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VARIAÇÃO LINGUÍSTICA E PRONÚNCIA EM CURSOS ELEMENTARES DE PORTUGUÊS COMO LÍNGUA ESTRANGEIRA

RESUMO

este artigo tem como objetivo discutir aspectos teóricos e práticos referentes ao ensino de pronúncia em cursos elementares de português como língua estrangeira (PLE). Primeiramente, apresentam-se argumentos que justificam por que a aprendizagem da pronúncia é importante em aulas de PLE. Posteriormente, com base em diversas pesquisas científicas, listam-se aspectos relevantes da pronúncia do português brasileiro (PB) que poderiam ser apresentados aos alunos de PLE. Finalmente, realizamos uma análise sobre como seis livros didáticos de PLE apresentam informações sobre o sistema fonético-fonológico do PB. Observamos tanto os conteúdos teóricos quanto os exercícios práticos sobre esse tema. Concluímos que existe discrepância na forma como os materiais didáticos abordam esse tópico: alguns não apresentam nenhuma informação sobre fonética e fonologia, outros mencionam correspondências entre grafemas e fonemas, enquanto outros, mais completos, oferecem explicações e exercícios que podem auxiliar o aluno na produção e percepção dos sons do PB. A partir dessa conexão entre que aspectos devemos ensinar sobre a pronúncia do PB e como os livros didáticos abordam esse tópico, argumenta-se, finalmente, que o ensino de pronúncia é fundamental para a formação e o letramento mais amplo de alunos de PLE.

português como língua estrangeira; pronúncia em segunda língua; fonética e fonologia; livros didáticos de português como língua estrangeira

ABSTRACT

this article discusses pronunciation in elementary courses of Portuguese as a second language. It is argued that pronunciation is a critical component of the language, and therefore should be taught in elementary classes. Based on empirical evidence from linguistic studies, we list some of the most important topics of the Brazilian Portuguese sound system that students should learn. Following that, we analyze six textbooks of Portuguese as a second language. We observe whether or not these materials teach pronunciation, as well as what kind of theoretical and practical components each textbook offers. We come to the conclusion that there is much difference in how textbooks discuss pronunciation: some of them do not provide any information on phonetics and phonology, whereas others present charts with correspondences between sounds and letters of the language, and others devote more time to theoretical explanation and exercises that can surely help students acquire more proficiency, both in speaking and understanding others. This connection between relevant aspects that must be taught in Portuguese as a second language and the comparison between textbooks allows us to argue that teaching pronunciation is a crucial component for our students’ literacy while learning Portuguese as a second language.

Portuguese as a second language; pronunciation in second language acquisition; phonetics and phonology; teaching materials of Portuguese as a second language

Introdução

A literatura sobre a variação dialetal do português brasileiro (PB) é bastante rica, como se pode ver através de inúmeros trabalhos acadêmicos que reportam pesquisas sobre diversos tópicos (ABAURRE; RODRIGUES, 2002ABAURRE, M.B.M.; RODRIGUES, A.C.S. Gramática do português falado: novos estudos descritivos. São Paulo: Ed. da Unicamp, 2002. v.8., CASTILHO, 2010CASTILHO, A. T. Nova Gramática do Português Brasileiro. São. Paulo: Contexto, 2010., BAGNO, 2013BAGNO, M. Sete erros aos quatro ventos: variação linguística no ensino de português. São Paulo: Parábola, 2013., OLIVEIRA JÚNIOR, 2019). De modo mais específico, há muitos trabalhos que analisam temas da fonética e fonologia do PB (CRISTÓFARO-SILVA, 2012, PERINI, 2004PERINI, M. A. Talking Brazilian: A Brazilian Portuguese pronunciation workbook. New Haven: Yale University Press, 2004.). É provável que essa seja uma das áreas mais estudadas na linguística da nossa língua. A despeito desse amplo enfoque científico em processos fonético-fonológicos do PB, infelizmente, a aplicação dessas análises ao ensino e aprendizagem de pronúncia do português como língua estrangeira (PLE) é limitada. Como veremos adiante, dentre os vários livros didáticos de PLE disponíveis no mercado, há muita discrepância sobre os tópicos de pronúncia ensinados e que tipos de exercícios são oferecidos para que os alunos adquiram mais proficiência falando e compreendendo português. A impressão que se tem é que a gama de estudos científicos sobre o PB não é levada em consideração na elaboração de manuais de PLE. A fim de estabelecer conexões entre conhecimento acadêmico e livros didáticos dessa área, este artigo organiza uma compilação de estudos de fonética e fonologia do PB que apontam para aspectos da pronúncia da nossa língua que devem ser enfatizados em aulas de PLE. Além disso, faz-se uma análise de como aspectos fonético-fonológicos do PB são tratados em seis livros didáticos de PLE.

Considerações Iniciais

Alguns questionamentos são importantes quando se pensa em ensinar a pronúncia de uma língua. Em primeiro lugar, uma pergunta essencial sobre a qual devemos refletir é: Por que ensinar pronúncia? Isso é, realmente, necessário? Esse tópico deve ser ensinado por duas razões principais: quando um estrangeiro tem uma pronúncia mais próxima à da língua que está aprendendo, ele é entendido com mais facilidade por falantes da língua-alvo, sejam eles nativos ou não-nativos; por outro lado, quando uma pessoa aprende a pronúncia adequada de uma língua, também é capaz de compreender melhor as palavras que são ditas, porque sabe, por exemplo, que ch será invariavelmente pronunciado como [ʃ] e poderá, com mais facilidade, saber de que vocábulo se trata, caso já tenha aprendido esse item. Outra razão para se ensinar pronúncia é que as regras fonético-fonológicas de uma língua são um sistema produtivo e se aplicam a todos os contextos que são por elas descritos (PINKER, 1999PINKER, S. Words and rules: the ingredientes of language. New York: Basic Books, 1999.). No caso do t, por exemplo, na maioria dos dialetos do Brasil, todas as ocorrências de ti serão pronunciadas como [tʃi], bem como as de te em coda final (CÂMARA JÚNIOR, 1977, SIMÕES, 2008SIMÕES, A. Pois não: Brazilian Portuguese course for Spanish speakers, with basic reference grammar. Austin: University of Texas Press, 2008.). Aprendendo esse arcabouço de regras de pronúncia de uma língua, o aluno tem uma fonte confiável de informações que lhe guiarão a produzir corretamente os sons, além de lhe proporcionarem uma correspondência relativamente estável entre grafema e fonema.

