ϕ ^ - 2 g ϕ = g ( 1 - cos θ ) r sin θ ϕ ^ - 2 g r sin θ ϕ ^ = - g ϕ ^ - g cos θ ϕ ^ r sin θ = - g ( 1 + cos θ ) r sin θ ϕ ^ .

Assim, o potencial A, que tem a corda ao longo do semi-eixo negativo z (ao longo da linha θ=π) se transforma em outro potencial A, que tem a corda ao longo do semi-eixo z positivo. Logo, o elemento U associado com λ=-2ϕ muda a corda de um semi-eixo para outro. Esta última escolha do potencial vetor é a utilizada no livro do Shnir [27[27] Y.M. Shnir, Magnetic Monopoles, (Springer-Verlag, Berlin, 2005).]. Dependendo do λ, podemos ter ainda alguns potenciais de monopolo particulares, como os dois exemplos dados a seguir.

3.2.2. Monopolo de Schwinger

O potencial vetor de Schwinger para o monopolo [31[31] J. Schwinger, Phys. Rev. 144, 1087 (1966).] pode ser obtido do potencial vetor de Dirac por meio de (79) usando λ=-ϕ e realizando um cálculo semelhante ao apresentado em (70), a expressão final para o potencial vetor é,

(82) A S c h = - g cos θ r sin θ ϕ ^ ,

este potencial vetor define o chamado monopolo de Schwinger. A justificativa para essa expressão, segundo Schwinger, era de que o mesmo acreditava ser mais apropriada para teorias de campo relativísticas. O potencial vetor de Schwinger também pode ser reconhecido como a soma de dois potenciais vetores de Dirac, cujas cordas diferem por θ=π,

(83) A S c h = g 2 r ( ( 1 - cos θ ) sin θ - ( 1 + cos θ ) sin θ ) ϕ ^ = 1 2 A + 1 2 A .

Pode-se verificar facilmente que a expressão anterior recai na expressão (82).

3.2.3. Monopolo de Banderet

O potencial vetor de Banderet para o monopolo [32[32] P. Banderet, Helv. Phys. Acta 19, 503 (1946).] pode ser obtido considerando λ=(1-cosθ)ϕ. A expressão para este potencial vetor é,

(84) A B = - g ϕ sin θ r ϕ ^ .

Este potencial vetor define o chamado monopolo de Banderet. O potencial vetor de Banderet para o monopolo possui a singularidade em todos os pontos do plano x0, y0.

3.3. Monopolo de Wu-Yang e a eliminação dacorda de Dirac

Observando a expressão (76) podemos concluir que este potencial vetor não é definido em todos os pontos do espaço. Existe um conjunto de pontos, passando pela origem, que compõe a tal corda de Dirac (já mencionada acima) e que se constitui em um conjunto de singularidades. Assim, seria mais adequado afirmar que não podemos considerar o potencial vetor de Dirac uma função, e sim uma distribuição. No caso da expressão (76), a corda de Dirac se encontra no semi-eixo z negativo, isto é, para o ângulo θ=π. Uma maneira de se contornar a singularidade que aparece nesta teoria foi apresentada por T. T. Wu e C. N. Yang em 1975 [33[33] T.T. Wu e C.N. Yang, Phys. Rev. D 12, 3845 (1975)., 34[34] T.T. Wu e C.N. Yang, Nucl. Phys. B 107, 365 (1976).], utilizando elementos da geometria diferencial, da teoria das variedades diferenciáveis17 17 Variedade diferenciável é um tipo de espaço topológico que é localmente uma cópia de um espaço Euclidiano e onde podemos fazer cálculo diferencial e integral. e dos espaços fibrados [35[35] C. Isham, Modern Differential Geometry for Physicists, (World Scientific Publishing, Singapore, 2001).].

A construção de Wu-Yang para o monopolo de Dirac abre mão da tradicional parametrização do espaço 3, no qual o monopolo está situado, e propõe no lugar desta uma separação do ambiente em dois hemisférios, os quais chamaremos hemisférios norte N e sul S. Estes serão parametrizados por um conjunto particular de coordenadas, seguindo a ideia das coordenadas na chamada projeção estereográfica. Assim, o potencial vetor A será dividido em duas expressões, uma definida para cada hemisfério, as quais chamaremos AN para o hemisfério norte e AS para o hemisfério sul. Em seus respectivos hemisférios, os potenciais não contém singularidades em seus domínios e na região do equador, os dois hemisférios possuem uma interseção ϵ. As expressões para os potenciais em cada hemisfério e seus respectivos domínios são dados por,

(85) { A N = g ( 1 - cos θ ) r sin θ ϕ ^ 0 θ < π 2 + ϵ 2 A S = - g ( 1 + cos θ ) r sin θ ϕ ^ π 2 - ϵ 2 < θ π .

