Acessibilidade / Reportar erro

Formalismo e Logicismo na recepção da filosofia kantiana: o esquecimento da antropologia de Kant em uma breve vista sobre os séculos XIX e XX

Formalism and Logicism in the reception of kantian philosophy: the oblivion of Kant anthropology in a brief overview on the 19th and 20th centuries.

RESUMO

Pensamos que apesar de Kant inaugurar sua filosofia crítica tratando das condições de possibilidade formais para resolução de problemas (filosofia crítica), ele avança na década de 1790 em direção a estabelecer a antropologia como finalidade da sua filosofia. Considerando isso, o objetivo deste escrito é mostrar que a recepção da filosofia kantiana nos séculos XIX e XX foi logicista e formalista, ressaltando bem mais sua base transcendental que pragmática (em sentido kantiano). Desse modo, o retorno a Kant, promovido pelo Neokantismo, contribuiu para o esquecimento e não tematização da centralidade da sua antropologia, pois se voltou às condições de possibilidade para a consolidação das ciências na segunda metade do século XIX e legou ao kantismo do século XX modelos interpretativos de viés logicista a analítico, deixando de lado qualquer reflexão profunda sobre a parte empírica de sua filosofia, posto considerá-la impura. Também pontuaremos que a própria ciência etnográfica desconsidera qualquer herança de Kant em sua constituição. No final, provaremos estatisticamente, por meio da análise do centenário histórico da revista Kant Studien que houve um baixíssimo volume de textos sobre temas pragmáticos. A antropologia de Kant foi esquecida pela fortuna crítica, quando deveria ter sido posta como central.

Palavras-Chave:
Logicismo; Formalismo; Neokantismo; esquecimento da antropologia

ABSTRACT

Although Kant inaugurated his critical philosophy treating about formal conditions for the possibilities to solve problems (Critical Philosophy) he advanced in the 1790s to stablish anthropology as the aim of his philosophy. Considering this, our aim is to show that the reception of Kantian philosophy in the 19th and 20th centuries was formalistic and logicist in a way that it has underlined its transcendental aspect when rather it ought to focus on the moral and the pragmatic (in Kantian sense). Thus, the return to Kant promoted by Neokantianism contributed to the forgetfulness and non-thematising the centrality of his Anthropology. It allowed Neokantianism to focus on the conditions for the possibilities of consolidating sciences in the half of 19th century, which has bequeathed to the Kantianism of the 20th century interpretative models of logicist and analytical biases; this left aside any deep reflection on the empirical part of Kant’s philosophy as well because it was considered impure. Also, we will point out that the Ethnographic science does not consider for its constitution any heritage from Kant. Finally, it will be statistically proved by means of analysing the centenary historic of Kant Studien Journal that there has been a very low quantity of papers concerned about pragmatic themes. Kant’s Anthropology has been forgotten by critical fortune when it should have been treated as central.

Keywords:
Logicism; Formalism; Neokantianism; forgetfulness of anthropology

1 Introdução

Partimos da tese que a finalidade da filosofia kantiana é direcionar o homem a um futuro comum, no qual toda a humanidade seja capaz de resolver os seus próprios problemas (Azevedo, 2019aAZEVEDO, H. 2019a. A Antropologia como Finalidade da Filosofia em Kant. Campinas: Tese de doutorado defendida na Unicamp.). Esta tese está materializada na pergunta “o que é o homem?” e tem a antropologia como sua disciplina principal; tal posição não pôde ser vista, senão após 17931 1 Em 04/05/1793, Kant escreve a Stäudlin sobre a censura de sua Religião nos limites da simples razão e delineia seu projeto final. “O plano que me propus há muito tempo clama por um exame dos campos da pura filosofia com o intuito de resolver tres tarefas: 1- O que posso saber? (Metafisica). 2-O que devo fazer? (Moral). 3-O que me e permitido esperar? (Religiao). Os quais, finalmente, devem seguir um quarto: o que e o homem? (Antropologia, uma matéria sobre a qual eu venho lecionando por mais de vinte anos). Com este amplo escrito, a Religião nos limites da simples razão, eu tentei completar o meu terceiro plano.” (Kant, 1999. p. 458). , ano da formulação daquela pergunta, contudo também esta posição não invalida a filosofia crítica; ao contrário, a potencializa dentro de um projeto de teor antropológico. Há uma pergunta incontornável, com isso, e ainda não respondida de maneira exaustiva pelos kantianos, a saber: por que a fortuna crítica ignorou a letra de Kant sobre a antropologia como saber principal de seu sistema? (Kant, 2002KANT, I. 2002. Manual dos cursos de lógica geral. Campinas: Ed. Unicamp; Uberlândia: Edufu.).2 2 “Was ist der Mensch? ” (Kant, 2002).

Não descuidando da relevância da problemática, gostaríamos de respondê-la a partir de uma apreciação básica, porém cirúrgica, da visão que, em linhas gerais, dominou a interpretação kantiana após sua morte: a principal interpretação kantiana que se estabeleceu no século XIX e se convencionou chamar de neokantismo foi logicista, cognitivista e, pautadamente, centrada na epistemologia formal, legando ao século XX comentários analíticos preocupados bem mais com a fundamentação do kantismo que com sua aplicação. Mesmo quando se tratou da sua aplicação, na ética, as interpretações não conseguiram abarcar o movimento de pensamento de Kant, na medida em que ainda ficaram presas às condições de possibilidade formais para que pudéssemos ser éticos em sociedade. Kant queria, em seu último pensamento, formular, e reformular, as relações teóricas em confronto com a maneira, a qual mundo se apresentava; ele chamou tal confrontação de ciência antropológica, um saber que pode fazer a humanidade avançar na resolução dos seus problemas. A interpretação do neokantismo do século XIX, no entanto, enquanto combate ao idealismo, por um lado, e ao materialismo, por outro lado, pautou as interpretações kantianas que buscavam compreender o ponto central do sistema.

Com isso, em nossa perspectiva, há um duplo movimento aqui, a saber, primeiro um legado de caráter analítico da filosofia do século XIX aos estudos kantianos e, segundo, o século XX incorporou a epistemologia como ponto nevrálgico da filosofia kantiana, ignorando a antropologia formulada por Kant de modo a, comumente, alegar que ela não faz parte no sistema. Mostraremos aqui que os comentadores de Kant embarcaram em uma tese que fazia completo sentido em uma época de avanço das ciências, mas que em uma confrontação séria com a filosofia kantiana não se dizia respeito à totalidade de seu projeto.

Assim, no início do neokantismo, tanto a escola de Baden quanto, principalmente, a escola de Marburg, tinham como seu foco e ponto de busca teórica o estabelecimento mais preciso do estatuto da ciência, por meio de uma epistemologia, a qual serviria tanto às recém, à época, identificadas ciências do espírito quanto, principalmente, às ciências da natureza. O sentido de epistemologia neste período se confunde com o de teoria do conhecimento, a qual também tem seu formalismo aplicado à ética, à história e à cultura, dentre outras áreas.

As duas principais escolas neokantianas, a Escola de Marburg e a chamada Escola do Sudoeste (Escola de Baden ou Heidelberg) não eram simplesmente polos intelectuais ligados a uma espécie de reabilitação do kantismo em face da corrente hegeliana, do positivismo empírico ou da filosofia historicista da vida. Elas buscaram desenvolver, no que concerne à primeira, uma teoria do conhecimento stricto sensu que correspondesse aos desenvolvimentos em matemática e física na virada do século, para a outra, fazer justiça às ciências do Espírito e, principalmente, à história, mas equipando as ciências morais com uma estrutura filosófica rigorosa, isto é, elaborando também uma teoria do conhecimento, certamente menos diretamente de Kuno Fisher e, sobretudo, de Rudolf Lotze, precisamente, em lógica. ( Launay, 2000 LAUNAY, M. 2000. Néokantisme et Théorie de la Connaissance. Paris: Vrin. . p 7) 3 3 “Les deux principales écoles néokantiennes, lécole de Marbourg et l‘École dite du sud-ouest (école de Baden ou de Heidelberg) n‘ont pas été simplement des pôles intellectuels attachés à une sorte de réhabilitation du kantisme face au courant hégelien, au positivisme empirique ou à la philosophie historiciste de la vie. Elles ont cherché à développer, pour la première, une théorie de la connaissance stricto sensu qui corresponde aux développements des mathématiques et de la physique au tournant du siècle, pour l‘autre, à faire droit aux sciences de l‘Esprit, et, principalement à l‘histoire, mais en dotant les sciences morales d‘une structure philosophique rigoureuse, c‘est-à-dire en élaborant également une théorie de la connaissance, certes moins directement de Kuno Fisher et, sutout de Rudolf Lotze, en logique précisément.” (Launay, 2000. p 7. Tradução nossa). .

Este viés interpretativo pautou o kantismo, tornando-o paradigma de pensamento das principais linhas filosóficas contemporâneas tais como, por exemplo, a hermenêutica, a fenomenologia e a filosofia analítica, a qual, em relevo, contribuiu fortemente para uma visão logicista de Kant ao longo do século XX com seu protagonismo nos países anglófonos e até mesmo na Alemanha. O neokantismo, no entanto, enquanto movimento filosófico cujo paradigma era o retorno aos textos de Kant, mostrou-se fecundo por atender as demandas filosóficas da segunda metade do século XIX e começo do XX.

Primeiramente, em resenha sobre o livro de J. Alberto Coffa intitulado The semantic tradition from Kant to Carnap: to the Vienna station, Paul Rusnock e Ralf George, mostram que “até mesmo em Königsberg não houve nenhum curso sobre Kant entre o outono de 1807 e o verão de 1865.” (Rusnock; George, 1996RUSNOCK, P; GEORGE, R. 1996. The semantic tradition from Kant to Carnap: to the Vienna station. Philosophy and Phenomenological Research, LVI(2)., p. 8)4 4 “In Königsberg itself there was no course of lectures about him between autumn of 1807 and the summer of 1865.” (Rusnock; George, 1996, p. 8, Tradução nossa). . Em termos exatos, a data de 1865 diz respeito à publicação do livro de Otto Liebmann de nome Kant e o epígono. Entretanto, antes disso, em 1862, em uma aula inaugural concedida por Eduard Zeller, aparece o mote do neokantismo, a saber, o retorno a Kant. Zeller pontua tal retorno em seu Sur la signification et la tâche de la théorie de la connaissance como nos atesta Alexis Philonenko (Philonenko, 1989PHILONENKO, A. 1989. L‘École de Marburg. Paris: Vrin ., p. 9). Ora, o que aconteceu entre 1807 e 1865 a ponto de a filosofia kantiana ter sido secundarizada em sua própria cidade e, posteriormente, trazida de volta ao debate filosófico? Adrea Poma propõe a seguinte hipótese:

O neokantismo surgiu como uma tentativa de resposta e uma alternativa crítica tanto à metafísica idealista quanto ao materialismo naturalista. Certamente, a necessidade de um “retorno a Kant” não surgiu da convicção de que ele havia sido esquecido, mas, de certo modo, do ponto de vista oposto. A referência contínua a Kant foi a causa da distorção de seu pensamento autêntico por seus seguidores, que sempre enfatizaram seus aspectos menos válidos (coisa-em-si), negligenciando cada vez mais sua contribuição verdadeiramente valiosa (o transcendental). Estou me referindo aqui à tese central do livro de Liebmann, Kant und die Epigonen. O autor, no entanto, estava apenas se juntando a um grupo maior de pensadores, que incluía Benecke, Weisse, Haym e Zeller, que haviam mostrado as mesmas intenções. A redescoberta do Kant “real” tinha um duplo significado: “o Kant real e histórico, o Kant essencial e significativo”. A dupla natureza desse “retorno a Kant” mostra claramente que a necessidade de uma reconstrução histórica do Kant real não se limitava a uma espécie de neoescolasticismo kantiano, mas estava em busca de um ponto de referência sólido para a “reconstrução da filosofia” neste Kant real ( Poma, 1997 POMA, A. 1997. The Critical Philosophy of Hermann Cohen. New York: State University of New York Press. , p. 2). 5 5 “Neo-Kantianism came into being as a tentative response and critical alternative both to idealist metaphysics and to naturalistic materialism. Certainly, the need for a “return to Kant” did not grow out of the conviction that he had been forgotten, but, in a way, from the very opposite view. Continual reference to Kant had been the cause of distortion of his authentic thought by his followers, who had always emphasized its less valid aspects (thing-in-itself), neglecting more and more his truly valuable contribution (the transcendental). I am here referring to the central thesis of the book by Liebmann, Kant und die Epigonen. The author, however, was only joining a larger group of thinkers, which included Benecke, Weisse, Haym and Zeller, who had shown the same intentions. The rediscovery of the “real” Kant had a twofold meaning: “the real, historical Kant, the essential, meaningful Kant.” The twofold nature of this “return to Kant” clearly shows that the need for a historical reconstruction of the real Kant was not limited to a kind of Kantian neoscholasticism, but was in search of a sound point of reference for the “reconstruction of philosophy” in this real Kant.” Poma, 1997, p. 2, Tradução nossa).