Outro ponto que requer discussão quando se fala do ensino de pronúncia é com relação aos casos de variação linguística. Em um país com tanta diversidade dialetal como o Brasil, vale a pergunta: que dialeto ou que características dialetais vamos ensinar? Nesse sentido, alguns tópicos práticos que emergem são: devemos ensinar a pronúncia de t e d palatalizados, como em [tʃ]ia e [dʒ]ia, ou não (PERINI, 2004PERINI, M. A. Talking Brazilian: A Brazilian Portuguese pronunciation workbook. New Haven: Yale University Press, 2004.)? Que tipo de pronúncia do r devemos adotar: glotal, retroflexo, velar, vibrante, tepe (CRISTÓFARO-SILVA, 2012; PERINI, 2010PERINI, M. A. Gramática do português brasileiro. São Paulo: Parábola, 2010.; OLIVEIRA LIMA, 2013OLIVEIRA LIMA, M. M. As consoantes róticas no português brasileiro com notas sobre as róticas das variedades de Goiânia, Goiatuba e Uberlândia. Orientador: Daniele Marcelle Grannier. 2013. 190 f. Dissertação (Mestrado em Linguística) - Departamento de Linguística, Português e Línguas Clássicas, Universidade de Brasília, Brasília, 2013.)? Essas perguntas de ordem dialetal são cruciais para que possamos começar a refletir sobre como ensinar pronúncia aos nossos alunos de PLE. Claro que todas as modalidades linguísticas são igualmente válidas. Um aluno que vá para o interior de São Paulo vai aprender o r retroflexo em posição de coda. Outro estudante que vá para certas regiões do Sul poderá aprender o r vibrante. A variação dialetal é um dos traços da riqueza cultural do Brasil como um todo e, embora haja variáveis de maior ou menor prestígio socioeconômico (LABOV, 1973LABOV, W. Sociolinguistic patterns. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 1973., 2001LABOV, W. Principles of linguistic change: social factors. Oxford: Blackwell, 2001.), falar de uma forma específica não impede que os alunos sejam compreendidos em outras regiões com dialetos diferentes. Caso se identifiquem mais com outra região geográfica do Brasil, os estudantes podem fazer mudanças dialetais voluntárias baseadas nessa identidade cultural. Essa é sempre uma opção à disposição de quem aprende não só o PB, mas qualquer língua estrangeira. Falantes de espanhol podem ou não, por exemplo, adotar a pronúncia de s dental como em zapato ou corazón, marca típica de certas regiões da Espanha. Essa mesma pessoa, posteriormente, pode mudar de dialeto por estar em um país hispânico da América Latina que não tenha esse traço. Essas mudanças podem ser mais ou menos conscientes para o aprendiz de uma segunda língua. O que se questiona aqui, no entanto, é quais são as características fonético-fonológicas do PB que devemos ensinar a nossos alunos de PLE.

Vamos discutir alguns critérios que podem nos ajudar a selecionar que aspectos devem ser adotados. Em casos em que houver alternância (como a palatalização ou não de t e d), é interessante considerar a frequência de cada uma dessas variáveis (BYBEE, 1985BYBEE, J. Morphology: a study of the relation between meaning and form. Philadelphia: John Benjamins, 1985., 2002BYBEE, J. Word frequency and context of use in the lexical diffusion of phonetically conditioned sound change. Language Variation and Change, Cambridge, n. 14, p. 261- 290, 2002.). Essa informação é crucial para nortear nossa opção por uma ou outra forma. Neste artigo, defende-se que é importante que os alunos de PLE sejam informados da variabilidade de pronúncia que o PB apresenta, mas que se ensinem, sistematicamente, aspectos fonético-fonológicos mais frequentes nos dialetos da língua, já que isso facilita, também, a compreensão auditiva. A fim de determinar que variável é mais recorrente, é importante consultar estudos linguísticos que analisem cada tópico a ser ensinado (CRISTÓFARO-SILVA, 2012; CALLOU et al., 1996). Na subseção seguinte, apresenta-se uma lista não-exaustiva desses temas e dos principais estudos que já foram realizados a esse respeito. Essa informação fundamentada em trabalhos realizados sobre vários dialetos do Brasil (BUENO, 1944BUENO, F. S. Gramática normativa da língua portuguesa. São Paulo: Livraria Acadêmica, 1944.; CÂMARA JÚNIOR, 1977) nos ajudará na decisão sobre que aspectos da pronúncia ensinar em cursos elementares de PLE.

Outro ponto muito relevante a ser questionado é em que momento devemos começar a ensinar pronúncia. Neste artigo, propõe-se que esse tópico deve ser introduzido no princípio dos cursos elementares. Por “cursos elementares” entendem-se, no contexto deste trabalho, cursos de iniciação ao ensino de português ou de nível básico comumente intitulados “Português Elementar I” e “Português Elementar II”. Considera-se, porém, que o ensino de pronúncia pode ser transversal, ou seja, percorrendo todos os níveis de cursos de português, mas que idealmente deve começar no primeiro semestre de exposição sistemática do aluno à língua portuguesa. Por que tão cedo? Porque, de posse desse conhecimento, os alunos, ao aprenderem o vocabulário a partir dos primeiros dias, já estarão aplicando uma forma de pronúncia compatível com o que se fala no Brasil. Isso evita que aspectos incorretos da fala sejam fossilizados (SELINKER, 2015SELINKER, L. Rediscovering interlanguage. Abingdon: Routledge, 2015.; HAN, 2004HAN, Z. Fossilization in adult second language acquisition. Buffalo: Multilingual Matters, 2004.) e faz com que, no trabalho em sala de aula, com o uso de uma pronúncia única, todo o input que se tenha seja consistente, facilitando o entendimento mútuo entre os alunos. Claro que, ao se ensinar a pronúncia nos primeiros dias de aula, não se espera que, imediatamente, os alunos falem todas as palavras de forma correta. Paulatinamente, com exercícios e monitoramento por parte do professor, as dificuldades vão sendo sanadas e uma pronúncia típica do PB é construída. Em cursos mais avançados, os alunos já terão mais exposição a diferentes variáveis linguísticas, então esse é um momento propício para que aspectos mais minuciosos da pronúncia possam ser abordados. O professor pode, inclusive, mostrar vídeos que tenham pronúncias típicas menos frequentes no PB, o que fará com que os alunos adquiram consciência das diferenças dialetais e culturais prevalentes no Brasil. Por outro lado, em cursos elementares, é importante restringir-se a informações básicas. Um excesso de detalhes sobre pronúncia nesse contexto não é produtivo diante da quantidade de vocabulário e questões gramaticais que o aluno tem que dominar paralelamente ao sistema sonoro.

Uma última pergunta relevante para o ensino do sistema sonoro do PB é: é necessário usar símbolos fonéticos para falar sobre pronúncia? Essas convenções certamente fazem com que a descrição do som seja mais inequívoca, já que um símbolo corresponde precisamente a um som específico e assim se desfazem possíveis ambiguidades (CRISTÓFARO-SILVA, 2012). No entanto, a utilização de um alfabeto fonético não é crucial. Desde que o professor possa ensinar a pronúncia e explicar os detalhes do aspecto específico que está abordando, não é fundamental que essas convenções sejam usadas.

Na subseção seguinte apresentamos uma compilação de pesquisas linguísticas que apontam direcionamentos em relação a que traços de pronúncia do PB devem ser ensinados em cursos de PLE. Propomos, também, algumas metodologias práticas sobre esses aspectos.

Pronúncia do PB Aplicada ao PLE

Antes de discutirmos pontos específicos relacionados ao ensino da pronúncia do PB, fazemos, abaixo, algumas recomendações gerais a serem adotadas em relação a essa metodologia. Essas observações são baseadas, primordialmente, em nossa própria prática pedagógica no ensino de pronúncia do PB.

