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Pegada hídrica dos suínos abatidos na região do Corede Serra, RS, Brasil

Water Footprint of pigs slaughtered in the northeast region of Rio Grande do Sul State, Brazil

Resumo

Este trabalho teve por objetivo calcular a pegada hídrica dos suínos abatidos nos municípios que compõem o Conselho Regional de Desenvolvimento da Serra (Corede Serra), localizado na região nordeste do Estado do Rio Grande do Sul, no ano de 2014. A água consumida na produção dos grãos (milho e soja), destinados à alimentação dos animais e a água destinada à dessedentação animal e limpeza das áreas de criação, além da água incorporada aos suínos em crescimento e terminação, foram utilizadas no cálculo da pegada hídrica. A pegada hídrica total dos suínos abatidos foi de 0,19825 km3 ano-1, na qual o consumo de água para o cultivo de milho e soja foi o mais representativo, 99,6%. O município de Nova Prata apresentou a maior pegada hídrica total (0,02343 km3 ano-1), seguida pelos municípios de Paraí (0,02187 km3 ano-1) e por Serafina Corrêa (0,01658 km3ano-1). Os municípios de São Marcos (0,000006 km3ano-1), Bento Gonçalves (0,00002 km3 ano-1) e Boa Vista do Sul (0,00004 km3 ano-1) apresentaram as menores pegadas, resultado da baixa produtividade de milho associada ao rebanho suíno abatido pouco expressivo. A partir desta avaliação indica-se que a gestão dos recursos hídricos associada à cadeia suinícola deve contemplar a produção de grãos, destinados à atividade, além da demanda hídrica destinada ao confinamento.

Palavras-chave:
gestão dos recursos hídricos; indicador de consumo de água; suinocultura.

Abstract

This study estimated the water footprint of pigs slaughtered in the municipalities that participate in the Regional Council for the Development of Serra (Corede Serra, in Portuguese), located in the northeast region of Rio Grande do Sul State, in 2014. In order to determine the water footprint, we estimated the water consumed in the production of grains (corn and soybeans) used for animal feed, the water used for livestock watering, the water used for cleaning creation areas and the water consumed by animals during the growing and finishing phases. The total water footprint of slaughtered pigs was 0.19825 km3, the largest component of which was water used for the cultivation of grains (99.6%). The municipality of Nova Prata had the largest water footprint of Corede Serra (0.02343 km3 year1), followed by the municipalities of Paraí (0.02187 km3 year-1) and Serafina Corrêa (0.01658 km3 year-1). The municipalities of São Marcos (0.000006 km3 year-1), Bento Gonçalves (0,00002 km3 year-1) and Boa Vista do Sul (0.0004 km3 year-1) had the lowest water footprints, due to low corn productivity associated with the low number of hogs slaughtered. From this assessment, it was found that the management of water resources associated with pig chain production should include water used in the production of feed grain as well as the water used directly in animal husbandry.

Keywords:
swine; water consumption indicator; water resource management.

1. INTRODUÇÃO

De acordo com a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), o Brasil é o quarto maior produtor e o quarto maior exportador de carne suína, tendo uma produção de cerca de 3,344 milhões de toneladas no ano de 2014, com destaque para a região sul do Brasil, responsável por 69,03% da produção nacional (ABPA, 2015ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PROTEÍNA ANIMAL - ABPA. Relatório anual de atividades 2014. São Paulo, 2015. Disponível em: http://abpa-br.com.br/files/RelatorioAnual_UBABEF_2015_DIGITAL.pdf. Acesso em: 23 out. 2015.
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).

A atividade suinícola, assim como as demais atividades pecuárias, é diretamente dependente de recursos naturais. Nesta evidencia-se o elevado consumo de água utilizada para o crescimento das commodities destinadas à alimentação dos suínos, dessedentação, higienização das áreas de criação, abate e processamento da carne. A falta de conhecimento acerca do impacto sobre os recursos hídricos na atividade pecuária pode comprometer o crescimento do setor, o que evidencia a necessidade de utilizar metodologias para avaliar o desempenho das atividades agropecuárias de forma a auxiliar os consumidores a optarem por produtos mais sustentáveis.

