Acessibilidade / Reportar erro

Efeito da adição do metacaulim na carbonatação de concretos de cimento Portland

Resumo

A carbonatação tem sido alvo de preocupação de construtores e pesquisadores, pois, ao diminuir o pH da solução intersticial do concreto, pode favorecer a despassivação e posterior corrosão das armaduras do concreto armado. Dentre os fatores que influenciam a carbonatação está a utilização de materiais pozolânicos, como o metacaulim. Entretanto, não há um consenso quanto à contribuição positiva ou negativa da presença destas adições. O presente trabalho avaliou a influência do metacaulim nas propriedades mecânicas, na porosidade e, principalmente, na carbonatação do concreto, a partir da adição de 0%, 5%, 10% e 15% de metacaulim, em relação à massa do cimento. De acordo com os resultados obtidos, observou-se que a adição de metacaulim, apesar de não ter influenciado significativamente na porosidade, conferiu ao concreto uma maior resistência à compressão axial, uma diminuição da absorção capilar e retardou o avanço da frente de carbonatação no concreto.

Palavras-chave:
metakaolin; carbonation; concrete

Abstract

Carbonation has been a concern of constructors and researchers because, by lowering the pH of the interstitial solution of the concrete, it can favor the post-deposition and subsequent corrosion of reinforced concrete reinforcement. Among the factors that influence carbonation is the use of pozzolanic materials, such as metakaolin. However, there is no consensus as to the positive or negative contribution of these additions. This work evaluated the influence of metakaolin on the mechanical properties, porosity and in particular on the carbonation of concrete, from the addition of 0%, 5%, 10% and 15% of metakaolin, in relation to the cement mass. From the results, it was observed that the addition of metakaolin, while not significantly influencing the porosity, gave the concrete a greater resistance to axial compression, a decrease in the capillary absorption and delayed the advance of the carbonation front in the concrete.

Keywords:
metacaulim; carbonatação; concreto

1. Introdução

A carbonatação é um complexo processo físico-químico de neutralização da fase líquida presente nos poros do concreto. O hidróxido de cálcio (Ca(OH)2), composto precipitado proveniente da hidratação do cimento, ao se dissolver na fase aquosa dos poros, apresenta íons que reagem com os constituintes iônicos resultantes da dissolução do gás carbônico (CO2), formando o carbonato de cálcio e liberando água, de acordo com as equações 1, 2 e 3 [1[1] THIERY, M., VILLAIN, G., DANGLA, P., PLATRET, G. Investigation of the carbonation front shape on cementitious materials: Effects of the chemical kinetics. Cement and Concrete Research, v. 37, n. 7, p. 1047-1058, 2007.].

C a O H 2 C a 2 + + 2 O H - (1)

C O 2 ( g ) C O 2 ( a q ) + H 2 O + H 2 C O 3 H C O 3 - + H + C O 3 2 - + 2 H + (2)

C a 2 + + C O 3 2 - + 2 H + + 2 O H - C a C O 3 + 2 H 2 O (3)

Payá et al. [2[2] CHINCHÓN-PAYÁ, S.; ANDRADE, C.; CHINCHÓN, S. Indicator of carbonation front in concrete as substitute to phenolphthalein. Cement and Concrete Research, v. 82, p. 87-91, 2016.] complementam que a carbonatação não ocorre apenas pela reação do CO2 com o Ca(OH)2, mas, também, pela reação do CO2 com o silicato de cálcio hidratado (C-S-H), conforme apresentado na Equação 4.

C S H + C O 2 3 C a C O 3 . 2 S i O 2 . 3 H 2 O (4)

Com a formação do CaCO3, há uma redução do pH do concreto devido ao consumo de hidróxido de cálcio e redução da concentração de hidroxilas (OH-), fazendo com que o pH da solução intersticial do concreto reduza de valores acima de 12,5 para valores inferiores a 9, favorecendo a despassivação do aço de reforço e uma posterior corrosão generalizada do mesmo, de acordo com o diagrama de Pourbaix (Figura 1) [3[3] ŠAVIJA, B.; LUKOVIĆ, M. Carbonation of cement paste: Understanding, challenges, and opportunities. Construction and Building Materials, v. 117, p. 285-301, 2016].

Figura 1
Diagrama de Pourbaix. Diagrama de equilíbrio termodinâmico para o sistema Fe-H2O a 25°C, delimitando os domínios prováveis de corrosão, passivação e imunidade [5[5] RIBEIRO, D. Corrosão em estruturas de concreto armado como consequência da carbonatação e da ação dos cloretos. In: Corrosão e degradação em estruturas de concreto. Ribeiro, D. (cord), Rio de Janeiro: Elsevier, 2018.]