Na região de interseção NS ambos os potenciais são bem-definidos e podemos conectá-los por uma transformação de calibre,

(86) A N = A S - i q e ( - 2 i q g ϕ ) e 2 i q g ϕ ,

onde q é a carga elétrica e g, a magnética. Assim, Wu e Yang compreenderam corretamente o problema da singularidade e apresentaram uma solução, introduzindo dois potenciais vetoriais relacionados por uma transformação de calibre. Desta forma, Wu e Yang eliminaram a corda de Dirac simplesmente redefinindo a parametrização do espaço em torno da carga magnética. O monopolo magnético com o potencial vetor A dado pela construção de Wu-Yang é chamado monopolo magnético de Wu-Yang abeliano, pois o grupo de simetria associado ainda é o grupo unitário U(1). Uma construção semelhante, porém utilizando o potencial vetor de Banderet, foi proposta por Shnir e Tolkachev no início dos anos 90 [36[36] Y.M. Shnir e E.A. Tolkachev. Phys. Lett. A. 183, 37 (1993).].

3.4. Equações de Maxwell e a simetria dual

Nesta subseção vamos apresentar as conhecidas equações de Maxwell incorporando agora a ideia do monopolo. Considerando densidades de carga magnética (isolada), as respectivas equações, na forma local, assumem o seguinte aspecto,

(87) { E = 4 π ρ e B = 4 π ρ g - × E = 4 π j g + B t × B = 4 π j e + E t

onde ρe e ρg são as densidades de carga elétrica e magnética, e je e jg são as densidades de corrente elétrica e magnética, respectivamente. Podemos observar que a lei de Gauss para o campo magnético agora incorpora uma fonte ρg (comentamos sobre isso na introdução deste trabalho). As equações de Maxwell então assumem uma forma mais simétrica, considerando a existência de cargas magnéticas isoladas.

Vamos considerar agora um quadrivetor corrente jμ=(ρ,j), onde o índice μ corre de 0 a 3 (a densidade de carga ρ é associada com o valor μ=0). Uma nova simetria surge nas equações de Maxwell quando consideramos a existência de cargas magnéticas isoladas. Chamamos esta nova simetria de simetria dual (ou invariância dual )[27[27] Y.M. Shnir, Magnetic Monopoles, (Springer-Verlag, Berlin, 2005)., 37[37] S.C.S. Silva, Princípio de Hamilton para a Eletrodinâmica Dual, Tese de Doutorado, Universidade de São Paulo, São Paulo (1995).]. As equações (87) são invariantes sob as seguintes transformações nos campos E e B, bem como nas fontes jeμ e jgμ,

(88) ( E B ) ( cos φ - sin φ sin φ cos φ ) ( E B ) ,
(89) ( j e μ j g μ ) ( cos φ - sin φ sin φ cos φ ) ( j e μ j g μ ) ,

onde o ângulo φ é o chamado ângulo dual da transformação. As matrizes quadradas 2×2 da transformação dual, com a multiplicação usual de matrizes, formam o grupo de rotação ortogonal O(2). Pode-se mostrar também que a energia e o momento do campo eletromagnético são invariantes pela ação deste grupo. Considerando como exemplo φ=π/2, temos para os campos E e B,

(90) E - B , B E ,

e para as densidades de carga,

(91) j e μ - j g μ , j g μ j e μ ,

a relação entre o ângulo dual φ e as cargas g e q é,

(92) tan φ = g q .

Onde o elemento neutro I2 do grupo de transformação dual é associado com o valor g=0.

