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A HISTÓRIA DE FRANCISCO GONÇALVES BRAGA: O PRIMEIRO MESTRE DE MACHADO DE ASSIS

THE STORY OF FRANCISCO GONÇALVES BRAGA: THE FIRST MASTER OF MACHADO DE ASSIS

Resumo

Considerado o "primeiro mestre" de Machado de Assis, o poeta português Francisco Gonçalves Braga (1836-1860) é um ilustre desconhecido nas literaturas brasileira e portuguesa. Dessa forma, o artigo mostra aspectos da vida literária de Gonçalves Braga, sobretudo nos seis anos em que viveu no Rio de Janeiro.

Palavras-chave:
Francisco Gonçalves Braga; vida literária; Rio de Janeiro

Abstract

Considered the "first master" of Machado de Assis, the Portuguese poet Francisco Gonçalves Braga (1836-1860) is an illustrious unknown in Brazilian and Portuguese literatures. Thus, the article shows aspects of Gonçalves Braga's literary life, especially during the six years he lived in Rio de Janeiro.

Keywords:
Francisco Gonçalves Braga; literary life; Rio de Janeiro

Embora tenha escrito e publicado toda sua (pequena) obra literária no Brasil, o poeta português Francisco Gonçalves Braga (1836-1860) é interessante exemplo de ilustre desconhecido, tanto na literatura brasileira quanto na portuguesa. Mas, a despeito de pontuais repercussões da obra, de cá ou de lá do Atlântico, e da morte precoce, a obscuridade do português não é definitiva, seu nome sempre aparece, aqui e ali, associado ao do então jovem poeta Joaquim Maria Machado de Assis. Na verdade, como salientou Jean-Michel Massa, Gonçalves Braga foi a primeira influência poética sobre Machado, "um exemplo imitado, copiado e, digamos a palavra certa, plagiado" (MASSA, 2009MASSA, Jean-Michel. A juventude de Machado de Assis, 1839-1870: ensaio de biografia intelectual. Trad. de Marco Aurélio de Moura Matos. 2. ed. São Paulo: Editora UNESP, 2009., p. 111). Enquanto se esforçava para relativizar a influência do português sobre o brasileiro, o crítico complementou:

Qualquer versificador teria representado o mesmo papel, atuando como uma espécie de catalizador. Mas foi por intermédio de Braga que Machado de Assis estabeleceu contato com todo um patrimônio poético. Infelizmente era um autor medíocre, um versejador desajeitado que devolvia, como um eco, os sons dos versos que estavam na moda. (MASSA, 2009MASSA, Jean-Michel. A juventude de Machado de Assis, 1839-1870: ensaio de biografia intelectual. Trad. de Marco Aurélio de Moura Matos. 2. ed. São Paulo: Editora UNESP, 2009., p. 113)

Apesar do olhar reticente de Jean-Michel Massa, não se pode menosprezar essa primeira influência, pois, no início da vida literária, entre 1854 e 1858, Machado de Assis praticamente gravitou em torno de Gonçalves Braga. Ao que tudo indica, conheceram-se em 1854BRAGA, Francisco Gonçalves. Requerimento a Diogo Soares da Silva de Bivar, solicitando exame censório na peça: Maria Espanhola. Rio de Janeiro, 4 ago. 1854. Biblioteca Nacional - Manuscrito (I-8, 11-28)., pouco depois da chegada, em maio, do português ao Rio de Janeiro. No entanto, antes de se preocupar em mostrar como os caminhos dos jovens poetas se cruzaram, é importante traçar o percurso desse desconhecido autor pela cidade do Rio de Janeiro.

Os primeiros movimentos

De modo geral, as informações sobre a vida de Francisco Gonçalves Braga são escassas. Jean-Michel Massa afirma que nasceu em 25 de julho de 1836 na cidade portuguesa que lhe deu o sobrenome e "chegou jovem ao Recife, que trocou pelo Rio em 1854" (MASSA, 2009MASSA, Jean-Michel. A juventude de Machado de Assis, 1839-1870: ensaio de biografia intelectual. Trad. de Marco Aurélio de Moura Matos. 2. ed. São Paulo: Editora UNESP, 2009., p. 105). Se nos oito anos que morou no Recife não há quase nenhum registro, exceto a menção de seu nome como "acionista" do Gabinete Português de Leitura de Pernambuco (Cf. Anuário Administrativo e Literário do Gabinete Português de Leitura de Pernambuco, 1854ANUÁRIO ADMINISTRATIVO E LITERÁRIO DO GABIBENTE PORTUGUÊS DE LEITURA DE PERNAMBUCO. Recife: Tipografia Universal, 1854., p. 11) e outra breve referência em artigo publicado pelo próprio autor, em junho de 1857, no Correio Mercantil, afirmaria "que durante o tempo em que esteve em Pernambuco foi em companhia de seus caros pais e irmãos, vivendo do seu trabalho, humilde mais dignamente" (CORREIO MERCANTIL, 1857bCORREIO MERCANTIL. n. 172, 24 jun. 1857b., p. 2). Nos seis anos seguintes em que viveu no Rio de Janeiro, é possível mapear informações mais precisas. Sobretudo, as decorrentes dos evidentes esforços do poeta português para entrar e ao mesmo tempo se fazer aceito pelo restrito universo literário brasileiro.

