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Idosos vítimas de maus-tratos: cinco anos de análise documental

Resumos

Objetivo

Verificar a ocorrência de maus-tratos contra idosos e suas características (local, tipo, motivo, envolvimento álcool/drogas, perfil e relação de parentesco entre vítimas e agressores), com base nos registros policiais de uma delegacia especializada, no período de cinco anos.

Método

Trata-se de estudo transversal, descritivo e retrospectivo, de análise documental. Foram analisadas as ocorrências policiais de um município de médio porte do noroeste paulista, no período de 2008 a 2012. Investigaram-se as características sociodemográficas de agressores e vítimas e dados relativos à agressão: tipo de violência; local; motivo; presença de álcool e drogas durante a agressão e relação vítima-agressor. Os dados foram tabulados e foi feita análise estatística descritiva.

Resultados

Do total, 572 casos, a maior parte dos agressores eram homens (69,20%), brancos (56,50%), faixa etária 31-40 anos (14,20%) e sem informação quanto à ocupação (50,70%); a maioria das vítimas eram mulheres (93%), brancas (71,50%), com idade entre 60-65 anos (46,30%), casadas (34,10%) e desempregadas/aposentadas (59,98%). Os maus-tratos emocionais foram prevalentes (57%), ocorridos na própria residência (81,30%) e os filhos foram os principais agressores (25,30%). O motivo foi relacionado a discussões (53,10%) na maior parte dos casos.

Conclusão

As mulheres da raça branca, casadas com idade entre 60-65, desempregadas/aposentadas são as principais vítimas, e os agressores são os próprios filhos, também da raça branca, solteiros, com idade entre 31-40 anos. A violência psicológica foi a mais prevalente, desencadeada principalmente por desentendimento entre os envolvidos e na própria residência da vítima. A maioria dos agressores não estava sob efeito de álcool/drogas.

Violência; Violência Doméstica; Idoso; Maus-Tratos ao Idoso


Objective

To verify the occurrence of maltreatment of the elderly and its characteristics (location, type, reason, involvement of alcohol/drugs, profile and family relationship of victims and perpetrators) from the police records of a specialized police station over a five year period.

Method

A cross-sectional, descriptive and documentary analytical study was performed. The police reports of a medium-sized municipality in the northwest of São Paulo were analyzed from 2008 to 2012. The sociodemographic characteristics of the perpetrators and victims and the data relating to the aggression investigated were: violence; location; reason; the presence of alcohol and drugs during the assault and victim-offender relationship. Data was tabulated using descriptive statistical analysis.

Results

Of a total of 572 cases, most of the perpetrators were men (69.2%), Caucasian (56.5%), aged 31-40 years (14.20%) with no information regarding occupation provided (50.70%); most of the victims were women (93.0%), Caucasian (71.5%), aged 60-65 years (46.30%), married (34.10%) and unemployed/retired (59.98 %). Emotional abuse was prevalent (57.0%), occurred in the home of the elderly person (81.3%) and the children of the elderly were the main perpetrators (25.3%). The motives were related to arguments in most cases (53.1%).

Conclusion

Women who were Caucasian, married, aged 60-65, unemployed/retired were the main victims, with the perpetrators most frequently their own children, also Caucasian, single and aged 31-40 years. Psychological violence was the most prevalent, primarily triggered by disagreements among those involved, and it occurred most frequently in the residence of the victim. Most of the attackers were not under the influence of alcohol/drugs.

Violence; Domestic Violence; Elderly; Elder Abuse


INTRODUÇÃO

O aumento da população idosa ocorreu de forma bastante acelerada em quase todos os países do mundo. Paralelo a esse crescimento, surgiram também os problemas ocultos, como maus-tratos, exploração e negligência contra esses indivíduos.11. Bond MC, Butler KH. Elder abuse and neglect definitions, epidemiology, and approaches to emergency department screening. Clin Geriatr Med 2013;29:257-73.