A avaliação da demanda hídrica é uma forma de geração deste tipo de informação que auxilia na tomada de decisão por produtos de menor impacto no uso da água e da terra (Jeswani e Azapagic, 2011JESWANI, H. K.; AZAPAGIC, A. Water footprint: methodologies and a case study for assessing the impacts of water use. Journal of Cleaner Production, v. 19, p. 1288-1299, 2011. http://dx.doi.org/10.1016/j.jclepro.2011.04.003
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; Pfister et al., 2011PFISTER, S.; BAYER, P.; KOEHLER, A.; HELLWEG, S. Environmental impacts of water use in global crop production: Hotspots and trade-offs with land use. Environmental Science & Technology, v. 45, p. 5761-5768, 2011. http://dx.doi.org/10.1021/es1041755
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). De acordo com Hoekstra et al. (2011HOEKSTRA, A. Y.; CHAPAGAIN, A. K.; ALDAYA, M. M.; MEKONNEN, M. M. Manual de avaliação da pegada hídrica: estabelecendo o padrão global. São Paulo: Instituto de Conservação Ambiental, 2011. ), a avaliação da pegada hídrica é uma ferramenta analítica que pode auxiliar na compreensão sobre como atividades e produtos interagem com a escassez e com a poluição da água e seus impactos relacionados, bem como o que pode ser feito para assegurar que as atividades e produtos contribuam para o uso sustentável dos recursos hídricos.

Hoekstra et al. (2011HOEKSTRA, A. Y.; CHAPAGAIN, A. K.; ALDAYA, M. M.; MEKONNEN, M. M. Manual de avaliação da pegada hídrica: estabelecendo o padrão global. São Paulo: Instituto de Conservação Ambiental, 2011. ) classificam a água em três tipos:

Água Verde: água precipitada sobre a terra que não escoa ou recarrega os aquíferos, mas é armazenada no solo ou temporariamente sobre o solo ou a vegetação;

Água Azul: água superficial e subterrânea, isto é, a água em lagos, rios e aquíferos; e

Água Cinza: volume de água necessário para diluir os poluentes de modo que a qualidade da água em seu estado natural seja mantida nos padrões legais.

De acordo com Silva et al. (2013SILVA, V. P. R. et al. Uma medida de sustentabilidade ambiental: pegada hídrica. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental,v. 17, n. 1, p. 100-105, 2013. http://dx.doi.org/10.1590/S1415-43662013000100014
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), o volume de água doce utilizada para produzir o produto é somado ao longo das várias fases da cadeia de produção, sendo essa a base para a compreensão do conceito de pegada hídrica. Segundo Palhares (2014PALHARES, J. C. P. Pegada hídrica de suínos e o impacto de estratégias nutricionais. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental, v. 18, n. 5, p. 533-538, 2014. http://dx.doi.org/10.1590/S1415-43662014000500010
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), o cálculo da pegada hídrica e sua relação com o território geram informações com relevantes impactos sociais, ambientais e econômicos, necessários para implantação dos instrumentos de gestão contidos na Política Nacional de Recursos Hídricos e proporcionam impactos científicos de grande importância, fortalecendo o tema produção animal e recursos hídricos e possibilitando o desenvolvimento de pesquisas nas áreas de eficiência hídrica, tecnologias de tratamento de resíduos, mitigação dos impactos ambientais e zootecnia de precisão.

Neste contexto, o objetivo deste trabalho foi calcular as pegadas hídricas verde a azul dos suínos abatidos no ano de 2014 nos municípios que compõem o Conselho Regional de Desenvolvimento da Serra (Corede Serra).

2. MATERIAIS E MÉTODOS

Neste trabalho considerou-se o número de suínos abatidos no ano de 2014 na região do Corede Serra, conforme informações disponibilizadas pela Secretaria Estadual de Agricultura, Pecuária e Abastecimento do Estado do Rio Grande do Sul (SEAPA, 2015bRIO GRANDE DO SUL. Secretaria Estadual de Agricultura, Pecuária e Abastecimento - SEAPA. Informações sobre os suínos abatidos no ano de 2014 nos municípios que compõem o Corede Serra. Caxias do Sul, 2015b.), para o cálculo da pegada hídrica.