No diagrama de Pourbaix de equilíbrio termodinâmico estão delimitados os domínios de corrosão, passivação e imunidade para o sistema Fe-H2O a 25 °C. Para a faixa de potencial de corrosão do ferro no concreto, que é de +0,1 a -0,4 V, um pH acima de 12 indica que o ferro está no estado passivado. Entretanto, com a reação de carbonatação e, portanto, decréscimo do pH do concreto para valores em torno de 8, o ferro encontra-se em uma região termodinamicamente favorável à corrosão [4, 5].

Morandeau et al. [6[6] MORANDEAU, A.; THIÉRY, M.; DANGLA, P. Investigation of the carbonation mechanism of CH and C-S-H in terms of kinetics, microstructure changes and moisture properties. Cement and Concrete Research, v. 56, p. 153-170, 2014.] ressaltam que a carbonatação produz mudanças importantes nas matrizes cimentícias como redução da porosidade e da permeabilidade, menor conectividade entre os poros, maior superfície específica, entre outras propriedades, mas o efeito desse impacto na microestrutura ainda é objeto de investigação e, muitas vezes, de divergência de opiniões entre os estudiosos.

O metacaulim é normalmente obtido através da calcinação de argilas cauliníticas ou caulins de alta pureza. Devido às suas características morfológicas, a metacaulinita é responsável pela atividade pozolânica do metacaulim. A reação pozolânica do metacaulim ocorre pela interação da metacaulinita com o hidróxido de cálcio presente na pasta cimentícia, formando silicatos (C-S-H) e aluminatos de cálcio hidratados (C2ASH8, C4AH13 e C3AH6) [7, 8]. Suas partículas extremamente finas, com dimensão máxima na ordem 10-6 m e elevada área específica, apresentam razoável reatividade química possibilitando ao metacaulim, ainda, atuar como microfiler [7[7] FIGUEIREDO, C. P.; SANTOS, F. B.; CASCUDO, O.; CARASEK, H.; CACHIM, P.; VELOSA, A. The role of metakaolin in the protection of concrete against the deleterious action of chlorides. Revista IBRACON de Estruturas e Materiais, v. 7, p. 685-708, 2014..].

De acordo com Barbhuiya et al. [9[9] BARBHUIYA, S.; CHOW, P. L.; MEMON, S. Microstructure, hydration and nanomechanical properties of concrete containing metakaolin. Construction and Building Materials, v. 95, p. 696-702, 2015..], o metacaulim modifica a matriz cimentícia por meio da reação pozolânica, reduzindo a porosidade, com a criação de pontos de nucleação e modificação nas proporções relativas das fases de gel de C-S-H.

Diversos estudos [10-12] sobre a utilização de adições pozolânicas em matrizes cimentícias comprovam que essas adições melhoram características como resistência mecânica e porosidade, aumentando a durabilidade das estruturas. Entretanto, ainda não existe um consenso no que se refere à carbonatação de concretos em que o metacaulim é adicionado. Ashish [13[13] ASHISH, D. K. Concrete made with waste marble powder and supplementary cementitious material for sustainable development. Journal of Cleaner Production, v. 211, p. 716-729, 2019.], em seu estudo, observou que ao substituir 10% do cimento Portland por metacaulim, obteve uma redução na profundidade de carbonatação de 32,1% após 56 dias de carbonatação acelerada, enquanto que Kim; Lee; Moon [14[14] KIM, H. S.; LEE, S. H.; MOON, H. Y. Strength properties and durability aspects of high strength concrete using Korean metakaolin. Construction and Building Materials, v. 21, n. 6, p. 1229-1237, 2007.] obtiveram um aumento na profundidade de carbonatação em 70%, ao substituir o mesmo teor de 10% do cimento por metacaulim.

O conhecimento desse efeito se torna importante, uma vez que se verifica uma crescente utilização de materiais pozolânicos em concretos, inclusive em grandes centros urbanos, onde há uma elevada emissão de gás carbônico na atmosfera devido, principalmente, à queima de combustíveis fosseis.

Apesar do crescente interesse sobre o processo de carbonatação em matrizes cimentícias, esse fenômeno ainda é pouco entendido, não havendo um procedimento normativo estabelecido para a avaliação do seu progresso dentro da matriz. Assim, a presente pesquisa visa avaliar como a adição de metacaulim influencia no processo de carbonatação de matrizes cimentícias.