Para a Action on Elder Abuse, instituição especializada do Reino Unido, a violência é definida como: "realizar ato único ou repetido, ou deixar de tomar determinadas providências necessárias, provocando dano ou angústia a uma pessoa de idade avançada."22. Action on Elder Abuse ? [Internet]. Streatham: Action on Elder Abuse; 1995- . What is elder abuse?; 2015 [acesso em 15 set. 2015]; [aproximadamente 2 telas]. Disponível em: http://www.elderabuse.org.uk/
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Em geral, classificam-se as formas de violência sofrida de acordo com as seguintes categorias: Maus-tratos físicos - causar dor ou lesões, exercer coerção física ou restringir a liberdade de movimentos mediante a força ou o uso de drogas; maus-tratos emocionais - infligir sofrimento psíquico; abuso econômico ou material - explorar o idoso ou fazer usos de seus rendimentos ou recursos materiais de forma ilícita ou indevida; abuso sexual - manter contato sexual não consentido de qualquer tipo com uma pessoa idosa; negligência - não cumprir com a obrigação de atender o idoso nas suas necessidades básicas, como higiene, alimentação, afeto, cuidados com a saúde, entre outros.33. World Health Organization [Internet]. Geneve: WHO; 1995- . Action on Elder Abuse. What is elder abuse? 1995 [acesso em 5 set. 2015]; [aproximadamente 2 telas]. Disponível em: http://www.who.in/ violence_injury_prevention
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O fenômeno da violência contra idosos é amplamente discutido no cenário científico internacional e, embora seja reconhecido como um grave problema de saúde publica, as ações realizadas para o seu enfrentamento se caracterizam por iniciativas esporádicas, seguidas por períodos de apatia entre pesquisadores, governos nacionais, organizações internacionais e do público em geral.44. Podnieks E, Penhale B, Goergen T, Biggs S, Dongnee H. Elder mistreatment: an international narrative. J Elder Abuse Negl 2010;22(1-2):131-63.

Assim, a violência contra os idosos tem sido uma das últimas formas de violência familiar a receber a atenção da sociedade.55. Mahoney J. Types of abuse. Nurs Clin North América 2011;46(4):385-90. No entanto, trata-se de um grupo populacional altamente vulnerável aos maus-tratos, na medida em que necessitam de mais cuidados com a saúde e podem apresentar dependência física ou mental.66. Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Políticas de Saúde.Violência intrafamiliar: orientações para prática em serviço. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2002

Uma das grandes dificuldades em relação ao diagnóstico da violência familiar diz respeito ao segredo ou conluio familiar, pois este faz com que os idosos violentados não denunciem os seus agressores. Isso se deve, sobretudo, à vinculação à honra, à cumplicidade, à confiança estabelecidas no âmbito familiar, pelo medo da vítima em quebrar esses vínculos, além do autoritarismo e pressão psicológica exercidos pelo agressor.77. Faleiros VP. Violência contra a pessoa idosa: ocorrências, vítimas e agressores. Brasília, DF: Universa; 2007.

Os idosos vitimados comumente apresentam sentimentos como impotência, alienação, culpa, vergonha, medo, ansiedade, negação, desordem pós-traumática e experiências de depressão, além de terem aumentado o risco de morte.88. Minayo MCS, Coimbra CE Junior, organizadores. Antropologia, envelhecimento e saúde. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2002. Entre a liberdade e a dependência: reflexões sobre o fenômeno social do envelhecimento. p. 11-24.,99. Minayo MCS, Souza ER, organizadores. As múltiplas mensagens da violência contra idosos. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2003. Violência sobre o olhar da saúde: a infra-política da contemporaneidade brasileira. p. 223-42.

Alguns fatores podem agravar o risco de agressão, como a falta de recursos financeiros, experiência de eventos violentos anteriores entre os membros da família, consumo abusivo de drogas, problemas de saúde mental e o elevado nível de estresse.1010. Acierno R, Hernandez MA, Amstadter AB, Resnick HS, Steve K, Muzzy W, et al. Prevalence and correlates of emotional, physical, sexual, and financial abuse and potential neglect in the United States: the National Elder Mistreatment Study. Am J Public Health 2010;100(2):292-7.

A escassez de informação sobre esses casos é uma situação que merece destaque, principalmente, pelo fato de os idosos não denunciarem abusos e agressões sofridas, em virtude do constrangimento e medo de repressão por parte de seus cuidadores, que são comumente os próprios agressores.1111. Minayo MCS. Violência contra idosos: relevância para um velho problema. Cad Saúde Pública 2003;19(3):783-91.

O presente estudo objetivou verificar a ocorrência de maus-tratos contra idosos e suas características (local, tipo, motivo, envolvimento álcool/drogas, perfil e relação de parentesco entre vítimas e agressores), com base nos registros policiais de uma delegacia especializada, no período de 2008 a 2012.

MÉTODO

Trata-se de estudo transversal, descritivo e retrospectivo, de análise documental, conduzido na Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) de um município de médio porte, localizado na região noroeste paulista. Existe somente essa delegacia para o registro de ocorrências envolvendo idosos, mulheres e crianças. A coleta foi realizada com base nos registros policiais: Boletins de Ocorrência e Termos Circunstanciados. O Boletim de Ocorrência é o registro inicial do delito, apresentando os dados básicos do fato e das partes envolvidas. Em alguns casos, no entanto, se faz o Termo Circunstanciado, usado apenas para crimes considerados de menor potencial ofensivo.