Aliás, ainda no Recife, Gonçalves Braga se aproximou de literatos ligados à cena teatral da província. Não por acaso, Tentativas poéticas, "em sinal de gratidão e amizade", seria dedicado aos "senhores doutores: José Soares de Azevedo, Antônio Rangel de Torres Bandeira e Antônio Marques Rodrigues" (BRAGA, 1856g______. Tentativas poéticas. Rio de Janeiro: Tipografia de Nicolau Lobo Vianna & Filhos, 1856g., p. 5), que faziam parte da diretoria do recém-criado Conservatório Dramático de Pernambuco (DIÁRIO DE PERNAMBUCO, 1854DIÁRIO DE PERNAMBUCO. Recife, n. 69, 24 mar. 1854., p. 3). Para reafirmar as homenagens, um poema acompanhava a dedicatória. Nele, entre outros aspectos, Braga justifica:

[...] Na frente de meu livro Vossos nomes escrevo: a vós somente, A quem eu devo animação sincera, Eu devia oferecer meus pobres versos, Frutos mesquinhos da mesquinha ideia D'um tímido poeta. [...] (BRAGA, 1856g______. Tentativas poéticas. Rio de Janeiro: Tipografia de Nicolau Lobo Vianna & Filhos, 1856g., p. 6)

Assim que chegou ao Rio de Janeiro, em 9 de maio de 1854, e impulsionado por aquela animação sincera dos amigos do Recife, Gonçalves Braga começou a se movimentar, tentando ingressar justamente no cenário teatral da cidade. No dia 4 de agosto de 1854, em ofício ao conselheiro Diogo Soares da Silva de Bivar, então presidente do Conservatório Dramático Brasileiro, solicitou, como primeiro passo, que fosse realizado o exame censório do drama Maria espanhola, que, por sinal, acabou proibido por imoralidade. Nas palavras do censor: "O infeliz, que escreveu este drama, atreve-se afrontar contra instituições, contra moral, contra religiões!" (BRAGA, 1854BRAGA, Francisco Gonçalves. Requerimento a Diogo Soares da Silva de Bivar, solicitando exame censório na peça: Maria Espanhola. Rio de Janeiro, 4 ago. 1854. Biblioteca Nacional - Manuscrito (I-8, 11-28).).

As Tentativas poéticas

Francisco Gonçalves Braga, que, "na voragem das necessidades materiais", sobreviveu às dificuldades do dia a dia e, provavelmente, morreu trabalhando como caixeiro,1 1 No dia 11 de agosto de 1864, em carta publicada no jornal carioca O Português (1861-1865) a Francisco Ramos Paz, Francisco Gomes Amorim, ao escrever sobre as dificuldades de sua trajetória literária, lamenta o destino de "Gonçalves Braga, morto no desterro como caixeiro!". (AMORIM, 1864, p. 1-2, grifos nossos) movimentou-se o quanto pôde para se fazer conhecido do público luso-brasileiro, seja publicando poemas em diversos periódicos locais, seja através do desejo de publicá-los em livro. Quase dois anos depois de sua chegada à capital do Império, a seguinte nota, publicada no jornal A Semana (1855-1857), em 13 de abril de 1856, anunciava:

O Sr. Francisco Gonçalves Braga está imprimindo uma coleção de poesias com o título de Tentativas poéticas, que são as primícias de seu talento poético. O Sr. Gonçalves Braga já é conhecido do público por algumas de suas poesias, que tem publicado no jornalismo. (A SEMANA, 1856SEMANA (A). Rio de Janeiro, n. 19, 13 abr. 1856., p. 1)

Embora anunciasse a impressão das Tentativas poéticas e sugerisse que o poeta "já é conhecido do público", a realidade era tortuosa e as dificuldades financeiras, enormes. De início, para viabilizar o livro, Braga recorreu ao comum expediente de venda de assinaturas. A partir de 18 de julho de 1855, começou a aparecer no Correio Mercantil anúncio em que o jornal afirmava receber "no escritório dessa folha assinaturas" para, entre outras obras, auxiliar a publicação das Tentativas poéticas (CORREIO MERCANTIL, 1855CORREIO MERCANTIL. n. 197, 18 jul. 1855., p. 3). O percurso foi longo, e o livro somente sairia dos prelos em outubro de 1856. Como foi noticiado em 21 de outubro pelo Diário do Rio de Janeiro, então dirigido por José de Alencar: "Acaba de ser publicado um volume de poesia intitulado Tentativas poéticas, e composto pelo Sr. Francisco Gonçalves Braga. O título modesto do livro deixa ver no seu autor uma esperança tímida que nos parece dever animar-se" (DIÁRIO DO RIO DE JANEIRO, 1856DIÁRIO DO RIO DE JANEIRO. Rio de Janeiro, n. 292, 21 out. 1856., p. 1); e no dia seguinte pelo Correio Mercantil: "O Sr. Francisco Gonçalves Braga acaba de publicar um volume de versos sob o título de Tentativas poéticas. A modéstia do título recomenda o livro" (CORREIO MERCANTIL, 1856aCORREIO MERCANTIL. n. 291, 22 out. 1856a., p. 1).

O obséquio das notas se deveu provavelmente ao fato de Gonçalves Braga ter publicado anteriormente poemas nos dois jornais. Se, por um lado, o aparecimento do livro de um desconhecido, que apresentava as "primícias de seu talento poético" e ocupava lugar periférico no cenário literário, não produziu maiores repercussões na imprensa; por outro, Tentativas poéticas é exemplo pontual de obra diluidora, permeada até a alma de lugares-comuns do ideário romântico luso-brasileiro. O que é detectado por rápida vista de olhos sobre os sessenta poemas do livro, e, como forma de demarcar filiação estética, pelo uso exagerado de epígrafes oriundas das duas tradições literárias.

Quanto ao livro, ao reproduzir a estrofe final do poema "A minha lira" no frontispício da obra, Gonçalves Braga antecipava aos eventuais leitores quais eram suas principais constantes temáticas:

A lira dos meus ternos pensamentos Que me alegra nas horas da saudade Encerra quatro nobres sentimentos: Amor e Pátria, Deus e Liberdade!" (BRAGA, 1856g______. Tentativas poéticas. Rio de Janeiro: Tipografia de Nicolau Lobo Vianna & Filhos, 1856g., p. 91-93)

Além de insistir à exaustão nos quatro temas, o poeta, como rezava a cartilha romântica, abriu seu volume com o programático "A cruz e a lira" que, dedicado de forma genérica ao "poeta", discutia, em tom elevado, a missão dos poetas no mundo. Prescrita por Deus, que lhe enviou a cruz e a lira, ou seja, a religião e a poesia, cabia, pois, ao poeta espalhá-las pelo mundo, para consolar os desgraçados e denunciar o poder dos potentados. Embora a missão fosse nobre e o reconhecimento do esforço empurrado para um futuro e incerto devir, o poeta, assumindo-se como mártir, deveria, portanto, resignar-se ao seu fado, cumprindo duplo destino no mundo, padecer e cantar.