2. Materiais e programa experimental

2.1 Materiais

Para a confecção dos concretos, utilizaram-se como agregados a areia natural quartzosa e a pedra britada de origem basáltica, comercializados na cidade de Salvador. Devido à ausência de pozolanas em sua constituição, utilizou-se o cimento Portland CP V ARI-RS. A água utilizada provém do sistema público de abastecimento da Empresa Baiana de Água e Saneamento S.A - Embasa. O Metacaulim (MC) utilizado foi o HP Ultra, da marca Metacaulim do Brasil, composto por aluminossilicatos e obtido da calcinação de argilas cauliníticas e caulins a uma temperatura entre 650°C e 800°C.

2.2 Métodos

2.2.1 Caracterização dos materiais

A distribuição granulométrica e o módulo de finura dos agregados foram determinados conforme a NBR NM 248 [15[15] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, Agregados - Determinação da composição granulométrica - NBR NM 248. Rio de Janeiro, 2003.] e a massa unitária segundo a NBR NM 45 [16[16] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, Agregados - Determinação da massa unitária e do volume de vazios - NBR NM 45. Rio de Janeiro, 2006.]. A massa específica foi definida de acordo com a NBR 9776 [17[17] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, Agregados - Determinação da massa específica de agregados miúdos por meio do frasco de Chapman - NBR 9776. Rio de Janeiro, 1987.] para a areia, e segundo a norma IPT-M9-76 [18[18] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, Agregados graúdo - Determinação da massa específica aparente e absorção de água - NBR NM 53. Rio de Janeiro, 2009.] para a brita.

Determinou-se a distribuição do tamanho de partículas do metacaulim e do cimento por sedigrafia a laser (Horiba CAPA-700), a massa específica por picnometria a gás hélio (AccuPyc II 1340 Micromeritics) e a área específica por BET (Micrometrics Gemini 2370 V1.02) e Blaine automático (apenas para o cimento), as amostras utilizadas estavam secas e em forma de pó. As composições químicas foram determinadas por espectrometria de fluorescência de raios-X (FRX) e a atividade pozolânica por titulação química, segundo a norma europeia EN 196-5 [19[19] INSTITUTO PORTUGUÊS DE QUALIDADE, NP EN 196 - Métodos de ensaio de cimentos. 1996.].

2.2.2 Dosagem e cura dos corpos de prova

Para a confecção dos corpos de prova (CPs) foi definida a relação, em massa, de 1:1,83:2,37:0,6 (cimento: areia: brita: água) com teores de 0%, 5%, 10% e 15% de metacaulim, em adição à massa do cimento. A Tabela 1 indica os teores de metacaulim utilizados, bem como as respectivas relações água/cimento (mantida em 0,60) e água/ligante (cimento + adição pozolânica).

Tabela 1
Proporção dos materiais utilizados nos concretos produzidos

A tabela 2 apresenta o consumo de material para a produção de um metro cúbico de concreto, para todos os traços utilizados na pesquisa.

Tabela 2
Consumo dos materiais em um metro cúbico de concreto produzido

Os CPs prismáticos, de dimensão (4x4x16) cm3, foram imersos em tanque de cura úmida, saturado em hidróxido de cálcio e a resistência mecânica foi determinada nas idades de 3, 7 e 28 dias. Após 28 dias de cura, os CPs foram expostos à câmara microprocessada de CO2 (Quimis, modelo Q316C1), a uma temperatura de 29 ± 1°C, umidade relativa de 65 ± 5% e concentração de gás carbônico de 5 ± 0,5%, conforme mostrado na Figura 2. Para a análise da carbonatação, foram utilizados dois lotes de amostras: No primeiro lote as amostras foram secas em estufa (100°C) por 24 horas e depois inseridas na câmara de carbonatação, já no segundo lote as amostras foram colocadas na estufa ainda saturadas, assim que retiradas da cura.

Figura 2
Câmara microprocessada de gás carbônico

2.2.3 Análise de desempenho do concreto

a) Caracterização físico-mecânica

Para analisar o desempenho dos corpos de prova, estes foram ensaiados após 21, 42 e 63 dias de exposição à câmara de gás carbônico, ou seja, nas idades de 49, 70 e 91 dias (após a moldagem). Assim, os corpos de prova foram caracterizados quanto à resistência à compressão axial (NBR 13279 [20[20] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, Argamassa para assentamento e revestimento de paredes e tetos - Determinação da resistência à tração na flexão e à compressão - NBR 13279, Rio de Janeiro, 2005.]), absorção de água por capilaridade (ABNT NBR 9779 [21[21] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, Argamassa e concreto endurecidos - Determinação da absorção de água por capilaridade - NBR 9779. Rio de Janeiro, 2012.]) e densidade aparente (NBR 9778 [22[22] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, Argamassa e concreto endurecidos - Determinação da absorção de água, índice de vazios e massa específica - NBR 9778. Rio de Janeiro, 2005.]).

b) Profundidade de carbonatação

Conforme dito anteriormente, após 28 dias de cura, os CPs foram expostos à câmara microprocessada de CO2, a uma temperatura de 29 ± 1°C, umidade relativa de 65 ± 5% e concentração de gás carbônico de 5 ± 0,5 %. A cada idade foram medidos 8 CPs de cada amostra, 4 CPs do lote inicialmente seco e 4 CPs do lote inicialmente saturado.