Ora, este movimento que tem como ponto de reivindicação um retorno a Kant ocorre devido ao fato de que a filosofia após a morte de Kant tomou um rumo o qual não satisfazia as demandas interpretativas de muitos intelectuais do século XIX. Além disso, como atesta a supracitada referência de Poma, os pós-kantianos trouxeram para o centro do debate a problemática do conceito de coisa-em-si. O verdadeiro Kant, resgatado na segunda metade do XIX, teria de colocar as bases para a fundamentação transcendental de um mundo intelectual bombardeado pelo advento de vários saberes e várias ciências surgidas recentemente no século XIX.

Podemos destacar, grosso modo, Hegel, Schelling, Hamman (1967HAMMAN, J. G. 1967. Schriften zur Sprache. Frankfurt am Main: Suhrkamp.) e Jacobi (1998aJACOBI, F H. 1996a. David Hume Über den Glauben, oder Idealismus und Realismus, Ein Gespräch. Hamburg: Meiner, Werke, II. ) como as principais influências da recepção de Kant no final do século XVIII e primeira metade do XIX. Enquanto Hamman faz uma dura crítica ao que ele chama de purismo da razão, identificando um fosso na apreciação da história e da linguagem como fonte de todo e qualquer conceito, Jacobi, por sua vez, mostra uma aporia ou impasse existente no conceito de coisa-em-si, por meio do apêndice à sua obra Sobre o idealismo transcendental; este é um conceito que sem o qual não é possível entrar na Crítica da razão pura, mas com ele não é possível sair dela. Posteriormente, em 1801, Jacobi lança a tese de que a filosofia kantiana reduzia a razão ao entendimento (Jacobi, 1998bJACOBI, F H. 1998b. Über das Unternehmen des Kritizismus, die Vernunft zu Verstande zu bringen und der Philosophie überhaupt eine neue Absicht zu geben. Hamburg: Meiner, Werke, II I.). Este modo de interpretação influenciou o que se convencionou a chamar de idealismo alemão, tendo Hegel como principal nome. O idealismo hegeliano se apresentava como uma filosofia muito incômoda ao modelo kantiano, vinculando-se a uma baixa apreciação de limites a priori claros, os quais deveriam, no mínimo, ser definidos à medida que se avançasse a investigação da experiência da consciência.6 6 Nunca é demais lembrar que Hegel morreu em 1836.

A oposição ao idealismo hegeliano iniciou ainda durante sua vida, contudo sem uma filiação kantiana muito bem definida e enraizada, tal como ocorrerá na segunda metade do século XIX. Um grande movimento que se contrapôs ao idealismo especulativo foi o materialismo do século XIX que possuía um viés, flagrantemente, epistemológico e foi colocado em prática, principalmente, por cientistas naturais, mas também por filósofos. Este materialismo deve ser considerado um dos pontos de necessidade de voltar a Kant e entender de onde veio toda a controvérsia acadêmica do século XIX (Poma, 1997POMA, A. 1997. The Critical Philosophy of Hermann Cohen. New York: State University of New York Press., p. 2)7 7 “What were forthcoming, however, were theories that were often crude and superficial, in their reliance on naive naturalistic objectivism and an illusory empirical method, taken over from scientific research. The Materialismusstreit controversy of 1850 through 1860 appeared to have come to an end with liberation from all metaphysical illusions and with the definitive establishment of materialistic dogma. Books such as Kohlerglaube und Wissenschaft (published in 1854 and reaching its sixth edition by 1856!) by Karl Vogt, and especially Kraft und Stoff (1855, twenty-first edition by 1904!) by Ludwig Büchner appeared to have opened up a new, more “scientific” conception of reality and man. Materialistic prejudice crossed the boundaries of specialization to take on the role of popular philosophy.” (Poma, 1997, p. 2). .

Um dos primeiros grandes motores para o retorno a Kant, além da entrada em cena das ciências naturais, foi a polêmica entre as ideias de Kuno Fisher e Friedrich Adolf Trendelenburg (Bird, 2006BIRD, G. 2006. The Neglected Alternative: Trendelenburg, Fischer, and Kant. In: BIRD, G. A Companion to Kant. Hong Kong: Blackwell., p 493)8 8 “The disagreement was pursued in Trendelenburg’s Logical Investigations (2nd ed., 1865), On a Gap in Kant’s Proof of the Exclusive Subjectivity of Space and Time (1867), and Fischer and His Kant (1869). Fischer offered his accounts of Kant in the System of Logic and Metaphysics (1865), and a four-volume History of Modern Philosophy (1860-7) and responded directly to Trendelenburg in the polemical Anti-Trendelenburg (1870).” (Bird, 2006, p. 493, Tradução nossa). . O ponto central, segundo Graham Bird, é a disputa acerca de um suposto fosso no que concerne à subjetividade do espaço e do tempo na estética transcendental kantiana (Bird, 2006BIRD, G. 2006. The Neglected Alternative: Trendelenburg, Fischer, and Kant. In: BIRD, G. A Companion to Kant. Hong Kong: Blackwell., p 487)9 9 “The criticism implies that a central inference in the Aesthetic about the character of space and time is a fallacy which undermines not only the Aesthetic but the whole Critical position. Fischer, by contrast, called the Aesthetics a paradigm of scientific precision and method, and his response was to deny that there is any such gap, or that Kant had neglected the relevant alternative.” (Bird, 2006, p. 487). . A disputa, com isso, diz que se Trendelenburg estiver certo não haverá como provar a existência de objetividade uma vez que o espaço e o tempo seriam meramente subjetivos, o que implicaria um comprometimento de toda filosofia kantiana, que não poderia evoluir objetivamente de modo nenhum, senão por um forçado objetivismo não provado (Bird, 2006BIRD, G. 2006. The Neglected Alternative: Trendelenburg, Fischer, and Kant. In: BIRD, G. A Companion to Kant. Hong Kong: Blackwell., p 487)10 10 “Fischer’s position by contrast was that Trendelenburg had failed properly to understand Kant’s position and that Kant had noted and made room for the neglected alternative. According to Fischer Kant had argued quite properly from subjectivity to non-objectivity provided that these terms were adequately understood.” (Bird, 2006, p. 487). .

O neokantismo trouxe, com isso, um paradigma epistemológico, que apesar de não secundarizar, completamente, o homem, o método de fundamentação científica passou a ser mais importante do que propriamente saber como é possível a espécie humana evoluir para as melhores formas possíveis de vida. Isto quer dizer, mais precisamente, que o século XIX colocou como ponto central de interpretação da filosofia kantiana, a busca pelo aprofundamento do estabelecimento das bases da ciência, as quais deveriam estar para além (e fundamentando, ao mesmo tempo,) do materialismo e do idealismo. O que se tem de fato é a tentativa de estabelecer o fundamento de todo e qualquer pensamento sob a crítica enquanto filosofia transcendental.

2 Movimento do Neokantismo

Segundo Eric Dufour, em Marburg há uma maneira própria de lidar com questões contemporâneas suas, nas quais Kant é um veículo de interpretação (Dufour, 2001DUFOUR, E. 2001. Hermann Cohen: Introduction au néokantisme de Marbourg. Paris: Puf., p. 8-9). O objetivo, com isso, é partir não de uma questão metafísica da possibilidade do conhecimento, mas de uma questão de fato, no que concerne à validade epistemológica do método. Por isso, a interrogação filosófica teria de ser lógica, em vez de psicológica. Isto ocorre em virtude da possibilidade de oposição ao idealismo hegeliano em que a lógica passa a ser o ponto alto da ciência, a ciência da ciência, da qual parte toda e qualquer interpretação. Oposição que também acontece frente ao psicologismo e ao naturalismo. Este movimento vem à tona com Hermann Cohen (1984COHEN, H. 1984.Werke. Hildesheim: Georg Olms. ).

No entanto, o retorno a Kant não foi meramente uma advertência contra os sistemas especulativos da primeira metade do século XIX, mas também, e talvez ainda mais (ou, pelo menos, mais imediatamente), uma rebelião do idealismo contra o maçante objetivismo naturalista do materialismo, e uma tentativa de unir filosofia e ciência de um ponto de vista crítico, em oposição às teorias arbitrárias e superficiais do materialismo vulgar (Vulgiirmaterialismus). Os protagonistas da primeira fase do neokantismo, o chamado neokantismo fisiológico, foram cientistas (Helmholtz) e filósofos (Lange, Liebmann), os quais reconheceram que o verdadeiro arcabouço conceitual dentro do qual se poderia reagir contra o objetivismo materialista e o empirismo seria a correspondência entre as teorias da Synnenphysiologie de Johannes Muller e a do a priori de Kant ( Poma, 1997 POMA, A. 1997. The Critical Philosophy of Hermann Cohen. New York: State University of New York Press. , p. 2-3) 11 11 “However, the “return to Kant” was not merely a warning against the speculative systems of the first half of the nineteenth century, but also, and perhaps even more (or at least more immediately), a rebellion of idealism against the dull naturalistic objectivism of materialism, and an attempt to bring together philosophy and science from a critical standpoint, as opposed to the arbitrary, superficial theorizings of “vulgar materialism” (Vulgiirmaterialismus). The protagonists of the first phase of Neo-Kantianism, so-called “physiological” Neo-Kantianism, were scientists (Helmholtz) and philosophers (Lange, Liebmann), who recognized that the real conceptual framework within which to react against materialistic objectivism and empiricism was the correspondence between the theories of Johannes Muller’s Synnenphysiologie Kant’s a priori.” (Poma, 1997, p. 2-3, Tradução nossa). .

Assim, Hermann Cohen lança um movimento de retorno a Kant como ponto de restabelecimento do criticismo como paradigma de pensamento12 12 “By 1870 the Hegelian school was indeed past its peak and neo-Kantianism began to unfold, initially in parallel to positivism and always differentiated from the philosophies of Schopenhauer, Herbart, and the materialists. The motivation to ‘return to Kant’ was considerably increased by Friedrich Albert Lange (1828-1875) who, in the widely read second edition of his Geschichte des Materialismus (1875) spoke of ‘a young school of Kantians in a narrower and wider sense of the word’. Among these he counted Otto Liebmann, Jürgen Bona Meyer, and Hermann Cohen. Lange admitted that Cohen’s book Kants Theorie der Erfahrung (1871) had inspired him to revise his presentation of the Kantian system.” (Holzhey, 2005). (Holzhey, 2005HOLZHEY, H. 2005. Cohen and the Marburg school in context. In: MUNK, R. Hermann Cohen’s Critical Idealism. Dordrecht: Spring.) e “um de seus primeiros livros, Kants Theorie der Erfahrung, cuja primeira edição foi publicada em 1871, dá a direção geral do que mais tarde permanecerá como uma das principais linhas de seu pensamento: a reinterpretação de Kant. No entanto, é significativo que este livro seja fundador, em certo sentido, do chamado de neokantismo.” (Launay, 2000LAUNAY, M. 2000. Néokantisme et Théorie de la Connaissance. Paris: Vrin., p 13)13 13 “L’un de ses premiers ouvrages, La Théorie Kantienne de l’experiénce, dont la première édition fut publiée en 1871, donne l’orientation générale de ce qui, par la suite, restera l’un des axes recteurs de sa pensée: la réinterprétation de Kant. Il est cependant significatif que ce livre, fondateur, en un sens, de ce qui s’est appelé le néokantisme.” (Launay, 2000, p. 13. Tradução nossa). . Ora, como se pode notar, o mais provável marco fundacional do neokantismo de Marburg está localizado no ano de 1871 (Cohen, 1885COHEN, H. 1885. Kants Theorie der Erfahrung. Berlin: Harrwitz und Gossman. ).

A função de Kant como paradigma de pensamento se vinculava à capacidade de fundamentação a priori do pensamento, o que era conveniente em uma época que uma série de ciências empíricas e humanas se desvinculava da direção da filosofia, ganhando estatuto próprio. Falamos, mais precisamente, da biologia, da química, da psicologia, da etnografia etc. Cohen “encontrou a solução no retorno a Kant, que é a filosofia transcendental.” (Poma, 1997POMA, A. 1997. The Critical Philosophy of Hermann Cohen. New York: State University of New York Press., p 4)14 14 “Found the solution in the return to Kant, that is transcendental philosophy.” (Poma, 1997, p. 4. Tradução nossa). . Por conta disso, em sua Kants Theorie der Erfahrung:

O autor enfatiza, a partir do prefácio, que não se trata de, simplesmente, ler por ler Kant, mas sim de extrair algo dele para pensar melhor hoje o problema do conhecimento. Há um duplo desafio: por um lado, o histórico, isto é, o filológico, de saber o que Kant disse e pensou exatamente, por outro lado, o desafio sistemático de saber de que maneira a crítica kantiana pode nos ajudar a filosofar depois de Kant. E ambos são inseparáveis. Se é verdade que nunca se pode ler e interpretar um texto de maneira neutra e imparcial, - “não se pode ler Kant sem revelar o mundo que se carrega na própria cabeça” (KTE, p xi) - os pressupostos segundo os quais se lê um texto devem encontrar sua confirmação e seu fundamento ao longo do movimento de debruçar-se na leitura do texto ( Dufour, 2001 DUFOUR, E. 2001. Hermann Cohen: Introduction au néokantisme de Marbourg. Paris: Puf. , p 29) 15 15 “L’auteur souligne, dès la Préface, qu’il ne s’agit pas de lire Kant pour lire Kant, mais pour en tirer quelque chose afin de mieux penser, aujourd’hui, le problème de la connaissance. Il y a un double enjeu: d’une part celui historique, c’est-à-dire philologique de savoir ce qu’a exactement dit et pensé Kant, d’autre part l’enjeu systématique de savoir en quoi la critique kantienne peut nous aider à philosopher après Kant. Et tous deux sont inséparables. S’il est vrai qu’on ne peut jamais lire et interpréter un texte d’une manière neutre et impartiale - «on ne peut pas lire Kant sans dévoiler le monde qu’on porte dans sa propre tête» (KTE, p xi) -, les présupposés à partir desquels on lit un texte doivent trouver leur confirmation et leur fondation lorsqu’on s’attache à la lecture du texte.” KTE é a sigla que Dufour estabelece para Kants Théorie der Erfahrung de Cohen (Dufour, 2001, p 29). .

