Acessibilidade / Reportar erro

História, literatura e antropologia no Iluminismo tardio alemão

History, literature and anthropology in the German Late Enlightenment

Resumo

Ao analisar o drama Os bandoleiros (1781), de Friedrich Schiller, este artigo defende a tese segundo a qual o pensamento antropológico desenvolvido à época do iluminismo tardio alemão serve de fundamento não apenas para os discursos médico e historiográfico, mas também para uma parcela significativa da produção literária do período. Para tanto, na primeira seção deste artigo, investigam-se as bases de formação da cultura letrada e, particularmente, da cultura médica alemã na segunda metade do século XVIII, bem como as discussões à época vigentes em torno do conceito de antropologia. Na segunda e na terceira seções, discutem-se as tendências da pesquisa contemporânea que exploram os pontos de contato entre o conhecimento histórico, o pensamento antropológico e a produção literária no século das Luzes. Esses passos fundamentam a tese aqui defendida e segundo a qual o modo de representação literária operado por Schiller em Os bandoleiros é expressão direta do projeto de compreensão - em termos antropológicos - das totalidades integradas do homem e da história da humanidade.

Palavras-chave:
Antropologia literária; História universal; Iluminismo tardio alemão; Friedrich Schiller; Os bandoleiros (1781)

Abstract

In analyzing Friedrich Schiller’s The Robbers (1781), this article supports the thesis according to which the anthropological thought developed at the time of the German Late Enlightenment serves as a common ground not only to medical and historiographical discourses, but also to eighteenth-century literary production. In the first section, I investigate the foundations of the Enlightenment literary and medical cultures, as well as the debate on the concept of anthropology at that time. In the second and third sections I discuss contemporary research trends that explore points of contact between historical knowledge, anthropological thought and literary production in the Enlightenment. By doing so, this article concludes that Schiller’s representational strategies presented in The Robbers are a direct expression of the Enlightenment project which aims at understanding - in anthropological terms - the ‘whole of man’ and the whole history of mankind.

Keywords:
Literary anthropology; Universal History; German Late Enlightenment; Friedrich Schiller; The Robbers (1781)

O prefácio da primeira edição de Os bandoleiros, de Friedrich Schiller (1759-1805), apresenta os personagens do drama publicado anonimamente em 1781 como “uma cópia do mundo real” (Schiller 2004a: 485). Por meio desta fórmula, o autor confere valor à representação literária que opera por semelhança com a realidade humana, em detrimento das construções idealizadoras do substrato moral das figuras em cena. Todavia, por mais proveitosa que possa ser a análise das estratégias discursivas que retomam o núcleo clássico da teoria da representação,1 1 Sobre esta concepção clássica da representação, para a qual “o artista ‘imita’ a ‘forma exterior’ do objeto que está à sua frente, e o espectador, por seu turno, reconhece por essa ‘forma’ o ‘assunto’ da obra de arte” ou da representação literária, cf. Gombrich 1999: 1. No polo oposto a esta concepção localiza-se a tese de Nelson Goodman, segundo a qual a semelhança não é condição suficiente para a representação. Cf. Goodman 1976: 4. Recentemente, a tese de Goodman foi retomada por Frank Ankersmit com o objetivo de discutir a relação entre verdade e estilo nas teorias da representação. Cf. Ankersmit 2012: 76. é outro tipo de “cópia” que, nesse caso, permite-nos inicialmente explorar os pontos de contato entre gêneros discursivos distintos na Época das Luzes.

Na primeira cena do último ato de Os bandoleiros, a consciência do personagem Franz Moor - que tramara contra a família para assumir a posição reservada para o primogênito - é assaltada tanto pelo espírito dos mortos que se levantam dos túmulos, quanto pelo medo de que a noite se prolongasse até o dia do Juízo Final. “Franz. Não! Eu não estou tremendo! Foi apenas um sonho - Os mortos ainda não se levantaram - Quem disse que estou tremendo e pálido? Estou calmo e tranquilo” (Schiller 2004aSchiller, Friedrich. Sämtliche Werke in fünf Bänden. Bd I: Gedichte, Dramen 1. München: Deutscher Taschenbuch Verlag, 2004a.: 599).

No momento em que Schiller descreve a tentativa de Franz Moor de ocultar a resposta do corpo ao estado de espírito do personagem, o autor também se ocupava com a redação de uma tese de doutorado em medicina. Os dois textos foram escritos paralelamente, ao longo do ano de 1780, como relatado posteriormente por Schiller em correspondência privada ao amigo Christian Gottfried Körner (1756-1831) (cf. Alt 2000Alt, Peter-André. Schiller. Leben - Werk - Zeit. Erster Band. München: Beck, 2000.: 277; Robert 2011Robert, Jörg. Vor der Klassik. Die Ästhetik Schillers zwischen Karlsschule und Kant-Rezeption. Berlin: De Gruyter, 2011.: 55-93). No texto acadêmico, Schiller analisa como a dor do espírito prejudica o bem-estar do corpo (Schiller 2004b: 308). Para sustentar esta tese, o discurso médico apresenta o caso de um homem que, ao despertar de um sono intranquilo, é tomado por sensações confusas e se vê arrastado pela marcha lenta da razão. Aqui, o movimento de cópia do mundo real se identifica com um ato de transposição literária. “Moor: Não, eu não estou tremendo. Foi apenas um sonho - Os mortos ainda não se levantaram - Quem disse que estou tremendo e pálido? Estou calmo e tranquilo” (Schiller 2004b: 309).

As variações entre os dois fragmentos da obra de Schiller são mínimas. A mesma angústia apocalíptica descrita na cena ficcional e no relato analisado na tese médica opera como prova, em ambos os textos, da existência de uma relação direta entre o comportamento do corpo e as sensações do espírito. Tanto para os espectadores, quanto para os leitores de Os bandoleiros, o tema surge de forma ainda mais evidente no segundo ato, no momento em que o mesmo personagem, antes de perceber o avanço das tormentas já prenunciadas, indaga sobre as possibilidades de inverter a lógica das práticas médicas e, ao invés de prolongar, encurtar o tempo da vida de um homem.

Franz von Moor: [...] Filósofos e médicos me ensinam como é pertinente relacionar a disposição do espírito com os movimentos da máquina [do corpo]. As sensações convulsivas vêm sempre acompanhadas por uma dissonância nas vibrações mecânicas - as paixões maltratam a força vital. O espírito, sobrecarregado, pressiona o seu invólucro em direção ao chão [...] (Schiller 2004aSchiller, Friedrich. Sämtliche Werke in fünf Bänden. Bd I: Gedichte, Dramen 1. München: Deutscher Taschenbuch Verlag, 2004a.: 522).

O pensamento dos filósofos e médicos mencionados no drama de Schiller encontra-se referenciado explicitamente em seus escritos acadêmicos. Apoiando-se em teorias médico-filosóficas mais recentes, a tese preparada pelo autor alemão em 1780 e aprovada pela comissão de professores da faculdade de medicina da Karlsschule defende a existência de relações recíprocas entre a natureza animal do homem e aquela de ordem espiritual - a alma humana. Ao longo do texto, Schiller sustenta que os fenômenos corpóreos denunciam as sensações do espírito, assim como a apatia do espírito retarda os movimentos do corpo (Schiller 2004b: § 22 e 17, respectivamente). Eis o núcleo da teoria da natureza humana que ultrapassa as fronteiras de distintos gêneros literários da prosa iluminista. E a forma do conhecimento que anima tal teoria, bem como os dois textos redigidos em 1780, é a antropologia.

Por antropologia - ou ciência do homem - entende-se, aqui, a forma do conhecimento iluminista que tinha por objetivo descrever e explicar a origem das diferenças da variedade humana. E uma vez que tal procedimento explicativo partia, não raro, da constatação empírica de diferenças físicas e socioculturais entre povos distintos, os procedimentos analíticos privilegiados do conhecimento antropológico setecentista são a comparação e a analogia.

Partindo do caso de Friedrich Schiller, este artigo investiga como o pensamento antropológico desenvolvido à época do iluminismo tardio alemão, por meio de seus procedimentos analíticos, opera como fundamento não apenas dos discursos médico e literário, mas também de uma parcela significativa da produção historiográfica do período. Entretanto, apesar da variedade discursiva experimentada pela pena com a qual Schiller relaciona, em seus escritos médicos, a história dos indivíduos à história da humanidade (Schiller 2004b: § 10 e 11, respectivamente), aqui não se postula indistinções metodológicas ou formais entre os gêneros da cultura letrada do iluminismo. De fato, o que se pretende explorar são os pontos de conexão entre distintos gêneros discursivos no momento em que os campos disciplinares não se atinham aos limites traçados por rígidas fronteiras acadêmicas e miravam a possibilidade de investigar, por analogia, a conexão integradora entre as partes outrora apartadas do homem - a saber: corpo e alma - e as partes - a saber: os povos, em diferentes “estágios evolutivos” - da história da humanidade.