Foram analisados todos os Boletins de Ocorrência e Termos Circunstanciados dos anos de 2008 a 2012 e incluídos na pesquisa todas as ocorrências praticadas contra idosos de ambos os gêneros. Esses registros policiais foram classificados de acordo com os critérios utilizados pela World Health Organization: maus-tratos físicos, maus-tratos emocionais, abuso financeiro ou material, abuso sexual e negligência, para facilitar a análise dos dados.33. World Health Organization [Internet]. Geneve: WHO; 1995- . Action on Elder Abuse. What is elder abuse? 1995 [acesso em 5 set. 2015]; [aproximadamente 2 telas]. Disponível em: http://www.who.in/ violence_injury_prevention
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Foram excluídos da amostra os crimes autoinfligidos, ou seja, aqueles praticados pelas próprias vítimas. Nesses documentos foram analisadas as seguintes variáveis:

Agressão: tipo de violência, local da ocorrência, motivo, relação vítima-agressor. Também foi verificada a presença de álcool e drogas durante o ato, de acordo com o relato da vítima.

Características sociodemográficas de agressores e vítimas: sexo, idade, raça/etnia, estado civil e ocupação.

Os dados coletados foram digitados em uma planilha eletrônica criada no programa Epi Info. Após o processamento dos dados, procedeu-se à análise estatística descritiva.

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Odontologia de Araçatuba da Universidade Estadual Paulista, processo nº 0829/10, seguindo os preceitos da Declaração de Helsinque e Código de Nuremberg, respeitando as normas de pesquisas envolvendo seres humanos (Resolução nº 196/96) do Conselho Nacional de Saúde.12 12. World Medical Association [Internet]. Ferney-Voltaire: WMA; 1964- . Declaration of Helsinki; 1964 [acesso em 18 dez. 2014]; [aproximadamente 2 telas]. Disponível em: http://www.wma.net
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A identidade das vítimas e agressores foi preservada por meio da ocultação dos nomes ou quaisquer outras informações que pudessem identificá-los nos documentos analisados. O estudo teve início após autorização da responsável pela Delegacia de Defesa da Mulher.

RESULTADOS

No período de 2008 a 2012, foram registrados na DDM do município estudado 10.884 Boletins de Ocorrência e 1.644 Termos Circunstanciados, dos quais 579 correspondiam às ocorrências contra idosos. Foram excluídos sete casos de tentativa de suicídio. Portanto, o universo pesquisado foi composto por 572 registros policiais.

Na tabela 1, destacam-se as características sociodemográficas de vítimas e agressores no que se refere ao sexo, raça/etnia, idade, estado civil e ocupação.

Tabela 1.
Distribuição absoluta e percentual das características sociodemográficas de vítimas e agressores de maus-tratos contra idosos registrados na delegacia no período de 2008 a 2012. Araçatuba, SP, 2014.

Na tabela 2 observam-se os dados relacionados aos registros policiais como o tipo de violência, o local onde ocorreram as ocorrências, o motivo que ocasionou os maus-tratos e o uso de álcool e drogas no momento da agressão.

Tabela 2.
Distribuição absoluta e percentual das ocorrências policiais dos casos de maus-tratos contra idosos registrados na delegacia no período de 2008 a 2012. Araçatuba, SP, 2014.

A tabela 3 demonstra a relação de parentesco entre agressores e vítimas dividida em três grupos: grupo A - relação conjugal; grupo B - relação familiar; e grupo C - outros agressores que não tenham relação de proximidade com a vítima.

Tabela 3.
Distribuição absoluta e percentual da relação de parentesco entre agressores e vítimas de maus-tratos contra idosos registrados na delegacia no período de 2008 a 2012. Araçatuba, SP, 2014.

DISCUSSÃO

No presente estudo, a taxa de casos de maus-tratos contra idosos registrados na unidade policial estudada foi de 4,62%, e pode ser considerada baixa quando comparada à totalidade de ocorrências registradas nessa unidade policial. Esse fato pode ser explicado pela singularidade da delegacia em questão. Muitas vezes os idosos do sexo masculino podem sentir-se constrangidos em registrar queixas em uma unidade direcionada para mulheres. Isso pode explicar também a alta incidência de vítimas do sexo feminino na pesquisa, assim como em outros estudos.1313. Clancy M, Mcdaid B, O'Neill D, O'Brien JG. National profiling of elder abuse referrals. Age Ageing 2011;40(3):346-52.