Assim, os dois grandes pilares de reflexão do início propriamente conjuntural do neokantismo podem ser encontrados em, por um lado, um viés filológico e, por outro lado, em um viés sistemático. Cohen, não fortuitamente, seguiu a mesma sequência reflexiva de Kant a partir destes princípios. Com isso, também escreve e reflete a partir de uma Kants Begründung der Ethik e de uma Kants Begründung der Ästhetik. Além destas, também encontramos Das Prinzip der Infinitesimal-Methode, Logik der reinen Erkenntnis, Ethik des reinen Willens, volumes I e II da Ästhetik des reinen Gefühls e Der Begriff der Religion im System der Philosophie.

Ora, para interpretar Kant no século XIX não bastava, meramente, repeti-lo, mas, sobretudo, ultrapassá-lo naquilo que a demanda logicista e epistemológica daquele período requeria. O sistema de Cohen procurou ter a base conceitual de Kant em suas proposições críticas, mas com conceitos que vão além do quadro conceitual kantiano, tal como o de valor (Philonenko, 1989PHILONENKO, A. 1989. L‘École de Marburg. Paris: Vrin ., p 38)16 16 “La disjonction entre l’homme comme être de la nature et l’être rationnel, calquée sur celle du connaître et du penser, ou sur celle des catégories et des idées, permettait à Cohen d’affirmer que quand bien même l’homme n’existerait pas - ni avec lui la psychologie et l’anthropologie - la vérité éthique cependant devrait être en rapport avec le vouloir pur (Kants Bengründung der Ethik, 162). Ainsi l’être rationnel doit affirmer son sens total dans l’exclusion du Dasein, l’être rationnel devient pour soi fin ultime. En même temps, comme être appartenant au monde supra-sensible, et non comprend en soi le Devoir-Etre comme connaissance de la valeur distinct de l’être du sensible.» (Philonenko, 1989, p 38). . Cohen está preocupado em fundamentar não apenas a sua ética, mas também a sua estética, por meio de uma estrutura determinante, que culmina em uma legalidade a priori (Dufour, 2001DUFOUR, E. 2001. Hermann Cohen: Introduction au néokantisme de Marbourg. Paris: Puf., p 29)17 17 «On doit cependant s’attacher au vouloir pur, que investit l’être rationnel, comme principe, en l’on trouvera que le vouloir pur - l’être rationnel se posant comme fin ultime - est un concept analytique […] dans ce rapport analytique la forme se manifeste comme le rationnel, ou encore comme une structure déterminant une légalité a priori.» (Dufour, 2001, p 39). . Ora, que pese todo o esforço do autor para fazer jus ao kantismo em sua exegese própria, ele não deixou de lado a crítica e, por meio dela, atualizou o pensamento kantiano, mas, em sua maturidade, pondo a psicologia (já nos moldes do século XIX) como ponto de coerência lógica do sistema; assim:

Cohen explicitamente assume a tripartição kantiana da filosofia. No entanto, depois de ter fundado as três partes da filosofia, é necessário estabelecer a unidade que caracteriza o sistema como tal. Desde o início, com a escrita da lógica, é para a psicologia que retorna o papel de fundar a unidade do sistema. A psicologia, anunciada como a quarta parte do sistema, tem como objeto a “unidade da consciência” (LRE, p. 17). Ela determina a relação entre as três orientações da consciência (pensamento, vontade, sentimento) que constituem as fontes subjetivas desse sistema ( Dufour, 2001 DUFOUR, E. 2001. Hermann Cohen: Introduction au néokantisme de Marbourg. Paris: Puf. , p 112) 18 18 “Cohen reprend explicitement la tripartition kantienne de la philosophie. Cependant, après avoir fondé les trois parties de la philosophie, il faut établir l’unité qui seule caractérise le système comme tel. Dés le commencement, c’est-à-dire la rédaction de la logique, c’est à la psychologie que revient le rôle de fonder l’unité du système. La psychologie, annoncée comme quatrième partie du système, a pour objet l’ <unité de la conscience> (LRE, p 17). Elle détermine le rapport entre les trois orientations de la conscience (pensée, vouloir, sentiment) qui constituent les sources subjectives de ce système.” LRE é a sigla que Dufour estabelece para Logik der reinen Erkenntnis. (Dufour, 2001, p. 112. Tradução nossa.). .

A psicologia, para Cohen, é capaz de unificar o sistema, posto que, em vez de partir de indivíduos determinados, inicia por meio de fatos culturais presentes em diferentes culturas, a totalidade deve fundamentar a unidade. Assim, obras de arte, a física e a matemática, a ciência do direito etc., são fatos culturais capazes de ser interpretados do ponto de vista do desenvolvimento da humanidade em geral. A análise do desenvolvimento da consciência de um homem determinado deve estar ligada ao desenvolvimento da consciência da humanidade como um todo, apoiando-se num fato cultural com este viés específico, a saber, a história.

Esta ideia de um desenvolvimento coletivo da consciência está ligada ao estabelecimento da psicologia como ciência no final do século XIX. Ora, para que pudesse colocar a psicologia como fundamento do sistema, Cohen usou o artifício das ciências baseadas em ganhos de outras, tal como, por exemplo, a matemática está para a lógica. Isto permitiu que ele desenvolvesse a psicologia como um análogo científico da ciência histórica. Cohen retomou um aspecto que esteve no centro do debate no início do movimento de retorno a Kant com Helmholz e Fries (Leary, 1982LEARY, D. 1982. The Psychology of Jakob Friedrich Fries (1773-1843): Its Context, Nature, and Historical Significance. Storia e Critica Della Psicologia 3(2): p. 217-248., p. 217-248), enquanto tendência de interpretar aquilo que era transcendental como propriedade inata.

Também podemos interpretar que este trato do homem estabelecido por Cohen, não se preocupa com a aplicação pragmática (antropológica, por assim dizer) na vida cotidiana, mas, mormente, em sua fundamentação última de modo a não haver contestação sobre sua base. Por conta desse relevo psicologista é possível notar um desinteresse sobre a filosofia de Cohen, e mesmo sobre o neokantismo de modo geral após a primeira guerra mundial, no que concerne à relevância deste para o ambiente filosófico (o que não pode ser confundido com a interpretação especificamente kantiana, cuja presença de bases neokantianas permanece inegável) (Dufour, 2001DUFOUR, E. 2001. Hermann Cohen: Introduction au néokantisme de Marbourg. Paris: Puf., p 20).

Ora, a continuação da filosofia de Marburg não segue, plenamente, as ideias de Cohen; no entanto não nega a sua Kants Theorie der Efahrung como ponto de partida. Com isso, assumiram os ganhos do sistema de reinterpretação kantiana de Cohen, mas escolheram um ponto nevrálgico do autor para se contrapor: o psicologismo. Em Paul Natorp isto fica muito claro, na medida em que ele atribui a luta contra o psicologismo como ponto fundador da escola de Marburg, ou seja, uma volta a Kant tem de significar um apelo a sua forma de resolução de problemas por meio da objetividade da lógica transcendental, contra o pano de fundo psicologista do subjetivismo. Desse modo, a lógica transcendental:

Longe de ser definida como uma disciplina meramente formal baseada em princípio único de não-contradição, ela deve, bem mais, ser entendida em seu sentido transcendental como um estudo da relação do conhecimento com o objeto, isto é, como uma declinação dos procedimentos mais universais que aplicamos quando procuramos conhecer um objeto qualquer; Natorp chega à sua questão principal: a fundação dessa lógica ou teoria do conhecimento válida deve se dar a partir do sujeito que julga (ato de conhecimento) ou do objeto julgado (conteúdo do que é conhecido)? ( Thomas-Fogiel, 1998 THOMAS-FOGIEL, I. 1998. Notice. In: NATORP, P. Fondation Objective et Fondation Subjective de la Connaissance. Néokantismes et théorie de la connaissance. Paris: Le Cerf . . p 111) 19 19 “Loin de devoir se définir comme discipline simplement formelle basée sur le seul principe de non-contradiction, doit bien plutôt se comprendre, en son sens transcendantal, comme étude de la relation de la connaissance à l’objet, c’est-à-dire comme déclinaison des procédures les plus universelles que nous mettons en œuvre lorsque nous cherchons à connaître un objet quelconque, Natorp en vient à sa question principale: la fondation de cette logique ou théorie de la connaissance valide, doit elle s’effectuer à partir du sujet qui juge (acte de connaissance) ou l’objet jugé (contenu de ce qui est connu)?” (Thomas-Fogiel, 1998, p. 111. Tradução nossa.). .

O primeiro movimento de retorno a Kant é visto por Natorp como de linha psicologista. Autores como Helmholz, Zeller, Mach e Fries, os quais formularam que a psicologia seria um ótimo meio para combater as inconsistências e falta de limites do idealismo (Leary, 1982LEARY, D. 1982. The Psychology of Jakob Friedrich Fries (1773-1843): Its Context, Nature, and Historical Significance. Storia e Critica Della Psicologia 3(2): p. 217-248., p 217-218)20 20 “One aspect of this influence is of particular interest: in his reaction against idealism, and in his own « completion » of Kant, Fries laid the foundation for the development and acceptance of psychology as an independent science.” (Leary, 1982, p. 217-218). , apenas põem uma forma de pensamento que propõe outra vez, mas de modo diferente, alguns limites. Assim, Natorp define o objeto de forma diferente dessa linha psicologista, a saber, aquele é investigado no seio da relação, e não como aquilo que é dado para que certa relação possa se exercer.

O objeto é uma tarefa a ser incessantemente alcançada, e não um dado anterior a ser preenchido tal como o quer a atitude psicologista do primeiro movimento de retorno a Kant. Esta definição de objeto tem de valer para as três áreas da crítica desenvolvidas por Kant, vindo à tona, assim, uma ideia de objeto como algo que necessita de determinação. Natorp se apoia na Kritik der Urteilskraft, daí não haver estranheza em sua proposição de que a determinação do objeto é uma tarefa infinita; o conceito que Natorp se vincula é o de teleologia (Thomas-Fogiel, 1998THOMAS-FOGIEL, I. 1998. Notice. In: NATORP, P. Fondation Objective et Fondation Subjective de la Connaissance. Néokantismes et théorie de la connaissance. Paris: Le Cerf ., p 114). A posição que Natorp estabelece para definir o objeto funciona como uma construção do conhecimento (Natorp, 1998NATORP, P. 1998. Fondation Objective et Fondation Subjective de la Connaissance. In: Néokantismes et théorie de la connaissance. Paris: Le Cerf ., p.139)21 21 “La fondation de la connaissance, atteinte par cette voie, doit absolument être dite objective et non subjective; elle honore l’exigence d’autonomie de la connaissance, car la fondation s’effectue à partir de la loi propre à la connaissance. Cette fondation diffère toto genere, et même s’oppose, à tout point de vue, / à la reconstruction du Subjectif originaire, en laquelle nous décelons le sens ultime de toute tentative de fondation psychologique de la connaissance. La fondation objective ne présuppose pas la fondation subjective, mais au contraire en constitue la condition indispensable. La justification de la loi de la connaissance réside dans la tendance constructive de la connaissance, dans la tendance à l’objectivation; elle cherche précisément les unités objectives ultimes.” (Natorp, 1998, p. 139). .

Enquanto Natorp representa uma volta e tentativa de melhor compreensão da ideia mesma de objeto, por meio do qual se poderia fazer ciência, Cassirer propõe pesquisar e desenvolver o conceito de símbolo como central para pensarmos todos os domínios por meio dos quais se desenvolve a atividade espiritual do homem. Seguindo a revolução copernicana de Kant como ponto central e paradigma de pensamento, podemos estabelecer que ao autor da Filosofia das Formas Simbólicas também é ponto de partida que o Ser repousa sobre o Conhecer. Precisamente, a matéria do conhecimento, aquilo que é fornecido pela sensibilidade, não pode ser dissociada da forma do conhecer.

