Resumos
Embora diversas vantagens - construtivas e/ou arquitetônicas - lhe sejam atribuídas, a continuidade entre vãos consecutivos de lajes lisas adotadas em projetos multipavimentos faz da ligação laje-pilar uma região crítica, dada a reduzida seção de contato entre os dois elementos. Com a transmissão de momentos devido à adição de carregamentos horizontais e/ou verticais excêntricos, esses efeitos são ainda mais pronunciados em painéis externos. Estudos específicos sobre os efeitos de excentricidades externas ainda são bastante escassos, embora se reconheça a preocupação das normas, em geral, estarem aptas a atender eventualmente todos os potenciais casos conexos, visando um desempenho estrutural seguro. Para o caso de ligações de borda, algumas das recomendações existentes são baseadas em extrapolações bastante consideráveis, cuja teoria foi originalmente desenvolvida para os casos de carregamento assimétrico em ligações internas e precisam ser consolidadas com dados experimentais específicos. Assim, para investigar o comportamento estrutural das ligações entre a laje e o pilar de borda foram ensaiados quatro modelos individuais que reproduziram uma porção de laje de 2.350 x 1.700 mm de um pavimento de concreto armado com 180 mm de espessura em torno do pilar de borda quadrado de seção transversal 300 mm x 300 mm, dotado de uma projeção para imposição das excentricidades. A posição do apoio sob o pilar determinou a excentricidade em termos físicos, variável estudada que definiu a interação M/V, a saber: 300 mm (interna), centrada (referência) e 300 mm e 400 mm (externa). Os ensaios experimentais possibilitaram avaliar comparativamente o comportamento dos modelos quanto às medições de deformações no aço e no concreto, deslocamentos verticais, rotações, modo de ruptura e cargas últimas das lajes. Os resultados indicam que a influência da transferência dos momentos nos modos de ruptura das lajes é muito mais pronunciada que ação do cisalhamento nos casos de ligações de borda submetidas a excentricidades externas.
lajes lisas; pilar de borda; excentricidade; punção; concreto armado
Although several advantages - either constructive or architectural - are assigned to flat slabs, the continuity between consecutive spans in multifloor buildings may turn slab-column connections into a critical region, due to the limited contact between both elements. When transferring moments caused by horizontal and/or vertical eccentric loads are present, these effects are even more pronounced on external panels. Specific studies on the effects of outward eccentricities are still rather scarce, although it is recognized that the codes, in general, are concerned with eventually meeting all potential cases, seeking to improve safety structural performance. Some current recommendations are based on considerable extrapolations, whose theory was originally developed for cases of asymmetric loading at internal connections and need to be consolidated with specific test data. Thus, to investigate the structural behaviour of slabs-edge columns connections, four specimens were tested, reproducing a 2,350 mm x 1,700 mm portion of a 180 mm thick reinforced concrete slab adjacent to a 300 mm x 300 mm cross section squared edge column, with a projection at the base for the imposition of eccentricities. The position of the support under the column has determined the eccentricity, defining in physical terms the interaction between bending moment and shear force, as follows: 300 mm (inward), centred (reference) and 300 mm and 400 mm (outward). Experimental results allowed to comparatively assess the performance of the specimens relating the strain measurements in steel and concrete, vertical displacements, rotations, failure mode and ultimate loads of the slabs. Results indicate that the influence of transferring moments on failure modes is much more pronounced than the shear action in the case of edge connections subjected to outward eccentricities.