Na primeira seção deste artigo serão investigados os pressupostos operantes de tal conexão integradora, quais sejam: as bases de formação da cultura letrada e, particularmente, da cultura médica alemã na segunda metade do século XVIII, bem como as discussões à época vigentes em torno do conceito de antropologia. A segunda e a terceira seções dedicam-se às interações discursivas, ao apresentar as tendências da pesquisa contemporânea que exploram os pontos de contato entre o conhecimento histórico, o pensamento antropológico e a produção literária no século das Luzes. Esses passos fundamentam a tese aqui defendida e segundo a qual o modo de representação literária operado por Schiller em Os bandoleiros é expressão direta do projeto de compreensão - em termos antropológicos - das totalidades integradas do homem e da história da humanidade.

1 Formação do conceito

Por volta de 1750, os centros mais populosos do ducado de Württemberg eram Stuttgart, cidade na qual viviam cerca de 17 mil pessoas (Kirn 2012Kirn, Daniel. Stuttgart. In: Adam, Wolfgang; Westphal, Siegrid (eds.). Handbuch kultureller Zentren der Frühen Neuzeit. Städte und Residenzen im alten deutschen Sprachraum. Bd 3: Nürnberg - Würzburg. Berlin: De Gruyter, 2012, p. 1877-1917.: 1890), além de Tübingen e Ludwigsburg. Entre o primeiro e o último desses três núcleos urbanos, o duque Karl Eugen (1728-1793) ergue um castelo de caça, nas dependências do qual promove a fundação de uma escola superior com o objetivo de assegurar a formação adequada dos quadros militares e administrativos da corte local.

A chamada Karlsschule já foi apresentada, por estudos críticos mais recentes, como um símbolo eloquente das ambiguidades do absolutismo esclarecido. Por um lado, a vida cotidiana na academia era bastante militarizada, de tal forma que se procurava evitar o contato dos jovens alunos com seus familiares, além de se promover censura às correspondências de trato privado (Quarthal 1998Quarthal, Franz. Die “Hohe Carlsschule”. In: Jamme, Christoph; Pöggeler, Otto (eds.). “O Fürstin der Heimath! Glükliches Stutgard”. Politik, Kultur und Gesellschaft im deutschen Südwesten um 1800. Stuttgart: Klett-Cotta, 1998, p. 35-54.: 44). Por outro lado, a escola superior proporcionava aos jovens internos familiaridade com as mais recentes tendências científicas, literárias e políticas do período, sobretudo após a expansão institucional ocorrida ao longo das décadas seguintes àquela de sua fundação (cf. Hofmann 2003Hofmann, Michael. Schiller. Epoche - Werke - Wirkung. München: Beck, 2003.: 15-16; Alt 2000Alt, Peter-André. Schiller. Leben - Werk - Zeit. Erster Band. München: Beck, 2000.: 82). As marcas da ambiguidade constitutiva da Karlsschule são reforçadas, na historiografia, a partir da perspectiva de seu aluno mais conhecido, Friedrich Schiller, cuja visão crítica quanto à disciplina acadêmica e às obrigações militares locais (cf. Uhland 1953Uhland, Robert. Geschichte der Hohen Karlsschule in Stuttgart. Stuttgart: W. Kohlhammer Verlag, 1953.: VII) remonta a um episódio conhecido.

A despeito de suas ocupações médicas obrigatórias no ducado de Württemberg, Schiller segue rumo à cidade de Mannheim, no início de 1782, com o objetivo de assistir à estreia do drama Os bandoleiros. Mas, uma vez que o autor do drama não obtivera autorização do duque para deixar a região de Württemberg, Karl Eugen penaliza o jovem médico ao proibi-lo de escrever novas peças poéticas. No entanto, a força da pena de Schiller leva-o a abandonar, em definitivo e ilegalmente, o ducado no qual entrara em contato com novas correntes do pensamento médico e filosófico do Iluminismo tardio, ou seja, das correntes de pensamento que se consolidam nas últimas três décadas do século XVIII e se veem influenciadas pela proposta kantiana de superação do dualismo das substâncias. É justamente o estímulo à superação da lógica dualista que particulariza o período conhecido na historiografia como Iluminismo tardio (Alt 2007______. Aufklärung. Lehrbuch Germanistik. 3. Auflage. Stuttgart; Weimar: J. B. Metzler, 2007.: 7-10) e que motiva, assim, tanto a formação acadêmica, quanto a articulação da prosa literária e das ideias médicas de Schiller.

Na Karlsschule, Schiller acompanhara os cursos de filosofia ministrados por Jakob Friedrich Abel (1751-1829), sendo este o docente responsável, a partir de 1774, por ofertar as disciplinas de introdução à lógica, à moral e à metafísica, além de promover encontros acadêmicos relacionados à ontologia e à história da filosofia, bem como à estética e à psicologia (cf. Alt 2000Alt, Peter-André. Schiller. Leben - Werk - Zeit. Erster Band. München: Beck, 2000.; Safranski 2004Safranski, Rüdiger. Schiller oder die Erfindung des Deutschen Idealismus. München: Carl Hanser Verlag, 2004.; Riedel 1985Riedel, Wolfgang. Die Anthropologie des jungen Schiller. Zur Ideengeschichte der medizinischen Schriften und der “Philosophischen Briefe”. Würzburg: Königshausen und Neumann, 1985. ). No contexto universitário frequentado por Schiller, Abel enfrentava, no entanto, um problema de ordem bibliográfica, uma vez que os manuais de psicologia disponíveis no mercado editorial alemão se apresentavam incompletos, na visão do jovem professor. Por esse motivo, Abel decide publicar um texto atualizado e introdutório às questões relacionadas à doutrina da alma (Einleitung in die Seelenlehre, 1786). No prefácio do manual, Abel afirma que a psicologia não se vê abordada de forma satisfatória nas obras correntes, posto que a acertada antropologia de Ernst Platner (1744-1818) - da qual o autor extrai, de fato, boa parte de suas ideias levadas ao prelo (cf. Alt 2000: 126) - ainda não fora concluída, e o plano de Christopher Meiners (1747-1810) não se ocupa de toda a matéria (Abel 1786: VI-VII).

O texto publicado por Abel defende que o verdadeiro propósito de uma doutrina do homem é promover o conhecimento completo da espécie e, particularmente, da alma humana (Abel 1786: XXIX). Desse modo, as preleções frequentadas por Schiller na Karlsschule definem o campo de estudo da psicologia como parte integrante de uma doutrina ou ciência do homem (cf. Vidal 2011______. The Sciences of the Soul. The Early Modern Origins of Psychology. Chicago/London: The University of Chicago Press, 2011.: 128). Essa definição, todavia, é menos original do que o docente anuncia, e mais sintomática de uma época.

No contexto acadêmico do Iluminismo tardio germânico, Abel representa a tendência do pensamento filosófico para o qual a metafísica perde sua função orientadora, de modo a ceder espaço para a consolidação de uma ciência empírica do homem. Essa ciência resulta da busca por uma síntese harmônica entre filosofia e medicina (Riedel 1985Riedel, Wolfgang. Die Anthropologie des jungen Schiller. Zur Ideengeschichte der medizinischen Schriften und der “Philosophischen Briefe”. Würzburg: Königshausen und Neumann, 1985. : 3) e recebe o nome, nas últimas décadas do século XVIII, ora de psicologia, ora de antropologia (cf. Zammito 2002Zammito, John H. Kant, Herder, and the Birth of Anthropology. Chicago/London: The University of Chicago Press, 2002.: 238; Riedel 1985: 13).

Ainda que à época do Iluminismo tardio a psicologia possa ser definida como uma doutrina da alma (Seelenlehre)2 2 A análise aqui apresentada do conceito de antropologia iluminista foi parcialmente desenvolvida no seguinte trabalho: Araújo 2012: 99-110. Sobre a importância da psicologia para a cultura letrada setecentista, consulte-se ainda: Scheerer 1989: 1599-1653; Reill; Wilson 2004: 479-482; Vidal 1993: 89-119; Hatfield 1995: 184-231; Porter 1992: 431; Rousseau 1980: 143-210. - sendo este o termo utilizado por Abel em seus escritos (Abel 1786Abel, Jacob Friedrich. Einleitung in die Seelenlehre. Stuttgart: Bey Johann Benedikt Mezler, 1786.) -, seu programa deveria se basear “na observação e na experimentação, ocupando-se da alma apenas em sua relação com o corpo” (Vidal 2011______. The Sciences of the Soul. The Early Modern Origins of Psychology. Chicago/London: The University of Chicago Press, 2011.: 2). Nos manuais acadêmicos publicados no período, a expressão “doutrina da alma” (Seelenlehre), cunhada por Christian Wolff (1679-1754), competiu com outros termos. Esse é o caso, por exemplo, do termo antropologia (Anthropologie), por meio do qual igualmente se procurava ultrapassar os limites clássicos da scientia de anima e, assim, apresentar uma doutrina abrangente de todo o homem.