O Grêmio Literário Português

Em meados de 1856, enquanto lutava para viabilizar as Tentativas poéticas, Gonçalves Braga se aproximou do Grêmio Literário Português do Rio de Janeiro. Fundado em 12 de fevereiro de 1855 por imigrantes portugueses, sobretudo jovens que, dotados de instrução formal, trabalhavam como caixeiros no comércio da cidade, o Grêmio era uma associação eminentemente literária. Ou seja, enquanto labutavam na exaustiva rotina de trabalho, almejando - a maioria deles - tornarem-se comerciantes, os caixeiros com veleidades artísticas poderiam compensar as dificuldades cotidianas no novo país expressando inquietações amorosas ou existenciais e, por fim, as saudades de Portugal através da própria literatura. Dessa forma, não causa surpresa que o Grêmio Literário Português tenha batizado sua revista literária de A Saudade - Publicação literária e instrutiva.

A partir de junho de 1856, Gonçalves Braga publicou ao longo do segundo semestre cinco poemas em A Saudade: "A Lua e o Douro"; "Portugal" (Parte I); "Portugal" (Parte II); "Almeida Garrett"; "O canto do Salteador" e "Um beijo" (BRAGA, 1856a______. A Lua e o Douro. A Saudade, Rio de Janeiro, n. 18, 8 jun. 1856a, p. 142-143., p. 142-143; 1856b, p. 183-184; 1856c, p. 191-192; 1856d, p. 16; 1856e, p. 69; e 1856f, p. 135, respectivamente). Dos cinco, os quatro primeiros faziam menções ao livro em preparação. De todo modo, a acolhida do jovem poeta pelo Grêmio Literário foi das melhores. Quando saiu o poema - "Portugal", dedicado "aos meus compatriotas" -, publicado em duas partes, ambas em julho de 1856, a redação do periódico fez questão de lhe agradecer com a seguinte nota: "Agradecemos ao Illm. Sr. Francisco Gonçalves Braga, autor da excelente poesia - 'Portugal' - a oferta que nos fez dela para A Saudade, pedindo-lhe que queira continuar a honrar-nos com suas produções" (A SAUDADE, 1856aSAUDADE (A). Rio de Janeiro, n. 23, 13 jul. 1856a, p. 183. , p. 183).

Atendendo ao pedido, Francisco Gonçalves Braga não somente se tornou membro do Grêmio Literário Português, como também, em fins de 1856 e ao longo do ano de 1857, elegeu-se presidente da agremiação por duas vezes. Na verdade, Braga assumiu a presidência num momento difícil, sobretudo em função das dificuldades financeiras ocasionadas pela manutenção d'A Saudade. Em fins de dezembro de 1856, por exemplo, uma nota aos assinantes pedia desculpas pelos "obstáculos imprevistos, e que se não podiam remediar de pronto, tem retardado a publicação deste número. Envidaremos todos os esforços para os remover; entretanto é possível que A Saudade não se publique nesta e na seguinte semana" (A SAUDADE, 1856bSAUDADE (A). Rio de janeiro, n. 18, 28 dez. 1856b., p. 1). Para resolver a situação e já sob a presidência de Gonçalves Braga, foi apresentada aos sócios do Grêmio, no dia 8 de fevereiro de 1857, uma proposta de reforma estatutária, que, aprovada no dia 19, previa, entre outras mudanças, o fim do periódico e sua substituição por uma publicação anual, cujo título seria Álbum do Grêmio Literário Português no Rio de Janeiro, e estabelecia mudanças na duração do mandato das novas diretorias, que passaria de três para seis meses, com eleições em fevereiro e agosto (ESTATUTO DO GRÊMIO LITERÁRIO PORTUGUÊS, 1857ESTATUTO DO GRÊMIO LITERÁRIO PORTUGUÊS. Rio de Janeiro: Tipografia de Peixoto e Leite, 1857., p. 4 e 10).

No relatório da primeira gestão, de 23 de agosto de 1857, Gonçalves Braga afirmou que "a Diretoria que me substituir achará o Grêmio livre do seu gérmen de dificuldades: A Saudade" (BRAGA, 1857b_____. Relatórios assinados por Francisco Gonçalves Braga, presidente da diretoria do Grêmio Literário Português, sobre o estado da referida instituição. Rio de Janeiro, 1857b. Biblioteca Nacional - Manuscrito (I-48,04,007)., p. 3). No decorrer do texto, Braga, por um lado, insistiu na importância da publicação do Álbum. E, por outro, apresentou nova "missão" aos associados do Grêmio Literário - a campanha para erigir em Lisboa um monumento em homenagem a Camões. Em suas palavras: "[...] o monumento ao gênio e à glória de um homem que reúne em si todos os gênios e todas glórias nacionais." (BRAGA, 1857b_____. Relatórios assinados por Francisco Gonçalves Braga, presidente da diretoria do Grêmio Literário Português, sobre o estado da referida instituição. Rio de Janeiro, 1857b. Biblioteca Nacional - Manuscrito (I-48,04,007)., p. 13).