A Figura 1 apresenta a distribuição dos municípios que compõem o Corede Serra e a localização da região no Estado do Rio Grande do Sul. A região do Corede Serra é composta por trinta e um municípios, localizados na região nordeste do Estado do Rio Grande do Sul (Rio Grande do Sul, 2015aRIO GRANDE DO SUL. Secretaria do Planejamento, Gestão e Participação Cidadã - SEPLAG. Informações do Corede Serra. 2015a. Disponível em: http://www.sri.rs.gov.br/coredes.asp?cod_corede=16. Acesso em: 14 maio 2015.
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). A presença de propriedades rurais de pequeno porte onde predominam a agricultura familiar, participação significativa da agropecuária na economia da região, além da localização da quase totalidade dos municípios sobre a mesma bacia hidrográfica, conforme apresentado na Figura 2, são características que tornam a região do Corede Serra uma unidade de referência ideal para a realização deste estudo.

Figura 1
Mapa com a localização e identificação dos municípios que compõem o Conselho de Desenvolvimento da Serra (Corede Serra).

A Figura 2 apresenta a localização do Corede Serra em relação à Bacia Hidrográfica Taquari-Antas e à Bacia Hidrográfica do Caí.

Neste estudo, utilizou-se a metodologia proposta por Chapagain e Hoekstra (2003CHAPAGAIN, A. K.; HOEKSTRA, A. Y. Virtual water flows between nations in relation to trade in livestock and livestock products. Netherlands: Unesco-IHE, 2003. 45p.) para o cálculo da pegada hídrica, considerando-se: a água consumida (evapotranspirada) na produção de grãos (milho e soja), a água destinada à dessedentação e a água utilizada na limpeza das instalações. Ressalta-se que, para a realização dos cálculos, foram consideradas as fases de crescimento e terminação.

Figura 2
Mapa com a localização do Conselho de Desenvolvimento da Serra em relação às Bacias Hidrográficas Taquari-Antas e Caí.

Considerou-se 70 dias para a fase de crescimento e 93 dias para a fase de terminação, conforme proposto por Carra (2012CARRA, S. H. Z. Projeto de melhorias em uma propriedade suinícola de pequeno porte visando um modelo ideal. 2012. Trabalho de conclusão de curso (Graduação em Engenharia Ambiental) - Universidade de Caxias do Sul, Caxias do Sul, 2012.). A Tabela 1 apresenta o número de suínos abatidos no ano de 2014 nos municípios do Corede Serra.

Tabela 1
Total de suínos abatidos no ano de 2014 nos municípios do Corede Serra.

A Tabela 2 apresenta a constituição da dieta dos suínos em crescimento e terminação, utilizada como referência para o cálculo da quantidade de milho e soja consumidos pelos animais, conforme proposto por Palhares (2011PALHARES, J. C. P. Pegada hídrica de suínos abatidos nos estados da região centro-sul do Brasil. Revista Acta Scientiarum Animal Sciences, v. 33, n. 3, p. 309-314, 2011. http://dx.doi.org/10.4025/actascianimsci.v33i3.9924
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).

Tabela 2
Consumo de ração, milho e farelo de soja durante as fases de crescimento e terminação.

Para o ciclo da cultura de milho considerou-se uma evapotranspiração de 450 mm (0,45 m3m-2), o que resulta na necessidade de 4.500 m3ha-1 (Palhares, 2011PALHARES, J. C. P. Pegada hídrica de suínos abatidos nos estados da região centro-sul do Brasil. Revista Acta Scientiarum Animal Sciences, v. 33, n. 3, p. 309-314, 2011. http://dx.doi.org/10.4025/actascianimsci.v33i3.9924
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) e para o ciclo da cultura de soja considerou-se uma evapotranspiração de 600 mm (0,60 m3m-2), o que resulta na necessidade de 6.000 m3ha-1 (Couto e Sans, 2002COUTO, L.; SANS, L. M. A. Requerimento de água das culturas. Sete Lagoas: Embrapa Milho e Sorgo, 2002. (Circular Técnico, n. 20).).