Apesar da presença do radical grego, o termo antropologia, no sentido de uma doutrina da natureza humana (doctrina humanae naturae), não deita raízes na antiguidade (cf. Marquard 1971Marquard, Odo. Anthropologie. In: Ritter, Joachim; Gründer, Karlfried; Gabriel, Gottfried (eds.). Historisches Wörterbuch der Philosophie. v. 1. Basel: Schwabe Verlag, 1971, cols. 362-374.). Nesta acepção, a palavra foi empregada pela primeira vez no início da Época Moderna, sobretudo nas obras de Magnus Hundt (1449-1519), Galeazzo Capella (1487-1532) e Otto Casmann (1562-1607). No sentido que o termo adquire, por exemplo, na obra de Casmann, a antropologia é compreendida a partir de uma perspectiva dualista, a saber: a psicologia antropológica de que se ocupa a primeira parte do estudo publicado em 1594 dedica-se à alma, enquanto que a segunda parte da mesma obra, impressa dois anos depois, ocupa-se do corpo, ou seja, da fisiologia e, particularmente, da anatomia humana (Zelle 2013Zelle, Carsten. Anthropologisches Wissen in der Aufklärung. In: Hofmann, Michael (ed.). Aufklärung. Epoche - Autoren - Werke. Darmstadt: Wissenschaftliche Buchgesellschaft, 2013, p. 191-207.: 192; Abel 1995______. Eine Quellenedition zum Philosophieunterricht an der Stuttgarter Karlsschule (1773-1782). Mit Einleitung, Übersetzung, Kommentar und Biographie herausgegeben von Wolfgang Riedel. Würzburg: Königshausen & Neumann, 1995.: 423; Godel 2007Godel, Rainer. Vorurteil - Anthropologie - Literatur. Der Vorurteilsdiskurs als Modus der Selbstaufklärung im 18. Jahrhundert. Tübingen: Max Niemeyer, 2007.: 42-43; Garber 2015Garber, Jörn, Anthropologie. In: Thoma, Heinz (ed.). Handbuch Europäische Aufklärung. Begriffe, Konzepte, Wirkung. Stuttgart: J. B. Metzler, 2015, p. 23-40.: 24). A esse tratamento dualista da natureza humana opõe-se uma concepção integrativa da ciência do homem defendida à época do Iluminismo tardio, sendo essa a proposta inovadora das correntes de pensamento marcadas pela superação do dualismo das substâncias.

De fato, no decurso do século XVIII, a antropologia se estabeleceu como um campo de conhecimento empírico que, no Sacro Império Romano Germânico, recebeu impulsos de novas abordagens das ciências da natureza e da vida, e foi moldado por uma linguagem popular-filosófica. Ao se firmar como “parte da resposta ao fracasso do paradigma mecanicista para incorporar as ciências da vida” (Zammito 2002Zammito, John H. Kant, Herder, and the Birth of Anthropology. Chicago/London: The University of Chicago Press, 2002.: 229), o pensamento antropológico passa a investigar todas as partes perceptivas e constitutivas do homem em relação recíproca, tal como defendido por Ernst Platner (1744-1818) na obra que servira de base para a introdução à doutrina da alma de Abel, na Karlsschule.

O título do volume publicado por Platner em 1772, Anthropologie für Aerzte und Weltweise, já revela o propósito conciliador dos interesses da antropologia setecentista: trata-se de uma ciência médico-filosófica (cf. Košenina 2001Košenina, Alexander. „Ernst Platner“. In: Neue Deutsche Biographie. Bd. 20. Berlin: Duncker & Humblot, p. 513-514, 2001.: 513-514),3 3 A filosofia do iluminismo alemão pode ser caracterizada nos termos incorporados na obra de Ernst Platner, a saber: como uma akademische Weltweisheit (cf. Schneiders 1985: 25-44; Schröder 2004: 531). no sentido a que Schiller fizera referência em Os bandoleiros, assim como também em sua tese de medicina. Para tal ciência, a integralidade do homem é definida nos termos de uma interação necessária, de um commercium mentis et corporis, ou seja, de relações recíprocas entre corpo e alma. A ideia central da antropologia de Platner - isto é, que “o conhecimento médico do corpo humano não pode se sustentar sem os conhecimento da psicologia, assim como a doutrina da alma se afirma ainda menos sem as observações e doutrinas médicas” -, foi assim sintetizada nas páginas do periódico Göttingischen Anzeigen von Gelehrten Sachen em uma resenha publicada por Johann Georg Heinrich Feder (1740-1821) (Feder 1772: 574), por sua vez, professor do segundo autor caracterizado por Abel como fundamental para a redação de sua introdução à doutrina da alma, a saber: Christopher Meiners. No texto assinado por Feder, afirma-se que a antropologia de Platner será altamente valorizada pelos leitores que já se encontram familiarizados com os princípios contemporâneos da verdadeira psicologia. E dentre esses leitores, destaca-se, sobretudo, o nome de Abel.

2 História e antropologia

Uma referência bibliográfica importante para os cursos de Jacob Friedrich Abel na Karlsschule não era apenas a adequada antropologia de Ernst Platner, mas também o plano incompleto de Christopher Meiners, professor em Göttingen que posteriormente convidaria Abel para fazer parte da instituição. Karl Eugen, no entanto, convence Abel a permanecer na Karlsschule (Abel 1995: 385). A obra incompleta a que Abel faz referência são os escritos de Meiners sobre a doutrina da alma. Nessa obra, Meiners torna a história das línguas individuais - e, portanto, uma singularidade humana associada às faculdades da alma - um objeto definido da história da humanidade. Assim, ao procurar dar aos eventos históricos uma forma significativa, Meiners passa da psicologia empírica para a história da humanidade, ocupando-se tanto com o surgimento, quanto com “a disseminação gradual do gênero humano, assim como também com as diferenças originárias de todos os povos no que concerne às suas habilidades físicas e mentais”, conforme o anúncio público de suas preleções universitárias.4 4 Cf. Göttingische Anzeigen von gelehrten Sachen, 157. Stück, 30. September 1784, p. 1568: “(…) sowohl die Entstehung u[nd] allmähliche Verbreitung des menschl[ichen] Geschlechts, als die ursprünglichen Verschiedenheiten aller Völker in Rücksicht auf ihre körperlichen u[nd] geistigen Anlagen.”

Não é novidade o fato de que a psicologia iluminista se dedica às faculdades físicas e mentais do homem. O que é notável no anúncio acadêmico feito por Meiners em 1784 é a clara aproximação da psicologia com a questão antropológica das diferenças originárias entre os representantes do gênero humano.5 5 A aproximação entre psicologia e história da humanidade não foi operada exclusivamente por Christopher Meiners. Também Friedrich August Carus (1770-1807) faz essa aproximação, diferenciando-se, no entanto, de Meiners, uma vez que este se atém - de acordo com a crítica pertinente de Carus - predominantemente aos aspectos externos da natureza humana (cf. Vidal 2011: 187-188). Nesse sentido, Meiners defende que o plano de trabalho das preleções universitárias que se ocupam com a psicologia e daquelas que se dedicam à História da humanidade têm pontos de contato, tais como a história do espírito humano e, consequentemente, as “investigações sobre os diferentes graus de cultura encontrados entre os povos” (Meiners 1785: *5v). De tais investigações, deriva-se a constatação de claro determinismo racial segundo a qual, no gênero humano, há raças não apenas mais desprovidas de virtudes, como também mais fracas no corpo e no espírito (Meiners 1785: **3v).6 6 O caso de Christopher Meiners é particular na produção historiográfica setecentista de Göttingen, uma vez que esse autor opera a explicação histórica nos termos de um determinismo racial. Nesse sentido, consulte-se Araújo 2012: 139-180. Ainda sobre as teorias racistas e a explicação histórica no século XVIII, cf. Demel 1992; sobre o caráter anti-humanístico de parte do pensamento antropológico alemão, no contexto, inclusive, da política imperialista do século XIX, consulte-se: Zimmerman 2001. “Essa transformação, que estendeu a psicologia empírica a civilizações passadas e povos ‘primitivos’ e reafirmou sua ruptura com a psicologia racional”, segundo Fernando Vidal, “ocorreu em um contexto no qual os estudos da antiguidade clássica e a história cultural e antropológica da humanidade começavam a tomar forma” (Vidal 2011: 185). Tanto é que o curso anunciado por Meiners em 1784 recebe um novo título, a partir do semestre de inverno de 1785/86, qual seja: História da humanidade. E assim como Abel prepara, nessa mesma época, um novo manual destinado à introdução da doutrina da alma para seus alunos na Karlsschule, também Meiners publica a primeira edição de seu esboço da História da humanidade (Grundriß der Geschichte der Menschheit, 1785), igualmente destinado ao público acadêmico. Nessa obra, Meiners retoma a tradição historiográfica fortemente influenciada no mercado editorial germânico por Isaak Iselin (1728-1782), cujo pioneirismo ganha destaque no prefácio do título publicado para auxiliar as preleções em Göttingen: “Em sua História da humanidade”, afirma Meiners, “Iselin tem o mérito de traçar, pela primeira vez, o plano básico desta ciência” - a saber: a construção de um pensamento predominantemente filosófico fundamentado, todavia, no conhecimento histórico - “e de chamar atenção do público alemão para o novo gênero” (Meiners 1793: 34-35).