  • Apesar de sugerir-se que as regras de pronúncia sejam ensinadas no início de cursos elementares, a automatização das relações entre grafema e fonema requer algum tempo de processamento cognitivo através da prática. Especialmente durante as primeiras semanas de aula, é importante que o professor monitore e esclareça os eventuais equívocos dos alunos. Para acompanhar o progresso na pronúncia, é interessante, por exemplo, que os estudantes gravem sua própria leitura de um mesmo texto no começo do semestre e, posteriormente, no final. Essa comparação servirá como evidência do progresso de sua pronúncia;

  • Para o falante não-nativo, a maior referência para pronunciar bem o PB é a escrita, através do input impresso na internet, em livros, materiais didáticos, etc. Embora a relação entre grafemas e fonemas não seja unívoca no PB, é importante, mesmo assim, que a grafia seja o referente a partir do qual o aluno se baseie para saber como certas letras serão pronunciadas (MORAIS, 2010MORAIS, A.G. Ortografia: ensinar e aprender. São Paulo: Ática, 2010.). Sendo assim, os diversos aspectos a serem aprendidos sobre a pronúncia devem partir de uma conexão com a escrita, mostrando os sons associados a certas letras em contextos determinados (CAGLIARI; CAGLIARI, 1999CAGLIARI, L.C.; CAGLIARI, G.M. Diante das letras: a escrita na alfabetização. Campinas: Mercado de Letras, 1999.);

  • Caso o professor saiba falar a língua nativa dos alunos, recomenda-se que ele utilize informações do sistema fonético-fonológico desse idioma para ajudá-los a compreender a pronúncia dos sons. Com relação à letra r, por exemplo, é sempre útil mostrar aos estudantes falantes de inglês que essa pronúncia no PB (em certos contextos específicos) é comparável à da letra h no início de palavras como house e home. Esse tipo de paralelo ajuda na fixação correta dos sons.

Nos parágrafos seguintes, vamos abordar diversos aspectos do sistema sonoro do PB, com vistas a discutir as melhores opções ao se ensinar pronúncia em cursos de PLE. Para cada item, apresentar-se-ão pesquisas linguísticas que nos ajudarão a tomar decisões sobre que variáveis do PB adotar.

Começamos nossas considerações discutindo uma regra que acarretará consequência em outras e, por isso, deve ser uma das primeiras a serem ensinadas. Trata-se da pronúncia das vogais e e o em posição de coda final, em casos como filme, telefone, livro, bolo. Essa regra terá impacto na palatalização de t e d, por isso é importante ensinar esse aspecto primeiro. Câmara Júnior (1977), Perini (2004)PERINI, M. A. Talking Brazilian: A Brazilian Portuguese pronunciation workbook. New Haven: Yale University Press, 2004., Simões (2008)SIMÕES, A. Pois não: Brazilian Portuguese course for Spanish speakers, with basic reference grammar. Austin: University of Texas Press, 2008. concordam com o fato de que, em posição postônica final, e e o são pronunciados, respectivamente, [ɪ] e [ʊ]1 1 Os símbolos fonéticos adotados neste artigo são os mesmos propostos por Cristófaro-Silva (2012). , como nos exemplos a seguir: filme film[ɪ], telefone telefon[ɪ], livro livr[ʊ], bolo bol[ʊ], e assim sucessivamente. Embora a pronúncia não reduzida ainda resista em alguns dialetos do Sul (HORA, [2009HORA, D. Fonética e fonologia. UFPB Virtual, João Pessoa, [2009].]), os autores citados apresentam evidência de que, em posição de coda final, e e o são reduzidos na maioria dos dialetos do Brasil. Essa é, então, uma das peculiaridades importantes a se ensinar, principalmente para falantes nativos de espanhol, que tendem a pronunciar esses dois segmentos como [e] e [o] por causa da interferência de sua língua materna. É importante enfatizar com os alunos que essa mesma pronúncia reduzida se mantém, também, em formas plurais: filmes film[ɪ]s, telefones telefon[ɪ]s, livros livr[ʊ]s, bolos, bol[ʊ]s, bem como em ditongos nasais: avião aviã[ʊ], e mã[ɪ], es mã[ɪ]s. Esses detalhes não são transparentes para falantes não-nativos.

O segundo aspecto da pronúncia do PB a ser ensinado pode ser sobre t e d. Em alguns dialetos do PB, esses segmentos são geralmente palatalizados quando estão diante de i, como em tia [tʃ]ia e dia [dʒ]ia. Nos demais ambientes, essas letras são pronunciadas como [t] ou [d], sem palatalização. Perini (2010PERINI, M. A. Gramática do português brasileiro. São Paulo: Parábola, 2010., p. 343) afirma que “A pronúncia [tʃ] do t antes do som [i], típica da região Sudeste, parece estar ganhando terreno também no Sul. No Norte e Nordeste, não é comum, e o t ali se pronuncia [t] em todas as posições.” Simões (2008SIMÕES, A. Pois não: Brazilian Portuguese course for Spanish speakers, with basic reference grammar. Austin: University of Texas Press, 2008., p. 54) aponta para a “pronúncia especial” de t e d diante do som [i]. Perini (2004)PERINI, M. A. Talking Brazilian: A Brazilian Portuguese pronunciation workbook. New Haven: Yale University Press, 2004. aponta que [tʃ] e [dʒ] ocorrem quase exclusivamente antes de [i] ou [j] (semivogal), grafadas na escrita como i ou e. O autor enfatiza, também, que esses alofones substituem [t] e [d], que nunca ocorrem diante de [i]. Essa descrição da alofonia e dos contextos alternantes de t e d também é um dos aspectos cruciais a serem ensinados em PLE. Os estudos linguísticos consultados concordam na opção da variável palatalizada de t e d diante de i, em função de sua maior prevalência no Brasil. Na metodologia de ensino, é importante esclarecer para os alunos dois detalhes dos contextos mais opacos em que a palatalização também ocorre: 1) Existe uma sobreposição da regra anterior (sobre a redução de e e o em coda final) e desta. Por causa disso, palavras como tarde e noite terão o e final reduzido a [ɪ], o que também acarretará a palatalização de t e d nesses contextos. Explicando essa sequência de regras, Perini (2010PERINI, M. A. Gramática do português brasileiro. São Paulo: Parábola, 2010., p. 343) afirma, “O som [i] geralmente é representado na escrita pela letra i. Mas a letra e, quando átona, é muitas vezes pronunciada [i], e nesses casos o t também se pronuncia [tʃ]”; 2) Quando as palavras primitivas que terminam com grafia te recebem sufixos que as tornam derivadas, a palatalização de t se transfere para essas palavras: frequente- frequentemente frequen[tʃi]mente, eloquente– eloquentemente eloquen[tʃi]mente.

O terceiro ponto sobre o sistema sonoro do PB, e talvez o mais controverso por sua ampla variação, é a pronúncia dos sons róticos. Em termos dialetais, existem muitas possibilidades de realização fonética da letra r. O quadro abaixo, baseado em Cristófaro-Siva (2012)CRISTÓFARO-SIVA, T. Fonética e fonologia do português: roteiro de estudos e guia de exercícios. São Paulo: Contexto, 2012. mostra as possibilidades de pronúncia do r no PB, juntamente com exemplos e contextos adequados em que cada som ocorre:

Quadro 1 Realizações fonéticas da letra r no PB

Símbolo Classificação Exemplo Contextos
h Fricativa glotal desvozeada rato carro mar carta início de palavra RR fim de palavra fim de sílaba diante de consoante desvozeada
ɦ Fricativa glotal vozeada árvore fim de sílaba precedido de consoante vozeada
X Fricativa velar desvozeada rato carro mar carta início de palavra RR fim de palavra fim de sílaba diante de consoante desvozeada
ɣ Fricativa velar vozeada árvore fim de sílaba precedido de consoante vozeada
ɾ Tepe alveolar vozeado cara prata mar carta intervocálico encontro consonantal tautossilábico final de palavra ou de sílaba (dialeto paulistano)
ɻ Retroflexa alveolar vozeada mar carta final de sílaba ou palavra (dialeto caipira)
Fonte: Cristófaro-Silva (2012, p. 38-39).