Primeiramente, é necessário compreender que, para Cassirer, “por um lado, é necessário descrever as diferentes formas simbólicas em sua especificidade, mas, por outro lado, exibir a unidade de significado desse conceito de símbolo que possibilita precisamente fazer a ligação entre as diferentes espécies como um tipo comum.” (Dufour, 1998DUFOUR, E. 1998. Notice. In: Néokantismes et théorie de la connaissance. Paris: Le Cerf., p.200)22 22 “Il faut d’une part décrire les différentes formes symbolique dans leur spécificité, mais d’autre part exhiber l’unité de sens de ce concept de symbole qui permet précisément de faire le lien entre les différentes espèces comme genre commun.” (Dufour, 1998, p. 200). . O símbolo, como nos atesta Dufour, é entendido por Cassirer como aquilo capaz de aglutinar em um gênero comum uma infinidade de matérias. O símbolo organiza a interpretação e a objetividade dos objetos sob um ponto de vista comum. Segundo, Cassirer entende que “as ciências da natureza não possuem nenhuma autonomia verdadeira, porque se baseiam numa rede de sentidos, num tipo de conhecimento ou atividade espiritual do homem, as ciências da natureza não constituem mais doravante, senão apenas um domínio particular (e que é mais tarde) de simbolização.” (Dufour, 1998DUFOUR, E. 1998. Notice. In: Néokantismes et théorie de la connaissance. Paris: Le Cerf., p.200)23 23 “Les sciences de la nature ne possèdent aucune autonomie véritable, car elles reposent sur un réseau de sens, sur un type de connaissance ou d’activité spirituelle de l’homme, les sciences de la nature ne constituant plus désormais qu’un domaine particulier (et, qui plus est, tardif) de symbolisation.” (Dufour, 1998, p. 200). . Assim, o símbolo aparece como uma forma, a qual pode ser considerada, kantianamente, como uma lei ideal de organização da matéria sensível. Com isso, que pese a volumosa e diversa obra de Cassirer, mostraremos duas passagens que comprovam nosso ponto.

Nesse ponto, então, toda a história da filosofia, independentemente de todas as controvérsias entre escolas e sistemas, parece infalivelmente seguir o mesmo curso. Pois é através deste ato de auto-afirmação - através desta confiança em si mesmo como o órgão verdadeiro para conhecer a realidade - que a filosofia como tal é constituída. A afirmação do adaequatio rei et intellectus permanece, nesse sentido, seu ponto de partida natural. E, no entanto, por outro lado, esse ato fundamental contém em si seu próprio oposto dialético. Quanto mais agudamente a filosofia procura determinar o seu objeto, mais o objeto, através dessa mesma determinação, se torna um problema para ela ( Cassirer, 1957 CASSIRER, E. 1957. Philosophy of Symbolic Forms: Volume III. The Phenomenology of Knowledge. New Haven / London: Yale University Press. , p. 3) 24 24 “On this point, then, the whole history of philosophy, regardless of all controversies between schools and systems, seems unerringly to take the same course. For it is through this very act of self-affirmation—through this confidence in itself as the true organ for knowing reality—that philosophy as such is constituted. The assertion of the adaequatio rei et intellectus remains in this sense its natural point of departure. And yet, on the other hand, this fundamental act contains within it its own dialectical opposite. The more sharply philosophy seeks to determine its object, the more the object, through this very determination, becomes a problem for it.” (Cassirer, 1957, p. 3, Tradução nossa). .

Cassirer (1957CASSIRER, E. 1957. Philosophy of Symbolic Forms: Volume III. The Phenomenology of Knowledge. New Haven / London: Yale University Press.. p 45) propõe, com isso, que o símbolo é a principal função do pensamento para organizar complexos conjuntos de objetos em relações perfeitamente verificáveis pelo pensamento, por meio de estruturas teóricas e modelos simbólicos. Neste sentido, as ciências naturais, estabelecidas em um domínio próprio por Dilthey, têm de ser vistas sob a determinação do símbolo, uma vez que as informações que a natureza nos apresenta devem, da mesma maneira e pelo menos em seu início, ser mediadas por aquela instância simbólica. Podemos encontrar o reforço e os meandros sobre o símbolo no conhecido debate de Davos entre Cassirer e Heidegger. Ambos tentam fazer Kant funcionar dentro de suas visões de mundo. Heidegger afirma que:

Ao tentar a fundamentação da Metafísica, Kant foi, por isso, impelido de modo a tornar o verdadeiro solo um abismo. Quando Kant diz: as três perguntas fundamentais se deixam reconduzir à quarta: “o que é o homem?”, então esta pergunta, em seu caráter de pergunta, tornou-se perguntável. Eu tentei mostrar que não é de modo nenhum autoevidente partir de um conceito de logos, mas que a pergunta da possibilidade da Metafísica requer uma metafísica do próprio Dasein enquanto possibilidade do fundamento de uma pergunta da Metafísica, de modo que a questão, “o que é o homem?”, não deve ser respondida tanto no sentido de um sistema antropológico, mas, isto sim, deve ser, primeiro, propriamente clarificada com respeito à perspectiva na qual ela quer ser posta […] eu gostaria, assim, de, mais uma vez, colocar toda nossa discussão nos termos da Crítica da Razão Pura de Kant, e fixar, mais uma vez, a pergunta do que o homem é como a pergunta central. Ao mesmo tempo, porém, enquanto pergunta que não pomos em certo sentido ético isolado, mas de modo que, sobre a problemática, ambas as posições tornem-se claras, de maneira que a pergunta do homem, para o filósofo, seja apenas essencial segundo o modo com que o filósofo simplesmente abre mão de si mesmo, com que a pergunta não possa ser colocada antropocentricamente, mas, isto sim, que deva ser mostrado: pelo fato de que o homem é o essenciar-se que é transcendente, isto é, aberto ao Ente na totalidade e a si mesmo, e que, ao mesmo tempo, o homem, através desse caráter extrínseco, é posto na totalidade do Ente em geral - e que apenas assim a pergunta e a ideia de uma antropologia filosófica tem sentido. ( Cassirer; Heidegger, 2017 CASSIRER, E.; HEIDEGGER, M. 2017. Disputa de Davos entre Ernst Cassirer e Martin Heidegger. Cadernos de Filosofia Alemã. 22(1): p.172-174. , p. 172-174).

Ora, esta afirmação de Heidegger mostra sua tentativa de distanciamento da filosofia feita pelo neokantismo ao trazer para o centro do debate a significação da pergunta antropológica. Nota-se que Heidegger coloca o ponto de fundamentação da pergunta antropológica na dimensão ontológica, de modo que a existência, ontologicamente, seria o ponto primevo de toda e qualquer interpretação de mundo. É interessante notar que Heidegger se apega ao homem empírico, contudo trata a finitude deste como o fundamento kantiano do filosofar, posição que não concordamos.

Em contrapartida, o homem que Kant está exaustivamente a falar em sua última fase filosófica (Azevedo, 2019aAZEVEDO, H. 2019a. A Antropologia como Finalidade da Filosofia em Kant. Campinas: Tese de doutorado defendida na Unicamp.) refere-se à totalidade da humanidade, a qual não se esgota no sujeito, mas também não pode prescindir dele. Esta tensa retroalimentação entre humanidade e subjetividade desempenha um papel central na filosofia kantiana, uma vez que a cultura, por exemplo, é algo que advém da empiria humana, mas se concretiza no progresso em direção ao cosmopolitismo. Heidegger, enfim, trata a pergunta antropológica sob uma ótica formal, ontológica, enquanto Kant está preocupado com a pragmática.25 25 Há de acrescentar que ambos, principalmente Cassirer, tratam da quarta pergunta. Cassirer, por sua vez, distancia-se de Heidegger.

Mas nós não podemos permanecer nesta relatividade, que colocaria o homem empírico no centro. E o que Heidegger disse por último foi muito importante. Também a posição dele não pode ser antropocêntrica, e se ela não o quer ser, eu pergunto onde reside, pois, o centro comum em nossa oposição. Que não pode estar no empírico, está claro. Devemos, precisamente na oposição, procurar novamente pelo centro comum […] isto se revela repetidamente para mim no fenômeno originário da linguagem. Cada um fala sua linguagem; e é impensável que a linguagem de um seja transportada para a do outro. E, ainda assim, nos entendemos pelo meio da linguagem. ( Cassirer; Heidegger, 2017 CASSIRER, E.; HEIDEGGER, M. 2017. Disputa de Davos entre Ernst Cassirer e Martin Heidegger. Cadernos de Filosofia Alemã. 22(1): p.172-174. , p. 175).

3 Declínio do Neokantismo

O formalismo dos valores e da epistemologia permite apenas delimitar o lugar da filosofia, mas não mostra aos humanos como avançar em direção à resolução dos seus problemas e isto pode ser o grande motivo para o declínio do neokantismo no século XX.26 26 Também, neste sentido, pode-se entender que a antropologia (como Etnologia e Etnografia) e a antropologia filosófica, surgida no mesmo contexto do neokantismo e estabelecida quando do declínio deste, não se reivindicam de nenhuma maneira como herdeiros de Kant, mas de Rousseau. Seguiremos aqui a hipótese de José Resende (2013RESENDE, J. 2013. Em busca de uma teoria do sentido. São Paulo: Educ.), a qual consiste que a partir do começo da década de 20 do século XX houve um declínio exponencial do neokantismo na academia alemã até praticamente desaparecer no começo dos anos 30 e isso pode ser explicado por meio dos âmbitos sociocultural e político. Primeiro, no que diz respeito ao âmbito sociocultural, em 1918 acabou aquilo que à época parecia ter sido a maior catástrofe causada pelo ser humano a si mesmo, a saber, a primeira guerra mundial. Tal acontecimento encerrou um evento que causou a morte de 30 milhões de pessoas, além de subverter, completamente, as fronteiras da Europa, surgindo uma série de novos países com conflitos externos e internos não resolvidos. O fato que melhor resume isso é a derrota alemã na guerra, o que acarretou consequências diretas ao seu ambiente acadêmico.

O tratado de Versalhes colocou a Alemanha em condição social degradante com uma inflação abissal em meio à fundação de uma nova república regida pela constituição promulgada na cidade de Weimar. A conhecida república de Weimar foi fundada por sociais-democratas, os quais alguns eram ligados ao neokantismo, entre estes Eduard Bernstein e Kurt Eisner. Ora, a vida na Alemanha tornou-se praticamente insustentável, ao mesmo tempo em que se via nas camadas da classe média uma casta de intelectuais que trabalhavam para o Estado e que possuíam, de algum modo, influência política na situação em que se encontrava o país. Esta elite intelectual alemã, desse modo, passou a negar a sua filiação à velha ordem acadêmica, de modo que no final da década de 1930 poucos ainda ousavam se dizer influenciados completamente pelo neokantismo.

Segundo, no plano político, a radicalização da esquerda socialista e da direita (viúva da monarquia, e das conquistas de Bismarck, eivada de um sentimento de nostalgia de um passado idealizado) começaram a tomar para si simpatias e tentar resolver, violentamente, os problemas do povo Alemão. Dois casos clássicos são o levante espartaquista de Rosa Luxemburgo em 1919, resultando em seu assassinato, e o Putsch de Hitler em 1924, uma tentativa de golpe de estado frustrado, que levou a moderada prisão de Hitler.

No entanto, a direita ganhou essa queda de braço e, em 1933, Hitler ascendeu como chanceler alemão. Isto significou, de modo pragmático em relação à academia, que todos os aspectos desta teriam de ser regulados pelo Estado, acarretando uma perseguição aos acadêmicos de origem judaica. Ora, muitos neokantianos, que ainda se reivindicavam como tais eram, judeus e foram obrigados a abandonar a Alemanha.

Windelband morreu em 1915, no mesmo ano que Emil Lask, este no fronte russo da primeira guerra mundial; contudo Herman Cohen, Jonas Cohn, Siegfrid Marck e Richard Hönigswald, por exemplo, morreram no exílio após emigrarem sem, no entanto, terem mantido uma atividade intelectual considerável. O único que emigrou e conseguiu manter tal atividade foi Cassirer, primeiro na Suécia e, posteriormente, nos Estados Unidos, passando inclusive a publicar em língua inglesa. As exceções para esta negação do neokantismo foram Heinrich Rickert e Bruno Bauch, que aderiram ao nazismo, não sem antes adaptar suas filosofias a serviço de valores espúrios.

José Resende, portanto, defende que esta negação do neokantismo possibilitou a ascensão de correntes filosóficas distintas a partir das ideias postas pelo próprio neokantismo. Ou seja, a negação do neokantismo possibilitou surgir a fenomenologia com Husserl e Heidegger; sendo este último também um dos precursores da hermenêutica com Dilthey, Gadamer e Rosenzweig; o positivismo lógico com Carnap e Schlick; a sociologia de Max Weber; o positivismo jurídico de Hans Kelsen; a filosofia da ciência de Koyré; e, principalmente, a antropologia filosófica de Dilthey e Max Scheler. Mas, todas essas filosofias possuem um tronco comum na lógica, na epistemologia e no formalismo do neokantismo, e não na pragmática de sua antropologia.

4 A antropologia / etnologia / etnografia e seu desconhecimento de Kant

A etnografia/antropologia-cultural/etnologia que se consolidou como ciência na virada do século XIX para o XX não reivindica a antropologia em sentido pragmático de Kant, tampouco este é visto como alguém de importância fundamental às bases dessa ciência. Nas nossas pesquisas acerca das características da antropologia nos seus primórdios não encontramos, espantosamente, muitos manuais ou obras que tratam da história dessa ciência (Azevedo, 2019aAZEVEDO, H. 2019a. A Antropologia como Finalidade da Filosofia em Kant. Campinas: Tese de doutorado defendida na Unicamp.). Uma exceção é George Stocking Jr.27 27 Em alguns e-mails trocados com o Prof. Dr. Mauro Almeida, do departamento de antropologia da UNICAMP (o qual agradecemos imensamente a gentileza), ele nos indicou tal autor preocupado com o resgate das bases desta ciência, com a sua delimitação e fundamentação.