No plano da obra apresentada por Iselin em 1764Iselin, Isaak. Ueber die Geschichte der Menschheit. Frankfurt und Leipzig: J. Heinrich Harscher, 1764., percebe-se, nas considerações psicológicas do gênero humano, a importância dada às sensações internas e às configurações do corpo para se compreender tanto o desenvolvimento humano (Iselin 1764: 30-33), quanto o desenvolvimento histórico da humanidade (Iselin 1764: 81-82). No entanto, sua conquista foi acertadamente caracterizada de forma distinta da tradição historiográfica iluminista associada à Universidade de Göttingen. Ao contrário dos professores de Göttingen, “Iselin nunca dominou o aparato crítico da historiografia”, como afirma Peter Hanns Reill. “Ele extraiu a maior parte de seu material histórico de relatos de viagem pouco confiáveis e incompletos”, de tal modo que os seus juízos sobre os mais diferentes povos podem ser caracterizados como ingênuos e superficiais (Reill 1975: 66).

De fato, o domínio metódico do aparato crítico da historiografia é uma característica central da produção historiográfica associada à Universidade de Göttingen à época do Iluminismo tardio (Araújo 2012Araújo, André de Melo. Weltgeschichte in Göttingen. Eine Studie über das spätaufklärerische universalhistorische Denken, 1756-1815. Bielefeld: transcript, 2012.: 57-95). Embora Christoph Meiners não tenha realizado trabalhos filológicos - como fez, por exemplo, seu colega August Ludwig (von) Schlözer (1735-1809) (cf. Araújo 2015) -, ele se aproximou de uma abordagem crítica das fontes a partir da comparação sistemática de uma grande quantidade de relatos de viagem, a que Meiners se dedicou cada vez mais no período de gestação de sua História da humanidade. Daí deriva, portanto, a base da crítica que Meiners apresenta à obra de Iselin, uma vez que ela se vale de um “número muito pequeno” de fontes (Meiners 1793: 35). De todo modo, a estrutura argumentativa tanto da História da humanidade proposta por Iselin, quanto daquela proposta por Meiners opera de forma semelhante. Os dois autores adotam as mesmas categorias para avaliar o progresso da história do gênero humano, quais sejam: sensorialidade, imaginação e razão. Trata-se de categorias que têm por referência a totalidade integrada do ser humano e que são aplicadas, por analogia, à totalidade igualmente integrada das sociedades humanas (im Hof 1947im Hof, Ulrich. Isaak Iselin. Sein Leben und die Entwicklung seines Denkens bis zur Abfassung der “Geschichte der Menschheit” von 1764. Basel: Benno Schwabe & Co., 1947.: 77; Gisi 2011aGisi, Lucas Marco. Die Parallelisierung von Ontogenese und Phylogenese als Basis einer “anthropologischen Historie” im 18. Jahrhundert. In: Bach, Thomas; Marino, Mario (eds.). Naturforschung und menschliche Geschichte. Heidelberg: Universitätsverlag Winter, 2011a, p. 41-59.; Gisi 2011b).

A comparação entre o desenvolvimento individual dos seres humanos e o desenvolvimento coletivo da humanidade é uma tônica dominante na Época das Luzes. Já em 1764, Iselin associara, por analogia, sensorialidade, imaginação e razão não apenas ao crescimento individual dos homens, mas também aos três estágios do desenvolvimento histórico da humanidade: o estado de natureza, o estado de barbárie e o estado civilizado (Iselin 1764: 81-87, 165-167; Iselin 1786: 3-9) - e é sobretudo nesses termos que se pode reconhecer a influência da perspectiva de análise histórica universal proposta por Iselin nos escritos de Meiners. Posteriormente, agora na mesma década em que Abel publica sua introdução à doutrina da alma e Meiners escreve uma História da humanidade, também Schiller opera por analogia, em sua tese de medicina, ao comparar a história dos indivíduos - da infância à vida adulta - com a história da humanidade, por sua vez marcada pelo avanço do predomínio das sensibilidades da alma em detrimento das sensações corporais (Schiller 2004b: 299-306). Dentro do campo discursivo das Histórias da humanidade, “Schiller desenvolveu um conceito independente de história que se movia na área de tensão da síntese ambivalente entre uma antropologia histórica e uma história antropológica” (Prüfer 2002Prüfer, Thomas. Die Bildung der Geschichte. Friedrich Schiller und die Anfänge der modernen Geschichtswissenschaft. Köln/Weimar/Wien: Böhlau, 2002.: 157). Todavia, é na História da humanidade publicada por Iselin que o vocabulário da antropologia - igualmente presente na tese de medicina defendida por Schiller em 1780 - ganha eficácia analítica. Nos termos formulados por Iselin, “o corpo seria um nódulo ineficaz sem a alma. [E] sem o corpo, a alma [...] não poderia satisfazer nenhuma, ou pelo menos poucas, de suas necessidades” (Iselin 1786: 40).

Ainda que não seja possível demonstrar que o princípio do commercium mentis et corporis se encontre realmente operacionalizado na obra de Iselin (cf. Gisi 2011b______. Die anthropologische Basis von Iselins Geschichtsphilosophie. In: Gisi, Lucas Marco; Rother, Wolfgang (eds.). Isaak Iselin und die Geschichtsphilosophie der europäischen Aufklärung. Basel: Schwabe, 2011b, p. 124-152.: 136), tal como propusera Schiller nos anos seguintes, o exame da relação entre corpo e alma no volume dedicado à história da humanidade revela o motivo pelo qual este título do mercado editorial germânico aparece classificado no léxico filosófico de Johann Georg Walch (1693-1775) sob o conceito de “antropologia”, ao lado do trabalho fundamental de Ernst Platner (Walch 1775: 173). Além disso, o primeiro volume da obra de Iselin dedica-se às preocupações da antropologia iluminista: assim como na tese de Schiller, também aqui se traça uma história do desenvolvimento da humanidade apoiada no caminho que parte da predominância das sensações corporais em direção à predominância da razão. Nesse sentido, Iselin afirma que uma criança e um selvagem se igualam nos desejos incipientes do espírito, e que são mais inclinados às atividades do corpo do que aos pensamentos elevados da filosofia (Iselin 1764: 216). Mas para além do caminho compartilhado entre os dois autores, Schiller avança com a proposta ao destacar, em sua prosa literária, como que as relações recíprocas entre os movimentos do corpo e a disposição do espírito são animadas por uma “força vital” (Schiller 2004a: 522).

No campo de estudo das ciências da vida à época do Iluminismo, firma-se a tese de Wolf Lepenies segundo a qual o modelo de conhecimento da antropologia setecentista se localiza entre a tradição da História natural e o advento das teorias evolucionistas a partir de meados do século XIX (Lepenies 1980: 223-224). No entanto, ao invés de apenas destacar o processo de temporalização da linguagem da natureza - como sugere a formulação clássica de Lepenies (Lepenies 1976) -, Peter Hanns Reill sustenta que as categorias analíticas que organizaram o conhecimento das ciências da natureza e da vida ao final do século XVIII encontram fundamento em uma teoria denominada vitalista que, por sua vez, manifesta-se claramente na tese de Schiller (Reill 2005: 150-151). Tal teoria confere destaque à força vital impulsionadora da interação necessária entre as partes integradoras da matéria viva. E uma vez que os “pensadores iluministas nunca conceberam separar as humanidades do estudo da natureza” e da vida (Reill 2005: 2), pode-se ainda afirmar que há três níveis de significado associados ao conceito de antropologia que, postos em interação, passam a conferir sentido à totalidade do homem e à totalidade do mundo histórico na época do Iluminismo tardio. Trata-se da antropologia física, segundo a qual a classificação das variedades humanas ocorre no âmbito de um sistema da natureza; da antropologia filosófica que se dedica, por um lado, às relações recíprocas entre corpo e alma - commercium mentis et corporis - e, por outro, a princípios gerais ou universais da humanidade; e da antropologia etnográfica, através da qual a diversidade de povos foi particularmente observada e descrita de acordo com suas respectivas características culturais (cf. Bödeker 2001Bödeker, Hans Erich. Anthropologie. In: Schneiders, Werner (ed.). Lexikon der Aufklärung. Deutschland und Europa. München: Beck, 2001, p. 38-39.; van Hoorn 2004van Hoorn, Tanja. Dem Leibe abgelesen. Georg Forster im Kontext der physischen Anthropologie des 18. Jahrhunderts. Tübingen: Max Niemeyer Verlag, 2004.: 1; Linden 1976Linden, Mareta. Untersuchungen zum Anthropologiebegriff des 18. Jahrhunderts. Frankfurt a.M.: Peter Lang, 1976.: 111; Zammito 2002Zammito, John H. Kant, Herder, and the Birth of Anthropology. Chicago/London: The University of Chicago Press, 2002.: 235-236).