O quadro acima nos mostra que escolher que variáveis do r ensinar aos alunos de PLE não é uma tarefa simples. Como vemos, além do contexto de palavra, existem, também, variações dialetais que marcam a escolha de uma pronúncia ou outra. Os sons [h] e [ɦ], típicos do dialeto de Belo Horizonte, por exemplo, alternam-se com [X] e [ɣ], que, nos mesmos contextos de palavra, são marcas do dialeto carioca. Nesse caso, não seria necessário ensinar esses quatro sons, já que um dialeto tipicamente adota um par ou outro. Para melhor visualizarmos a distribuição dos sons róticos de acordo com a região do Brasil, apresentamos o mapa abaixo, elaborado por Oliveira Lima (2013OLIVEIRA LIMA, M. M. As consoantes róticas no português brasileiro com notas sobre as róticas das variedades de Goiânia, Goiatuba e Uberlândia. Orientador: Daniele Marcelle Grannier. 2013. 190 f. Dissertação (Mestrado em Linguística) - Departamento de Linguística, Português e Línguas Clássicas, Universidade de Brasília, Brasília, 2013., p. 87), ilustrando as opções por esses sons em posição de coda em vários estados brasileiros:

Figura 1
– Distribuição de róticos em coda nos estados brasileiros

Além da grande variabilidade de pronúncia que o mapa ilustra, o que nos chama à atenção é o fato de que a o som glotal [h] é predominante na posição de coda nas regiões Norte e Nordeste, com exceção dos estados de Bahia e Sergipe. Já no Centro-Oeste, Sudeste e Sul há alternância entre [h] e [X], além da inserção de outras variáveis, como o r retroflexo. No Centro-Oeste, a variável glotal não foi registrada, mas ela se encontra em estados do Sudeste e do Sul também. Diante de tanta variação, o que fazer? Uma questão interessante a considerar é que, em termos de população, Rio de Janeiro e São Paulo são as maiores cidades brasileiras. Talvez por isso fizesse sentido adotar o dialeto de uma dessas duas capitais. No entanto, mesmo fazendo-se essa opção, a pergunta não se esgota. No dialeto do Rio de Janeiro, por exemplo, encontramos as variáveis [h, X, ɣ, ɾ], dependendo da variação geográfica dentro do próprio estado e do contexto de palavra. Além disso, existe também o idioleto, o fato de que cada indivíduo tem sua história linguística particular e, por isso, pode haver pessoas específicas com pronúncias diferentes daquela da sua comunidade. Ainda com relação à frequência das representações sonoras da letra r, Bueno (1944)BUENO, F. S. Gramática normativa da língua portuguesa. São Paulo: Livraria Acadêmica, 1944. comenta que o rótico com som aspirado [h] predomina nos estados de Alagoas, Pernambuco e na cidade do Rio de Janeiro. Perini (2010)PERINI, M. A. Gramática do português brasileiro. São Paulo: Parábola, 2010. apresenta as variáveis [h] e [ɾ] como as prevalentes do PB. Considerando o sistema de róticos a ser adotado no ensino de PLE, fazemos, aqui, as seguintes ponderações: 1) O tepe ([ɾ]) deve estar presente no repertório a ser adotado porque ele é distintivo nos contextos intervocálicos (caro) e em encontro consonantal tautossilábico (criança), ou seja, nenhuma das outras possibilidades de realização fonética do r poderia ser encaixada nesses dois ambientes; 2) Por outro lado, em dialetos em que a maior alternância é entre os pares [h, ɦ] e [X, ɣ], o mapa acima demonstra a grande prevalência pela pronúncia de [h] em coda. Em função desses fatores, em consonância também com Perini (2010)PERINI, M. A. Gramática do português brasileiro. São Paulo: Parábola, 2010., propõe-se que se adote um sistema de róticos com os sons [h] e [ɾ], distribuídos nos seguintes contextos:

Quadro 2 Contextos de [h] e [ɾ]

Símbolo Descrição Contextos Exemplos
h Fricativa glotal desvozeada início de palavra rato
RR carro
coda medial porta
coda final cor
depois de l, n, s Israel
ɾ Tepe alveolar vozeado entre vogais cara
encontro consonantal tautossilábico prata
Fonte: Elaboração própria.

Esse sistema, com somente duas possibilidades de realização para o r e contextos bem determinados e exclusivos, facilita a aprendizagem desses sons pelo aluno. É importante que se mencione que essas não são as únicas possibilidades de pronúncia, mas essa é uma forma simplificada e os estudantes, posteriormente, conforme se identifiquem com uma região ou dialeto do Brasil, podem adotar outra variável.

Outro aspecto a se considerar em relação aos róticos é o fato de que, em formas verbais, o r em posição de coda final é frequentemente apagado. Leite de Vasconcelos (1928)LEITE DE VASCONCELOS, J. Opúsculos: dialetologia. Coimbra: Imprensa da Universidade, 1928. já registrava esse fenômeno. Oliveira (1983)OLIVEIRA, M. A. Phonological variation and change in Brazilian Portuguese: the case of the liquids. Orientador: William Labov. 1983. 270 f. Tese (Doutorado em Linguística) - University of Pennsylvania, Philadelphia, 1983., entrevistando 50 informantes de Belo Horizonte, observou que o r foi apagado em 81,59% dos casos em posição final nas formas verbais. Perini (2010PERINI, M. A. Gramática do português brasileiro. São Paulo: Parábola, 2010., p. 344) também menciona esse cancelamento do r em formas verbais, e exemplifica que isso faz com que “partir e parti se pronunciem da mesma maneira”. O autor também atenta para o fato de que “Essa omissão não é característica da fala “inculta”, mas é universal no Brasil, em todas as regiões e todas as classes sociais. O r final só é pronunciado em falas muito formais (como em um discurso em público)...” Já que o apagamento do r em formas verbais é tão disseminado no PB, é importante que isso também seja informado aos alunos, para que eles tenham uma fala mais natural e compatível com a versão de português que efetivamente se fala no Brasil.

Com relação às sibilantes, na pronúncia típica do Rio de Janeiro, em posição de coda, s, x e z podem ser realizados foneticamente como [ʃ] ou [ʒ], dependendo do desvozeamento ou vozeamento da consoante seguinte, respectivamente: festa fe[ʃ]ta ou desde de[ʒ]de. Callou et al. (1996), analisando dados do NURC, observam que as variáveis alveopalatais são mais frequentes nas cidades do Rio de Janeiro e Recife. Outras regiões brasileiras demonstram preferência pelas variáveis alveolares [s] e [z] em posição final de sílaba. Considerando-se que a pronúncia de [ʃ] ou [ʒ] em posição de coda é uma característica dialetal de algumas cidades do Brasil, seria mais adequado que se fizesse a opção por ensinar [s] e [z] nessa posição. Os sons [ʃ] e [ʒ] serão ensinados nos seus contextos em que quase não há variação linguística, como em chuva [ʃ]uva ou janela [ʒ]anela, mas acrescentar esses sons às possibilidades de pronúncia em coda apresentaria mais uma complexidade para os alunos. Propõe-se, portanto, que a variável ensinada para os sons sibilantes em coda seja aquela adotada pela maioria do Brasil, ou seja, [s] antes de consoante desvozeada, como festa fe[s]ta, e [z] antes de consoante vozeada, como desde de[z]de.