A nossa hipótese é que a antropologia cultural/social, que se consolidou no final do século XIX, não reivindicou Kant como parte de suas fileiras por conta, primeiramente, do modo como este era interpretado pelo neokantismo naquele momento: por meio de uma filosofia dos valores bem formalista; segundo, devido ao fato de a antropologia, principalmente, aquela feita por Franz Boas, tentar desvincular a etnografia do darwinismo social e de um racismo cultural, do qual Kant é um dos partícipes (Azevedo, 2020AZEVEDO, H. 2020. Kant e a antropologia assimétrica: Cosmopolitismo e dependência da ‘natureza’ humana. Kant e-Prints, Campinas, Série 2, 15(2): p. 125-153., p. 125-153).28 28 Azevedo, H. “Kant e a antropologia assimétrica: Cosmopolitismo e dependência da ‘natureza’ humana”. Kant e-Prints, Campinas, Série 2, v. 15, n. 2, pp. 125-153, maio.-ago., 2020. Além deste nosso artigo, há boa literatura sobre a noção de raça em Kant, contudo, como resumo, indicamos Robert Bernasconi: Who Invented the Concept of Race? Kant’s Role in the Enlightenment Construction of Race. In: BERNASCONI, R. Race. Malden: Blackwell, 2001. Também: Kant as an Unfamiliar Source of Racism. In: WARD, J.; LOTT, T. Philosophers on race: critical essays. Oxford: Blackwell, 2002. Sem esquecer de: Kant’s Third Thoughts on Race. In: MENDIETA, E.; ELDEN, S. Reading Kant’s Geography. New York: Suny Press, 2011. Para provar tais assertivas devemos, inicialmente, entender, por meio de Stocking Jr., qual é o ponto de partida histórico da ciência antropológica. O autor nos aponta, por meio de seu ensaio Rousseau Redux (Stocking Jr., 2001STOCKING Jr., G. 2001. Rousseau Redux. In: STOCKING Jr., G. Delimiting Anthropology: Occasional Essays and Reflections. Madison: The University of Wisconsin Press.), tanto Rousseau e quanto o filósofo da moral escocês Lord Kames como iniciadores da etnologia. Stocking Jr associa o nascimento da antropologia diretamente ao conceito de progresso que se estabeleceu na metade do século XVIII.

Embora os primórdios da história intelectual nunca sejam tão simples, pode-se argumentar que o discurso da antropologia e a ideologia cultural do progresso são aproximadamente coevos. As genealogias da antropologia comumente encontram seus ancestrais apicais no mesmo período do meio do século XVIII, quando se diz que a ideia de progresso atinge uma articulação explícita. O segundo ensaio de Rousseau, “Sobre a origem da desigualdade humana”, foi ao mesmo tempo uma contribuição para o debate sobre o progresso e, na já citada décima nota de rodapé, um apelo à ciência empírica da humanidade (Rousseau, 1755, p. 203-213). A mesma sobreposição discursiva pode ser encontrada entre os filósofos morais escoceses que às vezes são reivindicados como antepassados da tradição antropológica anglo-americana. Assim, os tópicos principais dos esboços da história do homem de Lord Kame incluíam “o progresso dos homens como indivíduos”, “O progresso dos homens na sociedade” e “O progresso das ciências” ( Stocking Jr., 2001 STOCKING Jr., G. 2001. Rousseau Redux. In: STOCKING Jr., G. Delimiting Anthropology: Occasional Essays and Reflections. Madison: The University of Wisconsin Press. , p. 265) 29 29 “While beginnings in intellectual history are never so simple, it might be argued that the discourse of anthropology, and the cultural ideology of progress are approximately coeval. Genealogies of anthropology commonly find their apical ancestors in the same mid-eighteenth-century period when the idea of progress is said to fave achieved explicit articulation. Rousseau’s second essay “On the origin of human inequality” was at one and the same time a contribution to the debate on progress and, in the often quoted tenth footnote, a call for an empirically based science of mankind (Rousseau 1755: 203-13). The same discursive overlap may be found among the Scottish moral philosophers who are sometimes claimed as forefathers of the Anglo-American anthropological tradition. Thus, the major topic headings of Lord Kame’s Sketches of the history of Man included “the progress of men as individuals”, “The progress of men in society” and “The progress of the sciences”.”. .

Podemos notar que a noção de progresso da humanidade foi o problema central da antropologia do século XVIII, problema o qual era, eminentemente, filosófico. Stocking, com isso, traça que a antropologia estava se desenvolvendo em um ambiente que começou a levar, completamente, a sério, a ideia de desenvolvimento humano. Ora, para justificar a exploração de terras e a escravidão de homens, principalmente africanos, mas também ameríndios, foi necessário um discurso articulado de superioridade europeia em todos os níveis de sociabilidade, surgindo, com isso, a ideia de Europa (enquanto conjunto de valores) e a ideia de civilização como consecução da noção de Europa. Desse modo, “posto mais como problema do que como afirmação, essa tríade conceitual, o progresso da civilização europeia, foi uma das questões fundamentais do discurso antropológico.” (Stocking Jr., 2001STOCKING Jr., G. 2001. Rousseau Redux. In: STOCKING Jr., G. Delimiting Anthropology: Occasional Essays and Reflections. Madison: The University of Wisconsin Press., p.267). O progresso, assim, foi sempre associado à Europa e suas ideias e práticas de vida como as verdadeiras ideias civilizadas.

Ora, aqui ainda se segue a premissa de Rousseau de que o ser humano é naturalmente bom por natureza, mas o estágio de sociedade o corrompe; a civilização como imposição social era uma ideia supostamente estranha para os povos indígenas. Isto quer dizer que no século XVIII a maneira escalar de entender o homem ainda guardava entre os intelectuais certa curiosidade seguida por um discreto apreço pelas culturas autóctones, coisa que mudou completamente no século XIX, na medida em que vem à tona uma série de depreciações, as quais permitiam ver estes povos como degenerados, decorrendo isto, paradoxalmente, da experiência real da revolução francesa e sua reação em termos cristãos.

No início do século XIX, o pensamento antropológico sobre o progresso da civilização europeia estava em um momento complicado devido a reação contra a Revolução Francesa, além da reafirmação das visões cristãs tradicionais do processo histórico mundial e, à medida que os europeus entraram em contato crescente e desalojaram violentamente as variedades da humanidade nos confins da terra, através da elaboração de explicações raciais biologicamente orientadas sobre a diferença cultural humana. Os povos estigmatizados como selvagens eram agora menos propensos a serem vistos como representantes da condição humana original e mais como produtos de degeneração cultural (e mesmo física) acompanhando a migração da humanidade para fora da Babel ( Stocking Jr., 2001 STOCKING Jr., G. 2001. Rousseau Redux. In: STOCKING Jr., G. Delimiting Anthropology: Occasional Essays and Reflections. Madison: The University of Wisconsin Press. , p.268) 30 30 “In the early nineteenth century, anthropological thought about the progress of European civilization was complicated by the reaction against the French Revolution, by the reassertion of traditional Christian views of world historical process, and, as Europeans came into increasing contact with and violently dispossessed the varieties of humankind at the ends of the earth, by elaboration of biologically oriented racial explanations of human cultural difference. The peoples stigmatized as savages were now less likely to be seen as representatives of the original human condition and more as products of cultural (and even physical) degeneration accompanying the migration of mankind outward from Babel.” (Stocking Jr., 2001, p.268). .

Esta mudança de perspectiva estava sendo gestada desde o século XVIII, mas ainda sob um ponto de vista da antropologia fisiológica. Aqui está talvez um dos principais motivos para a não reivindicação de Kant como ponto de apoio da antropologia. Kant estabelece e consolida uma forma de racismo cultural, com divisões claras entre culturas e uma ideia de progresso humano em que o homem europeu, alemão, precisamente, seria o ápice do destino que se pode alcançar. Isto significa, curiosamente, que Kant inverteu o processo que moldou a antropologia social de seu período. No entanto, o modelo kantiano foi visto como obsoleto por parte daqueles antropólogos que na metade do século XIX faziam uma antropologia racista baseada na biologia, que ganhou uma vitamina em seus preconceitos após o aparecimento do Darwinismo.

Outro ponto a ser destacado é que a compilação e o estabelecimento da obra de Kant se deram apenas no final do século XIX, o que significa que suas lições de caráter antropológico não eram tão facilmente encontradas e, por conseguinte, tampouco discutidas. Ora, Kant poderia talvez ser mais bem entendido se suas lições de antropologia ali fossem conhecidas. Em contrapartida, segundo Stocking Jr., o trabalho de Franz Boas foi de encontro ao Darwinismo social e ao racismo em antropologia, contudo sem abdicar, da ideia de progresso, afirmando em sua A Mente do Homem Primitivo que cada povo e cada cultura contribuiu de algum modo para o progresso da humanidade, cabendo dá-los, contudo, uma melhor oportunidade para fazê-lo de uma forma melhor.

Este modo de entender os povos indígenas possui certa semelhança com o que fez Kant em suas Vorlesungen über Anthropologie (Kant, 1997KANT, I. 1997. Volesungen über Anthropologie, 2 Banden. Berlin: Walter de Gruyter & Co.) e em sua Antropologia de um ponto de vista pragmático, entretanto a especialização e profissionalização do antropólogo neste período de Boas voltou grande parte de sua confiança intelectual ao trabalho de campo como o ponto mais confiável da atividade antropológica, coisa que Kant nunca experimentou. O que estamos a afirmar, precisamente, é que um dos fatores do esquecimento de Kant pela antropologia do século XIX não se deve ao fato dele não ter feito uma antropologia muito similar ao que fora até aqui mostrada, mas sim que, por um lado, o movimento de pensamento de Kant em antropologia foi anacrônico e, por outro lado, suas posições raciais eram problemáticas.

Kant foi mais estudado por seu viés formalista, o que anuviou a sua finalidade pragmática, que, em certo sentido, e anteriormente ao próprio Kant, Rousseau também tratara. Isto acarreta que Kant foi visto como um filósofo muito importante do ponto de vista cognitivo e moral, mas um neófito do ponto de vista cultural. Desse modo, a ciência antropológica preferiu, por grande influência de Boas, se filiar à Geografia do século XIX, tendo nos irmãos Alexander e Wilhelm von Humbolt sua principal fonte e na divisão entre ciências do espírito e ciências da natureza como principal fundo metodológico.

Subjacente a essa dicotomia estava a tradicional separação alemã entre o Naturwissenschaten e o Geisteswissenschaten, ou, nas palavras do contemporâneo de Boas, Hermann Paul, o eminente linguista histórico, a distinção entre as Gesetzeswissenschaften (as ciências legislativas) e as Geschichtswissenschaften (as ciências históricas). […] É evidente que isso é o que Boas tinha em mente em seus exemplos: o sociólogo francês Auguste Comte e o historiador britânico da civilização HT Buckle para o método físico, e o explorador alemão e historiador natural Alexander von Humboldt para o histórico ou depois a obra-prima de Humboldt, Kosmos - método “cosmográfico”. Enquanto Buckle chamou nossa “atenção às leis que governam a história da humanidade”, ele não “descreve os homens e suas ações como decorrentes de seu próprio caráter e dos eventos que influenciam suas vidas”. Da mesma forma, o “sistema de ciências” de Comte subordinava os fenômenos individuais às leis deduzidas deles. A cosmografia, por outro lado, considerava “todo fenômeno digno de ser estudado por si mesmo”; “sua mera existência” lhe dava uma “total participação de nossa atenção” (1887a, p. 642). Ilustrando o método cosmográfico, Boas citou Goethe, que “expressou essa ideia com clareza admirável:” Parece-me que todo fenômeno, todo fato, em si mesmo, é o objeto realmente interessante ... uma única ação ou evento é interessante, não porque é explicável, mas porque é verdade “” (644).” ( Bunzl, 1996 BUNZL, M. 1996. Franz Boas and the humboldtian tradition: From Volksgeist and Nationalcharakter to an Anthropological Concept of Culture. In: STOCKING Jr., G. Volksgeist as Method and Ethics. Essays on Boasian Ethnography and the German Anthropological Tradition. Madinson: Wisconsin Press. , p 17) 31 31 “Underlying this dichotomy was the traditional German separation between the Naturwissenschaten and the Geisteswissenschaten, or, in the words of Boas’ contemporary Hermann Paul, the eminent historical linguist, the distinction between the Gesetzeswissenschaften (the law-giving sciences) and the Geschichtswissenschaften (the historical sciences). […] That this is what Boas had in mind is evident in his examples: the French sociologist Auguste Comte and the British historian of civilization H. T. Buckle for the physical method, and the German explorer and natural historian Alexander von Humboldt for the historical or after Humboldt’s masterpiece Kosmos-”cosmographical” method. While Buckle called our “attention to the laws governing the history of mankind,” he failed to “describe men and their actions as arising from their own character and the events influencing their lives.” Similarly, Comte’s “system of sciences” subordinated individual phenomena to the laws deduced from them. Cosmography, on the other hand, considered “every phenomenon as worthy of being studied for its own sake”; “its mere existence” entitled it to a “full share of our attention” (1887a, p. 642). Illustrating the cosmographical method, Boas quoted Goethe, who had “expressed this idea with admirable clearness: ‘It seems to me that every phenomenon, every fact, itself is the really interesting object ... a single action or event is interesting, not because it is explainable, but because it is true’” (644).” (Bunzl, 1996, p 17). .