A área total de milho e soja colhidos em cada município, bem como a quantidade produzida destes no ano de 2013 foram extraídas do IBGE (2013INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA - IBGE. IBGE Cidades: produção agrícola municipal: lavoura temporária: 2013. 2013. Disponível em: http://www.cidades.ibge.gov.br/xtras/uf.php?lang=&coduf=43&search=rio-grande-do-sul. Acesso em: 24 nov. 2014.
http://www.cidades.ibge.gov.br/xtras/uf....
), visto que os suínos abatidos no ano de 2014 foram alimentados com as culturas produzidas no ano de 2013. A Tabela 3 apresenta as informações do IBGE (2013INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA - IBGE. IBGE Cidades: produção agrícola municipal: lavoura temporária: 2013. 2013. Disponível em: http://www.cidades.ibge.gov.br/xtras/uf.php?lang=&coduf=43&search=rio-grande-do-sul. Acesso em: 24 nov. 2014.
http://www.cidades.ibge.gov.br/xtras/uf....
).

De acordo com Palhares (2011PALHARES, J. C. P. Pegada hídrica de suínos abatidos nos estados da região centro-sul do Brasil. Revista Acta Scientiarum Animal Sciences, v. 33, n. 3, p. 309-314, 2011. http://dx.doi.org/10.4025/actascianimsci.v33i3.9924
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), os três principais produtos do denominado complexo soja são: grão, farelo e óleo. Desses, o farelo é a forma que os suínos consomem a soja. Portanto, nem toda a água consumida para a produção dos produtos do complexo soja pode ser contabilizada no cálculo da pegada hídrica, apenas a parcela de água consumida no farelo.

Utilizando-se os índices constantes nos Fatores de Conversão das Commodities Agropecuárias da FAO (FAO, 2006FOOD AND AGRICULTURE ORGANIZATION OF THE UNITED NATIONS - FAO. Livestock Report 2006. Rome, 2006. Disponível em: ftp://ftp.fao.org/docrep/fao/009/a0255e/a0255e.pdf. Acesso em: 10 dez. 2014.
ftp://ftp.fao.org/docrep/fao/009/a0255e/...
), considera-se que no caso brasileiro, de cada grão produzido, 77% são farelo e 23% são óleo. A partir das informações apresentadas na Tabela 3 foi calculado o consumo de água (m3t-1) para as culturas de milho e soja a partir da Equação 1.

em que:

PHverde = pegada hídrica verde (m3ano-1);

Acolhida = área colhida (ha);

Et = evapotranspiração da cultura (mm ha-1);

Qprod = quantidade produzida (t);

AB = animais abatidos no ano de 2014 nos municípios do Corede Serra e;

AL = quantidade de alimento consumido por animal (informações apresentadas na Tabela 2).

A pegada hídrica verde total foi obtida através da Equação 2, na qual são somados os resultados das pegadas hídricas para o cultivo de milho e farelo de soja.

em que:

PHverde total = pegada hídrica verde total (m3ano-1);

PHverde/milho = pegada hídrica verde do milho (m3ano-1);

PHverde/farelo de soja = pegada hídrica verde do farelo de soja (m3ano-1).

Neste estudo considerou-se que todo o milho e o farelo de soja, destinados à alimentação dos suínos, sejam provenientes das áreas cultivadas nos municípios do Corede Serra, não havendo a necessidade de importação de alimento de outros municípios. Para o cálculo da pegada hídrica azul, referente ao processo de confinamento dos suínos, foram considerados apenas os usos diretos de água nas propriedades, sendo elas: dessedentação animal, lavagem e higienização das instalações de criação e quantidade de água incorporada ao animal (produto).

Tabela 3
Quantidade de milho e soja produzidos nos municípios do Corede Serra.