flat slabs; edge column; eccentricity; punching shear; reinforced concrete
1. Introdução
O sistema estrutural com lajes lisas de concreto armado vem se estabelecendo como uma alternativa viável em relação ao sistema convencional de lajes maciças, vigas e pilares, se destacando por sua funcionalidade e economia. Entre suas vantagens pode-se destacar que a eliminação ou redução das vigas implica uma redução nos materiais e mão-de-obra relacionados à produção de fôrmas e revestimentos, além de promover maior agilidade na execução destes serviços e de outros como armação, lançamento, adensamento e desforma do concreto [101 [01] WIGHT, J. K.; MACGREGOR, J. G. Reinforced Concrete: Mechanics and Design. New Jersey, NY: Prentice Hall, 6ed, 2011, 1157p.]. No entanto, é necessário se tomar cuidados especiais na implementação deste sistema. Dentre os principais está a possibilidade de ruptura por puncionamento na ligação da laje com o pilar. Este tipo de ruptura é frágil e ocorre quando o cisalhamento se torna crítico. Por isso, é importante o conhecimento do comportamento dessa região de ligação. Outro ponto que merece destaque é que, quando uma ruptura por punção ocorre, há uma grande possibilidade de acontecer um colapso progressivo em toda a estrutura, caso esta não seja capaz de absorver os acréscimos de carga devido à redistribuição de esforços.
Ainda são necessários muitos estudos sobre esse assunto, já que as principais normas internacionais apresentam divergências entre si. A realização de estudos experimentais é, sem dúvida, o melhor caminho para o entendimento deste fenômeno, pois permite a comparação com as disposições normativas e a adequação destas normas a um dimensionamento seguro e econômico. Quando se trata de laje com pilar de borda com transferência de momento do pilar para a laje a quantidade de estudos existentes é bastante reduzida, e quando esse momento fletor é resultante de uma excentricidade externa, as bibliografias são escassas [202 [02] NARASIMHAN, N. Shear reinforcement in reinforced concrete column heads, London, 1971, Thesis (PhD) - Faculty of Engineering of University of London, Imperial College of Science and Technology, 267p.], [303 [03] REGAN, P.E. Tests of Connections between flat slabs and edge columns, London, 1993, School of Architecture and Engineering, University of Westminster.].
Em uma situação real, essa transferência de momento pode ocorrer, por exemplo, em uma estrutura sob o efeito de abalos sísmicos. Outra causa é a existência de forças horizontais causadas pelo vento ou mesmo uma situação em que a excentricidade já exista em projeto. Em geral, a simulação da transferência de momento do pilar para a laje em estudos experimentais é feita pela resultante de forças horizontais no pilar ou por uma excentricidade no apoio do pilar, como mostra a Figura 1. Adotou-se neste trabalho esta última opção, por se considerar mais adequada às condições de ensaio disponíveis. Dessa forma, são exemplificados os dois casos possíveis de transferência de momento em torno do eixo paralelo à borda livre, definindo-se as direções adotadas para uma excentricidade interna ou externa à laje, as quais determinarão a direção de rotação do pilar referidas no decorrer do trabalho (a direção da rotação é tomada como interna quando a porção do pilar inferior à laje rotaciona em direção à laje, e externa quando rotaciona no sentido oposto).
2. Programa experimental
2.1 Concepção do ensaio
Os ensaios à punção aqui descritos fizeram parte dos trabalhos de Feliciano [404 [04] FELICIANO, F. M. H. Punção em lajes lisas de concreto armado com pilares de borda e excentricidade externa, Brasília, 2011, Dissertação (mestrado) - Faculdade de Tecnologia, Universidade de Brasília, 149p.] e Albuquerque [505 [05] ALBUQUERQUE, N. G. B. Comportamento das ligações de lajes lisas de concreto armado com pilares de borda sujeitas a excentricidades interna e externas, Brasília, 2014, Tese (doutorado) - Faculdade de Tecnologia, Universidade de Brasília, 204p.], os quais compuseram uma série contendo quatro modelos que reproduziram a região do pavimento em torno dos pilares de borda. Foi adotado um sistema de ensaio original e inédito quanto às definições das condições de contorno para ensaios dessa natureza, tratando-se, portanto, de uma medida apropriada, dada a sua viabilidade econômica, simplicidade na concepção, e principalmente, por traduzir o comportamento real da estrutura.