Outro ponto crucial a ser ensinado na pronúncia de PLE é com respeito à letra l. Em posição de onset ou como a segunda letra em encontros consonantais tautossilábicos, esse segmento representa o som [l], como nos exemplos livro [l]ivro e blusa b[l]usa. Por outro lado, em coda, tanto em meio quanto em final de palavra, na maioria dos dialetos do PB, essa letra é vocalizada como [w], como podemos ver nas palavras sal sa[w] e soldado so[w]dado (CRISTÓFARO-SILVA, 2012). Hora ([2009HORA, D. Fonética e fonologia. UFPB Virtual, João Pessoa, [2009].], p. 36) afirma que “A variante semivocalizada [w], tanto em posição medial como em posição final, é a mais recorrente no Brasil. De norte a sul, é possível encontrá-la, e sua utilização independe de sexo, idade ou escolaridade.” Quandt (2004)QUANDT, V. O. O comportamento da lateral anterior na fala do norte-noroeste fluminense. 2004. Dissertação (Mestrado em Letras Vernáculas) - Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2004. e Hora (2007)HORA, D. Vocalização da lateral /l/: correlação entre restrições sociais e estruturais. Scripta, Belo Horizonte, v. 09, n. 18, p. 29-44, 2007. também apontam evidências para a vocalização de l em coda silábica. Há, portanto, estudos linguísticos que amparam a decisão de ensinar esse traço do PB. Essa distinção entre l em onset e coda é muito importante, sobretudo para falantes de inglês ou espanhol, já que, nessas duas línguas, em coda, a letra l representa o som [l]. Para que os alunos tenham uma pronúncia mais adequada à do PB, é necessário que esse traço seja enfatizado.

Um dos aspectos mais desafiadores da pronúncia do PB é o caráter nasal das vogais. Para que os alunos possam compreender bem esse tópico, é importante que estejam cientes, primeiramente, dos contextos em que as vogais devem ser nasais ou nasalizadas. Para tanto, é essencial estabelecer a distinção entre as letras m e n em começo de sílaba, como em amor e sino, e as mesmas letras em posição de coda, tanto em meio quanto em fim de palavra, como nos exemplos antigo e ontem. Nos dois primeiros casos, m e n representam sons que iniciam sílabas (PERINI, 2004PERINI, M. A. Talking Brazilian: A Brazilian Portuguese pronunciation workbook. New Haven: Yale University Press, 2004.). Nos dois últimos exemplos, m e n são símbolos que indicam que a vogal precedente será nasalizada, ou seja, esses não são fonemas. Temos, também, o caso do dígrafo nh, que fará com que a vogal que o precede seja sempre nasal: banho b[ã]nho e sonho s[õ]nho. Deve-se mencionar, também, que o PB tem cinco vogais nasais e que o til indica a nasalidade das letras a e o no caso dos ditongos -ão(s), como em pão(s), -ãe(s), como em mãe(s) e -ões, como em aviões. Outro aspecto relevante é com relação ao fato de que a letra m em coda absoluta, ou seja, no fim de palavra, geralmente forma um ditongo com a vogal anterior, como em amam, bem, bom, etc. Perini (2004PERINI, M. A. Talking Brazilian: A Brazilian Portuguese pronunciation workbook. New Haven: Yale University Press, 2004., p. 53) menciona, por exemplo, que “The sound [ẽ] never occurs word-finally; there it is replaced by the diphthong [ẽj].3 3 Este é o único livro desta lista que foi publicado há mais de 10 anos. Contrariando os critérios de seleção dos demais materiais, ele foi mantido porque é o único desses manuais que é voltado especificamente para falantes de espanhol. Pareceu-nos interessante apresentar essa peculiaridade e verificar se isso interferiria na apresentação do sistema fonético-fonológico do PB. Nesses casos de letra m em coda final, falantes nativos do inglês geralmente têm o impulso de juntarem os lábios como se fossem pronunciar uma consoante bilabial, como é na sua língua nativa. Para evitar esse tipo de equívoco, é importante que essas correspondências ortográficas sejam paulatinamente apresentadas e que esses hábitos oriundos da língua materna sejam adaptados. A partir do conhecimento das representações escritas da nasalidade, é mais fácil produzir esses sons nos contextos adequados. Com relação à produção desses sons, é necessário apresentar práticas que estimulem os alunos a se conscientizarem sobre a saída da corrente de ar da fala simultaneamente pela boca e pelo nariz (CRISTÓFARO-SILVA, 2012).

De um modo geral, os aspectos de pronúncia apresentados nesta subseção são os mais relevantes a serem ensinados aos alunos de cursos elementares de PLE. Na próxima subseção, vamos analisar como os livros didáticos abordam o sistema fonético-fonológico do PB.

O Ensino de Pronúncia nos Livros Didáticos de PLE

A partir das considerações sobre o ensino de pronúncia em PLE feitas nas subseções anteriores, uma análise sobre como os materiais didáticos abordam esse tema foi realizada. Para tanto, foram selecionados seis manuais de níveis elementares de PLE. A seleção desses materiais foi feita a partir de um critério cronológico: todos os livros escolhidos tinham menos de 10 anos a partir da publicação de sua última edição. Esse parâmetro foi importante por duas razões: 1) Em primeiro lugar, livros publicados mais recentemente têm mais chances de ainda serem adotados em cursos de PLE. Livros mais antigos vão, paulatinamente, sendo descartados pelas escolas e universidades à medida que outros, mais novos, vão entrando no mercado; 2) Livros mais recentes provavelmente são norteados por pedagogias mais atualizadas e talvez apresentem abordagens mais modernas sobre o ensino da pronúncia. Abaixo apresentamos a lista cronológica por ano de publicação dos seis livros selecionados. Essa não é, necessariamente, a ordem que vamos seguir na análise abaixo, mas, para melhor organização e referência, optamos por manter a organização temporal aqui.

  1. Simões (2008)SIMÕES, A. Pois não: Brazilian Portuguese course for Spanish speakers, with basic reference grammar. Austin: University of Texas Press, 2008.. Pois não: Brazilian Portuguese course for Spanish speakers, with basic reference grammar3 3 Este é o único livro desta lista que foi publicado há mais de 10 anos. Contrariando os critérios de seleção dos demais materiais, ele foi mantido porque é o único desses manuais que é voltado especificamente para falantes de espanhol. Pareceu-nos interessante apresentar essa peculiaridade e verificar se isso interferiria na apresentação do sistema fonético-fonológico do PB.

  2. Slade (2012)SLADE, R.O. Bom dia, Brasil!: Português básico para estrangeiros. New Haven: Yale University Press, 2012.. Bom dia, Brasil! Português básico para estrangeiros

  3. Jouët-Pastré et al. (2013a). Ponto de encontro: Portuguese as a world language e o caderno de exercícios voltados para o português brasileiro: Jouët-Pastré et al. (2013b). Brazilian Portuguese student activities manual for Ponto de encontro: Portuguese as a world language

  4. Otuki de Ponce (2014)OTUKI DE PONCE, M. Como está o seu português? São Paulo: HUB Editorial, 2014.. Como está o seu português?