4. Fibrado de Hopf e o Monopolo de Dirac

Fora do escopo desta revisão, porém não menos interessante, é a relação entre monopolo de Dirac e Geometria diferencial. Esta relação foi descoberta na década de 70 do século passado quando os físicos perceberam que a matemática das teorias de calibre é um ramo da Geometria Diferencial que estuda objetos como os fibrados (fiber bundles), conexões e suas curvaturas. Nesta seção faremos uma sucinta discussão sobre o assunto e referimos o leitor a [27[27] Y.M. Shnir, Magnetic Monopoles, (Springer-Verlag, Berlin, 2005)., 35[35] C. Isham, Modern Differential Geometry for Physicists, (World Scientific Publishing, Singapore, 2001).] para maiores detalhes.

Um Fibrado é basicamente um espaço topológico18 18 Um espaço topológico é basicamente um espaço onde se pode definir noções de continuidade e proximidade. que localmente é um produto cartesiano com a topologia do produto. O fibrado complexo de Hopf S1S3S2 é um fibrado onde o espaço total é a 3 esfera S3 e localmente é o produto S2×S1 onde S2 é chamado espaço base e S1 é chamado de fibra. Quando a fibra também possui a estrutura de grupo de Lie como S1 e uma ação a direita no espaço base, este fibrado é chamado de fibrado principal.

Toda teoria de calibre envolve um fibrado principal onde o grupo de simetria da teoria é o grupo dado pela fibra, a física do monopolo de Dirac é descrita matematicamente pelo fibrado de Hopf, onde o potencial vetor localmente definido é identificado com a conexão natural neste fibrado. A teoria das classes caracteristicas, uma generalização do teorema de Gauss-Bonnet da geometria diferencial, ainda fornece uma explicação topológica para a quantização da carga elétrica, resultado que foi obtido por Dirac na descrição de uma partícula quântica carregada na presença do monopolo [24[24] P.A.M. Dirac, Proc. Roy. Soc. A 133, 60 (1931).].

5. Monopolo Magnético: Modelos Análogos

Nesta seção vamos listar alguns modelos análogos ao monopolo magnético, isto é, sistemas físicos que se comportam exatamente como monopolos magnéticos sob determinadas condições. Embora o presente trabalho trate somente do monopolo clássico, alguns modelos análogos quânticos serão também apresentados nesta seção, com o objetivo de motivar o leitor para um possível aprofundamento no tema, buscando outras referências. Não entraremos em muitos detalhes sobre os modelos análogos apresentados aqui.

A Física do monopolo magnético foi reproduzida em diversos sistemas: Tiurev, Kuopanportti e Mottonen realizaram experimentalmente a criação de um par monopolo-antimonopolo de Dirac em um condensado de Bose-Einstein com spin 1 [38[38] K. Tiurev, P. Kuopanportti e M.Möttönen, Phys. Rev. A 99, 023621 (2019).]. Monopolos magnéticos foram reproduzidos experimentalmente em gelos de spin (spin ice), que são certos materiais onde podemos reproduzir quasipartículas19 19 Quasipartículas são excitações coletivas em algum meio físico que se comportam como partículas fracamente interagentes. de monopolo em um gás livre a uma temperatura abaixo de 1K [39[39] C. Castelnovo, R. Moessner e S.L. Sondhi, Nature 451, 42 (2008)., 40[40] D.J.P. Morris, D.A Tennant, S.A Grigera, B. Klemke, C. Castelnovo, R. Moessner, C. Czternasty, M. Meissner, K.C. Rule, J.-U Hoffmann et al., Science 326, 411 (2009)., 41[41] H.M. Revell, L.R. Yaraskavitch, J.D. Mason, K.A. Ross, H.M.L. Noad, H.A. Dabkowska, B.D. Gaulin, P. Henelius e J.B. Kycia, Nat. Phys. 9, 34 (2013)., 42[42] G.F. Magno, Monopolos Magnéticos. Trabalho de Conclusão de Curso, Universidade de São Paulo, São Paulo (2018).].