Considerou-se um consumo de água, para fins de lavagem das instalações de criação de 0,004 m3animal-1, conforme proposto por Oliveira e Bellaver (2009OLIVEIRA, P. A.; BELLAVER, C. Balanço da água nas cadeias de aves e suínos. Agricultura Industrial, v. 10, p. 39-44, 2009.), sendo que a mesma ocorre somente na desocupação da instalação, ou seja, ao final da terminação. Portanto, o volume de água para fins de lavagem das áreas de criação foi considerado no cálculo apenas para os suínos em terminação. Para a dessedentação animal considerou-se a metodologia citada por Perdomo et al. (2001PERDOMO, C. C. et al. Produção de suínos e meio ambiente. In: SEMINÁRIO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA SUINOCULTURA, 9., 2001, Gramado. Anais... Concórdia: EMPBRAPA Suínos e Aves, 2001. p. 8-24.), onde os suínos em crescimento consomem em torno de 0,003 m3dia-1 e os suínos em terminação consomem em torno de 0,007 m3dia-1.

No que tange à quantidade de água incorporada ao animal (produto), utilizada apenas no cálculo para os suínos em fase de terminação, considerou-se uma média de 66% de água por quilo de carne, existente no animal vivo, conforme proposto por NEPA (2011NÚCLEO DE ESTUDOS E PESQUISAS EM ALIMENTAÇÃO - NEPA. Tabela brasileira de composição de alimentos versão 2011. 2011. Disponível em: http://www.unicamp.br/nepa/taco/. Acesso em: 16 abr. 2015.
http://www.unicamp.br/nepa/taco/...
), adição de 4% de água (contida no sangue, glândulas, vísceras e conteúdo estomacal), rendimento de carcaça fria de 74% (Palhares, 2011PALHARES, J. C. P. Pegada hídrica de suínos abatidos nos estados da região centro-sul do Brasil. Revista Acta Scientiarum Animal Sciences, v. 33, n. 3, p. 309-314, 2011. http://dx.doi.org/10.4025/actascianimsci.v33i3.9924
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) e peso ao abate de 110,99 kg. O cálculo da pegada hídrica azul é apresentado na Equação 3.

em que:

PHazul = pegada hídrica azul (m3ano-1);

CD = consumo de água para dessedentação (m3animal-1);

TP = tempo de permanência na fase de criação (70 dias para a fase de crescimento e 93 dias para a fase de terminação);

AB = quantidade de animais abatidos no ano de 2014 nos municípios do Corede Serra;

Cl = consumo de água de limpeza, 0,04m3animal-1 (Oliveira e Bellaver, 2009OLIVEIRA, P. A.; BELLAVER, C. Balanço da água nas cadeias de aves e suínos. Agricultura Industrial, v. 10, p. 39-44, 2009.) e;

Ap = quantidade de água no produto, considerando-se uma média de 66% de água por quilo de carne (NEPA, 2011NÚCLEO DE ESTUDOS E PESQUISAS EM ALIMENTAÇÃO - NEPA. Tabela brasileira de composição de alimentos versão 2011. 2011. Disponível em: http://www.unicamp.br/nepa/taco/. Acesso em: 16 abr. 2015.
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), fator de adição de 4% de água (água contida no sangue, glândulas, vísceras e conteúdo estomacal, entre outros), rendimento de carcaça fria de 74% e peso ao abate de 110,99 kg.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Conforme observado na Tabela 1, foram abatidos 739.858 suínos no Corede Serra no ano de 2014, no qual o município de Paraí apresentou a maior quantidade, com 78.111 animais, seguido por Nova Prata com 73.100 animais. Os municípios que apresentaram os menores números de suínos abatidos foram: São Marcos, com 37 animais e Bento Gonçalves, com 83 animais. O município de Monte Belo do Sul não apresentou nenhum suíno abatido no ano de 2014. A Tabela 4 apresenta a pegada hídrica verde para os suínos abatidos no ano de 2014, no Corede Serra.