Além do primeiro relatório de gestão, existe um segundo que, apesar de não datado, atesta que Gonçalves Braga fora reeleito. Corroborando a continuidade no cargo, ele escreve, por exemplo, que "por ocasião do passado relatório nutri a lisonjeira esperança de que as minhas palavras achariam ecos em vossos corações, e que o Grêmio atingiria nesses 6 meses ao fim honroso a que se propõe" (BRAGA, 1857b_____. Relatórios assinados por Francisco Gonçalves Braga, presidente da diretoria do Grêmio Literário Português, sobre o estado da referida instituição. Rio de Janeiro, 1857b. Biblioteca Nacional - Manuscrito (I-48,04,007)., p. 15, grifos nossos). De todo modo, no segundo relatório, lamentava as dificuldades que o Grêmio Literário vinha enfrentando, mas não deixou de animar os "irmãos", que "procuramos sempre a união que deve existir em Associações como a nossa e posso afirmar com prazer que estamos e continuaremos nas mesmas disposições" (BRAGA, 1857b_____. Relatórios assinados por Francisco Gonçalves Braga, presidente da diretoria do Grêmio Literário Português, sobre o estado da referida instituição. Rio de Janeiro, 1857b. Biblioteca Nacional - Manuscrito (I-48,04,007)., p. 17). Na verdade, estava preocupado com o atraso do Álbum, pois, considerava a publicação vital para a existência do Grêmio.

Em 24 de março de 1858, conforme o Diário do Rio de Janeiro, Reinaldo Carlos Montoro foi eleito presidente do Grêmio Literário Português. Naquele momento, e ecoando de perto as preocupações de Gonçalves Braga, o principal intuito da associação era o de levar adiante a publicação do Álbum. Inclusive, Braga, que teria participação na preparação do livro, também fazia parte da nova diretoria, como membro da comissão de redação. (DIÁRIO DO RIO DE JANEIRO, 1858aDIÁRIO DO RIO DE JANEIRO. n. 80, 24 mar. 1858a., p.1)

O Álbum do Grêmio Literário Português

De fato, Francisco Gonçalves Braga estava certo, o Álbum, como sugerira com insistência em seus relatórios, trouxe maior visibilidade ao Grêmio Literário Português. O aparecimento da publicação, que saíra no início de outubro de 1858, foi saudado de imediato pelo Diário do Rio de Janeiro, que louvou a iniciativa do Grêmio, "que conta tantos jovens inteligentes e esperançosos" (DIÁRIO DO RIO DE JANEIRO, 1858bDIÁRIO DO RIO DE JANEIRO. n. 269, 05 out. 1858b., p. 1). À margem das instâncias oficiais e desejando ampliar o espaço de atuação dos imigrantes portugueses na vida cultural do Rio de Janeiro, os membros do Grêmio Literário - "sonhando c'o a glória/ O Sábio caixeiro," (LOUSADA, 1858LOUSADA, J. Coelho. O caixeiro literato. Álbum do Grêmio Literário Português. Rio de Janeiro: Tipografia de Teixeira e Companhia , 1858, p.76-77., p. 76-77) -, no texto de apresentação, dedicado a Alexandre Herculano, acreditavam que a publicação era ousada empresa de "homens do povo" que "vieram do exílio disseminar pela pátria em épocas de tristes recordações a cópia de conhecimentos, que em alheias terras haviam adquirido" (ÁLBUM DO GRÊMIO LITERÁRIO PORTUGUÊS, 1858ÁLBUM DO GRÊMIO LITERÁRIO PORTUGUÊS NO RIO DE JANEIRO. Rio de Janeiro: Tipografia de Teixeira e Companhia, 1858., p. VII).

Na realidade, o Álbum não trouxe apenas maior visibilidade ao Grêmio, mas, sobretudo, ao próprio Francisco Gonçalves Braga, que, além de ter participado da preparação do livro, publicou oito poemas: "Béranger"; "Desejos"; "Garrett"; "Os cinco sentidos"; "Transição"; "Pedido"; "A uma menina" e "A Lamartine" (BRAGA, 1858______. "Béranger"; "Desejos"; "Garrett"; "Os cinco sentidos"; "Transição"; "Pedido"; "A uma menina" e "A Lamartine". Álbum do Grêmio Literário Português. Rio de Janeiro: Tipografia de Teixeira e Companhia, 1858, p. 17-24; 104-106; 153-158; 210-211; 224; 251-252; 263 e 267., p. 17-24; 104-106; 153-158; 210-211; 224; 251-252; 263 e 267, respectivamente). De modo geral, nos artigos que noticiaram e/ou repercutiram o aparecimento da nova publicação do Grêmio, foram feitas várias menções ao poeta, em função do impacto causado pelo poema à morte de Béranger. No início de novembro, Luiz José Pereira da Silva escreveu resenha de fôlego - "Duas palavras" -, dessa vez, no entanto, no Correio da Tarde. Pereira da Silva dedicou grande parte do artigo a Gonçalves Braga e ao poema "Béranger":

Logo na segunda página do Álbum encontra o leitor uma poesia cheia de força e de majestade. É um canto em honra a Béranger; é uma inspiração bem própria de um desses talentos, cuja vida marca ordinariamente uma época para a literatura de um povo, é uma epopeia completa pela qual o Sr. F. Gonçalves Braga se levantou um título de glória.

O poeta elevou-se à altura de seu talento, [...].

Esta poesia do Sr. Gonçalves Braga é o que do melhor temos lido nesse gênero. Em seu lugar teríamos escolhido outra forma, e talvez o pensamento aparecesse mais colorido, e as imagens tivessem mais força; isso, porém, não desmerece dos versos, porque neles sobra majestade e natureza.

Se o senhor Gonçalves Braga só tivesse publicado no Álbum do Grêmio Literário Português o seu "Béranger" tinha cumprido sua missão e tinha-o enriquecido como se podia desejar. [...]