Os quatro modelos foram biapoiados no sentido do maior vão (direção longitudinal ou eixo x), sendo um apoio sob a base do pilar e outro apoio contínuo próximo à outra extremidade. O carregamento foi aplicado por meio de dois atuadores hidráulicos acoplados a células de carga acima das duas vigas de distribuição posicionadas próximas à borda do menor vão (direção transversal ou eixo y), que dividiram cada uma o carregamento para mais dois pontos equidistantes, como mostrado na Figura 2. A posição do apoio sob o pilar foi o que determinou a excentricidade, sendo a projeção do pilar convenientemente voltada à direção da variável definida para cada modelo. A Tabela 1 apresenta a excentricidade que foi utilizada em cada modelo, considerando excentricidade externa à laje como positiva.
2.2 Confecção dos modelos
2.2.1 Geometria
Os modelos foram formados por lajes de dimensões 1.700 mm x 2.350 mm, com espessura de 180 mm, e pilares de 830 mm de altura, com seção transversal de 300 mm x 300 mm e uma projeção para implementação da excentricidade do apoio em relação ao eixo do pilar de 350 mm com uma altura de 300 mm a partir da base do pilar. As dimensões foram definidas de modo a se adaptarem à estrutura de reação existente no Laboratório de Estruturas da Universidade de Brasília. A projeção do pilar foi direcionada para fora da laje nos casos com pilar centrado e excentricidade externa, e para dentro no caso de excentricidade interna. A Figura 3 ilustra uma visão geral do sistema carga e reação, incluindo também as disposições dessas projeções.
2.2.2 Armadura das lajes
As lajes foram armadas à flexão nas duas direções. Para a armadura superior foram usadas 15 barras de Ø12,5 mm espaçadas a cada 100 mm e dispostas na direção longitudinal, sendo dobradas em gancho na faixa extrema junto à borda livre do pilar e 20 barras retas de Ø16 mm espaçadas a cada 100 mm na direção transversal unidas à ganchos em ambas extremidades. Para a armadura inferior da laje utilizou-se 15 barras de Ø16 mm espaçadas a cada 100 mm e dispostas na direção longitudinal, sendo dobradas em gancho na faixa extrema junto à borda livre do pilar e 12 barras retas de Ø12,5 mm espaçadas a cada 200 mm na direção transversal.
2.2.3 Armadura dos pilares
A armadura dos pilares foi composta de 8 barras de Ø16 mm, sendo quatro retas e quatro formando ganchos para ancoragem do "consolo curto". Para amarração dessas ferragens, foram confeccionados estribos de Ø6,3 mm espaçados a cada 10 cm. A Figura 4 apresenta esquematicamente a distribuição das armaduras, tanto no pilar quanto na laje.
2.2.4 Concretagem
Os modelos foram concretados monoliticamente no mesmo dia, utilizando concreto usinado, bombeado e de resistência à compressão característica especificada de 40 Mpa. Foram utilizados os materiais disponíveis na região centro-oeste do Brasil, tais como areia e brita 0. O ensaio de abatimento de tronco de cone (slump test) foi realizado momentos antes da concretagem, resultando em 12 cm. Todas as superfícies de contato com o conceto das formas dos corpos de prova foram limpas e aplicadas desmoldante, sendo preenchidas com concreto fresco em camadas e adensadas por meio de vibradores de imersão com 25 mm de diâmetro, seguido da cura. Foram moldados 30 corpos de prova (100 mm x 200 mm) para a realização de ensaios de determinação da resistência à compressão, tração por compressão diametral e módulo de elasticidade do concreto, em conformidade com as normas NBR 5739 (2007) [606 [06] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. Concreto - Ensaio de compressão de corpos-de-prova cilíndricos - Métodos de ensaio - NBR 5739, Rio de Janeiro, 1994.], NBR 7222 (2011) [707 [07] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. Argamassas e concreto - Determinação da resistência à tração por compressão diametral de corpos-de-prova cilíndricos - Método de ensaio - NBR 7222, Rio de Janeiro, 1994.] e NBR 8522 (2008) [808 [08] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. Concreto - Determinação do módulo de deformação elástica e diagrama tensão deformação - Método de ensaio - NBR 8522, Rio de Janeiro, 1994.], respectivamente.