A visualização da área carbonatada foi possível graças à aspersão de solução aquo-alcóolica contendo 1% do indicador de pH fenolftaleína. As amostras foram fraturadas por flexão e a solução foi aspergida na superfície de fratura das amostras, sendo esta fotografada para uma posterior comparação da área carbonatada. A diferença de pH entre a região carbonatada (pH em torno de 8) e a faixa de viragem da solução de fenolftaleína (pH entre 8,3 e 10) ocasiona um erro de medida da profundidade de carbonatação. De acordo com recomendações RILEM [10[10] RILEM. 1994. Measurement of hardened concrete carbonation depth. In: RILEM Recommendations for the Testing and Use of Constructions Materials, p.56 -58.], esta imprecisão é de 0,5 mm quando a frente de carbonatação ultrapassa 3 mm, devendo ser corrigida.

A área carbonatada dos corpos de prova foi calculada com o auxílio do programa Autocad, em procedimento ilustrado na Figura 3. Primeiro, a área não carbonatada e o corpo de prova foram contornados com a função “polyline” do software, além de criar uma reta de referência com dimensão conhecida, com o auxílio de uma régua. Posteriormente foi utilizada a função “scale” para redimensionar a fotografia de maneira que as dimensões desta fossem condizentes com as dimensões reais do corpo de prova. A área carbonatada (incolor) foi calculada subtraindo a área não carbonatada (rósea-carmim, na figura representada pela cor escura) da área total da seção do corpo de prova. A partir da área carbonatada fez-se a correlação com a profundidade de avanço da carbonatação para o interior do CP a partir da borda do mesmo.

Figura 3
Representação da análise da área carbonatada dos corpos de prova, obtida pelo software Autocad

Para a análise da carbonatação, também foram produzidas pastas de cimento de referência (REF) e com adição de MC, que foram mantidos em cura imersa por 28 dias e, posteriormente, secos em estufa por 24 horas à 100ºC e expostos ao CO2, em câmara, por 63 dias. As fases cristalinas das pastas de cimento foram identificadas aos 28 dias de cura e após à exposição ao CO2, utilizando a técnica de difração de raios-X (DRX), utilizando um difratômetro D2 Phaser, Bruker, com corrente de 10mA e voltagem de 30Kv, os espectros de difração foram obtidos na faixa de varredura 2θ de 5° a 80°, modo contínuo a 0,3°/min e as fases foram identificadas utilizando-se o software DIFFRAC plus-EVA, com banco de dados centrado no sistema Crystallography Open Database (COD).

3. Resultados e discussões

3.1 Caracterização dos materiais

As propriedades físicas e a distribuição granulométrica dos materiais utilizados são apresentadas na Tabela 3 e na Figura 4, respectivamente.

Tabela 3
Caracterização física dos materiais utilizados

Figura 4
Distribuição granulométrica das matérias-primas

Observa-se que o metacaulim apresentou-se o mais fino entre os materiais, seguido pelo cimento, areia e brita, respectivamente. A partir da distribuição granulométrica apresentada na Figura 4, a areia foi classificada, segundo a NBR 7211[23[23] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, NBR 7211- Agregado para concreto, Rio de Janeiro, 1983.], como areia muito fina, característica das areias da região de Salvador, e a brita pertence à zona granulométrica 4,75/12,5, tendo dimensão máxima de 9,5 mm.

A avaliação da pozolanicidade por meio de titulação química, cujo resultado é mostrado na Figura 5, caracterizou o metacaulim utilizado como material pozolânico.

Figura 5
Concentração de óxido de cálcio em função da concentração de íons hidroxilos, com linha de concentração de saturação de CaO na solução, caracterizando o metacaulim como material pozolânico

As composições químicas do metacaulim (MC) e do cimento (CP) são apresentadas na Tabela 4, verificando-se o elevado teor do MC em SiO2 e Al2O3 e do cimento em CaO.