O Sr. Gonçalves Braga é poeta! (SILVA, 1858SILVA, Luiz José Pereira da. Duas palavras. Correio da Tarde, Rio de Janeiro, n. 246, 5 nov. 1858, p. 1-2., p. 1-2)

Se a apreciação crítica trouxe satisfação pessoal a Gonçalves Braga, sobretudo pelo reconhecimento de que era "poeta", dez dias depois, outra resenha - "Novidades velhas" -, no Diário do Rio de Janeiro, deve ter aumentado a satisfação, já que também não economizou nos adjetivos. Assinado por "N.", o crítico, ao se referir ao poema "Béranger", que, na opinião dele, "era justamente a composição que devia inaugurar as páginas do Álbum", não se furtou em assinalar:

Há nos versos do Sr. Gonçalves Braga, além de uma linguagem harmoniosa, elevação de ideias, a semente das crenças de uma civilização cujo horizonte se dilata nos destinos futuros da humanidade e dominando em toda a composição o espírito de fraternidade que nivela os homens de todas as nações perante o sentimento imortal que range em torno da tumba do gênio a falange inteligente, como os membros de uma mesma família se reúnem no dia em que a morte lhes rouba um irmão querido. (DIÁRIO DO RIO DE JANEIRO, 1858dDIÁRIO DO RIO DE JANEIRO. n. 304, 15 nov. 1858d, p. 2)

De fato, Gonçalves Braga encontrou um tema que estava na ordem do dia, o que contribuiu para potencializar o sucesso do poema. A morte de Pierre-Jean de Béranger, em 16 de julho de 1857, teve ampla repercussão no Rio de Janeiro, tendo sido publicados inúmeros folhetins, artigos e algumas traduções. Em janeiro de 1858, por exemplo, o Correio Mercantil publicou, em duas edições, fragmentos sobre a vida de Béranger, escrita pela "lavra do imortal [...] Lamartine", para quem, "Béranger era o eco da revolução, o eco do exército: o povo e o exército ouviam-se nele sentir, pensar, amar, odiar e conspirar: era o homem-nação" (CORREIO MERCANTIL, 1858aCORREIO MERCANTIL. n. 10, 12 jan. 1858a., p. 1; 1858bCORREIO MERCANTIL. n. 18, 20 jan. 1858b., p. 1). Como Lamartine fora homenageado por Braga no Álbum e também é citado no poema a Béranger como o "Homero da Europa", talvez esteja aí, nos fragmentos biográficos do Correio Mercantil, a fonte de "inspiração" do poema, de abril de 1858. De todo modo, a despeito da escolha de tema atual ou da identificação da fonte, ao louvar o revolucionário Béranger, Braga escreveu um poema que, na opinião dos críticos, atestava o seu desenvolvimento literário. Veja-se, nesse sentido, alguns fragmentos do longo poema:

I Em luto está Paris, a França, a Europa inteira! Das ruas da cidade augusta das grandezas Fugiram vida e luz! O povo errante exprime a dor mais verdadeira Por ter morrido o sol das ínclitas empresas, Que um nome só traduz! [...] Nome qual o do Homero da Europa - Lamartine Tal nome é Béranger! II Era um homem-nação! A França inteira No seu coração nobre se abrigava, E nele é que sentia! E nos seus olhos de alma verdadeira, Onde a luz da república brilhava, Exultava ou sofria! Quando soava a marcial trombeta, Quando o povo agitava-se nas ruas Em grandes convulsões, Ele que foi-lhe oráculo e profeta, P'ra dominá-lo erguia uma de suas Inspiradas canções! VII Dorme, oh poeta, o sono derradeiro, Que a memória o velho cancioneiro Há de ir à eternidade! E à voz da pátria, a geração futura Erguerá sobre a tua sepultura O altar da liberdade! (BRAGA, 1858______. "Béranger"; "Desejos"; "Garrett"; "Os cinco sentidos"; "Transição"; "Pedido"; "A uma menina" e "A Lamartine". Álbum do Grêmio Literário Português. Rio de Janeiro: Tipografia de Teixeira e Companhia, 1858, p. 17-24; 104-106; 153-158; 210-211; 224; 251-252; 263 e 267., p. 17-24)

Com certeza, o poema de Gonçalves Braga foi o que causou maior repercussão entre leitores e críticos. Em outra longa resenha, publicada, em 12 de novembro de 1858, no Diário do Rio de Janeiro, sob o título de "Impressões de Leitura", o crítico, que não se identificou, realizou a primeira valoração crítica do percurso poético de Braga. Nas suas palavras:

O Sr. Gonçalves Braga, do Álbum, não é o mesmo das Tentativas poéticas, publicação infeliz na opinião do próprio autor. Há entre os dois livros as diferenças de duas épocas. As Tentativas poéticas são as primeiras emanações de uma alma muito criança, para quem os segredos da arte eram ainda puramente segredos. Produções informes de uma vocação que aparecia, os primeiros versos do Sr. Braga reproduziram os defeitos de todas as tendências em embrião; e revelavam a leitura de muitos poetas modernos, que podem ser tudo, exceto modelos. Publicado o livro, o poeta reconheceu que tem feito mal, e que remediá-lo: estudou. [...]. O poeta modificou-se inteiramente. Uma só das suas produções últimas vale por todo o livro publicado em 1856. Este progresso ascendente é uma prova que o Sr. Braga pode ocupar uma posição literária.

[...] Não me dilato com o Sr. G. Braga. Poeta estudioso, cheio de fé, e de vida, tem a vantagem de fazer um culto exclusivo das letras. (DIÁRIO DO RIO DE JANEIRO, 1858cDIÁRIO DO RIO DE JANEIRO. n. 301, 12 nov. 1858c., p. 1-2)

Na apreciação do crítico, o "progresso ascendente" de Gonçalves Braga seria explicado por nova postura diante da literatura, calcada no estudo, o que, nesse sentido, "modificou-[o] inteiramente". Ainda para o crítico, ao fazer mea culpa - "publicação infeliz" - em relação ao livro de estreia, Braga sinalizava com suas novas produções que poderia vir a "ocupar uma posição literária", uma vez que, "como [...] estudioso, [...], tem a vantagem de fazer um culto exclusivo das letras". Entretanto, esta afirmação deixa outra dúvida no ar, que é a de saber como o poeta conseguiu conciliar a rotina do trabalho de caixeiro com os estudos de literatura, enfim, como conseguiu obter mais tempo para se dedicar ao culto exclusivo das letras? Ao contrário do que se supunha que sempre trabalhara como caixeiro, Gonçalves Braga, na verdade, arrumou outro emprego.