Em vista do que nos afirma Matti Bunzl, o conhecimento de Geografia por parte de Boas o conduziu a uma antropologia muito rica, fazendo, de fato, uma intersecção com outras disciplinas, mas sempre em função do conhecimento antropológico como centro nevrálgico da teoria. Com isso, Humbolt queria uma junção entre a filosofia da história de Herder, de caráter empírico, e a filosofia transcendental de Kant, a qual era massivamente interpretada, mesmo com Kant ainda vivo, por um viés formalista (Bunzl, 1996BUNZL, M. 1996. Franz Boas and the humboldtian tradition: From Volksgeist and Nationalcharakter to an Anthropological Concept of Culture. In: STOCKING Jr., G. Volksgeist as Method and Ethics. Essays on Boasian Ethnography and the German Anthropological Tradition. Madinson: Wisconsin Press., p 22). Também há de se reiterar que no século XX, quando os antropólogos enfrentam as origens de sua disciplina a atribuem a Rousseau, e não a Kant.

Levi-Strauss atribui a Rousseau a origem da ciência antropológica no que diz respeito à sua formatação (Levi-Strauss, 1991LEVI-STRAUSS, C. 1991 Totemism. London: The Merlin Press., p. 99), contudo Kant fez uma antropologia muito mais completa com um método crítico muito mais profundo, no qual o transcendental e o empírico, pelo menos no seu projeto antropológico, devem estar lado a lado, na medida em que o transcendental tem de se esforçar para formalizar o empírico; além disso, a antropologia kantiana é erigida dentro de um sistema completo e consciente de si, coisa que não ocorrera com Rousseau. Então, a antropologia/etnologia esqueceu Kant, o que acarreta que a hipótese de levar a sério a filosofia kantiana como uma antropologia soe aos ouvidos mais tradicionalistas como uma heresia.

5 A interpretação Formalista de Kant ignorou a antropologia no século XX

Os intérpretes de Kant do século XX tiveram uma grande influência do neokantismo de viés analítico, de modo a interpretá-lo como um epistemólogo formalista, ao qual o mundo deve moldar-se de acordo com a razão; apesar de esta tese não ser em nada errada, ela é extremamente incompleta se não levarmos em consideração a influência da pragmática humana nos cálculos racionais, tal como pensou o último Kant.

Quanto à influência de viés analítico acima aludida, Max Scheler, por exemplo, nota que a história da filosofia alemã pós-kantiana está eivada de uma visão de mundo epistemologicista: “assim, a filosofia do último terço do século XIX dissolveu-se quase integralmente nas teorias do conhecimento e da experiência. Mas a filosofia não deve ser uma simples serva das ciências, assim como não deve sê-lo da fé religiosa.” (Scheler, 1986SCHELER, M. 1986. Visão Filosófica do Mundo. São Paulo: Perspectiva.. p 8)

O que podemos notar aqui vai ao encontro da hipótese do esquecimento da antropologia kantiana, na medida em corrobora o fato de a revolução copernicana ter colocado a filosofia como ponto alto e fundamental de todas as ciências particulares, além de Kant flexionar um projeto de filosofia transcendental em favor de uma antropologia pragmática (Azevedo, 2019 a AZEVEDO, H. 2019a. A Antropologia como Finalidade da Filosofia em Kant. Campinas: Tese de doutorado defendida na Unicamp.). Podemos afirmar que há um projeto antropológico inacabado em Kant e, por conta disso, foi deixado de lado pelos seus intérpretes, tanto que a acusação de Scheler faz completo sentido ao olharmos para a maneira como se interpretou Kant no século XX, a saber, postulando a teoria do conhecimento como ciência principal, a qual todas as outras teriam de recair por ser o princípio transcendental fundamentador de juízos e discursos. Este é o cerne da interpretação do espírito geral da literatura acerca de Kant no século XX:

A ideia de que a antropologia pragmática não representa mais do que uma rota sobressalente na produção kantiana parece ter influenciado a recepção da obra até os dias de hoje: desde o início do século XIX até o presente, poucos estudos dedicados a temas antropológicos podem ser contados na filosofia kantiana e, entre eles, são ainda menos aqueles que dedicam atenção específica à antropologia pragmática, ou àquela disciplina na qual Kant tem um curso de “mais de vinte anos” (a partir do inverno de 1772/1773), e cujos manuscritos das lições constituem a base do trabalho de 1798, um dos últimos publicados diretamente por Kant. ( Raimondi, 2002 RAIMONDI, I. 2002. L’Antropologia pramatica kantiana: “«Lebenswelt»", «Prassi» O «Autocoscienza Storica»? Note su alcune interpretazioni recenti dell’Antropologia di Kant. Studi Kantiani, 15, p. 211-223. , p. 211-223) 32 32 “L’idea che l’antropologia pragmatica non rappresenti nulla più di una ruota di scorta nella produzione kantiana sembra aver influenzato la ricezione dell’opera sino ai nostri giorni: dai primi del Novecento ad oggi si possono contare ben pochi studi dedicati ai temi antropologici nella filosofia kantiana e, tra di essi, sono ancor meno quelli che dedicano un’attenzione specifica all’antropologia pragmatica, ovvero a quella disciplina sulla quale Kant tiene un corso per «più di vent’anni» (a partire dal semestre invernale 1772/1773), i cui manoscritti delle lezioni costituiscono la base dell’opera del 1798, una delle ultime pubblicata direttamente da Kant.” (Raimondi, 2002, p. 211-223). .

A literatura kantiana produzida no século XX é vastíssima e, por conta disso, traçamos uma estratégia para analisar os vieses interpretativos. Mais precisamente, pensamos que a análise dos títulos e temas publicados na Kant Studien ao longo de sua história é um ótimo retrato do que foi a interpretação kantiana ao longo do século XX. Ora, a Kant Studien é a principal revista acerca da filosofia kantiana no mundo e existe desde 1896, estando ainda atualmente em atividade; a revista aqui em destaque concentra, em publicações diversas, a quase totalidade de intérpretes relevantes de Kant ao longo do século XX.

Assim, podemos traçar a história da interpretação kantiana a partir da estatística da divisão do número de publicações de 1896 a 2010, por meio de quatro grandes categorias, a saber, Formal (não antropológico), Antropologia Ampla (a fim de incluir não apenas a Antropologia Pragmática, mas também temas antropológicos gerais), Outros Temas Kantianos e, por fim, Outros Assuntos.33 33 O levantamento contendo os títulos de todas as 2994 publicações encontra-se em anexo em nossa tese de doutorado. (Cf. Azevedo, 2019a). Temos um total de 2494 publicações analisados. A explicação metodológica para a divisão em quatro categorias diz respeito, mormente, à maneira como espelha os temas da tese que aqui queremos provar.

A elaboração das categorias se deu à medida que as publicações iam se apresentando, de maneira que, inicialmente, apenas as categorias formal e ampla antropologia seriam utilizadas, mas houve a surpresa de que em alguns casos, haviam coisas relevantes que não se encaixavam em apenas uma categoria, daí surgirem as duas outras. Com o intuito de interpretar da melhor maneira possível o esquecimento da filosofia kantiana trouxemos cinco gráficos explicativos, mostrando o percentual do número de artigos em cada categoria e o percentual geral.34 34 Agradecemos a gentileza e, principalmente, a competência dos ensinamentos da pesquisadora da UNICAMP Ianca Almeida por gentilmente ter-nos presenteado com a feitura dos gráficos, explicado, didaticamente, como funciona e o que é a metodologia de interpretação de dados feita com pesquisa séria.

Assim, a nossa metodologia se baseou na análise dos títulos dos artigos, uma vez que seria praticamente impossível ler todos os artigos de mais de 100 anos de história da revista aqui em destaque. Obviamente, houve alguns artigos que ou não pareciam se enquadrar em nenhuma categoria ou o título não era tão claro a ponto de, tranquilamente, encaixá-los em uma das categorias por nós, anteriormente, formuladas. Nestes casos, analisamos parte dos artigos para identificar a temática que melhor os encaixava. Também devemos esclarecer que não categorizamos todas as publicações da revista, uma vez que há vários necrológios, convites para eventos científicos etc. Consideramos, no entanto, que as resenhas de livros são importantes, de modo a mostrar a discussão sobre temas da filosofia kantiana, que os estudiosos se dignaram a debater. Temos a plena noção de que podemos ter nos equivocado na qualificação de alguns artigos, mas, as revisões que fizemos nos garantem haver um alto nível de acerto. As escalas utilizadas diferem a fim de que alguns grupos mal apreciados pudessem ser melhores comparados.35 35 Assim a escala do quadro geral é de 100, a escala do quadro formal é 50, a da ampla antropologia é de 10 e a de outros temas kantiano de 2,5; também fizemos um gráfico sobre a pragmática a fim de mostrar o quadro conceitual de publicações dentro desta categoria específica usando a escala de 2,5; não geramos gráficos sobre a grande categoria de outros temas, uma vez que não concernem à filosofia kantiana diretamente.

Com isso, os artigos em sentido Formal dizem respeito a temas que orbitam em torno das três críticas, ou seja, dividimos em Filosofia teórica (subdividido em Temas de filosofia teórica e Sistema e Método em sentido formal), Filosofia prática (subdivido em Temas em filosofia prática e em Sistema e método em filosofia prática) e Teleologia (subdivido em Temas estéticos, Conceito de fim e Sistema e método teleológico). Contudo, notamos que havia alguns artigos que se encaixavam em mais de uma categoria, de maneira que seria arbitrário colocá-los em uma das categorias especificadas, pois geraria um déficit interpretativo. Optamos, com isso, em criar mais duas categorias, a saber, Híbridos a priori (que tratam de comparação de conceitos dentro da filosofia kantiana) e Filosofia comparada em sentido formal (que trata da interpretação entre Kant e outros autores ou temas).

Como podemos notar, 21,9% (484) das publicações em filosofia formal dizem respeito à filosofia teórica de Kant que perpassam, mormente, a Crítica da Razão Pura. Quanto à filosofia prática temos um número bem diminuto, o que, de fato, pode ser considerado um sintoma dos estudos kantianos, posto que a finalidade da filosofia, desde seu primeiro projeto, é a efetivação da liberdade no mundo. Poucos artigos trabalham com esta temática, que tem 5,86% (135) das publicações. Um número ainda menor é visto quando o assunto é a teleologia, que diz respeito à terceira crítica com 2,91% (67) publicações. As outras duas categorias também expõem assuntos que giram em torno das outras três temáticas totalizando 91 (2,91%) de híbridos a priori e 284 (12,76%) de filosofia comparada em sentido formal, mais precisamente entre Kant e outros autores ou temas fora da filosofia kantiana, mas que a tocam de algum modo. Podemos interpretar estes números como uma grande preocupação de entender as condições de possibilidade da formalidade do mundo, em vez de sua aplicação como Kant apregoou depois de 1793 de maneira mais clara, apesar de já o ter feito ao longo do primeiro projeto também.

A segunda grande categoria trata de Temas Antropológicos. A fim de tornar a interpretação dos artigos concernentes à nossa tese, consideramos um amplo leque de temas de conteúdo antropológico. Assim, consideramos a Pragmática (a qual subdividimos em Antropologia, Filosofia Política, Direito, Filosofia da História, Religião, Educação, Aufklärung e Psicologia), Híbridos pragmáticos (envolvendo mais de uma categoria ou comparação de conceitos ou obras de Kant) e Filosofia comparada em sentido pragmático (envolvendo Kant e outros autores ou temas). A pragmática diz respeito à efetivação e o uso em sentido cosmopolita destas áreas, o que acarreta que inclusive o direito possa ser considerado dentro desta temática.

A segunda grande categoria responde por apenas 201 publicações em um universo de mais de 2494 (voltaremos a isso ao analisarmos a totalidade das publicações). Em nossa perspectiva apenas a Antropologia de um ponto de vista pragmático não é suficiente para esgotar os temas antropológicos da filosofia kantiana, apesar de ser sua principal obra do período. A pragmática, em sentido amplo, que inclui várias áreas, contém 176 publicações (7,6%). No entanto, o que é estarrecedor aqui é o baixo número de publicações sobre a comparação das obras pragmáticas de Kant com outros autores e também temas pragmáticos entre si. Apenas 0,59% (16) e 0,39% (9), respectivamente, da totalidade dos artigos dizem respeito a isso. Somente esse gráfico já seria suficiente para mostrarmos a baixa ou quase nula apreciação daquilo que Kant textualmente chama de finalidade de sua filosofia.