Monopolos magnéticos também foram reproduzidos em campos magnéticos sintéticos [43[43] M.W. Ray, E. Ruokokoski, S. Kandel, M. Möttönen e D.S. Hall, Nature 505, 657 (2014).], em ímas quirais [44[44] N. Kanazawa, Y. Nii, X.-X. Zhang, A.S. Mishchenko, G. de Filippis, F. Kagawa, Y. Iwasa, N. Nagaosa e Y. Tokura, Nat. Comm. 7, 11622 (2016).], usando metamateriais [45[45] J. Wang, S. Qu, Z. Xu, A. Zhang, H. Ma, J. Zhang, H. Chen e M. Feng, Photonics and Nanostructures 12, 429 (2014).] e também em campos quânticos [46[46] M.W. Ray, E. Ruokokoski, K. Tiurev, M. Möttönen e D.S. Hall, Science 348, 544 (2015).]. Um modelo experimental clássico análogo a um monopolo magnético foi criado por Béché e colaboradores, usando uma agulha magnética finíssima em escala nanoscópica [47[47] A. Béché, R. van Boxem, G. van Tendeloo e J. Verbeeck, Nature Phys. 10, 26 (2014).]. Modelos análogos ao monopolo (e também ao dyon) utilizando sistemas quânticos com massa efetiva variável (abreviados como sistemas PDM), via mapeamento, foram estudados por dois dos autores deste trabalho e podem ser reunidos na Tabela 1. Embora os monopolos magnéticos ainda não tenham sido observados na natureza, pela grande quantidade de informações a respeito de seu comportamento, inúmeros modelos análogos teóricos e experimentais (tanto clássicos como quânticos) podem ser obtidos.

Tabela 1:
Sumário de sistemas alvos envolvendo monopolo e dyon, que foram modelados utilizando sistemas quânticos PDM. O ano de publicação e a referência também são apresentados.

6. Conclusões

Neste artigo apresentamos uma revisão introdutória à Fisica do Monopolo Magnético, clássico, investigando a dinâmica não-relativística de uma partícula pontual eletricamente carregada (abreviada como carga) na presença de uma partícula pontual na origem, possuindo uma carga magnética, ou um monopolo magnético (abreviada como monopolo). O estudo deste sistema carga-monopolo levou às equações clássicas do movimento em coordenadas esféricas, bem como na obtenção de suas soluções exatas. Um estudo do potencial vetor para o monopolo abeliano, conhecido como monopolo de Dirac, e a questão da corda de Dirac, foram abordados e através de uma transformação de calibre apropriada, mostramos que partindo do potencial vetor de Dirac, outros potenciais vetores associados com monopolos diversos podem ser obtidos, todos diferindo apenas pela posição da corda. A questão da eliminação da corda de Dirac foi investigada inicialmente por Wu e Yang, e a maneira apresentada para esta realização foi dividir topologicamente o espaço em dois setores, associados com dois potenciais vetores de Dirac, regulares em todos os pontos daquele setor. Apresentamos também brevemente as equações de Maxwell, considerando a existência de monopolos magnéticos, o que leva a uma nova simetria nessas equações chamada simetria dual. Uma breve seção também foi dedicada a um tema mais avançado, relacionando o monopolo magnético de Dirac com a topologia dos espaços fibrados. Para finalizar, listamos alguns modelos análogos para o monopolo magnético, utilizando outros sistemas físicos, como sistemas PDM, e tanto modelos teóricos quanto experimentais foram apresentados. No campo experimental a utilização de certos materias conhecidos como gelo de spin foi bem sucedida em reproduzir o comportamento do monopolo magnético em um gás livre nesses materiais.

Agradecimentos

Os autores agradecem ao editor chefe e aos revisores pelas orientações, sugestões e elogios, os quais contribuíram grandemente para o enriquecimento deste trabalho.