14. Abath MB, Leal MCC, Melo DA Filho. Fatores associados à violência doméstica contra a pessoa idosa. Rev Bras Geriatr Gerontol 2012;15(2):305-14.
-1515. Oliveira AAV, Trigueiro DRSG, Fernandes MGM, Silva AO. Maus-tratos a idosos: revisão integrativa da literatura. Rev Bras Enferm 2013;66(1):128-33. Historicamente, a mulher apresentava um papel de dependência ao homem, mas recentemente vem conquistando sua independência, apesar de ainda sofrer as consequências de uma sociedade machista e violenta.1616. Salivkar S. Domestic violence: a problem. Indian J Appl Res [Internet] 2013 [acesso em 18 dez 2014];3(5):596-97. Disponível em: http://www.theglobaljournals.com/ijar/articles.php?val=MTU3MA==#sthash.38FCFu1d.dpuf
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Deve-se considerar, portanto, a violência de gênero, pois a mulher continua sendo a principal vítima de violência doméstica.66. Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Políticas de Saúde.Violência intrafamiliar: orientações para prática em serviço. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2002

A faixa etária mais prevalente da vítima foi dos 60 aos 65 anos, indicando que o grau de independência do idoso está diretamente relacionado com a idade, facilitando a busca por ajuda.

A maioria das vítimas era casada e do lar, achados que se somam a outros estudos na literatura1717. Moraes CL, Apratto PC Junior, Reichenheim ME. Rompendo o silêncio e suas barreiras: um inquérito domiciliar sobre a violência doméstica contra idosos em área de abrangência do Programa Médico de Família de Niterói, Rio de Janeiro, Brasil. Cad Saúde Pública 2008;24(10):2289-300.

18. Nogueira CF, Freitas MC, Almeida PC. Violência contra idosos no município de Fortaleza, CE: uma análise documental. Rev Bras Geriatr Gerontol 2011;14(3):543-54.
-1919. Dossi AP, Garbin CAS, Garbin AJI, Saliba O. Perfil epidemiológico da violência física intrafamiliar: agressões denunciadas em um município do Estado de São Paulo, Brasil, entre 2001 e 2005. Cad Saúde Pública 2008;24(8):1939-52. e sugerem certa dependência, o que pode aumentar o risco de serem vitimizadas.

Em relação à raça dos agressores e vítimas, ambos mostraram maior proporção de brancos, população predominante no município.2020. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [Internet]. Rio de Janeiro: IBGE; 1995 - . Censo Demográfico de 2000; 2000 [acesso em 25 out. 2014]; [aproximadamente 2 telas]. Disponível em: https://www.seade.gov.br/produtos/idr/download/populacao.pdf.
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Porém, a identificação da cor da pele ainda é questão complexa e controversa, não havendo consenso quanto a essa classificação.2121. Cecilio LPP, Garbin CAS, Rovida TAS, Queiróz APDG, Garbin AJI. Interpersonal violence: descriptive study of not fatal cases assisted in an emergency reference unity to seven municipalities of the state of São Paulo,Brazil, from 2008 to 2010. Epidemiol Serv Saúde 2012;21(2):293-304.

Quanto ao perfil do agressor, foi possível observar que a maioria pertencia ao sexo masculino e mantinha relação de proximidade com a vítima. Essa situação pode ser explicada pela fragilidade das relações familiares, desgastadas por problemas rotineiros, pois o principal motivo que levou à agressão foram as discussões e os desentendimentos. A condição de habitar o mesmo lar, muitas vezes imposta pela situação econômica e estrutural da família, vem a ser um dos principais fatores de risco para que a violência ocorra.1313. Clancy M, Mcdaid B, O'Neill D, O'Brien JG. National profiling of elder abuse referrals. Age Ageing 2011;40(3):346-52.

14. Abath MB, Leal MCC, Melo DA Filho. Fatores associados à violência doméstica contra a pessoa idosa. Rev Bras Geriatr Gerontol 2012;15(2):305-14.
-1515. Oliveira AAV, Trigueiro DRSG, Fernandes MGM, Silva AO. Maus-tratos a idosos: revisão integrativa da literatura. Rev Bras Enferm 2013;66(1):128-33. Por vezes, o abuso é uma continuação dos padrões de longa data de abuso físico ou emocional dentro da família.11. Bond MC, Butler KH. Elder abuse and neglect definitions, epidemiology, and approaches to emergency department screening. Clin Geriatr Med 2013;29:257-73.,1010. Acierno R, Hernandez MA, Amstadter AB, Resnick HS, Steve K, Muzzy W, et al. Prevalence and correlates of emotional, physical, sexual, and financial abuse and potential neglect in the United States: the National Elder Mistreatment Study. Am J Public Health 2010;100(2):292-7.,2222. Yaffe M, Tazkarji B. Understanding elder abuse in family practice. Can Fam Physician 2012;58(12):1336-40. Diante desse contexto, é possível entender por que a maior parte das ocorrências aconteceu dentro dos lares.