2.3 Instrumentação dos modelos
Para execução e avaliação do comportamento das lajes durante o ensaio, foram selecionadas alguns pontos estratégicos (Figura 6) para a coleta das medições de deformações no aço e no concreto e dos deslocamentos verticais e horizontais.
Foram usados extensômetros elétricos de resistência da marca KYOWA para a aquisição das deformações no aço de flexão, distribuídos em 20 pontos instrumentados com dois extensômetros colados em lados diametralmente opostos em cada laje tanto na armadura superior quanto na armadura inferior, dispostas em ambos os eixos; as deformações na superfície de concreto também foram avaliadas em diferentes pontos através da adaptação de rosetas, embora parte dos dados gerados não tenham se mostrado consistente. O fato de a maioria dos casos os extensômetros falhos terem apresentado deformações de tração traz indícios de fissuração ou ocorrência de danos ou descolamentos do sensor e, em função disso, é apresentado apenas o ponto posicionado no canto interno do pilar para cada laje.
Para medição dos deslocamentos verticais e horizontais foram utilizados LVDTs (transdutores de variação de deslocamento linear) da marca HBM - tipo WA50, possibilitando grande precisão na leitura dos deslocamentos, feita automaticamente pelo sistema de aquisição de dados. Foram utilizados 15 LVDTs por laje em pontos característicos dos eixos longitudinal e transversal, bem como à 45º de um dos cantos do pilar até a borda da laje. Além disso, a rotação do pilar foi obtida através dos deslocamentos horizontais da região superior e inferior do pilar. Pequenas plaquetas de alumínio foram coladas à superfície da laje a fim de uniformizar o contato da sonda para a leitura dos deslocamentos.
3. Procedimentos de ensaio
Todos os dados quanto a deformações, deslocamentos e carregamentos aplicados foram lidos pelo sistema de aquisição de dados SPIDER 8, conjuntamente com o software CATMAN [909 [09] Catman(r) 4.5 Operating Manual. HBM Software. Hottinger Balswin Messtechnik GmbH. Darmstadt, Germany. 2003.]. Ao todo foram usados 68 canais, sendo 40 para os extensômetros da armadura, 9 para os extensômetros do concreto, 15 para os LVDTs e 4 para as células de carga. Para tal, foram utilizados 9 módulos do SPIDER 8 e 2 microcomputadores.
Para monitoramento da aplicação de carregamento, foram utilizadas células de carga KRATOS, com 1000 kN de capacidade alinhada à cada atuador hidráulico. Essas células de carga serviram apenas para controle do aplicador de carga. Outras células de carga, vazadas, da marca HBM tipo C6A, foram colocadas nos pontos de fixação de cada tirante para conferência do carregamento dos dados redundantes, sendo ligadas a indicadores digitais e a partir destes conectadas ao SPIDER 8.
Dois atuadores hidráulicos de pistão vazado, da marca Enerpac, acionados por bombas elétricas, aplicaram o carregamento em vigas de distribuição que dividiram a carga, cada uma, em dois pontos da laje. A carga foi aplicada até a ruptura dos modelos. Os ensaios foram realizados utilizando o pórtico metálico do Laboratório de Estruturas da Universidade de Brasília. O sistema de aplicação de carregamento é mostrado na Figura 7.
4. Resultados e discussões
4.1 Cargas últimas e modos de ruptura
Os resultados dos ensaios foram analisados e comparados através de tabelas e gráficos. A Tabela 2 resume as cargas últimas dos modelos, de forma que Vu corresponde à reação do apoio do pilar, calculado estaticamente na direção longitudinal e Pu é a carga total aplicada pelo sistema, considerando-se também o peso próprio da laje e equipamentos.