Tabela 4
Composições químicas do metacaulim (MC) e do cimento (CP), obtidas por meio de fluorescência de raios X (FRX)

3.2 Análise de desempenho do concreto

Os resultados de resistência à compressão axial para os concretos contendo MC, apresentados na Figura 6A, mostram que houve um aumento na resistência mecânica em função do aumento do teor de MC adicionado, pois, ao ser incorporado no concreto por adição ao cimento, a relação água/aglomerante diminuiu. Além disso, o incremento de resistência ocorreu devido às reações pozolânicas e à redução na porosidade destes materiais ocasionada pela presença de mais pontos de nucleação e aos produtos resultantes da reação de carbonatação [6[6] MORANDEAU, A.; THIÉRY, M.; DANGLA, P. Investigation of the carbonation mechanism of CH and C-S-H in terms of kinetics, microstructure changes and moisture properties. Cement and Concrete Research, v. 56, p. 153-170, 2014.].

Figura 6
(A) Resistência à compressão, (B) Coeficientes de absorção capilar e (C) Porosidade aparente de corpos de prova contendo diferentes teores de metacaulim e em diferentes idades de exposição em câmara de CO2

Os coeficientes de capilaridade, apresentados na Figura 6B, mostram que o MC contribui para a diminuição da absorção capilar e esta também é diminuída com o aumento do tempo de exposição ao CO2. Destaca-se que aos 63 dias, as amostras MC10 apresentaram um aumento absorção de água capilar, se comparada com a idade anterior (42 dias); entretanto, os coeficientes de capilaridade foram menores do que os apresentados na idade controle (28 dias de cura) e após 21 dias de exposição.

A relação inversamente proporcional entre a quantidade e interconectividade de poros capilares e o teor de pozolanas nos compósitos é observada em diversos trabalhos recentes [11, 12]. Esse fenômeno pode ser explicado pelo fato da reação da pozolana com o Ca(OH)2 produzir um maior volume de C-S-H, levando a uma redução adicional da porosidade capilar durante a hidratação [12[12] RAMEZANIANPOUR, A. A.; BAHRAMI JOVEIN, H. Influence of metakaolin as supplementary cementing material on strength and durability of concretes. Construction and Building Materials, v. 30, p. 470-479, 2012.]. Barbhuiya et al. [9[9] BARBHUIYA, S.; CHOW, P. L.; MEMON, S. Microstructure, hydration and nanomechanical properties of concrete containing metakaolin. Construction and Building Materials, v. 95, p. 696-702, 2015..] explicam que o MC pode provocar um refinamento dos poros e torná-los descontínuos, diminuindo, assim, a absorção de água por capilaridade.

Além disso, o volume ocupado pelo CaCO3, resultante da carbonatação, é maior que o ocupado pelo Ca(OH)2, podendo ocasionar um tamponamento dos poros, diminuindo a absorção capilar. Arandigoyen [24[24] ARANDIGOYEN, M. et al. Variation of microstructure with carbonation in lime and blended pastes. Applied Surface Science, v. 252, n. 20, p. 7562-7571, 2006.] cita que os carbonatos formados têm entre 2,9 a 11,2% mais volume que a portlandita (11,2% para a calcita, 2,9% para a aragonita e 2,54% para a vaterita). No entanto, alguns pesquisadores observaram um aumento da absorção capilar devido à carbonatação [6[6] MORANDEAU, A.; THIÉRY, M.; DANGLA, P. Investigation of the carbonation mechanism of CH and C-S-H in terms of kinetics, microstructure changes and moisture properties. Cement and Concrete Research, v. 56, p. 153-170, 2014.].

No que se refere aos resultados de porosidade aparente (Figura 6C), não foi observada diferença significativa até a idade controle. Com a exposição ao gás carbônico, a porosidade aparente diminuiu para todas as amostras, devido ao preenchimento dos poros causados pelos produtos da reação de carbonatação e à continuidade das reações pozolânicas e de hidratação. Uma vez que os resultados de porosidade aparente e de absorção capilar são concordantes, pode-se concluir que a diminuição da porosidade está relacionada, principalmente, com a diminuição dos poros capilares.

3.3 Determinação da profundidade de carbonatação

Para a análise da carbonatação, foram utilizados dois lotes de amostras. Para o primeiro lote, cujos resultados são apresentados na Figura 7A, as amostras foram secas em estufa antes de serem inseridas na câmara de carbonatação. As amostras do segundo lote foram colocadas na estufa assim que retiradas da cura, ou seja, saturadas de água, e os resultados são mostrados na Figura 7B.