Em cinco artigos, publicados na segunda série de A Saudade (1861-1862), V. dos Santos Pereira, que pretendia inserir o já falecido poeta no cenário literário luso-brasileiro, passou em revista sua produção literária (PEREIRA, 1861aPEREIRA, V. dos Santos. Poesias de Francisco Gonçalves Braga. A Saudade - 2º série. Rio de Janeiro: n. 8, 21 jul. 1861a, p. 57-58; n. 9, 4 ago. de 1861b, p. 65-66; n. 9, 01 set. 1861c, p. 85-87; n. 16, 17 nov. 1861d, p. 134-136; e n. 18, 15 dez. 1861e, p. 154-155., p. 57-58; 1861bPEREIRA, V. dos Santos. Poesias de Francisco Gonçalves Braga. A Saudade - 2º série. Rio de Janeiro: n. 8, 21 jul. 1861a, p. 57-58; n. 9, 4 ago. de 1861b, p. 65-66; n. 9, 01 set. 1861c, p. 85-87; n. 16, 17 nov. 1861d, p. 134-136; e n. 18, 15 dez. 1861e, p. 154-155., p. 65-66; 1861cPEREIRA, V. dos Santos. Poesias de Francisco Gonçalves Braga. A Saudade - 2º série. Rio de Janeiro: n. 8, 21 jul. 1861a, p. 57-58; n. 9, 4 ago. de 1861b, p. 65-66; n. 9, 01 set. 1861c, p. 85-87; n. 16, 17 nov. 1861d, p. 134-136; e n. 18, 15 dez. 1861e, p. 154-155., p. 85-87; 1861cPEREIRA, V. dos Santos. Poesias de Francisco Gonçalves Braga. A Saudade - 2º série. Rio de Janeiro: n. 8, 21 jul. 1861a, p. 57-58; n. 9, 4 ago. de 1861b, p. 65-66; n. 9, 01 set. 1861c, p. 85-87; n. 16, 17 nov. 1861d, p. 134-136; e n. 18, 15 dez. 1861e, p. 154-155., p. 134-136 e 1861dPEREIRA, V. dos Santos. Poesias de Francisco Gonçalves Braga. A Saudade - 2º série. Rio de Janeiro: n. 8, 21 jul. 1861a, p. 57-58; n. 9, 4 ago. de 1861b, p. 65-66; n. 9, 01 set. 1861c, p. 85-87; n. 16, 17 nov. 1861d, p. 134-136; e n. 18, 15 dez. 1861e, p. 154-155., p. 154-155, respectivamente). No terceiro artigo, Pereira, ao discutir Tentativas poéticas, afirmou que Braga "conhecia [...] o pouco valor dessas suas produções que arrependeu-se imediatamente [...]". Na continuação do texto, e não somente informou que o conhecera numa "sessão do Grêmio Literário Português, que ele presidia", ou seja, em algum momento de 1857, como observou que, depois da estreia em livro, estava "cônscio de que seria mister estudar muito para poder produzir alguma coisa de mérito". Mas, se até então "de mui tenra idade se havia aplicado à carreira comercial", agora, Gonçalves Braga, livre do "materialismo das cifras", entregou-se:

[...] com afã à leitura dos bons modelos, aos quais consagrava o tempo em que restava do seu novo emprego de amanuense de Advogado. A avidez do saber, e o instinto natural de uma vocação não desmentida, o levaram bem depressa a procurar a convivência de outros mancebos que como ele também buscavam reabilitar-se pelo estudo, e preencher por esse meio o imenso vácuo que sentiam, já que não haviam tido as ditas dos nobilitados da fortuna, nem alisado com eles os bancos da academia. (PEREIRA, 1861c, p. 85, grifos nossos)

A novidade da mudança de emprego de Gonçalves Braga, de caixeiro para amanuense de advogado, bem como a "vocação não desmentida" que o levou a "procurar a convivência de outros mancebos que como ele também buscavam reabilitar-se pelo estudo", coincidem com o momento em que, em torno do advogado Caetano Alves de Sousa Filgueiras, alguns jovens autores, ao fim do expediente de trabalho, começaram a se reunir "na salinha de [seu] escritório" para discutirem literatura. Seria o início do chamado Grupo dos Cinco, às vezes sete, do qual faziam parte, além de Filgueiras e Braga, os jovens Casimiro de Abreu, Cândido de Macedo (o Macedinho) e Machado de Assis.2 2 Jean-Michel Massa afirma que o grupo se constitui ao longo de 1857, salientando, no entanto, que Casimiro de Abreu retornara de Lisboa em setembro e que José Joaquim Cândido Macedo, o Macedinho, somente se integrou ao grupo em 1858, quando chegaria ao Rio de Janeiro para seguir os cursos da Escola Militar. O crítico francês ainda sugere que os outros dois e eventuais membros seriam Augusto Emílio Zaluar e José Alexandre Teixeira de Melo. (MASSA, 2009, p. 151-152) Em "O poeta e o livro", prefácio de Crisálidas, Filgueiras, entre outros apontamentos, rememorou o clima de camaradagem literária que imperava nas reuniões vesperais do grupo:

Pago o quotidiano tributo à existência material; satisfeitos os deveres de cada profissão, a palestra literária nos reunia na faceira e tranquila salinha do meu escritório.

Ali, - horas inteiras, - alheios às lutas do mundo, aconchegados nos lugares e nas afeições, levitas do mesmo culto, filhos dos mesmos pais - a pobreza e o trabalho, - em derredor do altar do nosso templo - a mesa de estudo... falávamos de Deus, de amor, de sonhos; conversávamos música, pintura, poesia!...