Referências

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  • 1
    Uma ampla discussão sobre o limite de validade do Eletromagnetismo Maxwelliano pode ser encontrada em [1[1] T.W. Barrett, Topological Foundations of Electromagnetism (World Scientific Publishing, Singapore, 2008).].
  • 2
    Esta é a forma integral da Lei de Gauss para o campo elétrico.
  • 3
    Esta lei é escrita na forma local como B=0.
  • 4
    Tal detector utiliza a radiação Cherenkov emitida pelas partículas em detecção.
  • 5
    A condição de quantização de Dirac estabelece que a quantização da carga elétrica seria explicada pela existência de pelo menos um monopolo magnético. A expressão para esta condição é eg=n2, onde n é um número inteiro.
  • 6
    Especial significa ter determinante igual a 1, unitária significa que a matriz inversa é igual a transposta conjugada.
  • 7
    Estes monopolos são associados a grupos de simetrias onde os elementos não comutam com relação à operação de grupo.
  • 8
    A título de curiosidade, no SI o monopolo magnético possui duas unidades: o Weber (Wb) e o Ampère-metro (Am). Ambas as unidades estão relacionadas por: gWb=μ0gAm.
  • 9
    Estados ligados são aqueles onde a energia potencial do sistema é negativa e no caso clássico, são relacionados com órbitas fechadas. Exemplo: sistema terra-lua.
  • 10
    Associaremos o sinal positivo ao pólo norte e o sinal negativo ao pólo sul.
  • 11
    O conceito de massa reduzida é muito útil em um sistemas de duas partículas, pois reduz a um problema onde um único corpo se move, com uma massa menor do que sua massa original.
  • 12
    Para b>0 (o que equivale a g0), temos r>0.
  • 13
    Na nossa convenção, u^=-z^.
  • 14
    As subseções2.10 2.10. Velocidade da carga na presençado monopolo As componentes angular e radial da velocidade v→ da carga que interage com o monopolo, ao longo de sua trajetória contida na superfície cônica, podem ser obtidas como segue: realizando o produto vetorial do momento angular total J→ à direita por r→ e utilizando a identidade vetorial (A→×B→)×C→=B→⁢(A→⋅C→)-A→⁢(B→⋅C→), temos, (46) J → × r → = m ⁢ ( r → × v → ) × r → - q ⁢ g ⁢ r ^ × r → ⏟ = 0 = m ⁢ [ v → ⁢ ( r → ⋅ r → ) - r → ⁢ ( v → ⋅ r → ) ] = m ⁢ r 2 ⁢ v → - m ⁢ r 2 ⁢ r → r 2 ⁢ ( v → ⋅ r → ) = m ⁢ r 2 ⁢ [ v → - r ^ r ⁢ ( d ⁢ r → d ⁢ t ⋅ r → ) ] , utilizando o resultado (7) e isolando v→, temos, (47) v → = 1 m ⁢ r 2 ⁢ ( J → × r → ) + v ⁢ ( v ⁢ t r ) ⁢ r ^ , utilizando agora (11) em (47)e considerando que, (48) ω → = J → m ⁢ r 2 , chegamos ao seguinte resultado, (49) v → = J → m ⁢ ( v 2 ⁢ t 2 + b 2 ) × r → + v ( 1 + ( b / v ⁢ t ) 2 ) ⁢ r ^ = ( ω → × r → ) + v r ⁢ r ^ , onde ω→×r→=ω⁢r⁢sin⁡θ⁢ϕ^ é a velocidade tangencial (na direção ϕ^). Temos então as nossas velocidades angular ω→ e radial v→r, cujos módulos são, respectivamente, (50) ω = ( m ⁢ v ⁢ b ) 2 + ( q ⁢ g ) 2 m ⁢ ( v 2 ⁢ t 2 + b 2 ) , v r = v ( 1 + ( b / v ⁢ t ) 2 ) , na posição onde a carga atinge a distância mínima b de aproximação do monopolo (t=0), os módulos das velocidades angular e radial são, respectivamente, (51) ω = ( m ⁢ v ⁢ b ) 2 + ( q ⁢ g ) 2 m ⁢ b 2 , v r = 0 , por outro lado, para um tempo t→±∞, os módulos das velocidades angular e radial da carga são, respectivamente, (52) lim t → ± ∞ ⁡ ω = 0 , lim t → ± ∞ ⁡ v r = v . Como era de se esperar, a uma distâcia infinita do monopolo a carga possui movimento retilíneo uniforme. A mesma situação ocorreria se tivéssemos g=0 (ausência do monopolo) e consequentemente b=0 (neste caso para qualquer tempo t). e 2.11 