Considerando-se (a) a interação necessária entre as partes integradoras da matéria viva e (b) os três níveis de significado relacionados ao conceito de antropologia, deve-se ainda investigar como diferentes gêneros da cultura letrada iluminista compartilham o mesmo fundamento, qual seja: as operações do pensamento antropológico ou da ciência do homem setecentista por meio das quais se procurou tanto explicar a origem das diferenças da variedade humana, quanto definir a natureza da relação que se verifica entre as manifestações do corpo e as sensações do espírito. Pretende-se, na última seção deste artigo, explorar uma proposta mais recente dos estudos literários germanistas em função da qual se pode relacionar as produções historiográfica e ficcional do Iluminismo tardio a partir de uma perspectiva da história do conhecimento.

3 Antropologia e literatura

O pensamento antropológico setecentista foi recentemente definido como “uma característica estrutural do Iluminismo europeu” (Bödeker; Büttgen; Espagne 2008Bödeker, Hans Erich; Büttgen, Philippe; Espagne, Michel. Die “Wissenschaft vom Menschen” in Göttingen um 1800. Skizze der Fragestellung. In: Bödeker, Hans Erich; Büttgen, Philippe; Espagne, Michel (eds.). Die Wissenschaft vom Menschen in Göttingen um 1800. Wissenschaftliche Praktiken, institutionelle Geographie, europäische Netzwerke. Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 2008, p. 11-20.: 12). No momento em que a historiografia apresentava, nesses termos, o fundamento de parte significativa do conhecimento impresso durante as últimas décadas do século das Luzes, também os estudos literários se dedicavam com afinco crescente à perspectiva de pesquisa denominada “antropologia literária” (cf. Košenina 2008_______. Literarische Anthropologie. Die Neuentdeckung des Menschen. Berlin: Akademie Verlag, 2008.; Košenina 2016a). Na verdade, já desde o início da década de 1990, os estudos germanísticos ressaltam a importância de se considerar o projeto de compreensão da totalidade integrada do homem ao se investigar a produção literária setecentista (cf. Schings 1994Schings, Hans-Jürgen (ed.). Der ganze Mensch. Anthropologie und Literatur im 18. Jahrhundert. DFG Symposium 1992. Stuttgart/Weimar: J.B. Metzler, 1994.; Riedel 1994_______. Anthropologie und Literatur in der deutschen Spätaufklärung. Skizze einer Forschungslandschaft. In: Internationales Archiv für Sozialgeschichte der deutschen Literatur. Sonderheft 6, 1994, p. 93-157.). E é a partir desta perspectiva de pesquisa que a prosa ficcional e o projeto iluminista de compreensão da história da humanidade se aproximam.

Considerando-se, em perspectiva histórica, os estudos dedicados à prosa ficcional iluminista publicados até o início dos anos 2000, Peter-André Alt identifica forte predileção conferida por pesquisadores e pesquisadoras ora ao romance, ora ao drama setecentista, em detrimento de gêneros literários menos extensos (Alt 2007: 302). Todavia, ao constatar que a diversidade morfológica das manifestações literárias de menor extensão foi acelerada pelas transformações midiáticas ocorrida ao final do século XVIII - cujo resultado mais sensível para a produção literária foi a ampliação do consumo de textos curtos veiculados na imprensa periódica -, Alexander Košenina e Carsten Zelle publicaram, em 2011_______; Zelle, Carsten (eds.). Kleine anthropologische Prosaformen der Goethezeit (1750-1830). Hannover: Wehrhahn, 2011., os trabalhos apresentados em um congresso cujo propósito era incentivar novos estudos dedicados às formas breves da prosa antropológica do Iluminismo tardio e, assim, equilibrar o quadro desenhado por Alt. De fato, esta obra coletiva procura identificar pontos de contato entre o paradigma da “antropologia literária” e “a questão das formas de representação do conhecimento médico-antropológico” (Košenina; Zelle 2011: VII).

O paradigma da antropologia literária posto em destaque por Košenina e Zelle é aquele que se encontra presente nas teses assinadas por Jakob Friedrich Abel e defendidas por Friedrich Schiller na Karlsschule ao final de 1776 (cf. Abel 1995: 428-430), teses estas configuradas em termos semelhantes àqueles com os quais Ernst Platner conceituara em 1772 a nova antropologia e adotadas, em 1780, no trabalho de medicina escrito pelo autor do drama Os bandoleiros (cf. Theopold 1967Theopold, Wilhelm. Der Herzog und die Heilkunst. Die Medizin an der Hohen Carlsschule zu Stuttgart. Köln/Berlin: Deutscher Ärzte-Verlag, 1967.: 150). No enredo teatral, Schiller deixa transparecer nas manifestações corporais dos personagens a verdadeira expressão dos seus estados de espírito. Como já vimos, a consciência intranquila do personagem Franz Moor frente às suas ações se deixa observar, por leitores e espectadores da cena, nos tremores do corpo ou na palidez da face (Schiller 2004a: 599). Com efeito, o drama já se inicia com a constatação de que o espírito do patriarca teme o presente e o futuro, uma vez que o conde Maximilian Moor, na percepção premonitória de seu filho Franz, mostra-se em cena sem cor no semblante. As notícias comprometedoras que a família receberia sobre o desvio moral do primogênito Karl em terras distantes - notícias estas forjadas por Franz -, não seriam suportáveis, com o espírito assim enfraquecido, para o corpo igualmente debilitado do patriarca (Schiller 2004a: 493). Em todo o drama, a relação direta entre o estado de espírito dos agentes dramáticos centrais de Os bandoleiros e suas manifestações corporais contribui para a caracterização dos personagens, sendo este um procedimento literário que não era exclusivo à pena de Schiller.

Marcada pela presença crescente de metáforas anatômicas e pela condução narrativa de uma operação da alma dos personagens, a prosa literária setecentista acaba por dar importância à reação fisiológica dos agentes da trama à variação de seus sentimentos. Assim, tanto nas formas mais curtas, quanto no romance, a história interior dos personagens assume o protagonismo e ganha visibilidade corporal na cena. Antes mesmo da publicação do texto de Schiller, o público-leitor alemão já se encontrava familiarizado com procedimentos narrativos semelhantes presentes no sucesso literário intitulado Os sofrimentos do jovem Werther. No romance de Johann Wolfgang Goethe (1749-1832), publicado em 1774, a trama se desenvolve ao apresentar a desintegração completa da harmonia espiritual de Werther, de forma a resultar, consequentemente, na prostração absoluta de seu corpo. E esse estado - que já transparecia nos sonhos intranquilos do protagonista do romance (Goethe 1998: 71)7 7 Sobre as situações de fronteira que obrigam o leitor a desconfiar dos limites estabelecidos entre o sonho e a alucinação na prosa literária setecentista, cf. Košenina 2016b. - comprometeu a alma de Werther (Goethe 1998: 124). De modo análogo, em Os bandoleiros, as preocupações médicas de Schiller se expressam na constatação de Franz Moor segundo a qual o estado doentio do corpo perturba o funcionamento regular da mente, resultando em sonhos extravagantes (Schiller 2004a: 600). Ao longo do drama, Franz constata que o corpo humano se deteriora em função do débil estado de espírito (Schiller 2004a: 522). E é nesse sentido que a “relação entre antropologia e ficção opera na forma narrativa, caracteriza o tipo de representação dos caracteres, liga vida interior e exterior” (Košenina; Zelle 2011_______; Zelle, Carsten (eds.). Kleine anthropologische Prosaformen der Goethezeit (1750-1830). Hannover: Wehrhahn, 2011.: XII), segundo a tendência contemporânea de pesquisa dos estudos literários germânicos que se ocupa com a antropologia literária. Na verdade, o que se desloca para o centro de interesse dos estudos germanísticos, nas últimas décadas, é o princípio do conhecimento que impulsiona a produção literária setecentista ao conjugar os três níveis de significado associados ao conceito de antropologia iluminista, a saber: a antropologia física, a antropologia filosófica e a antropologia etnográfica.

Dessa forma, Carsten Zelle avalia, por exemplo, a coleção de sonhos organizada por Johann Gottlob Krüger (1715-1759) na década de 1750. Nessa coleção de sonhos, retoma-se “o conhecimento das primeiras obras etnográficas do Iluminismo europeu [...], integrando-o à feitura” dos textos, segundo o germanista. Krüger “populariza esse conhecimento e, assim, abre os olhos de seu público para ‘tous les Peuples du Monde’”, ou seja, para toda a humanidade (Zelle 2014: 56). Nessa direção, também Sebastian Kaufmann ressalta, mais recentemente, que não apenas o projeto de estudo das relações recíprocas entre corpo e alma - commercium mentis et corporis - encontra-se ligado à estética por volta de 1800, mas também outro ramo da antropologia iluminista, a saber, aquele “que lida com a comparação sistemática entre os povos” (Kaufmann 2014: 184).