Ali depúnhamos o fruto das lucubrações da véspera, e na singela festa das nossas crenças, novas inspirações bebíamos para os trabalhos do seguinte dia. Era um contínuo deslizar de ameníssimos momentos; era um suave fugir das murmurações dos profanos; era enfim um dulcíssimo viver nas regiões da fantasia!... (FILGUEIRAS, 1864FILGUEIRAS, Caetano. Prefácio. In: ASSIS, Machado de. Crisálidas. Rio de Janeiro: Livraria de B. L. Garnier , 1864., p. 8)

Em outras palavras, os encontros em torno da "mesa de estudo", onde depunham "o fruto das lucubrações da véspera", ajudaram tanto a Gonçalves Braga quanto aos demais membros do grupo no desenvolvimento das respectivas carreiras literárias. Entretanto, no caso do poeta português, o novo emprego de amanuense de advogado foi o que lhe propiciou, como afirmara o crítico do Diário do Rio de Janeiro, "a vantagem de fazer um culto exclusivo das letras". Teria sido Francisco Gonçalves Braga amanuense do próprio Caetano Filgueiras? Ainda que a suposição não seja de todo descabida, é difícil provar.

Entre os desdobramentos do "progresso ascendente" de Gonçalves Braga estava o esforço de se tornar, além de poeta, tradutor, o que conseguiu com algum êxito. No elogio fúnebre a Braga, feito por J. Bracarense em A Marmota, de 16 de março de 1860BRACARENSE, J. Francisco Gonçalves Braga. A Marmota, Rio de Janeiro, n. 1.143, 16 mar. 1860., o cronista, entre outros aspectos biográficos, destacou a relação do português com a língua francesa, "não há muito que ignorava os rudimentos da língua de Hugo e Lamartine, e hoje era versadíssimo nas páginas imorredouras, da águia e do cisne da poesia francesa" (BRACARENSE, 1860BRACARENSE, J. Francisco Gonçalves Braga. A Marmota, Rio de Janeiro, n. 1.143, 16 mar. 1860., p. 1).

Algumas traduções e a morte

A partir de 1857, Braga traduziu algumas peças de teatro. O que talvez possa ser explicado pela afirmação do cronista de A Marmota de que "não há muito que ignorava os rudimentos da língua de Hugo e Lamartine". A despeito da imprecisão temporal desse "não há muito", tudo indica que talvez a partir do momento em que se tornara amanuense, Gonçalves Braga entregou-se ao estudo sistemático da língua francesa.

Em 8 de fevereiro de 1858, o Correio Mercantil anunciava que, no dia seguinte, "subirá à cena o novo e magnífico drama em 5 atos, de Victor Séjour, traduzido pelo Sr. Gonçalves Braga e elogiado pelo Conservatório Dramático, intitulado: André Gérard". (CORREIO MERCANTIL, 1858cCORREIO MERCANTIL. n. 37, 8 fev. 1858c., p. 4)

No dia 21 de agosto de 1859, a comédia Meu nariz, meus olhos, minha boca, dos srs. Sirandin, Chillout e Durá, estrearia também no Teatro Ginásio Dramático. No mesmo dia, nota do Correio Mercantil fazia referência direta a Gonçalves Braga, chamando-o de "inteligente tradutor".

Pouco mais de vinte dias, em 11 de setembro, nova tradução de Gonçalves Braga subia aos palcos no Teatro São Pedro de Alcântara (JORNAL DO COMMERCIO, 1859JORNAL DO COMMERCIO. Rio de Janeiro, n. 250, 10 set. 1859., p. 4). Era uma nova comédia, Minha sobrinha e meu urso, de Clairville e De Frascati. Em 18 de setembro, o jovem Machado de Assis, então responsável pela "Revista de Teatros" de O Espelho, faria uma breve apreciação negativa da peça, "sem ideia nem tese", enfatizando, no entanto, que a "tradução é ótima":

Minha sobrinha e meu urso [...] é uma dessas produções sem ideia nem tese, que só tem o mérito de fazer rir. E esta cumpre totalmente o seu fim; o espírito francês está ali vivo e brilhante e o equívoco move toda a ação até ao desfecho que a plateia já esperava de alcateia.

A tradução é ótima; o Sr. Gonçalves Braga, moço de talento e bom senso, sobretudo, que é o que falta a muitos talentos - merece por certo aplausos por esse trabalho. (ASSIS, 1859ASSIS, Machado de. Revista de Teatros. O Espelho, n. 3, 18 set. 1859, p. 6-8., p. 6-8, grifos nossos)