De acordo com a Tabela 4, a pegada hídrica verde para o cultivo de milho corresponde a 50,34% da pegada hídrica verde total, onde o mesmo resultado para o cultivo de soja corresponde a 49,66%. O consumo de água para a produção de milho, considerando os suínos em crescimento resultou em 0,02740 km3ano-1 ao passo que na terminação resultou em de 0,07204 km3ano-1, corroborando em um volume de 0,09944 km3ano-1. Para a cultura de soja, o consumo de água, considerando os suínos em crescimento, resultou em 0,03066 km3ano-1 e considerando a terminação resultou em 0,06743 km3ano-1, corroborando em um volume de pegada hídrica verde de 0,09810 km3ano-1. Desta forma, a pegada hídrica verde total resultou em 0,19754 km3ano-1, conforme apresentado na Tabela 4.

Tabela 4
Pegada hídrica verde para os suínos abatidos no ano de 2014 no Corede Serra.

Conforme observado a soja apresenta evapotranspiração 25% superior se comparada a cultura de milho. Todavia, a cultura de soja foi produzida em 2013 em apenas 16 municípios, o que equivale a 51,61% dos municípios que integram o Corede Serra. Ressalta-se que a cultura de soja não é predominante na Serra Gaúcha, em virtude da falta de tradição e de conhecimento sobre o manejo da cultura, o que pode refletir no resultado da pegada hídrica.

A Tabela 5 apresenta a pegada hídrica azul para os suínos abatidos, ano de 2014, na região do Corede Serra.

Tabela 5
Pegada hídrica azul para o processo de confinamento dos suínos.

O consumo de água para a dessedentação dos suínos na fase de crescimento resultou em 0,0001554 km3ano-1 ao passo que na fase de terminação resultou em 0,000481 km3ano-1, corroborando em um volume de 0,000637 km3ano-1. Ressalta-se que o volume de água para lavagem/higienização e embutida no produto foram calculadas apenas para os suínos em terminação. Conforme observado na Tabela 5, a pegada hídrica azul total é de 0,0007097 km3ano-1.

A Tabela 6 apresenta o resultado da pegada hídrica para os suínos abatidos em 2014, no Corede Serra.

Tabela 6
Pegada hídrica dos suínos abatidos no ano de 2014 no Corede Serra.

Conforme observado na Tabela 6, a pegada hídrica total, considerando a soma das pegadas hídricas verde e azul resultou em 0,19825 km3ano-1. A Tabela 7 apresenta a representatividade percentual das pegadas hídricas verde e azul na pegada hídrica total dos processos analisados.

Tabela 7
Porcentagem que das pegadas hídricas verde e azul na pegada hídrica total.

Conforme observado na Tabela 7, a pegada hídrica verde é a mais significativa, correspondendo a 99,6% do total, enquanto a pegada hídrica azul correspondeu por apenas 0,4%. Observa-se que o maior consumo de água está na produção das culturas de milho e soja, que são base para a alimentação dos animais. O resultado obtido corrobora com a afirmação dos autores Schlink et al. (2010SCHLINK, A. C.; NGUYEN, M. L.; VILJOEN, G. J. Water requirements for livestock production: a global perspective. Revue Scientifique et Technique (International Office of Epizootics), v. 29, n. 3, p. 603-619, 2010.) e Mekonnen e Hoekstra (2012MEKONNEN, M. M.; HOEKSTRA, A. Y. A global assessment of the water footprint of farm animal products. Ecosystems, v. 15, n. 3, p. 401-415, 2012. http://dx.doi.org/10.1007/s10021-011-9517-8
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), que a alimentação é o principal contribuinte para a pegada hídrica na atividade pecuária.