Ao longo do século XVIII, a Universidade de Göttingen se estabeleceu como um importante centro de interesse etnográfico,8 8 Parte desse raciocínio foi desenvolvido, com mais detalhes, em: ARAÚJO 2016. de forma a privilegiar a comparação sistemática entre os povos a partir de evidências etnográficas de natureza distintas e, igualmente, a promover a conjunção dos três níveis de significado, acima mencionados, associados ao conceito de antropologia iluminista. A variedade das evidências que fizeram da Universidade de Göttingen uma instituição privilegiada no cenário acadêmico europeu ocupava espaço tanto nas prateleiras de livros, quanto na coleção de objetos e vestígios deixados pela espécie humana. Tanto é que entre os anos de 1783 e 1787 a biblioteca da universidade foi ampliada com o objetivo de prover espaço para o número crescente de títulos lançados no mercado editorial de descrições de viagens (cf. Kind-Doerne 1986Kind-Doerne, Christiane. Die Niedersächsische Staats- und Universitätsbibliothek Göttingen. Ihre Bestände und Einrichtungen in Geschichte und Gegenwart. Wiesbaden: Otto Harrassowitz, 1986.; Fabian 1980Fabian, Berhard. Die Göttinger Universitätsbibliothek im achtzehnten Jahrhundert. In: Göttinger Jahrbuch. Göttingen: Heinz Reise-Verlag, 1980, p. 109-123.). Em correspondência privada, Georg Forster (1754-1794), viajante cujo relato impresso sobre os povos do pacífico sul já figurava nas prateleiras em Göttingen e que trouxera a bordo objetos de povos distantes que passaram a fazer parte da coleção do Museu Acadêmico Real da mesma universidade, define como privilegiada a condição de trabalho daqueles que se encontravam na cidade alemã. De próprio punho, Forster ressalta a importância do “[...] material que [Christopher] Meiners teve à disposição para escrever o seu plano de uma história da humanidade” (Forster 1978: 617-618).

O projeto de Meiners, claramente marcado por uma lógica de determinismo racial, dedica-se à gênese e ao progresso do gênero humano (origines et progressus generis humani) tendo em vista suas diferentes estruturas físicas e mentais (animi et corporis diuersitates).9 9 Cf. Catalogvs praelectionvm pvblice et privatim in academia Georgia Avgvsta per hibernvm semester. Gottingae: Litteris Joh. Christian Dieterich, 1784, p. VII. Mas não é nos termos moralmente comprometedores desse projeto que os interesses da psicologia empírica e do pensamento antropológico ganham espaço na literatura. Na prosa literária do Iluminismo tardio, a valorização da conexão integradora entre as partes outrora apartadas do homem e as unidades desconectadas da história da humanidade se justifica pela necessidade crescente de representar a vida interior dos personagens de forma autêntica e verossímil.

Em Os bandoleiros, Franz Moor aprende com filósofos e médicos “como é pertinente relacionar a disposição do espírito com os movimentos” do corpo (Schiller 2004aSchiller, Friedrich. Sämtliche Werke in fünf Bänden. Bd I: Gedichte, Dramen 1. München: Deutscher Taschenbuch Verlag, 2004a.: 522). Tal relação é valorizada por Schiller à medida que o autor explora gêneros discursivos distintos com o objetivo de fazer cumprir o que se anuncia no prefácio do drama publicado em 1781, a saber: que seus personagens são “uma cópia do mundo real” (Schiller 2004a: 485). Nesses termos, Schiller opera não apenas um ato de transposição literária, mas também o corpo e a alma das figuras em cena, valendo-se, portanto, dos princípios que serviram de fundamento, à época do Iluminismo tardio, à antropologia ou à ciência do homem. Assim, o modo de representação literária levado adiante por Schiller em Os bandoleiros pode ser visto como expressão direta do projeto de compreensão - em termos antropológicos - das totalidades integradas do homem e da história da humanidade. É a identidade desse projeto de conhecimento, a despeito das diferenças dos gêneros discursivos da cultura letrada setecentista, que permite o ato de transposição literária operado, paradigmaticamente, pela pena de Schiller. Trata-se de um projeto aberto à contaminação de formas literárias distintas e avesso às rígidas fronteiras acadêmicas que seccionam ora o homem, ora a história da humanidade em partes inertes da matéria viva.