  5. Harumi de Ponce et al. (2017). Fale português (volume 1)

  6. Huback et al. (2018). Gramática básica do português brasileiro

Nenhum desses materiais trata especificamente da pronúncia do PLE. Esses são livros didáticos usados em cursos regulares de nível elementar para ensinar vocabulário e gramática. Alguns manuais, como Ponto de Encontro: Portuguese as a world language (JOUËT-PASTRÉ et al., 2013a), podem ser divididos ao longo de mais de um semestre, por isso vamos analisar apenas suas unidades iniciais que seriam usadas em cursos elementares. Apesar de esses livros não serem voltados propriamente para o ensino de pronúncia, seria importante que apresentassem alguma informação sobre o sistema fonético-fonológico do PB, a fim de que os alunos saibam como pronunciar corretamente as palavras novas que forem aprendendo. Na análise sobre como cada um desses livros aborda informações dessa natureza, observamos o seguinte:

O livro Pois não (SIMÕES, 2008SIMÕES, A. Pois não: Brazilian Portuguese course for Spanish speakers, with basic reference grammar. Austin: University of Texas Press, 2008.) apresenta extensas e aprofundadas seções explicativas sobre a pronúncia do PLE. Como esse é um manual direcionado a falantes de espanhol, as diferenças entre as duas línguas aparentemente similares são enfatizadas em suas minúcias. Um aspecto interessante a mencionar é que, no primeiro capítulo do livro, antes de começar com tópicos gramaticais, o autor apresenta as diferenças entre os sistemas sonoros do espanhol e do PB. Essa abordagem parece ser ideal, de acordo com o que expusemos nas recomendações anteriores, porque os alunos já vão saber a pronúncia correta das palavras novas que forem aprendendo quando começarem a estudar vocabulário e gramática. A fim de explicar os temas apresentados, o livro cita conceitos básicos de Linguística (princípios sobre os símbolos fonéticos, bem como a utilização de colchetes para transcrições fonéticas e a de barras para a representação fonológica). Alguns linguistas clássicos, como Mattoso Câmara Jr., são mencionados para explicar peculiaridades do PB. Explica-se a pronúncia das vogais orais e nasais, e logo das consoantes, sempre levando-se em consideração a comparação com o espanhol. Diagramas do aparelho fonador são usados para demonstrar a diferença entre sons consonantais e vocálicos nas duas línguas (SIMÕES, 2008SIMÕES, A. Pois não: Brazilian Portuguese course for Spanish speakers, with basic reference grammar. Austin: University of Texas Press, 2008.). A seguir, é apresentada uma tabela com as letras do alfabeto, os símbolos fonéticos que estas podem representar e exemplos de palavras em que esse grafema ocorre (SIMÕES, 2008SIMÕES, A. Pois não: Brazilian Portuguese course for Spanish speakers, with basic reference grammar. Austin: University of Texas Press, 2008.). Nos casos em que uma letra representa mais de um som, como com a letra x, todas essas possibilidades são apresentadas, com exemplos para cada pronúncia possível. As transcrições fonéticas, tanto em português quanto em espanhol, são frequentemente usadas nesta parte introdutória, provavelmente para que o aluno faça uma transição mais suave de uma língua para a outra. Diversos exercícios são apresentados, sejam de escrita, para fazer distinções fonéticas baseadas na grafia, ou de compressão auditiva, para distinguir pares como avó e avô, dada a dificuldade que os hispano-falantes têm com os pares de vogais abertas e fechadas. Além do sistema sonoro do PB apresentado no primeiro capítulo do livro, outras informações mais detalhadas sobre regras específicas são esparsamente introduzidas ao longo do manual, juntamente com revisões e reforço sobre o que já foi mencionado no primeiro capítulo. Na lição 2, por exemplo, apresentam-se as diferenças entre /s/ e /z/, bem como /a/ e /ã/ (SIMÕES, 2008SIMÕES, A. Pois não: Brazilian Portuguese course for Spanish speakers, with basic reference grammar. Austin: University of Texas Press, 2008.). Depois de fornecer explicações e comparações entre espanhol e português, um texto contendo vogais abertas e a representação do som z sublinhados é apresentado (SIMÕES, 2008SIMÕES, A. Pois não: Brazilian Portuguese course for Spanish speakers, with basic reference grammar. Austin: University of Texas Press, 2008.). Os alunos devem atentar para esses sons na leitura em voz alta dessa passagem. Posteriormente, um exercício de percepção visual dos gestos articulatórios é apresentado (SIMÕES, 2008SIMÕES, A. Pois não: Brazilian Portuguese course for Spanish speakers, with basic reference grammar. Austin: University of Texas Press, 2008.). Os alunos devem assistir a um vídeo em que o som foi eliminado, ou seja, as imagens são mudas. A partir dos gestos articulatórios feitos pelos lábios dos falantes nos vídeos, os alunos deverão, sem ouvir o som, identificar, com base em pares de palavras dados, qual vocábulo foi pronunciado. Alguns exemplos desses pares são: 1. Quim [kĩ] ou Kim [kim], 2. ou lama, 3. sou ou sol. Esse é um exercício bastante elaborado e que certamente ajudará os alunos não só na percepção sonora, mas também na pronúncia correta dos sons, aprendendo, por exemplo, a pronunciar o l final de sol vocalizado como [w]. De um modo geral, esse livro é bastante completo em termos de apresentação do sistema fonético-fonológico do PB, abordagem das regras que determinam a pronúncia da língua e elaboração de exercícios que possivelmente contribuem para que as habilidades de pronúncia e compreensão auditiva dos alunos sejam bastante aprimoradas. Esse manual é, dentre nossa seleção para este artigo, o que melhor representa toda a variabilidade de aspectos do sistema sonoro do PB que apresentamos na subseção anterior e que precisariam ser ensinados aos alunos de níveis elementares de PLE. Com tantas minúcias e exercícios tão elaborados que treinam habilidades variadas, o aluno terá uma visão bastante ampla do PB e suas peculiaridades fonéticas. Observa-se que este livro se coaduna com as recomendações que propusemos nas subseções anteriores, em relação a como ensinar pronúncia em PLE e que aspectos seriam mais relevantes nesse aspecto.

Bom dia, Brasil (SLADE, 2012SLADE, R.O. Bom dia, Brasil!: Português básico para estrangeiros. New Haven: Yale University Press, 2012.) é um livro elementar centrado em unidades temáticas. O primeiro capítulo apresenta informações sobre pronúncia, começando com as vogais e, posteriormente, as consoantes. O fato de que se explica a pronúncia logo no começo do livro é um ponto positivo, já que os alunos poderão, desde o início, aplicar as regras corretas do sistema sonoro do PB. O livro, no entanto, não traz explicações teóricas sobre os contextos dos sons elencados. Tanto para vogais quanto para consoantes, apresenta-se uma lista das letras, seguidas de um exemplo de palavra e da transcrição daquele som. Para a vogal a, por exemplo, são mostradas as seguintes possibilidades:

a la4 4 Supõe-se que houve um problema de digitação e a palavra, na verdade, deveria apresentar acento gráfico: lá. /la/

ã fã /fã/

an canta /kãta/

am samba /sãba/

O fato de esse livro apresentar essas minúcias sobre as possíveis pronúncias da vogal a, dependendo da presença do til ou de consoante nasal, é um ponto bastante positivo, porque isso desfaz o equívoco de que toda letra a é pronunciada da mesma forma. Essa certamente é uma vantagem deste manual. Nas consoantes, algo similar é adotado, conforme citamos no exemplo sobre a letra t, transcrito a seguir:

t tapa /tápa/

tia, sete /tʃia/, /sétʃi/

(t seguido de i é pronunciado com ligeira fricção)