A terceira grande categoria chamamos de Outros Temas Kantianos, devido ao fato de os artigos que a compõem não assentarem nas duas outras categorias de modo tranquilo, sem tensão. Tal categoria, assim, é preenchida pela Recepção em Países, Recepção por Autores (ambos concernentes, obviamente, às obras de Kant), Notas Biográficas, Traduções/Cartas/Archives/Nachlass kantiano, Estabelecimento das Obras da Akademie Ausgabe, Pré-Críticos e Filosofia comparada em Sentido Formal e Pragmático (quando da intersecção das duas grandes categorias postas anteriormente). Destacam-se aqui as notas biográficas de Kant, ocupando um total de 2,13% (32) do número de publicações. A recepção da obra de Kant em países soma um total de 34 (1,5%) das publicações, já a recepção por autores (que diz respeito a autores que contam suas impressões sobre a recepção da filosofia kantiana) somam um total de 12 publicações (0,52%) do total. Traduções/Cartas/Archives/Nachlass kantiano devido o fato de tratar de várias categorias ocupa um lugar privilegiado aqui com 2,13% (49) das publicações.

É interessante o fato de que até 1997, apenas 22 artigos haviam sido publicados sobre a Antropologia pragmática; a publicação em 1997 das Vorlesungen über Anthropologie trouxe aos estudos antropológicos sobre Kant uma nova abordagem, uma vez que o material de pesquisas ampliou-se consideravelmente. Com isso, 28 publicações ocorreram de 1999 até 2010, o que totaliza 46% das publicações em apenas 11 anos. A função antropológica claramente ganhou relevo nos últimos 20 anos, tendo aumentado o número de publicações, mas com o adendo de que ainda podemos notar uma timidez e resistência ao tema por parte dos pesquisadores sênior da filosofia kantiana; apenas 2,2% (50) das publicações da história da Kant Studien foram sobre antropologia pragmática. Destaca-se também que a filosofia da religião kantiana, que mostra pela primeira vez que a satisfação da filosofia deve se dar em sua aplicação, que em 1793 pode ser provada como antropológica, possui apenas 2% da totalidade das publicações.

Portanto, de 1896 a 2010 temos um total de 2494 artigos publicados, incluindo aqui também resenhas de livros sobre Kant, ensaios, discussões e etc. A divisão dentro das quatro grandes categorias é a seguinte: Em relação à primeira grande categoria, Formal, há um total de 991 artigos; em relação aos Temas Antropológicos há um total de 201 artigos; no que concerne aos Outros Temas Kantianos, contamos 211 artigos; finalmente no que concerne aos Outros Autores e Temas temos um total de 800 artigos. A quarta grande categoria trata de Outros Autores e Temas, que apesar de mostrarem artigos que tratam de autores da época de Kant ou de movimentos de pensamento relacionados com Kant, não dizem respeito diretamente à filosofia kantiana, de maneira que preferimos tratá-los em uma categoria diferente e também não subdividimos em categorias próprias.

Assim, podemos notar que apenas 8,7% dos artigos publicados na Kant Studien dizem respeito a um dos oito temas antropológicos acima categorizados. É, deveras, salutar, este diminuto número, posto ser o tema com o maior número de subcategorias, justamente, para abarcar de maneira ampla aquilo que consideramos como temas antropológicos. Apenas a categoria concernente a temas em filosofia teórica possui mais que o dobro de artigos, 448, em relação a todos os temas antropológicos somados, o que pode ser considerado uma prova cabal para o esquecimento da antropologia por parte da fortuna crítica kantiana.

Se nos atentarmos apenas a artigos concernentes à antropologia pragmática, como subcategoria dos temas pragmáticos, temos a completa dimensão da total ignorância do século XX sobre os anseios últimos de Kant. Mais precisamente, há um total nesta subcategoria de ínfimos 50 artigos em toda história da revista; tal quantidade é equivalente a 2,26% dos artigos publicados até 2010. Isso mesmo, tal quantidade de artigos prova, de maneira cabal, o total desprezo dos comentadores de Kant sobre tudo que é empírico, tudo que possui carne, osso, sangue e desejos. Temos que levar em conta que aqui não fizemos a classificação sobre os temas antropológicos que se enquadrariam em sentido formal, posto fazerem parte de um tipo de interpretação sobre as condições de possibilidade dos assuntos antropológicos.

Portanto, a antropologia kantiana como projeto final de sua filosofia foi, além de esquecida, deliberadamente ignorada pela tradição de interpretação do pensamento de Kant. Esperamos que esta artigo possa reaver o afã pelo entendimento da própria letra de Kant, que apesar de não ter cumprido completamente o que escrevera, perseverou até o último suspiro de vida para tentar entregar sua promessa e mostrar à humanidade como progredir, constantemente, em direção a melhor maneira possível de viver.36 36 Em nossa visão, O OP estava sendo reformado para cumprir uma função antropológica, no qual Deus e a Natureza teriam necessariamente de ser sustentados pelo Homem. Cf. AZEVEDO, H. “A Antropologia póstuma de Kant: O Opus Postumum como uma obra de Antropologia.” Studia Kantiana, vol. 17, n. 3 (dez. 2019b): 129-156. Também não podemos esquecer o quão turvo é o conteúdo da humanidade proposta por Kant aos povos não europeus. Ser humano, para Kant, virou sinônimo epistemológico de europeu, masculino e branco; é, igualmente, necessário que denunciemos todos os conteúdo torpes e infames que carregaram o colonialismo idealmente.