Quanto aos municípios observa-se que Nova Prata apresentou a maior pegada hídrica total (0,02343 km3ano-1), seguida por Paraí (0,02187 km3ano-1) e por Serafina Corrêa (0,01658 km3ano-1). Juntos, esses municípios foram responsáveis por um total de 28,12% dos suínos abatidos no ano de 2014 no Corede Serra. Os municípios de São Marcos (0,000006 km3ano-1), Bento Gonçalves (0,00002 km3ano-1) e Boa Vista do Sul (0,00004 km3) apresentaram as menores pegadas. Os três municípios representam 0,047% do total de abates do Corede Serra no ano de 2014. Apesar de estes municípios apresentarem uma área colhida de milho (ha) próxima ou abaixo da média, se comparado aos demais municípios e uma produtividade (t ha-1) acima da média, se comparado aos demais municípios do Corede Serra, associado ao fato de não serem produtores de soja, a pegada hídrica total não resultou com um alto valor, em virtude do inexpressivo número de animais abatidos.

De acordo com um trabalho publicado por Palhares (2011PALHARES, J. C. P. Pegada hídrica de suínos abatidos nos estados da região centro-sul do Brasil. Revista Acta Scientiarum Animal Sciences, v. 33, n. 3, p. 309-314, 2011. http://dx.doi.org/10.4025/actascianimsci.v33i3.9924
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), onde foi calculada a pegada hídrica dos suínos abatidos no ano de 2008 na região Centro-Sul do Brasil, o Estado do Rio Grande do Sul, com 6.863.059 suínos abatidos, apresentou uma pegada hídrica verde de 2,6967 km3ano-1. No mesmo trabalho obteve-se uma representatividade da cultura de milho de 58,30% e da cultura de soja de 41,70% sobre o resultado da pegada hídrica verde total.

Na avaliação sobre o Corede Serra, realizada neste trabalho, a pegada hídrica verde da cultura de soja correspondeu a 49,66% sobre o valor da pegada hídrica verde total, ao passo que a pegada hídrica verde da cultura de milho correspondeu a 50,34%.

4. CONCLUSÃO

Sabendo que a atividade pecuária e, em especial, a atividade suinícola apresenta significativo valor econômico na região, com destaque para os municípios que apresentaram as maiores pegadas hídricas totais, este indicador expressa a necessidade de realizar a gestão dos recursos hídricos de forma prioritária evitando, assim, o risco de não haver oferta de água suficiente para manter a atividade suinícola.

Para reduzir a pegada hídrica verde é necessário aumentar a produtividade de milho e soja, visto que baixas produtividades elevam o seu valor, em virtude da menor eficiência hídrica. Com vistas a promover o aumento da produtividade das culturas e, respectivamente, a redução da pegada hídrica, é necessário investir em tecnologias associadas a políticas públicas que incentivem o aumento da produtividade. Todavia, cabe ressaltar a necessidade de se promover o aumento da produtividade sem causar impactos ao meio ambiente pelo uso excessivo de fertilizantes e outros insumos.

Apesar da pegada hídrica azul ter apresentado um valor bem inferior (0,4%) comparado com a verde, esse resultado não diminui sua importância para a gestão dos recursos hídricos. Isso porque a criação de suínos é uma atividade realizada, na sua quase totalidade, de forma intensiva, estando concentrada em determinadas regiões, o que torna a água destinada à dessedentação e à limpeza das áreas de criação, uma ameaça à segurança hídrica das regiões de produção.

Em virtude da dificuldade de se obter informações fidedignas para a realização dos cálculos, tendo em vista diferenças das condições ambientais entre os municípios, variação entre os sistemas produtivos e a ausência de dados consistentes, ressalta-se que os resultados deste trabalho expressam tendências e não valores absolutos.

5. AGRADECIMENTOS

Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia do Estado do Rio Grande do Sul; Secretaria de Agricultura, Pecuária e Abastecimento do Estado do Rio Grande do Sul; Escritório Regional da EMATER de Caxias do Sul; Dr. Julio César Palhares - Pesquisador da EMBRAPA Pecuária Sudeste; Dr. Juliano Gimenez - Professor da Universidade de Caxias do Sul; Geise Macedo dos Santos - Monitora de pesquisa do Instituto de Saneamento Ambiental da Universidade de Caxias do Sul.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar 2016

Histórico

  • Recebido
    22 Jun 2015
  • Aceito
    02 Dez 2015
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