2.11. Constância do módulo da velocidadeda carga Nesta subseção iremos mostrar que o módulo da carga na presença do monopolo é uma constante no tempo. Vamos utilizar a equação (49) para obter o módulo ao quadrado v2, (53) v → ⋅ v → = v 2 = [ ( ω → × r → ) + v r ⁢ r ^ ] ⋅ [ ( ω → × r → ) + v r ⁢ r ^ ] = ( ω → × r → ) ⋅ ( ω → × r → ) + 2 ⁢ v r ⁢ r ^ ⋅ ( ω → × r → ) ⏟ 0 + v r 2 = ( ω → ⋅ ω → ) ⁢ ( r → ⋅ r → ) - ( ω → ⋅ r → ) ⁢ ( ω → ⋅ r → ) + v r 2 = ω 2 ⁢ r 2 - ( ω → ⋅ r → ) 2 + v r 2 , onde usamos a identidade vetorial (A→×B→)⋅(C→×D→)=(A→⋅C→)⁢(B→⋅D→)-(A→⋅D→)⁢(B→⋅C→) e o fato do produto misto ser nulo por conter dois vetores radiais proporcionais. Pelo resultado (31), o termo (ω→⋅r→) é constante, isto é, (54) ( ω → ⋅ r → ) = 1 m ⁢ r ⁢ ( J → ⋅ r ^ ) = - q ⁢ g m ⁢ r , prosseguindo com os cálculos, (55) v 2 = ω 2 ⁢ r 2 - ( q ⁢ g ) 2 m 2 ⁢ r 2 + v r 2 = m 2 ⁢ r 4 ⁢ ω 2 - ( q ⁢ g ) 2 m 2 ⁢ r 2 + v r 2 = J 2 - ( q ⁢ g ) 2 m 2 ⁢ r 2 + v r 2 = m 2 ⁢ v 2 ⁢ b 2 m 2 ⁢ r 2 + v r 2 = v 2 ⁢ b 2 r 2 + v r 2 , utilizando a expressão para o módulo de vr e realizando as simplificações necessárias, (56) v 2 = v 2 ⁢ b 2 r 2 + v 2 ⁢ v 2 ⁢ t 2 r 2 = v 2 ⁢ ( b 2 + v 2 ⁢ t 2 r 2 ) , o que resulta em, (57) ( v 2 ⁢ t 2 + b 2 r 2 ) = 1 → r 2 = v 2 ⁢ t 2 + b 2 . Isto é, recuperamos a solução radial14 (11). Este resultado indica não ser possível verificar a constância do módulo de v→ partindo diretamente das expressões (47) ou (49), pois pelo resultado visto em (57), teríamos que primeiro isolar v2 na solução radial (11), o que cairia numa expressão envolvendo o próprio r2, resultando numa identidade com a derivada temporal de v em ambos os lados da igualdade. Para demonstrarmos a constância do módulo de v→, seguiremos por outro caminho. Vamos partir da equação radial do movimento (3), realizando nela o produto escalar à esquerda por v→, (58) v → ⋅ d ⁢ v → d ⁢ t = q ⁢ g m ⁢ r 3 ⁢ v → ⋅ ( d ⁢ r → d ⁢ t × r → ) = q ⁢ g m ⁢ r 3 ⁢ v → ⋅ ( v → × r → ) ⏟ 0 = 0 , o produto misto possui dois vetores iguais e consequentemente se anula. Assim, o produto escalar da velocidade com a sua derivada temporal é zero.15 Vamos utilizar a seguinte identidade vetorial, (59) d d ⁢ t ⁢ v 2 = d d ⁢ t ⁢ ( v → ⋅ v → ) = v → ⋅ d ⁢ v → d ⁢ t + d ⁢ v → d ⁢ t ⋅ v → = 2 ⁢ v → ⋅ d ⁢ v → d ⁢ t , ou seja, podemos escrever, (60) v → ⋅ d ⁢ v → d ⁢ t = 1 2 ⁢ d d ⁢ t ⁢ v 2 , utilizando o resultado (58) na igualdade (60), podemos concluir que, (61) v → ⋅ d ⁢ v → d ⁢ t = 1 2 ⁢ d d ⁢ t ⁢ v 2 = v ⁢ d ⁢ v d ⁢ t = 0 , para o caso onde v≠0, a derivada temporal de v necessariamente deverá ser, (62) d ⁢ v d ⁢ t = 0 . Ou seja, o módulo v da velocidade da carga é uma constante no tempo. Este resultado foi obtido por meio de uma identidade vetorial oriunda da segunda lei de Newton, sendo esta última representada em nosso trabalho pela equação16 (3), de onde obtemos também a solução radial(11) e a expressão (49) para a velocidade da carga na presença do monopolo. poderiam vir antes da seção2.2 2.2. Solução da equação radial A solução para a equação radial (3) pode ser obtida da seguinte maneira: realizando o produto escalar de ambos os lados da respectiva equação por r→ à esquerda, obtemos, (4) r → ⋅ d 2 ⁢ r → d ⁢ t 2 = q ⁢ g m ⁢ r 3 ⁢ r → ⋅ ( d ⁢ r → d ⁢ t × r → ) ⏟ 0 = 0 , visto que o produto misto r→⋅(v→×r→), que surge no lado direito de (3) após a multiplicação escalar por r→, possui dois vetores iguais e consequentemente se anula (pela definição deste produto). Vamos também utilizar o seguinte resultado, (5) d d ⁢ t ⁢ ( r → ⋅ d ⁢ r → d ⁢ t ) = r → ⋅ d 2 ⁢ r → d ⁢ t 2 + d ⁢ r → d ⁢ t ⋅ d ⁢ r → d ⁢ t ⏟ v 2 , onde v=|v→|. Podemos combinar os resultados (4) e (5) para chegar na seguinte igualdade, (6) d d ⁢ t ⁢ ( r → ⋅ d ⁢ r → d ⁢ t ) - v 2 = 0 . Temos assim uma equação para a coordenada radial em função do tempo. Prosseguindo então com a integração desta equação, (7) d ⁢ ( r → ⋅ d ⁢ r → d ⁢ t ) = v 2 ⁢ d ⁢ t , r → ⋅ d ⁢ r → d ⁢ t = ∫ v 2 ⁢ d t = v 2 ⁢ t + C , onde a constância do módulo v (idem para v2) da velocidade v→ da carga na presença do monopolo será demonstrada mais adiante, na subseção2.11. Prossenguindo então com a separação das variáveis no resultado (7) e integrando novamente, (8) r → ⋅ d ⁢ r → = ( v 2 ⁢ t + C ) ⁢ d ⁢ t , ∫ r → ⋅ d r → = v 2 ⁢ t 2 2 + C ⁢ t + D , como o vetor r→ é paralelo a d⁢r→ (campo radial), temos r→⋅d⁢r→=r⁢d⁢r. Considerando então este novo integrando, realizamos uma integração simples do lado esquerdo e redefinimos as constantes C e D do lado direito de (8), sendo estas constantes reescritas agora como, (9) C = C ′ 2 , D = D ′ 2 , após essas ações, a igualdade (8) assume a seguinte expressão, (10) r 2 = v 2 ⁢ t 2 + C ′ ⁢ t + D ′ , no problema carga-monopolo, temos uma aproximação mínima entre ambas as partículas, chamada parâmetro de impacto b (a ser definido mais adiante). Esta informação precisa estar presente na solução radial. Na ausência do monopolo, a carga possui movimento retilíneo e uniforme (passando pela origem). Estes comportamentos só são obtidos se escolhermos as constantes C′ e D′ tal que C′=0 e D′=b2. Assim, chegamos ao resultado desejado, (11) r = v 2 ⁢ t 2 + b 2 . Que é a nossa solução radial da equação (3). A solução (11) representa um cone circular, em cujo vértice está o monopolo. Conforme já mencionado a pouco, podemos perceber a presença de um parâmetro b, chamado parâmetro de impacto do espalhamento. Esta grandeza é definida como a aproximação mínima entre a carga espalhada e o centro espalhador, em um problema clássico de espalhamento [30]. No nosso caso, b é a distância mínima de aproximação12 entre a carga e o monopolo situado na origem (para t=0, a carga se encontra a esta distância). A carga, vindo do infinito, atinge essa distância mínima e sofre o espalhamento, retornando para o infinito (efeito espelho magnético) se movendo sobre a superfície de um cone circular (a equação da trajetória da carga será obtida mais adiante). Podemos verificar que para b=0, a solução radial (11) se reduz à função horária de uma partícula em movimento retilíneo e uniforme, passando pela origem (ausência de monopolo). . A presente organização foi só uma escolha dos autores.
  • 15
    Lembrando que por se tratar de vetores, o resultado nulo não indica necessariamente que os vetores são nulos e sim que podem ser ortogonais.
  • 16
    Segunda lei de Newton para o movimento de translação. No caso de rotação, esta lei é representada na equação (35).
  • 17
    Variedade diferenciável é um tipo de espaço topológico que é localmente uma cópia de um espaço Euclidiano e onde podemos fazer cálculo diferencial e integral.
  • 18
    Um espaço topológico é basicamente um espaço onde se pode definir noções de continuidade e proximidade.
  • 19
    Quasipartículas são excitações coletivas em algum meio físico que se comportam como partículas fracamente interagentes.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Mar 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    21 Dez 2022
  • Revisado
    31 Jan 2023
  • Aceito
    02 Fev 2023
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