Figura 7
Verificação da região carbonatada de amostras de concreto (A) secas e (B) saturadas em água, após exposição em câmara de carbonatação

De acordo com a Figura 7A, até aos 21 dias de exposição não foi observada carbonatação considerável nas amostras. Esse comportamento se deve ao fato de as amostras terem sido inseridas na câmara no estado seco, ou seja, umidade extremamente baixa, dificultando a ocorrência da reação de carbonatação, que necessita de água. Aos 42 dias, a área carbonatada teve sensível aumento, pois, uma vez que os poros, principalmente os capilares, estavam sem água, a difusão do CO2 tornou-se mais fácil e com a posterior absorção de umidade presente na câmara, o ambiente tornou-se favorável à ocorrência da carbonatação [25[25] WILD, S.; KHATIB, J. M.; JONES, A. Relative strength, pozzolanic activity and cement hydration in superplasticised metakaolin concrete. Cement and Concrete Research, v. 26, n. 10, p. 1537-1544, 1996.].

Na Figura 7B é possível observar que as amostras de referência (REF) e MC5 apresentaram carbonatação já aos 21 dias, e que as amostras MC10 e MC15 apresentaram carbonatação aos 42 dias e 63 dias, respectivamente. Assim, até o final do ensaio, as amostras de referência apresentaram maior área carbonatada, seguidas das amostras MC5, MC10 e MC15, mostrando que a velocidade da reação de carbonatação diminui com o aumento do teor de MC adicionado.

Apesar das amostras inicialmente secas apresentarem uma mais acentuada evolução da reação de carbonatação em comparação às amostras inicialmente úmidas, em ambas as situações a presença do metacaulim resultou numa redução da área carbonatada.

Barbhuiya et al. [9[9] BARBHUIYA, S.; CHOW, P. L.; MEMON, S. Microstructure, hydration and nanomechanical properties of concrete containing metakaolin. Construction and Building Materials, v. 95, p. 696-702, 2015..] mostraram que uma substituição de 10% de massa de cimento por metacaulim não afetou negativamente a resistência à carbonatação, mesmo tendo uma menor concentração de Portlandita (Ca(OH)2) após 28 dias de cura.

3.4 Análise mineralógica

A Figura 10 apresenta o Difratograma de raios X das pastas após 28 dias de cura úmida (Figura 10A) e aos 91 dias de idade sem exposição à câmara de carbonatação (Figura 10B) e de pastas após 63 dias de exposição à câmara de carbonatação (91 dias de idade).

Após 28 dias de hidratação (Figura 8A) todas as amostras apresentam picos intensos de Portlandita (P), mostrando que há uma alta concentração de reserva alcalina nas pastas. Estes resultados mostram que não houve uma redução significativa da Portlandita ao se adicionar metacaulim à mistura, o que contribui para que não haja um aumento da velocidade de carbonatação. Em estudos anteriores [9, 12, 25], pesquisadores mostraram que, ao substituir o cimento por metacaulim, os picos representativos da Portlandita são reduzidos, mostrando um maior consumo desta fase mineralógica, e explicando assim, a avanço mais acelerado da frente de carbonatação. Diferentemente do que ocorre no presente estudo, em que o metacaulim foi adicionado à massa de cimento e a reserva de Ca(OH)2 não foi prejudicada.

Figura 8
Difratogramas das pastas de cimento contendo diferentes teores de metacaulim, (A) na idade controle (após 28 dias de cura úmida) e aos 91 dias, (B) sem exposição ao CO2 e (C) com exposição à câmara de carbonatação, durante 63 dias. E-etringita, T-tobermorita, F-fluorarrojadita, L-larnita, P-portlandita, Q-quartzo, M-muscovita, C-calcita, V-vaterita, A-aragonita

Após os 91 dias (Figura 8B), as amostras apresentaram um incremento na concentração de Portlandita e de Tobermorita, evidenciando que as reações pozolânicas e de hidratação continuaram a ocorrer, favorecidas provavelmente pela umidade residual nos corpos de prova [27[27] EL-GAMAL, S. M. A.; AMIN, M. S.; RAMADAN, M. Hydration characteristics and compressive strength of hardened cement pastes containing nano-metakaolin. HBRC Journal, v. 13, n. 1, p. 114-121, 2015.]. Além disso, as amostras contendo metacaulim apresentaram maiores picos do C-S-H (torbemorita, T).