Comparando a reação de apoio no pilar (Vu) para os modelos L1 e L3, confirma-se a hipótese da excentricidade externa ser mais crítica, uma vez que, apesar de terem o mesmo valor de excentricidade (sendo uma interna e outra externa), percebe-se que as reações de apoio no pilar (Vu) valem, respectivamente, 308 kN e 256 kN, o que representa uma redução de 17 %. Um maior carregamento total aplicado pelo sistema em L1 se explica pela configuração do ensaio, em que neste modelo, o dispositivo de apoio localizado próximo à borda oposta ao pilar atrai para si menor proporção do carregamento. Além disso, comparando Vu dos modelos L2, L3 e L4, percebe-se que com o aumento da excentricidade externa reduz-se a capacidade de carga da ligação. Se comparados os dois casos de excentricidade externa, L3 e L4, o acréscimo de 100 mm na excentricidade impôs uma redução de 18 % da reação de apoio no pilar. A Figura 8 ilustra esse comportamento.
Ao contrário de L1 e L2, cujas rupturas foram bruscas, nos modelos L3 e L4, de excentricidade externa, os modos de ruptura foram preponderantemente determinados pela transferência de momentos em detrimento do cisalhamento, embora a ruptura tenha culminado na formação do cone de punção ao final do ensaio.
4.2 Deformações na armadura de flexão
As deformações na armadura são apresentadas nos gráficos da Figura 9 a Figura 12, em função do carregamento aplicado conforme os pontos de instrumentação pré-definidos. Os gráficos apresentam em destaque a carga de primeira fissura visível, a carga que levou o modelo à ruptura, bem como o limite de escoamento correspondente à bitola do aço analisado.
Observou-se que os extensômetros nas barras longitudinais superiores, ELS, e transversais superiores, ETS, apresentaram predominantemente deformações de tração no modelo L1, evidenciando o fato de que estando o pilar submetido à excentricidade interna e ao carregamento vertical próximo às bordas na direção transversal, a região próxima ao pilar fica submetida à tração nas duas direções. As maiores deformações longitudinais encontraram-se na linha do eixo do pilar nas proximidades de sua face interna, com barras atingindo o escoamento. As deformações transversais superiores de L1 também se destacaram na região próxima à face interna do pilar.
Para as lajes com excentricidade externa, destaca-se as deformações coletadas pelos extensômetros nas barras longitudinais inferiores, ELI, e transversais superiores, ETS, indicando um efeito "sela de cavalo", dada sua conformação. A laje L1, de excentricidade nula, situou-se entre ambos os casos.
Assim, para os modelos L2, L3 e L4, na direção longitudinal, dentro da faixa de largura do pilar, constata-se que a laje é submetida a um momento fletor positivo, uma vez que é solicitada à tração em suas fibras inferiores e compressão nas superiores. Este comportamento é confirmado pelos gráficos de deformação nas armaduras longitudinais superiores dos modelos L2, L3 e L4, sendo que com o aumento da excentricidade as deformações na região próxima ao pilar aumentaram, já que o momento aplicado foi maior. Apenas o extensômetro ELS1, dos modelos L3 e L4, apresentou deformações de compressão, o que pode ser explicado pelo fato de que este extensômetro, que não se encontrava em barras que atravessassem o pilar, estando sujeito a maior influência das deformações nas barras da outra direção.
Nos gráficos de deformação das barras transversais superiores dos modelos L2, L3 e L4, a configuração de carregamento vertical, gerou apenas momento fletor negativo para todos os casos, sendo que conforme a rotação do pilar decorrente da excentricidade imposta, este permitia uma maior ou menor deformação de tração das barras mais próximas à borda da laje ou à face interna do pilar. Quanto às armaduras transversais inferiores, os gráficos mostram que em várias seções da laje as deformações das barras superiores e inferiores tiveram o mesmo sinal. Para o modelo L1 isto aconteceu para praticamente todos os pontos instrumentados da direção longitudinal. A direção longitudinal de L2, por não possuir momento no pilar, apresentou deformações mais comportadas, em que, para todos os pontos as regiões superior e inferior possuíram deformações com sinais opostos. A excentricidade, e conseqüente rotação do pilar, apenas limitou mais ou menos a deformação dos pontos mais próximos à face externa ou interna do pilar.
4.3 Deformações na superfície de concreto
Também foi construído o gráfico para visualização das deformações do concreto em função do carregamento aplicado no ponto em que a monitoração foi mais eficiente (Figura 13). Apenas os extensômetros colados na direção transversal apresentaram deformações de compressão comparáveis entre si, de acordo com o que já foi explicado sobre o comportamento da laje em relação ao extensômetros do aço.