O uso de álcool ou drogas pelos membros da família também pode aumentar o risco de agressões.11. Bond MC, Butler KH. Elder abuse and neglect definitions, epidemiology, and approaches to emergency department screening. Clin Geriatr Med 2013;29:257-73.,1414. Abath MB, Leal MCC, Melo DA Filho. Fatores associados à violência doméstica contra a pessoa idosa. Rev Bras Geriatr Gerontol 2012;15(2):305-14. No entanto, os achados deste estudo demonstraram baixo índice de consumo no momento das ocorrências, suscitando possível perda de informação no relato das vítimas, uma vez que existe a dependência dos dados registrados com a veracidade do depoimento.

Um dos principais fatores que envolvem a violência contra os idosos é a subnotificação. Os idosos podem não relatar o abuso devido a fatores como: medo de retaliação, medo de ser institucionalizado em lares para idosos, medo que seu cuidador seja prejudicado legalmente, culpa, constrangimento, baixa autoestima e sensação de que o abuso foi merecido.11. Bond MC, Butler KH. Elder abuse and neglect definitions, epidemiology, and approaches to emergency department screening. Clin Geriatr Med 2013;29:257-73.,2323. Hernandez-Tejada MA, Amstadter A, Muzzy W, Acierno R. The national elder mistreatment study: race and ethnicity findings. J Elder Abuse Negl 2013;25(4):281-93.

Entre as ocorrências, a mais prevalente foi a violência psicológica, que inclui agressão verbal, ameaças, isolamento social, entre outros atos capazes de infligir sofrimento psíquico ao idoso. A questão da dependência do idoso em busca de ajuda e assistência na realização de atividades cotidianas pode provocar esse tipo de abuso, quando associado ao estresse e à falta de preparo do cuidador.1818. Nogueira CF, Freitas MC, Almeida PC. Violência contra idosos no município de Fortaleza, CE: uma análise documental. Rev Bras Geriatr Gerontol 2011;14(3):543-54.,2424. Melo VL, Cunha JOC, Falbo Neto GH. Maus-tratos contra idosos no município de Camaragibe, Pernambuco. Rev Bras Saúde Mater Infant 2006;6(1):43-8.

Outro fato que chama a atenção nos achados deste estudo se refere à falta de informação em relação às características do agressor (tabela 1). Essas informações são de suma importância para que se possa delinear o contexto que envolve esse tipo de violência. Propõe-se, assim, como recomendação para trabalhos futuros, o desenvolvimento de um protocolo que contemple dados para subsidiar uma adequada documentação da ocorrência de maus-tratos contra idosos, a fim de auxiliar os profissionais que registram as ocorrências e demais pesquisadores das áreas da Geriatria e Gerontologia.

O Brasil está bem amparado legalmente no que diz respeito à defesa do direito dos idosos, mas muito ainda precisa ser feito. Sugere-se, assim, que novos estudos devam ser incentivados para que se possa conhecer melhor a realidade da comunidade e desta forma criar ações preventivas no combate a esse grande problema de saúde pública.

Alguns fatores limitantes do presente estudo devem ser considerados, como a ausência de definições comuns e conceituação que possam servir de base para coleta de dados padronizados, bem como a falta de informações existentes nos registros, o que dificulta a visualização do problema social dos maus-tratos aos idosos. Além disso, devem-se considerar as diversidades sociais e culturais encontradas em diferentes regiões do país, tornando-se um desafio dimensionar e caracterizar esse tipo de violência. Embora o estudo tenha sido realizado em apenas um município, a relevância e justificativa do trabalho contribuem para a visualização do problema, devendo, portanto, ser expandido para outros municípios.

CONCLUSÃO

Conclui-se que, no município pesquisado, as mulheres da raça branca, casadas, com idade entre 60 e 65 anos, desempregadas/aposentadas são as principais vítimas, e os agressores são os próprios filhos, também da raça branca, solteiros, com idade entre 31 e 40 anos. A violência psicológica foi a mais prevalente, desencadeada principalmente por desentendimento entre os envolvidos, ocorrendo na própria residência da vítima. A maioria dos agressores não estava sob efeito de álcool/drogas.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 2016

Histórico

  • Recebido
    20 Out 2014
  • Revisado
    23 Jun 2015
  • Aceito
    30 Jul 2015
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