Referências bibliográficas

  • Abel, Jacob Friedrich. Einleitung in die Seelenlehre. Stuttgart: Bey Johann Benedikt Mezler, 1786.
  • ______. Eine Quellenedition zum Philosophieunterricht an der Stuttgarter Karlsschule (1773-1782). Mit Einleitung, Übersetzung, Kommentar und Biographie herausgegeben von Wolfgang Riedel. Würzburg: Königshausen & Neumann, 1995.
  • Alt, Peter-André. Schiller. Leben - Werk - Zeit. Erster Band. München: Beck, 2000.
  • ______. Aufklärung. Lehrbuch Germanistik. 3. Auflage. Stuttgart; Weimar: J. B. Metzler, 2007.
  • Ankersmit, Frank. Meaning, Truth, and Reference in Historical Representation. Ithaca: Cornell University Press, 2012.
  • Araújo, André de Melo. Weltgeschichte in Göttingen. Eine Studie über das spätaufklärerische universalhistorische Denken, 1756-1815. Bielefeld: transcript, 2012.
  • ______. A verdade da crítica. O método histórico-crítico de August Ludwig (von) Schlözer e o padrão histórico dos juízos. História da Historiografia, v. 8, n. 18, 2015, p. 93-109.
  • ______. Visuelle Evidenz. Materielle Zeugnisse und Visualisierungsstrategien als wissenschaftliche Grundlage des weltumfassenden historischen Denkens im Göttingen der Spätaufklärung. In: Bremer, Thomas (ed). Materialitätsdiskurse der Aufklärung. Bücher - Dinge - Praxen. Halle an der Saale: Universitätsverlag Halle-Wittenberg, p. 2016, p. 187-217.
  • Bödeker, Hans Erich. Anthropologie. In: Schneiders, Werner (ed.). Lexikon der Aufklärung. Deutschland und Europa. München: Beck, 2001, p. 38-39.
  • Bödeker, Hans Erich; Büttgen, Philippe; Espagne, Michel. Die “Wissenschaft vom Menschen” in Göttingen um 1800. Skizze der Fragestellung. In: Bödeker, Hans Erich; Büttgen, Philippe; Espagne, Michel (eds.). Die Wissenschaft vom Menschen in Göttingen um 1800. Wissenschaftliche Praktiken, institutionelle Geographie, europäische Netzwerke. Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 2008, p. 11-20.
  • Demel, Walter. Wie die Chinesen gelb wurden. Ein Beitrag zur Frühgeschichte der Rassentheorien. Historische Zeitschrift, v. 255, n. 1, 1992, p. 625-666.
  • Fabian, Berhard. Die Göttinger Universitätsbibliothek im achtzehnten Jahrhundert. In: Göttinger Jahrbuch. Göttingen: Heinz Reise-Verlag, 1980, p. 109-123.
  • Feder, Johann Georg Heinrich. [Rezension zu] D. Ernst Plattners der Arzeneyk. Prof. Anthropologie für Aerzte und Weltweise. In der Dyckischen Buchhandlung 1772. Erster Theil, 292 S. 8. In: Göttingische Anzeigen von Gelehrten Sachen. 67. Stück, 14. Junius 1772, p. 571-574.
  • Forster, Georg. Georg Forsters Werke. Sämtliche Schriften, Tagebücher, Briefe. v. 14: Briefe 1784 - Juni 1787. Berlin: Akademie Verlag, 1978.
  • Garber, Jörn, Anthropologie. In: Thoma, Heinz (ed.). Handbuch Europäische Aufklärung. Begriffe, Konzepte, Wirkung. Stuttgart: J. B. Metzler, 2015, p. 23-40.
  • Gisi, Lucas Marco. Die Parallelisierung von Ontogenese und Phylogenese als Basis einer “anthropologischen Historie” im 18. Jahrhundert. In: Bach, Thomas; Marino, Mario (eds.). Naturforschung und menschliche Geschichte. Heidelberg: Universitätsverlag Winter, 2011a, p. 41-59.
  • ______. Die anthropologische Basis von Iselins Geschichtsphilosophie. In: Gisi, Lucas Marco; Rother, Wolfgang (eds.). Isaak Iselin und die Geschichtsphilosophie der europäischen Aufklärung. Basel: Schwabe, 2011b, p. 124-152.
  • Godel, Rainer. Vorurteil - Anthropologie - Literatur. Der Vorurteilsdiskurs als Modus der Selbstaufklärung im 18. Jahrhundert. Tübingen: Max Niemeyer, 2007.
  • Goethe, Johann Wolfgang. Die Leiden des jungen Werther. Frankfurt am Main: Insel Verlag, 1998 [1774].
  • Gombrich, E. H. Meditações sobre um Cavalinho de Pau ou as Raízes da Forma Artística. In: Gombrich, E. H. Meditações sobre um Cavalinho de Pau e Outros Ensaios sobre a Teoria da Arte. São Paulo: EDUSP, 1999, p. 1-11.
  • Goodman, Nelson. Languages of Art. An Approach to a Theory of Symbols. Indianapolis/Cambridge: Hackett Publishing Company, 1976.
  • Hatfield, Gary. Remaking the Science of Mind. Psychology as Natural Science. In: Fox, Christopher; Porter, Roy; Wokler, Robert (eds.). Inventing Human Science. Eighteenth-Century Domains. Berkeley/Los Angeles: University of California Press, 1995, p. 184-231.
  • Hofmann, Michael. Schiller. Epoche - Werke - Wirkung. München: Beck, 2003.
  • im Hof, Ulrich. Isaak Iselin. Sein Leben und die Entwicklung seines Denkens bis zur Abfassung der “Geschichte der Menschheit” von 1764. Basel: Benno Schwabe & Co., 1947.
  • Iselin, Isaak. Ueber die Geschichte der Menschheit. Frankfurt und Leipzig: J. Heinrich Harscher, 1764.
  • _____. Über die Geschichte der Menschheit. 5. Auflage. Basel: Johann Schweighauser 1786.
  • Kaufmann, Sebastian. “Was ist der Mensch, ehe die Schönheit die freie Lust ihm entlockt?” Völkerkundliche Anthropologie und ästhetische Theorie in Kants Kritik der Urteilskraft und Schillers Briefen Über die ästhetische Erziehung des Menschen. In: Hermes, Stefan; Kaufmann, Sebastian (eds.). Der ganze Mensch - die ganze Menschheit. Völkerkundliche Anthropologie, Literatur und Ästhetik um 1800. Berlin: De Gruyter, 2014, p. 183-211.
  • Kind-Doerne, Christiane. Die Niedersächsische Staats- und Universitätsbibliothek Göttingen. Ihre Bestände und Einrichtungen in Geschichte und Gegenwart. Wiesbaden: Otto Harrassowitz, 1986.
  • Kirn, Daniel. Stuttgart. In: Adam, Wolfgang; Westphal, Siegrid (eds.). Handbuch kultureller Zentren der Frühen Neuzeit. Städte und Residenzen im alten deutschen Sprachraum. Bd 3: Nürnberg - Würzburg. Berlin: De Gruyter, 2012, p. 1877-1917.
  • Košenina, Alexander. „Ernst Platner“. In: Neue Deutsche Biographie. Bd. 20. Berlin: Duncker & Humblot, p. 513-514, 2001.
  • _______. Literarische Anthropologie. Die Neuentdeckung des Menschen. Berlin: Akademie Verlag, 2008.
  • _______; Zelle, Carsten (eds.). Kleine anthropologische Prosaformen der Goethezeit (1750-1830). Hannover: Wehrhahn, 2011.
  • _______ (ed.). Literarische Anthropologie. Grundlagentexte zur “Neuentdeckung des Men schen”. Berlin/Boston: De Gruyter, 2016a.
  • _______. Die dunkle Macht in uns: Der Sandmann als medizinische Fallgeschichte. In: Jahraus, Oliver (ed.). Zugänge zur Literaturtheorie. 17 Modellanalysen zu E. T. A. Hoffmanns Der Sandmann. Stuttgart: Reclam, 2016b, p. 197-211.
  • Lepenies, Wolf. Das Ende der Naturgeschichte. Wandel kultureller Selbstverständlichkeiten in den Wissenschaften des 18. und 19. Jahrhunderts. München: Hanser Verlag, 1976.
  • _______. Naturgeschichte und Anthropologie im 18. Jahrhundert. In: Fabian, Bernhard; Schmidt-Biggemann, Wilhelm; Vierhaus, Rudolf (eds.). Deutschlands kulturelle Entfaltung. Die Neubestimmung des Menschen. München: Kraus International Publications, 1980, p. 211-226.
  • Linden, Mareta. Untersuchungen zum Anthropologiebegriff des 18. Jahrhunderts. Frankfurt a.M.: Peter Lang, 1976.
  • Marquard, Odo. Anthropologie. In: Ritter, Joachim; Gründer, Karlfried; Gabriel, Gottfried (eds.). Historisches Wörterbuch der Philosophie. v. 1. Basel: Schwabe Verlag, 1971, cols. 362-374.
  • Meiners, Christoph. Grundriß der Geschichte der Menschheit. Lemgo: Im Verlage der Meyerschen Buchhandlung, 1785.
  • ______. Grundriß der Geschichte der Menschheit. 2. Ausgabe. Lemgo: Im Verlage der Meyerschen Buchhandlung, 1793.
  • Porter, Roy. Psychology. In: Yolton, John W.; Porter, Roy; Rogers, Pat; Stafford, Barbara Maria (eds.). The Blackwell Companion to the Enlightenment. Oxford: Blackwell, 1992.
  • Prüfer, Thomas. Die Bildung der Geschichte. Friedrich Schiller und die Anfänge der modernen Geschichtswissenschaft. Köln/Weimar/Wien: Böhlau, 2002.
  • Quarthal, Franz. Die “Hohe Carlsschule”. In: Jamme, Christoph; Pöggeler, Otto (eds.). “O Fürstin der Heimath! Glükliches Stutgard”. Politik, Kultur und Gesellschaft im deutschen Südwesten um 1800. Stuttgart: Klett-Cotta, 1998, p. 35-54.
  • Reill, Peter Hanns. The German Enlightenment and the Rise of Historicism. Berkeley: University of California Press, 1975.
  • ______. Vitalizing Nature in the Enlightenment. Berkeley; Los Angeles; London: University of California Press, 2005.
  • Reill, Peter Hanns; Wilson, Ellen Judy (eds.). Encyclopedia of the Enlightenment. Revised Edition. New York: Facts on File, 2004.
  • Riedel, Wolfgang. Die Anthropologie des jungen Schiller. Zur Ideengeschichte der medizinischen Schriften und der “Philosophischen Briefe”. Würzburg: Königshausen und Neumann, 1985.
  • _______. Anthropologie und Literatur in der deutschen Spätaufklärung. Skizze einer Forschungslandschaft. In: Internationales Archiv für Sozialgeschichte der deutschen Literatur. Sonderheft 6, 1994, p. 93-157.
  • Robert, Jörg. Vor der Klassik. Die Ästhetik Schillers zwischen Karlsschule und Kant-Rezeption. Berlin: De Gruyter, 2011.
  • Rousseau, G. S. Psychology. In: Rousseau, G. S.; Porter, Roy (eds.). The Ferment of Knowledge. Studies in the Historiography of Eighteenth-Century Science. Cambridge: Cambridge University Press, 1980, p. 143-210.