Comparando os extensômetros posicionados na direção transversal percebe-se que com o aumento da excentricidade externa as deformações de compressão evoluíram, sendo maiores nas lajes L3 e L4, caindo aproximadamente pela metade para um mesmo nível de carga em L2, e em menor proporção para L1, até desviar-se da tendência e atingir valores positivos, causada pela intensa fissuração local. Nesse caso, as máximas deformações atingidas foram próximas a -1,5‰ para as lajes L3 e L4, embora, deva-se ressaltar que, dentre outros pontos, isoladamente as leituras se mantiveram sem a perda/incoerência dos dados, as maiores deformações na superfície do concreto ocorreram nas proximidades do canto interno da pilar a 45° (direção axial em relação ao pilar), atingindo valores ultrapassando -1,5‰.
4.4 Rotações no pilar
A partir dos valores de deslocamentos horizontais dos LVDT 14 e LVDT 15, observa-se que o pilar rotaciona em diferentes sentidos, segundo a excentricidade de apoio aplicada. O modelo L1, único com excentricidade interna, apresentou rotação para a direção externa em relação à laje, afastando o eixo de rotação do centro do pilar. Apesar do pilar do modelo L2 não ser solicitado a momentos fletores significativos, a continuidade da ligação laje-pilar contribui em sua rotação, fazendo-o girar, ainda que em menor escala, na direção interna à laje. Já os modelos com excentricidade externa indicaram que o aumento da excentricidade implica em uma maior rotação do pilar. No entanto, deve-se atentar que, sendo a carga de ruptura de L4 menor que L3, é permitida a esta última rotacionar até um maior patamar de carregamento, atingindo valores maiores.
O desenvolvimento do ângulo de rotação dos pilares pode ser verificado no gráfico da Figura 14, que representa a rotação no pilar com o desenvolvimento do carregamento. É visível que a ausência de excentricidade tornou a curva de capacidade da ligação com uma rotação mais íngreme, atestando também que, para um mesmo passo de carga, o ganho de excentricidade externa fez com que o pilar girasse mais rapidamente, se comparado à interna.
4.5 Deslocamentos verticais
Quanto aos deslocamentos verticais, a deformada dos modelos é apresentada com os gráficos no eixo longitudinal a meio do vão (Figura 15), no eixo transversal na linha central do pilar (Figura 16) e em um eixo diagonal a 45° (Figura 17).
Para o modelo L1, o gráfico de deslocamentos verticais no eixo longitudinal mostra que, com a aplicação do carregamento, a excentricidade interna fez com que o pilar se deslocasse para baixo e rotacionasse para a direção externa à laje, provocando uma ligeira movimentação para cima na região interna ao pilar. Quanto aos deslocamentos verticais na direção transversal de L1, o sentido da rotação do pilar fez com que os deslocamentos na faixa da borda da laje fossem mais pronunciados que no sentido perpendicular à borda.
Nos modelos L2, L3 e L4, o padrão de deslocamentos foi semelhante entre si, aumentando a magnitude dos deslocamentos de acordo com o aumento da excentricidade. Nos casos de L3 e L4, as lajes fletiram bastante até a formação do cone de punção na ruptura. Além disso, foi visível que uma maior excentricidade fez com que os deslocamentos medidos acima do pilar aumentassem consideravelmente em relação aos pontos adjacentes nas duas direções, dando indícios de uma possível torção na ligação de borda. Observou-se que o ponto monitorado pelo LVDT 13, embora devesse ser idealmente espelhado ao LVDT 11, apresentou valores sistematicamente mais expressivos que este. Desconsiderando-se, porém, suas medições, tem-se, para todas as lajes, que os maiores deslocamentos ocorrem no eixo diagonal, logo abaixo das cargas, correspondente ao LVDT 12. No eixo longitudinal, verifica-se ainda que os pontos de maior magnitude se movimentam do meio da laje para as regiões mais próximas à ligação.