Essa crítica de Machado de Assis será o último texto que se referirá a Francisco Gonçalves Braga, anunciando de forma cifrada o seu distanciamento do "primeiro mestre". De todo modo, maio de 1859, em seis números de A Marmota, Braga publicou a tradução de um conto do escritor francês Joseph Méry, sob o título de "Uma amiga de colégio" (BRAGA, 1859a______. Uma amiga do colégio (Méry). A Marmota, Rio de Janeiro, n. 1.055, 13 mai. 1859a, p. 3-4; n. 1.056, 17 mai. 1859b, p. 2-3; n. 1.057, 20 mai. 1859c, p. 2-3; n. 1.058, 24 mai. 1859d, p. 2; n. 1.059, 27 mai. 1859e, p. 2-3; n. 1.060, 31 mai. 1859f, p. 2., p. 3-4; 1859b______. Uma amiga do colégio (Méry). A Marmota, Rio de Janeiro, n. 1.055, 13 mai. 1859a, p. 3-4; n. 1.056, 17 mai. 1859b, p. 2-3; n. 1.057, 20 mai. 1859c, p. 2-3; n. 1.058, 24 mai. 1859d, p. 2; n. 1.059, 27 mai. 1859e, p. 2-3; n. 1.060, 31 mai. 1859f, p. 2., p. 2-3; 1859c______. Uma amiga do colégio (Méry). A Marmota, Rio de Janeiro, n. 1.055, 13 mai. 1859a, p. 3-4; n. 1.056, 17 mai. 1859b, p. 2-3; n. 1.057, 20 mai. 1859c, p. 2-3; n. 1.058, 24 mai. 1859d, p. 2; n. 1.059, 27 mai. 1859e, p. 2-3; n. 1.060, 31 mai. 1859f, p. 2., p. 2-3; 1859d______. Uma amiga do colégio (Méry). A Marmota, Rio de Janeiro, n. 1.055, 13 mai. 1859a, p. 3-4; n. 1.056, 17 mai. 1859b, p. 2-3; n. 1.057, 20 mai. 1859c, p. 2-3; n. 1.058, 24 mai. 1859d, p. 2; n. 1.059, 27 mai. 1859e, p. 2-3; n. 1.060, 31 mai. 1859f, p. 2., p. 2; 1859e______. Uma amiga do colégio (Méry). A Marmota, Rio de Janeiro, n. 1.055, 13 mai. 1859a, p. 3-4; n. 1.056, 17 mai. 1859b, p. 2-3; n. 1.057, 20 mai. 1859c, p. 2-3; n. 1.058, 24 mai. 1859d, p. 2; n. 1.059, 27 mai. 1859e, p. 2-3; n. 1.060, 31 mai. 1859f, p. 2., p. 2-3 e 1859f______. Uma amiga do colégio (Méry). A Marmota, Rio de Janeiro, n. 1.055, 13 mai. 1859a, p. 3-4; n. 1.056, 17 mai. 1859b, p. 2-3; n. 1.057, 20 mai. 1859c, p. 2-3; n. 1.058, 24 mai. 1859d, p. 2; n. 1.059, 27 mai. 1859e, p. 2-3; n. 1.060, 31 mai. 1859f, p. 2., p. 2, respectivamente). Em outubro de 1862, dois anos após sua morte, apareceria a notícia que Gonçalves Braga traduzira o libreto da ópera-cômica A corte de Mônaco. Segundo nota, publicada no Correio Mercantil, no dia da primeira récita, "a letra foi imitada pelo jovem mal-aventurado poeta Gonçalves Braga, autor de tantos e tão bonitos versos, que por aí andam espalhados e quase esquecidos" (CORREIO MERCANTIL, 1862CORREIO MERCANTIL. n. 276, 6 out. 1862., p. 1).

Se, apenas dois anos depois, Francisco Gonçalves Braga e sua pequena obra caminhavam, e a passos largos, para o ostracismo literário, a sua morte, ocorrida em 10 de março de 1860, aos vinte quatro anos incompletos, foi ao menos lamentada. E a tônica dos pontuais lamentos concentrava-se nas supostas potencialidades literárias, frutos de seus reconhecidos e incansáveis estudos, insistia-se no que ele poderia ter sido se a morte não o levasse tão cedo, como fez J. Bracarense no citado artigo de A Marmota .

Por fim, embora tivesse publicado em A Marmota ao longo do mesmo mês de março de 1860 três textos: um artigo sobre "O Conservatório Dramático" (ASSIS, 1860a______. O Conservatório Dramático. A Marmota, Rio de Janeiro, n. 1.142, 13 mar. 1860a, p. 2-3; n. 1.143, 16 mar. 1860b, p. 2-3., p. 2-3; 1860b______. O Conservatório Dramático. A Marmota, Rio de Janeiro, n. 1.142, 13 mar. 1860a, p. 2-3; n. 1.143, 16 mar. 1860b, p. 2-3., p. 2-3) e duas peças - Hoje avental, amanhã luva (ASSIS, 1860c______. Hoje avental, amanhã luva. A Marmota, Rio de Janeiro, n. 1.144, 20 mar. 1860c, p. 2-3; n. 1.145, 23 mar. 1860d, p. 3-4; n. 1.146, 27 mar. 1860e, p. 1-3., p. 2-3; 1860d______. Hoje avental, amanhã luva. A Marmota, Rio de Janeiro, n. 1.144, 20 mar. 1860c, p. 2-3; n. 1.145, 23 mar. 1860d, p. 3-4; n. 1.146, 27 mar. 1860e, p. 1-3., p. 3-4 e 1860e______. Hoje avental, amanhã luva. A Marmota, Rio de Janeiro, n. 1.144, 20 mar. 1860c, p. 2-3; n. 1.145, 23 mar. 1860d, p. 3-4; n. 1.146, 27 mar. 1860e, p. 1-3., p. 1-3) e Odisseia dos vinte anos (ASSIS, 1860f______. Odisseia dos vinte anos. A Marmota, Rio de Janeiro, n. 1.147, 30 mar. 1860f, p. 3., p. 3) -, Machado de Assis não se pronunciou, ao menos por escrito, sobre a morte de Francisco Gonçalves Braga; discreto, preferiu o silêncio.

Referências

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  • 1
    No dia 11 de agosto de 1864, em carta publicada no jornal carioca O Português (1861-1865) a Francisco Ramos Paz, Francisco Gomes Amorim, ao escrever sobre as dificuldades de sua trajetória literária, lamenta o destino de "Gonçalves Braga, morto no desterro como caixeiro!". (AMORIM, 1864AMORIM, Francisco Gomes. O Português. Rio de Janeiro, n. 59, 11 ago. 1864., p. 1-2, grifos nossos)
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    Jean-Michel Massa afirma que o grupo se constitui ao longo de 1857, salientando, no entanto, que Casimiro de Abreu retornara de Lisboa em setembro e que José Joaquim Cândido Macedo, o Macedinho, somente se integrou ao grupo em 1858, quando chegaria ao Rio de Janeiro para seguir os cursos da Escola Militar. O crítico francês ainda sugere que os outros dois e eventuais membros seriam Augusto Emílio Zaluar e José Alexandre Teixeira de Melo. (MASSA, 2009MASSA, Jean-Michel. A juventude de Machado de Assis, 1839-1870: ensaio de biografia intelectual. Trad. de Marco Aurélio de Moura Matos. 2. ed. São Paulo: Editora UNESP, 2009., p. 151-152)

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Ago 2020
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2020

Histórico

  • Recebido
    12 Jan 2020
  • Aceito
    18 Fev 2020
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