Apesar de a explicação para a palatalização de t não ser técnica, é muito bom que o livro mencione essa peculiaridade da pronúncia de t diante de i. Como esse manual só apresenta essa lista de correspondência entre letras e seus possíveis sons, sem que haja explicação sobre as regras de pronúncia, é necessário que o professor esclareça alguns pontos. Não se explica, por exemplo, que a letra e átona em posição de coda final será pronunciada como [i] na maioria dos dialetos do PB. Sem essa informação, o aluno terá dificuldades de entender a palatalização de t e d diante de e em posição final de coda, como em noite e tarde. Como mostramos no excerto acima, um dos exemplos dados para a pronúncia da letra t foi sete, que se encaixa nesse caso, mas, sem uma explicação mais precisa da regra, essas conexões são opacas e, por isso, seria necessário que o professor fizesse a conexão entre esses aspectos. Outro ponto análogo é que, por exemplo, ao explicar a pronúncia da letra s, o livro apresenta os exemplos sala e isso, que contêm duas representações gráficas distintas para esse som. Posteriormente, o manual mostra os exemplos casa e trânsito, que ilustram o fonema [z] representado pelo s intervocálico, um precedido por um som oral e outro pelo nasal, respectivamente. Em nenhum momento se menciona explicitamente a regra de que um s entre vogais será pronunciado como [z] ou de que ss é sempre pronunciado como [s]. Fica implícito que essas regras podem ser deduzidas a partir puramente dos exemplos. Como esse é um livro de nível elementar, seria necessário que esses aspectos fossem elaborados com mais detalhamento. Seria importante, também, que houvesse exercícios que enfatizassem os pontos ensinados. Concluímos que esse é um manual que oferece alguns recursos para que o aluno possa se guiar no conhecimento do sistema fonético-fonológico do PB, mas não está totalmente de acordo com os critérios que definimos anteriormente. O maior ponto negativo é o fato de que não se fazem conexões entre os grafemas e sua respectiva pronúncia e, além disso, não são explicadas as regras de pronúncia de forma que os alunos possam aplicá-las a outras palavras.

O livro Como está o seu português? (OTUKI DE PONCE, 2014OTUKI DE PONCE, M. Como está o seu português? São Paulo: HUB Editorial, 2014.) é uma gramática de nível elementar a intermediário em que cada capítulo trata de uma classe gramatical específica. Esse manual começa com a apresentação da estrutura da frase em português, enfatizando a flexão do artigo de acordo com gênero e número do substantivo a que se refere. Posteriormente, a função sintática das palavras dentro das frases é explicada e aí apresentam-se os nomes das nove classes gramaticais em português. Começa-se pelos substantivos, logo adjetivos, e a culminância é com verbos, que representam quatro capítulos inteiros do livro. Apesar da abordagem de tópicos desde os mais simples (pronomes pessoais e concordância verbal) até os mais complexos (modo subjuntivo e tempos verbais compostos), este livro não apresenta nenhuma referência sobre a pronúncia do PB. Pode-se dizer que, por ser uma gramática, não está implícito que informações sobre fonética e fonologia devam ser incluídas. Mesmo assim, seria produtivo que se apresentasse uma tabela de correspondência entre sons e letras, para que os alunos possam ler corretamente as palavras que aprenderem. A falta de informações sobre pronúncia faz com que esse livro não se enquadre nos critérios que definimos como relevantes para o ensino de pronúncia. Nesse caso, caberia ao professor dispor de um material que explicasse esse tópico.

O livro Ponto de encontro: Portuguese as a world language (JOUËT-PASTRÉ et al., 2013a) é, provavelmente, o material didático de PLE mais adotado nos Estados Unidos. Esse é um livro bastante extenso, de quase 600 páginas, dividido em unidades temáticas que vão, progressivamente, introduzindo tópicos gramaticais e informações culturais sobre os países lusófonos. Dentre os materiais analisados, este é o único que visa, simultaneamente, a estudantes do português brasileiro e também do europeu. As diferenças entre as duas modalidades estão assinaladas ao longo das unidades através das bandeiras dos dois países. Este livro vem acompanhado de um caderno de atividades, em duas versões: uma voltada para o português europeu e outra para o PB, que analisaremos aqui (JOUËT-PASTRÉ et al., 2013b). O livro desta coleção não apresenta informações sobre a pronúncia de nenhuma das duas modalidades da língua portuguesa. O caderno de exercícios, no entanto, expõe, em cada capítulo, um ou mais tópicos sobre a pronúncia do PB. A Lição Preliminar, por exemplo, fornece explicações sobre as vogais, estabelecendo distinções entre tônicas, átonas, fechadas e abertas. Exemplos são dados para cada uma das vogais em cada uma das categorias mencionadas (JOUËT-PASTRÉ et al., 2013b). Explica-se que e e o em coda final são átonos e pronunciados como [i] ou [u]. Além disso, a pronúncia de todas as palavras usadas como exemplo pode ser ouvida em uma gravação de áudio disponível em uma plataforma de recursos online. A mesma lição apresenta as vogais nasais e sua representação gráfica a partir do til ou de m ou n como consoantes seguintes à vogal. No mesmo capítulo, explica-se sobre a palatalização de t e d diante de i. A regra de redução de e em coda absoluta é retomada e mostra-se que palavras como noite também terão o t palatalizado por causa da redução do som de e final. Essa parece ser uma forma precisa de apresentar a sobreposição das regras e como uma acarreta consequências sobre a outra. Comparações entre as pronúncias do PB e do inglês são feitas, como, por exemplo, mencionar que o som [tʃ] corresponde ao som de ch em cheese (JOUËT-PASTRÉ et al., 2013b). Apesar de este caderno de exercícios apresentar atividades de áudio para os exemplos dados, não existem exercícios escritos ou de percepção auditiva disponíveis para os alunos. Essa seria uma adição que faria com que esse livro proporcionasse ainda mais possibilidades de o aluno aprimorar sua pronúncia. Há atividades de áudio baseadas no vocabulário e na gramática de cada capítulo, mas não há nada específico para os aspectos de pronúncia que vão sendo explicados. Sem esses exercícios, é possível que esses excertos tão minuciosos sobre o sistema sonoro do PB passem despercebidos se os professores não tiverem a iniciativa de mencionar esses tópicos em aula. Por outro lado, a qualidade da informação apresentada nesse livro é inegável, e a abrangência de aspectos fonético-fonológicos do PB adotados é bastante adequada para que o aluno tenha uma formação sólida em termos de pronúncia. A disponibilidade de recursos on-line é outro aspecto favorável deste livro em relação aos demais analisados. Todos esses pontos positivos fazem com que esse livro também seja plenamente adequado aos critérios que definimos anteriormente como relevantes para o ensino da pronúncia do PB.