Nas amostras carbonatadas (Figura 8C) foi verificada uma diminuição na concentração de Portlandita mais acentuada para as amostras contendo metacaulim, consequência da formação dos produtos de carbonato de cálcio (aragonita, A; calcita, C e vaterita, V). Contudo, deve-se atentar que o consumo da Portlandita também é causado pela reação pozolânica, formando o gel C-S-H; assim, nem toda a Portlandita transformou-se em CaCO3. Da mesma forma, a reação de carbonatação ocorre, também, nas fases de C-S-H e outros produtos hidratados do cimento; assim, nem todo CaCO3 formado teve como origem a Portlandita [2[2] CHINCHÓN-PAYÁ, S.; ANDRADE, C.; CHINCHÓN, S. Indicator of carbonation front in concrete as substitute to phenolphthalein. Cement and Concrete Research, v. 82, p. 87-91, 2016.]. Porém, os produtos de C-S-H têm uma maior resistência a carbonatação [6[6] MORANDEAU, A.; THIÉRY, M.; DANGLA, P. Investigation of the carbonation mechanism of CH and C-S-H in terms of kinetics, microstructure changes and moisture properties. Cement and Concrete Research, v. 56, p. 153-170, 2014.].

As amostras contendo MC apresentaram uma reserva alcalina semelhante às observadas nas amostras de referência no início da exposição ao CO2 e uma maior concentração de C-S-H o que, associado a uma redução nos coeficientes de capilaridade para as amostras contendo MC, contribuiu para que as amostras contendo metacaulim apresentassem uma maior resistência à carbonatação.

4. Conclusões

A partir dos resultados obtidos, pode-se concluir que:

  • A adição de metacaulim ao concreto propiciou um aumento da resistência mecânica e diminuição dos poros capilares, principal meio de entrada de agentes agressivos;

  • A adição do metacaulim provocou uma diminuição na porosidade aparente das misturas, contribuindo para uma redução na intensidade das reações de carbonatação e, consequentemente, um retardo do avanço da frente de carbonatação;

  • Amostras expostas à câmara de carbonatação, em estado seco, apresentaram maior facilidade quanto à entrada de CO2, mas, as reações carbonatação não ocorreram por não haver água disponível nos poros. No entanto, estas amostras, ao adquirirem umidade ambiente (cerca de 65%), carbonataram mais rapidamente que amostras completamente saturadas, nas quais o CO2 apresentou dificuldades em se difundir;

  • A técnica de difração de raios X mostrou-se eficiente na avaliação dos produtos provenientes da carbonatação e da reação pozolânica;

  • No que se refere à avaliação da influência do metacaulim na reação de carbonatação, tem-se que seu comportamento ainda é de difícil previsão, devido as mais diversas variáveis influentes, tais como reserva alcalina inicial, microestrutura formada, reações simultâneas de hidratação e carbonatação, macroestrutura porosa, umidade, entre outras. Assim, faz-se necessário um estudo específico do concreto especificado em projeto quanto à carbonatação, visando um melhor controle tecnológico do mesmo antes de sua utilização.

5. Agradecimentos

À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB) pela bolsa de pesquisa. Ao Laboratório de Ensaios em Durabilidade dos Materiais (LEDMa) e ao Centro de Ensino e Trabalho em Argamassas (CETA) pelo apoio na realização dos ensaios.