  • Safranski, Rüdiger. Schiller oder die Erfindung des Deutschen Idealismus. München: Carl Hanser Verlag, 2004.
  • Scheerer, Eckart. Psychologie. In: Ritter, Joachim; Gründer, Karlfried; Gabriel, Gottfried (eds.). Historisches Wörterbuch der Philosophie. v. 7, Basel: Schwabe Verlag, 1989, p. 1599-1653.
  • Schiller, Friedrich. Sämtliche Werke in fünf Bänden. Bd I: Gedichte, Dramen 1. München: Deutscher Taschenbuch Verlag, 2004a.
  • ______. Sämtliche Werke in fünf Bänden. Bd V: Erzählungen, Theoretische Schriften. München: Deutscher Taschenbuch Verlag, 2004b.
  • Schings, Hans-Jürgen (ed.). Der ganze Mensch. Anthropologie und Literatur im 18. Jahrhundert. DFG Symposium 1992. Stuttgart/Weimar: J.B. Metzler, 1994.
  • Schneiders, Werner. Akademische Weltweisheit. Die deutsche Philosophie im Zeitalter der Aufklärung. In: Sauder, Gerhard; Schlobach, Jochen (eds.). Aufklärungen. Frankreich und Deutschland im 18. Jahrhundert. v. 1, Heidelberg: Carl Winter, 1985, p. 25-44.
  • Schröder, Winfried. Weltweisheit. In: Ritter, Joachim; Gründer, Karlfried; Gabriel, Gottfried (eds.). Historisches Wörterbuch der Philosophie. v. 12. Basel: Schwabe Verlag, 2004, cols. 531-534.
  • Theopold, Wilhelm. Der Herzog und die Heilkunst. Die Medizin an der Hohen Carlsschule zu Stuttgart. Köln/Berlin: Deutscher Ärzte-Verlag, 1967.
  • Uhland, Robert. Geschichte der Hohen Karlsschule in Stuttgart. Stuttgart: W. Kohlhammer Verlag, 1953.
  • van Hoorn, Tanja. Dem Leibe abgelesen. Georg Forster im Kontext der physischen Anthropologie des 18. Jahrhunderts. Tübingen: Max Niemeyer Verlag, 2004.
  • Vidal, Fernando. Psychology in the 18th century: a view from encyclopaedias. History of the Human Sciences. v. 6, n. 1, 1993, p. 89-119.
  • ______. The Sciences of the Soul. The Early Modern Origins of Psychology. Chicago/London: The University of Chicago Press, 2011.
  • Walch, Johann Georg. Philosophisches Lexicon. Leipzig: Gleditische Buchhandlung, 1775.
  • Zammito, John H. Kant, Herder, and the Birth of Anthropology. Chicago/London: The University of Chicago Press, 2002.
  • Zelle, Carsten. Anthropologisches Wissen in der Aufklärung. In: Hofmann, Michael (ed.). Aufklärung. Epoche - Autoren - Werke. Darmstadt: Wissenschaftliche Buchgesellschaft, 2013, p. 191-207.
  • ______. Johann Gottlob Krügers ethnologische Träume. In: Hermes, Stefan; Kaufmann, Sebastian (eds.). Der ganze Mensch - die ganze Menschheit. Völkerkundliche Anthropologie, Literatur und Ästhetik um 1800. Berlin: De Gruyter, 2014, p. 37-56.
  • Zimmerman, Andrew. Anthropology and Antihumanism in Imperial Germany. Chicago/ London: The University of Chicago Press, 2001.
  • 1
    Sobre esta concepção clássica da representação, para a qual “o artista ‘imita’ a ‘forma exterior’ do objeto que está à sua frente, e o espectador, por seu turno, reconhece por essa ‘forma’ o ‘assunto’ da obra de arte” ou da representação literária, cf. Gombrich 1999Gombrich, E. H. Meditações sobre um Cavalinho de Pau ou as Raízes da Forma Artística. In: Gombrich, E. H. Meditações sobre um Cavalinho de Pau e Outros Ensaios sobre a Teoria da Arte. São Paulo: EDUSP, 1999, p. 1-11.: 1. No polo oposto a esta concepção localiza-se a tese de Nelson Goodman, segundo a qual a semelhança não é condição suficiente para a representação. Cf. Goodman 1976: 4. Recentemente, a tese de Goodman foi retomada por Frank Ankersmit com o objetivo de discutir a relação entre verdade e estilo nas teorias da representação. Cf. Ankersmit 2012: 76.
  • 2
    A análise aqui apresentada do conceito de antropologia iluminista foi parcialmente desenvolvida no seguinte trabalho: Araújo 2012Araújo, André de Melo. Weltgeschichte in Göttingen. Eine Studie über das spätaufklärerische universalhistorische Denken, 1756-1815. Bielefeld: transcript, 2012.: 99-110. Sobre a importância da psicologia para a cultura letrada setecentista, consulte-se ainda: Scheerer 1989Scheerer, Eckart. Psychologie. In: Ritter, Joachim; Gründer, Karlfried; Gabriel, Gottfried (eds.). Historisches Wörterbuch der Philosophie. v. 7, Basel: Schwabe Verlag, 1989, p. 1599-1653.: 1599-1653; Reill; Wilson 2004Reill, Peter Hanns; Wilson, Ellen Judy (eds.). Encyclopedia of the Enlightenment. Revised Edition. New York: Facts on File, 2004.: 479-482; Vidal 1993Vidal, Fernando. Psychology in the 18th century: a view from encyclopaedias. History of the Human Sciences. v. 6, n. 1, 1993, p. 89-119.: 89-119; Hatfield 1995Hatfield, Gary. Remaking the Science of Mind. Psychology as Natural Science. In: Fox, Christopher; Porter, Roy; Wokler, Robert (eds.). Inventing Human Science. Eighteenth-Century Domains. Berkeley/Los Angeles: University of California Press, 1995, p. 184-231.: 184-231; Porter 1992Porter, Roy. Psychology. In: Yolton, John W.; Porter, Roy; Rogers, Pat; Stafford, Barbara Maria (eds.). The Blackwell Companion to the Enlightenment. Oxford: Blackwell, 1992.: 431; Rousseau 1980Rousseau, G. S. Psychology. In: Rousseau, G. S.; Porter, Roy (eds.). The Ferment of Knowledge. Studies in the Historiography of Eighteenth-Century Science. Cambridge: Cambridge University Press, 1980, p. 143-210.: 143-210.
  • 3
    A filosofia do iluminismo alemão pode ser caracterizada nos termos incorporados na obra de Ernst Platner, a saber: como uma akademische Weltweisheit (cf. Schneiders 1985Schneiders, Werner. Akademische Weltweisheit. Die deutsche Philosophie im Zeitalter der Aufklärung. In: Sauder, Gerhard; Schlobach, Jochen (eds.). Aufklärungen. Frankreich und Deutschland im 18. Jahrhundert. v. 1, Heidelberg: Carl Winter, 1985, p. 25-44.: 25-44; Schröder 2004Schröder, Winfried. Weltweisheit. In: Ritter, Joachim; Gründer, Karlfried; Gabriel, Gottfried (eds.). Historisches Wörterbuch der Philosophie. v. 12. Basel: Schwabe Verlag, 2004, cols. 531-534.: 531).
  • 4
    Cf. Göttingische Anzeigen von gelehrten Sachen, 157. Stück, 30. September 1784, p. 1568: “(…) sowohl die Entstehung u[nd] allmähliche Verbreitung des menschl[ichen] Geschlechts, als die ursprünglichen Verschiedenheiten aller Völker in Rücksicht auf ihre körperlichen u[nd] geistigen Anlagen.”
  • 5
    A aproximação entre psicologia e história da humanidade não foi operada exclusivamente por Christopher Meiners. Também Friedrich August Carus (1770-1807) faz essa aproximação, diferenciando-se, no entanto, de Meiners, uma vez que este se atém - de acordo com a crítica pertinente de Carus - predominantemente aos aspectos externos da natureza humana (cf. Vidal 2011______. The Sciences of the Soul. The Early Modern Origins of Psychology. Chicago/London: The University of Chicago Press, 2011.: 187-188).
  • 6
    O caso de Christopher Meiners é particular na produção historiográfica setecentista de Göttingen, uma vez que esse autor opera a explicação histórica nos termos de um determinismo racial. Nesse sentido, consulte-se Araújo 2012Araújo, André de Melo. Weltgeschichte in Göttingen. Eine Studie über das spätaufklärerische universalhistorische Denken, 1756-1815. Bielefeld: transcript, 2012.: 139-180. Ainda sobre as teorias racistas e a explicação histórica no século XVIII, cf. Demel 1992Demel, Walter. Wie die Chinesen gelb wurden. Ein Beitrag zur Frühgeschichte der Rassentheorien. Historische Zeitschrift, v. 255, n. 1, 1992, p. 625-666.; sobre o caráter anti-humanístico de parte do pensamento antropológico alemão, no contexto, inclusive, da política imperialista do século XIX, consulte-se: Zimmerman 2001Zimmerman, Andrew. Anthropology and Antihumanism in Imperial Germany. Chicago/ London: The University of Chicago Press, 2001..
  • 7
    Sobre as situações de fronteira que obrigam o leitor a desconfiar dos limites estabelecidos entre o sonho e a alucinação na prosa literária setecentista, cf. Košenina 2016b_______. Die dunkle Macht in uns: Der Sandmann als medizinische Fallgeschichte. In: Jahraus, Oliver (ed.). Zugänge zur Literaturtheorie. 17 Modellanalysen zu E. T. A. Hoffmanns Der Sandmann. Stuttgart: Reclam, 2016b, p. 197-211..
  • 8
    Parte desse raciocínio foi desenvolvido, com mais detalhes, em: ARAÚJO 2016______. Visuelle Evidenz. Materielle Zeugnisse und Visualisierungsstrategien als wissenschaftliche Grundlage des weltumfassenden historischen Denkens im Göttingen der Spätaufklärung. In: Bremer, Thomas (ed). Materialitätsdiskurse der Aufklärung. Bücher - Dinge - Praxen. Halle an der Saale: Universitätsverlag Halle-Wittenberg, p. 2016, p. 187-217..
  • 9
    Cf. Catalogvs praelectionvm pvblice et privatim in academia Georgia Avgvsta per hibernvm semester. Gottingae: Litteris Joh. Christian Dieterich, 1784, p. VII.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Maio 2019

Histórico

  • Recebido
    20 Nov 2018
  • Aceito
    23 Jan 2019
Universidade de São Paulo/Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas/; Programa de Pós-Graduação em Língua e Literatura Alemã Av. Prof. Luciano Gualberto, 403, 05508-900 São Paulo/SP/ Brasil, Tel.: (55 11)3091-5028 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: pandaemonium@usp.br