4.6 Mapas de fissuração
A Figura 18 ilustra o padrão de fissuração resultante nas lajes após a ruptura, sendo verificada nas superfícies superior e inferior das lajes, especialmente da região mais próxima à ligação, pois que, de maneira geral, as fissuras seguiam o alinhamento da distribuição das armaduras nas regiões mais distantes da ligação.
O modelo L1 apresentou a primeira fissura visível nas proximidades da face interna do pilar a uma carga de 60 kN aplicada no sistema, enquanto que a região próxima às faces laterais do pilar começou a fissurar a uma carga de 100 kN. Algumas fissuras aparentemente de torção também puderam ser verificadas, se iniciando nas laterais do pilar, seguindo diagonalmente até a borda da laje e continuando durante a espessura da laje. Essas fissuras ocorreram apenas neste modelo, o que pode ser explicado pelo sentido da rotação do pilar.
Analogamente ao modelo L1, uma maior concentração de fissuras em L2 aconteceu na região próxima à face interna do pilar. Porém, neste modelo, as fissuras que se encaminharam para a borda da laje possuíram pequena inclinação. A primeira fissura visível ocorreu a uma carga de 100 kN, também próxima à face interna do pilar, enquanto que as fissuras nas proximidades das faces laterais ocorreram apenas a 180 kN.
Os modelos L3 e L4 apresentaram padrão de fissuração semelhante entre si, onde algumas fissuras seguiram diagonalmente para a borda da laje que continha o pilar, embora em direção oposta às de L1. Nestes modelos o cone de ruptura se formou mais próximo às faces do pilar, especialmente em L4, o que aparenta ser devido à excentricidade. O modelo L3 teve as primeiras fissuras a um carregamento de 60 kN e 100 kN, respectivamente, na região próxima à face interna e próxima às laterais, enquanto que L4 fissurou a 80 kN e 160 kN.
Na região inferior, todos os modelos mostraram comportamento similar. Dividindo-se a laje em três segmentos longitudinais, o seguimento interno apresentou fissuras predominantemente transversais, enquanto nos dois outros segmentos as fissuras foram inclinadas até a borda, indicando a presença de torção devido ao comportamento diferenciado de flexão da laje nas duas direções.
5. Conclusões
Devido ao reduzido número de modelos ensaiados, os resultados não podem ser tomados como conclusivos, embora dêem indicativos bastante esclarecedores do comportamento de ligações de borda sujeitos a excentricidades externas. Os pontos instrumentados nas lajes auxiliaram a análise, permitindo a coleta de dados representativos dos modelos, conforme cada excentricidade imposta. Ao instrumentar barras inferiores e superiores nos mesmos pontos foi possível verificar o comportamento de deformação em diferentes seções transversais, compensando, de certo modo, a baixa eficácia da instrumentação colada à face inferior do concreto, que não acompanhou as direções das bielas.
Assim, dentre as possibilidades que podem ser atribuídas à influência das excentricidades externas na resistência das ligações de borda, tomando-se por base as observações experimentais deste estudo, destaca-se: a ocorrência de maiores aberturas de fissura; as fissuras de torção atingem a borda livre em pontos mais distantes da ligação; as deformações do concreto são comparativamente mais pronunciadas; o cone de ruptura aparentemente se forma mais próximo da face interna do pilar; o maior deslocamento no eixo longitudinal é móvel, aproximando-se da ligação à medida que a excentricidade aumenta; as cargas últimas de ruptura são mais penalizadas em ligações submetidas a excentricidades externas que internas.
6. Agradecimentos
Os autores gostariam de agradecer ao Prof. P.E. Regan, Professor Emérito da Universidade de Westminster (London, UK), pelas valiosas sugestões do tema e ao longo de toda pesquisa, bem como às agências brasileiras destinadas ao fomento da pesquisa científica e tecnológica, CNPq e CAPES, pelo apoio financeiro.
7. References
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
Mar-Apr 2015
Histórico
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Recebido
15 Nov 2014 -
Aceito
18 Jan 2015