5. References

  • [1]
    THIERY, M., VILLAIN, G., DANGLA, P., PLATRET, G. Investigation of the carbonation front shape on cementitious materials: Effects of the chemical kinetics. Cement and Concrete Research, v. 37, n. 7, p. 1047-1058, 2007.
  • [2]
    CHINCHÓN-PAYÁ, S.; ANDRADE, C.; CHINCHÓN, S. Indicator of carbonation front in concrete as substitute to phenolphthalein. Cement and Concrete Research, v. 82, p. 87-91, 2016.
  • [3]
    ŠAVIJA, B.; LUKOVIĆ, M. Carbonation of cement paste: Understanding, challenges, and opportunities. Construction and Building Materials, v. 117, p. 285-301, 2016
  • [4]
    CASCUDO, O. O controle da corrosão de armaduras em concreto. Goiania: PINI e UFG, 1997, 237 p.
  • [5]
    RIBEIRO, D. Corrosão em estruturas de concreto armado como consequência da carbonatação e da ação dos cloretos. In: Corrosão e degradação em estruturas de concreto. Ribeiro, D. (cord), Rio de Janeiro: Elsevier, 2018.
  • [6]
    MORANDEAU, A.; THIÉRY, M.; DANGLA, P. Investigation of the carbonation mechanism of CH and C-S-H in terms of kinetics, microstructure changes and moisture properties. Cement and Concrete Research, v. 56, p. 153-170, 2014.
  • [7]
    FIGUEIREDO, C. P.; SANTOS, F. B.; CASCUDO, O.; CARASEK, H.; CACHIM, P.; VELOSA, A. The role of metakaolin in the protection of concrete against the deleterious action of chlorides. Revista IBRACON de Estruturas e Materiais, v. 7, p. 685-708, 2014..
  • [8]
    SIDDIQUE, R.; KLAUS, J. Influence of metakaolin on the properties of mortar and concrete: A review. Applied Clay Science, v. 43, n. 3-4, p. 392-400, 2009.
  • [9]
    BARBHUIYA, S.; CHOW, P. L.; MEMON, S. Microstructure, hydration and nanomechanical properties of concrete containing metakaolin. Construction and Building Materials, v. 95, p. 696-702, 2015..
  • [10]
    RILEM. 1994. Measurement of hardened concrete carbonation depth. In: RILEM Recommendations for the Testing and Use of Constructions Materials, p.56 -58.
  • [11]
    YAJUN, J.; CAHYADI, J. H. Effects of densified silica fume on microstructure and compressive strength of blended cement pastes. Cement and Concrete Research, v. 33, n. 10, p. 1543-1548, 2003.
  • [12]
    RAMEZANIANPOUR, A. A.; BAHRAMI JOVEIN, H. Influence of metakaolin as supplementary cementing material on strength and durability of concretes. Construction and Building Materials, v. 30, p. 470-479, 2012.
  • [13]
    ASHISH, D. K. Concrete made with waste marble powder and supplementary cementitious material for sustainable development. Journal of Cleaner Production, v. 211, p. 716-729, 2019.
  • [14]
    KIM, H. S.; LEE, S. H.; MOON, H. Y. Strength properties and durability aspects of high strength concrete using Korean metakaolin. Construction and Building Materials, v. 21, n. 6, p. 1229-1237, 2007.
  • [15]
    ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, Agregados - Determinação da composição granulométrica - NBR NM 248. Rio de Janeiro, 2003.
  • [16]
    ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, Agregados - Determinação da massa unitária e do volume de vazios - NBR NM 45. Rio de Janeiro, 2006.
  • [17]
    ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, Agregados - Determinação da massa específica de agregados miúdos por meio do frasco de Chapman - NBR 9776. Rio de Janeiro, 1987.
  • [18]
    ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, Agregados graúdo - Determinação da massa específica aparente e absorção de água - NBR NM 53. Rio de Janeiro, 2009.
  • [19]
    INSTITUTO PORTUGUÊS DE QUALIDADE, NP EN 196 - Métodos de ensaio de cimentos. 1996.
  • [20]
    ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, Argamassa para assentamento e revestimento de paredes e tetos - Determinação da resistência à tração na flexão e à compressão - NBR 13279, Rio de Janeiro, 2005.
  • [21]
    ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, Argamassa e concreto endurecidos - Determinação da absorção de água por capilaridade - NBR 9779. Rio de Janeiro, 2012.
  • [22]
    ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, Argamassa e concreto endurecidos - Determinação da absorção de água, índice de vazios e massa específica - NBR 9778. Rio de Janeiro, 2005.
  • [23]
    ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, NBR 7211- Agregado para concreto, Rio de Janeiro, 1983.
  • [24]
    ARANDIGOYEN, M. et al. Variation of microstructure with carbonation in lime and blended pastes. Applied Surface Science, v. 252, n. 20, p. 7562-7571, 2006.
  • [25]
    WILD, S.; KHATIB, J. M.; JONES, A. Relative strength, pozzolanic activity and cement hydration in superplasticised metakaolin concrete. Cement and Concrete Research, v. 26, n. 10, p. 1537-1544, 1996.
  • [26]
    MIKHAILENKO, P. et al. Influence of physico-chemical characteristics on the carbonation of cement paste at high replacement rates of metakaolin. Construction and Building Materials, v. 158, p. 164-172, 2018.
  • [27]
    EL-GAMAL, S. M. A.; AMIN, M. S.; RAMADAN, M. Hydration characteristics and compressive strength of hardened cement pastes containing nano-metakaolin. HBRC Journal, v. 13, n. 1, p. 114-121, 2015.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Mar 2020
  • Data do Fascículo
    Jan-Feb 2020

Histórico

  • Recebido
    29 Jun 2017
  • Aceito
    19 Mar 2018
IBRACON - Instituto Brasileiro do Concreto Instituto Brasileiro do Concreto (IBRACON), Av. Queiroz Filho, nº 1700 sala 407/408 Torre D, Villa Lobos Office Park, CEP 05319-000, São Paulo, SP - Brasil, Tel. (55 11) 3735-0202, Fax: (55 11) 3733-2190 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: arlene@ibracon.org.br