Fale português (HARUMI DE PONCE et al., 2017) é o primeiro volume de uma coleção de dois livros, portanto esse é o nível mais básico ou inicial da série. Esse é um manual com uma diagramação gráfica bastante moderna e atraente, com tópicos culturais relevantes sobre o Brasil e uma proposta de incorporar aspectos da língua falada ao ensino de PLE. Cada capítulo é centrado em torno de uma unidade cultural (“O Mercadão”, “O Carnaval”, “As Baianas de Acarajé”, etc.) e, a partir daí, são inseridos tópicos gramaticais ou tarefas relevantes para aquele tema (por exemplo, fazer uma reserva em um restaurante, falar sobre situações hipotéticas, etc.). Apesar de ser um livro de nível inicial, não é apresentada nem uma tabela sobre as letras e seus possíveis sons e também não há explicações sobre o sistema sonoro do PB. A única menção que se faz à pronúncia é na última página do livro (HARUMI DE PONCE et al., 2017), em um apêndice intitulado “Algumas Marcas de Oralidade”. Aí estão listados aspectos do PB menos monitorado, tais como o uso de pronome oblíquo no início da frase, uso de “a gente” e de expressões como “dá pra”, “será que”, etc. Nessa lista, há um item chamado “simplificação de palavras”. Os exemplos mencionados aí são a redução do verbo estar (está x , etc.) e a contração de para + artigo definido singular, com os exemplos pra e pro. Esses aspectos de redução e sobreposição dos gestos articulatórios são os únicos tópicos de pronúncia mencionados em todo o livro. Dada a falta de material abordando diretamente o ensino da pronúncia, podemos afirmar que este livro não está de acordo com os critérios que consideramos relevantes para esse tópico. Seria necessário, mais uma vez, que o professor produzisse materiais para apresentar esse tema.

A Gramática básica do português brasileiro (HUBACK et al., 2018) utiliza as bases teóricas da Linguística Cognitiva para explicar tópicos gramaticais. Esse livro aborda informações sobre o sistema fonético-fonológico do PB no capítulo final, que versa sobre a ortografia. Apresentam-se duas tabelas extensas, uma com letras que podem representar sons diferentes (caso de s, que pode representar [s] ou [z]) e outra com um mesmo som representado por letras diferentes (caso de [s], que pode ser representado por ç e s, além de outras possibilidades). Os símbolos fonéticos de cada um dos sons do PB são citados. Não há exercícios de discriminação auditiva, mas, com base nas regras apresentadas, são propostas atividades em que, por exemplo, em um conjunto de palavras, o aluno deve sublinhar as letras que representam o som [k] e circular as que representam o som [s], para fazer a distinção de casos como casa e cedo. Outros exercícios propõem que se completem as lacunas com a letra que representa o som adequado de acordo com o contexto da palavra, além de atividades de percepção das similaridades sonoras entre vários itens. Este livro apresenta os temas básicos de pronúncia que mencionamos na subseção anterior e que seriam cruciais no ensino de PLE. Apesar desse aspecto positivo, uma desvantagem dessa gramática é o fato de não apresentar exercícios de compreensão auditiva. Isso certamente seria bastante útil para os alunos treinarem tanto a pronúncia quanto a percepção auditiva.

Observa-se, portanto, que dentre os manuais analisados, aqueles que mais estão de acordo com os preceitos que este artigo sugere como relevantes para o ensino de pronúncia do PB são Pois não (2008) e Ponto de Encontro (2013).

Na subseção seguinte, finalizamos a discussão sobre o ensino de pronúncia do PLE e apresentamos nossas conclusões a partir da comparação entre os livros didáticos.

Conclusões

Através deste artigo, discutimos as razões pelas quais o ensino de pronúncia em cursos de PLE é fundamental para que o aluno possa não só se expressar bem na língua, mas também compreender melhor o que lhe é dito. Apresentaram-se estudos linguísticos que embasam os principais aspectos de pronúncia que devem ser abordados em cursos elementares de PLE, o que pode servir como guia para que professores suplementem atividades de livros didáticos que não tratem detidamente do sistema sonoro do PB. Argumenta-se que é crucial que a pronúncia seja ensinada logo no início da aprendizagem do PB, a fim de que não se fossilizem representações sonoras equivocadas. A partir da lista de aspectos de pronúncia que são recomendáveis no ensino elementar de PLE, foram analisados seis livros didáticos a fim de observar que informações do sistema sonoro do PB eles apresentam e como esse tópico é tratado (que tipo de exercícios são propostos, se os itens são compatíveis com a lista que apresentamos, etc.). Dentre os livros selecionados, observamos que os mais completos, por apresentarem todas as informações de pronúncia apontadas por estudos linguísticos, foram Pois não (SIMÕES, 2008SIMÕES, A. Pois não: Brazilian Portuguese course for Spanish speakers, with basic reference grammar. Austin: University of Texas Press, 2008.) e Ponto de encontro: Portuguese as a world language (JOUËT-PASTRÉ et al., 2013a), juntamente com seu manual de atividades Brazilian Portuguese student activities Manual for Ponto de encontro: Portuguese as a world language (JOUËT-PASTRÉ et al., 2013b). O primeiro é mais completo por oferecer uma grande variedade de exercícios, tanto de escrita quanto de compreensão auditiva. O segundo fornece bastante informação sobre o sistema fonético-fonológico do PB, mas o fato de não propor exercícios que reforcem tópicos específicos de pronúncia faz com que se questione se esse conhecimento será, efetivamente, aproveitado na sala de aula. A Gramática básica do português brasileiro (HUBACK et al., 2018) também é um bom recurso para ensinar pronúncia, mas não apresenta exercícios de compreensão auditiva. Bom dia, Brasil (SLADE, 2012SLADE, R.O. Bom dia, Brasil!: Português básico para estrangeiros. New Haven: Yale University Press, 2012.) apresenta informações sobre pronúncia que são adequadas, mas não oferece a minúcia proposta nos manuais mencionados anteriormente. Por fim, os livros Fale português (HARUMI DE PONCE et al., 2017) e Como está o seu português? (OTUKI DE PONCE, 2014OTUKI DE PONCE, M. Como está o seu português? São Paulo: HUB Editorial, 2014.) não apresentam nenhuma informação sobre pronúncia, o que fará com que o professor que adotá-los tenha que suplementar esse tópico com outros materiais. O guia de pronúncia apresentado neste artigo pode ser um recurso a ser utilizado para esse propósito.

Finalmente, observa-se que, embora o ensino de pronúncia não seja privilegiado em cursos de PLE, já existem livros, como Pois não (SIMÕES, 2008SIMÕES, A. Pois não: Brazilian Portuguese course for Spanish speakers, with basic reference grammar. Austin: University of Texas Press, 2008.) e Ponto de encontro: Portuguese as a world language (JOUËT-PASTRÉ et al., 2013a, 2013b) (juntamente com seu caderno de atividades), que dão a relevância necessária a esse tema. Espera-se que, no futuro, mais informações sobre o sistema fonético-fonológico do PB possam aparecer nas páginas dos novos materiais de PLE. Sem esse aspecto, o letramento de nossos alunos não será completo.

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  • SLADE, R.O. Bom dia, Brasil!: Português básico para estrangeiros. New Haven: Yale University Press, 2012.
  • 1
    Os símbolos fonéticos adotados neste artigo são os mesmos propostos por Cristófaro-Silva (2012).
  • 2
    “O som [ẽ] nunca ocorre em posição final de palavra; lá (nessa posição), ele é substituído pelo ditongo [ẽj].” (PERINI, 2004PERINI, M. A. Talking Brazilian: A Brazilian Portuguese pronunciation workbook. New Haven: Yale University Press, 2004., p. 53, tradução nossa).
  • 3
    Este é o único livro desta lista que foi publicado há mais de 10 anos. Contrariando os critérios de seleção dos demais materiais, ele foi mantido porque é o único desses manuais que é voltado especificamente para falantes de espanhol. Pareceu-nos interessante apresentar essa peculiaridade e verificar se isso interferiria na apresentação do sistema fonético-fonológico do PB.
  • 4
    Supõe-se que houve um problema de digitação e a palavra, na verdade, deveria apresentar acento gráfico: .

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Jul 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    03 Ago 2020
  • Aceito
    11 Jun 2021
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