Referências

  • AZEVEDO, H. 2019a. A Antropologia como Finalidade da Filosofia em Kant Campinas: Tese de doutorado defendida na Unicamp.
  • AZEVEDO, H. 2019b. “A Antropologia póstuma de Kant: O Opus Postumum como uma obra de Antropologia.” Studia Kantiana, 17(3): p. 129-156.
  • AZEVEDO, H. 2020. Kant e a antropologia assimétrica: Cosmopolitismo e dependência da ‘natureza’ humana. Kant e-Prints, Campinas, Série 2, 15(2): p. 125-153.
  • BERNASCONI, R. 2001. Who Invented the Concept of Race? Kant’s Role in the Enlightenment Construction of Race. In: BERNASCONI, R. Race Malden: Blackwell.
  • BERNASCONI, R. 2002. Kant as an Unfamiliar Source of Racism. In: WARD, J.; LOTT, T. Philosophers on race: critical essays Oxford: Blackwell.
  • BERNASCONI, R. 2011. Kant’s Third Thoughts on Race. In: MENDIETA, E.; ELDEN, S. Reading Kant’s Geography New York: Suny Press.
  • BIRD, G. 2006. The Neglected Alternative: Trendelenburg, Fischer, and Kant. In: BIRD, G. A Companion to Kant Hong Kong: Blackwell.
  • BUNZL, M. 1996. Franz Boas and the humboldtian tradition: From Volksgeist and Nationalcharakter to an Anthropological Concept of Culture. In: STOCKING Jr., G. Volksgeist as Method and Ethics. Essays on Boasian Ethnography and the German Anthropological Tradition Madinson: Wisconsin Press.
  • CASSIRER, E. 1957. Philosophy of Symbolic Forms: Volume III. The Phenomenology of Knowledge New Haven / London: Yale University Press.
  • CASSIRER, E.; HEIDEGGER, M. 2017. Disputa de Davos entre Ernst Cassirer e Martin Heidegger. Cadernos de Filosofia Alemã 22(1): p.172-174.
  • COHEN, H. 1984.Werke Hildesheim: Georg Olms.
  • COHEN, H. 1885. Kants Theorie der Erfahrung Berlin: Harrwitz und Gossman.
  • DUFOUR, E. 2001. Hermann Cohen: Introduction au néokantisme de Marbourg Paris: Puf.
  • DUFOUR, E. 1998. Notice In: Néokantismes et théorie de la connaissance Paris: Le Cerf.
  • HAMMAN, J. G. 1967. Schriften zur Sprache Frankfurt am Main: Suhrkamp.
  • HOLZHEY, H. 2005. Cohen and the Marburg school in context. In: MUNK, R. Hermann Cohen’s Critical Idealism Dordrecht: Spring.
  • JACOBI, F H. 1996a. David Hume Über den Glauben, oder Idealismus und Realismus, Ein Gespräch Hamburg: Meiner, Werke, II.
  • JACOBI, F H. 1998b. Über das Unternehmen des Kritizismus, die Vernunft zu Verstande zu bringen und der Philosophie überhaupt eine neue Absicht zu geben Hamburg: Meiner, Werke, II I.
  • KANT, I. Gesammelten Werken In: https://korpora.zim.uni-duisburg-essen.de/kant/verzeichnisse-gesamt.html
    » https://korpora.zim.uni-duisburg-essen.de/kant/verzeichnisse-gesamt.html
  • KANT, I. 1999. Correspondence London: Cambridge Press, p. 458.
  • KANT, I. 2002. Manual dos cursos de lógica geral Campinas: Ed. Unicamp; Uberlândia: Edufu.
  • KANT, I. 1997. Volesungen über Anthropologie, 2 Banden Berlin: Walter de Gruyter & Co.
  • LAUNAY, M. 2000. Néokantisme et Théorie de la Connaissance Paris: Vrin.
  • LEARY, D. 1982. The Psychology of Jakob Friedrich Fries (1773-1843): Its Context, Nature, and Historical Significance. Storia e Critica Della Psicologia 3(2): p. 217-248.
  • LEVI-STRAUSS, C. 1991 Totemism London: The Merlin Press.
  • NATORP, P. 1998. Fondation Objective et Fondation Subjective de la Connaissance In: Néokantismes et théorie de la connaissance Paris: Le Cerf .
  • PHILONENKO, A. 1989. L‘École de Marburg Paris: Vrin .
  • POMA, A. 1997. The Critical Philosophy of Hermann Cohen New York: State University of New York Press.
  • RAIMONDI, I. 2002. L’Antropologia pramatica kantiana: “«Lebenswelt»", «Prassi» O «Autocoscienza Storica»? Note su alcune interpretazioni recenti dell’Antropologia di Kant. Studi Kantiani, 15, p. 211-223.
  • RESENDE, J. 2013. Em busca de uma teoria do sentido São Paulo: Educ.
  • RUSNOCK, P; GEORGE, R. 1996. The semantic tradition from Kant to Carnap: to the Vienna station. Philosophy and Phenomenological Research, LVI(2).
  • SCHELER, M. 1986. Visão Filosófica do Mundo São Paulo: Perspectiva.
  • STOCKING Jr., G. 2001. Rousseau Redux. In: STOCKING Jr., G. Delimiting Anthropology: Occasional Essays and Reflections Madison: The University of Wisconsin Press.
  • THOMAS-FOGIEL, I. 1998. Notice. In: NATORP, P. Fondation Objective et Fondation Subjective de la Connaissance. Néokantismes et théorie de la connaissance Paris: Le Cerf .
  • 1
    Em 04/05/1793, Kant escreve a Stäudlin sobre a censura de sua Religião nos limites da simples razão e delineia seu projeto final. “O plano que me propus há muito tempo clama por um exame dos campos da pura filosofia com o intuito de resolver tres tarefas: 1- O que posso saber? (Metafisica). 2-O que devo fazer? (Moral). 3-O que me e permitido esperar? (Religiao). Os quais, finalmente, devem seguir um quarto: o que e o homem? (Antropologia, uma matéria sobre a qual eu venho lecionando por mais de vinte anos). Com este amplo escrito, a Religião nos limites da simples razão, eu tentei completar o meu terceiro plano.” (Kant, 1999KANT, I. 1999. Correspondence. London: Cambridge Press, p. 458.. p. 458).
  • 2
    “Was ist der Mensch? ” (Kant, 2002KANT, I. 2002. Manual dos cursos de lógica geral. Campinas: Ed. Unicamp; Uberlândia: Edufu.).
  • 3
    “Les deux principales écoles néokantiennes, lécole de Marbourg et l‘École dite du sud-ouest (école de Baden ou de Heidelberg) n‘ont pas été simplement des pôles intellectuels attachés à une sorte de réhabilitation du kantisme face au courant hégelien, au positivisme empirique ou à la philosophie historiciste de la vie. Elles ont cherché à développer, pour la première, une théorie de la connaissance stricto sensu qui corresponde aux développements des mathématiques et de la physique au tournant du siècle, pour l‘autre, à faire droit aux sciences de l‘Esprit, et, principalement à l‘histoire, mais en dotant les sciences morales d‘une structure philosophique rigoureuse, c‘est-à-dire en élaborant également une théorie de la connaissance, certes moins directement de Kuno Fisher et, sutout de Rudolf Lotze, en logique précisément.” (Launay, 2000LAUNAY, M. 2000. Néokantisme et Théorie de la Connaissance. Paris: Vrin.. p 7. Tradução nossa).
  • 4
    “In Königsberg itself there was no course of lectures about him between autumn of 1807 and the summer of 1865.” (Rusnock; George, 1996RUSNOCK, P; GEORGE, R. 1996. The semantic tradition from Kant to Carnap: to the Vienna station. Philosophy and Phenomenological Research, LVI(2)., p. 8, Tradução nossa).
  • 5
    “Neo-Kantianism came into being as a tentative response and critical alternative both to idealist metaphysics and to naturalistic materialism. Certainly, the need for a “return to Kant” did not grow out of the conviction that he had been forgotten, but, in a way, from the very opposite view. Continual reference to Kant had been the cause of distortion of his authentic thought by his followers, who had always emphasized its less valid aspects (thing-in-itself), neglecting more and more his truly valuable contribution (the transcendental). I am here referring to the central thesis of the book by Liebmann, Kant und die Epigonen. The author, however, was only joining a larger group of thinkers, which included Benecke, Weisse, Haym and Zeller, who had shown the same intentions. The rediscovery of the “real” Kant had a twofold meaning: “the real, historical Kant, the essential, meaningful Kant.” The twofold nature of this “return to Kant” clearly shows that the need for a historical reconstruction of the real Kant was not limited to a kind of Kantian neoscholasticism, but was in search of a sound point of reference for the “reconstruction of philosophy” in this real Kant.” Poma, 1997POMA, A. 1997. The Critical Philosophy of Hermann Cohen. New York: State University of New York Press., p. 2, Tradução nossa).
  • 6
    Nunca é demais lembrar que Hegel morreu em 1836.
  • 7
    “What were forthcoming, however, were theories that were often crude and superficial, in their reliance on naive naturalistic objectivism and an illusory empirical method, taken over from scientific research. The Materialismusstreit controversy of 1850 through 1860 appeared to have come to an end with liberation from all metaphysical illusions and with the definitive establishment of materialistic dogma. Books such as Kohlerglaube und Wissenschaft (published in 1854 and reaching its sixth edition by 1856!) by Karl Vogt, and especially Kraft und Stoff (1855, twenty-first edition by 1904!) by Ludwig Büchner appeared to have opened up a new, more “scientific” conception of reality and man. Materialistic prejudice crossed the boundaries of specialization to take on the role of popular philosophy.” (Poma, 1997POMA, A. 1997. The Critical Philosophy of Hermann Cohen. New York: State University of New York Press., p. 2).
  • 8
    “The disagreement was pursued in Trendelenburg’s Logical Investigations (2nd ed., 1865), On a Gap in Kant’s Proof of the Exclusive Subjectivity of Space and Time (1867), and Fischer and His Kant (1869). Fischer offered his accounts of Kant in the System of Logic and Metaphysics (1865), and a four-volume History of Modern Philosophy (1860-7) and responded directly to Trendelenburg in the polemical Anti-Trendelenburg (1870).” (Bird, 2006BIRD, G. 2006. The Neglected Alternative: Trendelenburg, Fischer, and Kant. In: BIRD, G. A Companion to Kant. Hong Kong: Blackwell., p. 493, Tradução nossa).
  • 9
    “The criticism implies that a central inference in the Aesthetic about the character of space and time is a fallacy which undermines not only the Aesthetic but the whole Critical position. Fischer, by contrast, called the Aesthetics a paradigm of scientific precision and method, and his response was to deny that there is any such gap, or that Kant had neglected the relevant alternative.” (Bird, 2006BIRD, G. 2006. The Neglected Alternative: Trendelenburg, Fischer, and Kant. In: BIRD, G. A Companion to Kant. Hong Kong: Blackwell., p. 487).
  • 10
    “Fischer’s position by contrast was that Trendelenburg had failed properly to understand Kant’s position and that Kant had noted and made room for the neglected alternative. According to Fischer Kant had argued quite properly from subjectivity to non-objectivity provided that these terms were adequately understood.” (Bird, 2006BIRD, G. 2006. The Neglected Alternative: Trendelenburg, Fischer, and Kant. In: BIRD, G. A Companion to Kant. Hong Kong: Blackwell., p. 487).
  • 11
    “However, the “return to Kant” was not merely a warning against the speculative systems of the first half of the nineteenth century, but also, and perhaps even more (or at least more immediately), a rebellion of idealism against the dull naturalistic objectivism of materialism, and an attempt to bring together philosophy and science from a critical standpoint, as opposed to the arbitrary, superficial theorizings of “vulgar materialism” (Vulgiirmaterialismus). The protagonists of the first phase of Neo-Kantianism, so-called “physiological” Neo-Kantianism, were scientists (Helmholtz) and philosophers (Lange, Liebmann), who recognized that the real conceptual framework within which to react against materialistic objectivism and empiricism was the correspondence between the theories of Johannes Muller’s Synnenphysiologie Kant’s a priori.” (Poma, 1997POMA, A. 1997. The Critical Philosophy of Hermann Cohen. New York: State University of New York Press., p. 2-3, Tradução nossa).
  • 12
    “By 1870 the Hegelian school was indeed past its peak and neo-Kantianism began to unfold, initially in parallel to positivism and always differentiated from the philosophies of Schopenhauer, Herbart, and the materialists. The motivation to ‘return to Kant’ was considerably increased by Friedrich Albert Lange (1828-1875) who, in the widely read second edition of his Geschichte des Materialismus (1875) spoke of ‘a young school of Kantians in a narrower and wider sense of the word’. Among these he counted Otto Liebmann, Jürgen Bona Meyer, and Hermann Cohen. Lange admitted that Cohen’s book Kants Theorie der Erfahrung (1871) had inspired him to revise his presentation of the Kantian system.” (Holzhey, 2005HOLZHEY, H. 2005. Cohen and the Marburg school in context. In: MUNK, R. Hermann Cohen’s Critical Idealism. Dordrecht: Spring.).
  • 13
    “L’un de ses premiers ouvrages, La Théorie Kantienne de l’experiénce, dont la première édition fut publiée en 1871, donne l’orientation générale de ce qui, par la suite, restera l’un des axes recteurs de sa pensée: la réinterprétation de Kant. Il est cependant significatif que ce livre, fondateur, en un sens, de ce qui s’est appelé le néokantisme.” (Launay, 2000LAUNAY, M. 2000. Néokantisme et Théorie de la Connaissance. Paris: Vrin., p. 13. Tradução nossa).
  • 14
    “Found the solution in the return to Kant, that is transcendental philosophy.” (Poma, 1997POMA, A. 1997. The Critical Philosophy of Hermann Cohen. New York: State University of New York Press., p. 4. Tradução nossa).
  • 15
    “L’auteur souligne, dès la Préface, qu’il ne s’agit pas de lire Kant pour lire Kant, mais pour en tirer quelque chose afin de mieux penser, aujourd’hui, le problème de la connaissance. Il y a un double enjeu: d’une part celui historique, c’est-à-dire philologique de savoir ce qu’a exactement dit et pensé Kant, d’autre part l’enjeu systématique de savoir en quoi la critique kantienne peut nous aider à philosopher après Kant. Et tous deux sont inséparables. S’il est vrai qu’on ne peut jamais lire et interpréter un texte d’une manière neutre et impartiale - «on ne peut pas lire Kant sans dévoiler le monde qu’on porte dans sa propre tête» (KTE, p xi) -, les présupposés à partir desquels on lit un texte doivent trouver leur confirmation et leur fondation lorsqu’on s’attache à la lecture du texte.” KTE é a sigla que Dufour estabelece para Kants Théorie der Erfahrung de Cohen (Dufour, 2001DUFOUR, E. 2001. Hermann Cohen: Introduction au néokantisme de Marbourg. Paris: Puf., p 29).
  • 16
    “La disjonction entre l’homme comme être de la nature et l’être rationnel, calquée sur celle du connaître et du penser, ou sur celle des catégories et des idées, permettait à Cohen d’affirmer que quand bien même l’homme n’existerait pas - ni avec lui la psychologie et l’anthropologie - la vérité éthique cependant devrait être en rapport avec le vouloir pur (Kants Bengründung der Ethik, 162). Ainsi l’être rationnel doit affirmer son sens total dans l’exclusion du Dasein, l’être rationnel devient pour soi fin ultime. En même temps, comme être appartenant au monde supra-sensible, et non comprend en soi le Devoir-Etre comme connaissance de la valeur distinct de l’être du sensible.» (Philonenko, 1989PHILONENKO, A. 1989. L‘École de Marburg. Paris: Vrin ., p 38).
  • 17
    «On doit cependant s’attacher au vouloir pur, que investit l’être rationnel, comme principe, en l’on trouvera que le vouloir pur - l’être rationnel se posant comme fin ultime - est un concept analytique […] dans ce rapport analytique la forme se manifeste comme le rationnel, ou encore comme une structure déterminant une légalité a priori.» (Dufour, 2001DUFOUR, E. 2001. Hermann Cohen: Introduction au néokantisme de Marbourg. Paris: Puf., p 39).
  • 18
    “Cohen reprend explicitement la tripartition kantienne de la philosophie. Cependant, après avoir fondé les trois parties de la philosophie, il faut établir l’unité qui seule caractérise le système comme tel. Dés le commencement, c’est-à-dire la rédaction de la logique, c’est à la psychologie que revient le rôle de fonder l’unité du système. La psychologie, annoncée comme quatrième partie du système, a pour objet l’ <unité de la conscience> (LRE, p 17). Elle détermine le rapport entre les trois orientations de la conscience (pensée, vouloir, sentiment) qui constituent les sources subjectives de ce système.” LRE é a sigla que Dufour estabelece para Logik der reinen Erkenntnis. (Dufour, 2001DUFOUR, E. 2001. Hermann Cohen: Introduction au néokantisme de Marbourg. Paris: Puf., p. 112. Tradução nossa.).
  • 19
    “Loin de devoir se définir comme discipline simplement formelle basée sur le seul principe de non-contradiction, doit bien plutôt se comprendre, en son sens transcendantal, comme étude de la relation de la connaissance à l’objet, c’est-à-dire comme déclinaison des procédures les plus universelles que nous mettons en œuvre lorsque nous cherchons à connaître un objet quelconque, Natorp en vient à sa question principale: la fondation de cette logique ou théorie de la connaissance valide, doit elle s’effectuer à partir du sujet qui juge (acte de connaissance) ou l’objet jugé (contenu de ce qui est connu)?” (Thomas-Fogiel, 1998THOMAS-FOGIEL, I. 1998. Notice. In: NATORP, P. Fondation Objective et Fondation Subjective de la Connaissance. Néokantismes et théorie de la connaissance. Paris: Le Cerf ., p. 111. Tradução nossa.).
  • 20
    “One aspect of this influence is of particular interest: in his reaction against idealism, and in his own « completion » of Kant, Fries laid the foundation for the development and acceptance of psychology as an independent science.” (Leary, 1982LEARY, D. 1982. The Psychology of Jakob Friedrich Fries (1773-1843): Its Context, Nature, and Historical Significance. Storia e Critica Della Psicologia 3(2): p. 217-248., p. 217-218).
  • 21
    “La fondation de la connaissance, atteinte par cette voie, doit absolument être dite objective et non subjective; elle honore l’exigence d’autonomie de la connaissance, car la fondation s’effectue à partir de la loi propre à la connaissance. Cette fondation diffère toto genere, et même s’oppose, à tout point de vue, / à la reconstruction du Subjectif originaire, en laquelle nous décelons le sens ultime de toute tentative de fondation psychologique de la connaissance. La fondation objective ne présuppose pas la fondation subjective, mais au contraire en constitue la condition indispensable. La justification de la loi de la connaissance réside dans la tendance constructive de la connaissance, dans la tendance à l’objectivation; elle cherche précisément les unités objectives ultimes.” (Natorp, 1998NATORP, P. 1998. Fondation Objective et Fondation Subjective de la Connaissance. In: Néokantismes et théorie de la connaissance. Paris: Le Cerf ., p. 139).
  • 22
    “Il faut d’une part décrire les différentes formes symbolique dans leur spécificité, mais d’autre part exhiber l’unité de sens de ce concept de symbole qui permet précisément de faire le lien entre les différentes espèces comme genre commun.” (Dufour, 1998DUFOUR, E. 1998. Notice. In: Néokantismes et théorie de la connaissance. Paris: Le Cerf., p. 200).
  • 23
    “Les sciences de la nature ne possèdent aucune autonomie véritable, car elles reposent sur un réseau de sens, sur un type de connaissance ou d’activité spirituelle de l’homme, les sciences de la nature ne constituant plus désormais qu’un domaine particulier (et, qui plus est, tardif) de symbolisation.” (Dufour, 1998DUFOUR, E. 1998. Notice. In: Néokantismes et théorie de la connaissance. Paris: Le Cerf., p. 200).
  • 24
    “On this point, then, the whole history of philosophy, regardless of all controversies between schools and systems, seems unerringly to take the same course. For it is through this very act of self-affirmation—through this confidence in itself as the true organ for knowing reality—that philosophy as such is constituted. The assertion of the adaequatio rei et intellectus remains in this sense its natural point of departure. And yet, on the other hand, this fundamental act contains within it its own dialectical opposite. The more sharply philosophy seeks to determine its object, the more the object, through this very determination, becomes a problem for it.” (Cassirer, 1957CASSIRER, E. 1957. Philosophy of Symbolic Forms: Volume III. The Phenomenology of Knowledge. New Haven / London: Yale University Press., p. 3, Tradução nossa).
  • 25
    Há de acrescentar que ambos, principalmente Cassirer, tratam da quarta pergunta.
  • 26
    Também, neste sentido, pode-se entender que a antropologia (como Etnologia e Etnografia) e a antropologia filosófica, surgida no mesmo contexto do neokantismo e estabelecida quando do declínio deste, não se reivindicam de nenhuma maneira como herdeiros de Kant, mas de Rousseau.
  • 27
    Em alguns e-mails trocados com o Prof. Dr. Mauro Almeida, do departamento de antropologia da UNICAMP (o qual agradecemos imensamente a gentileza), ele nos indicou tal autor preocupado com o resgate das bases desta ciência, com a sua delimitação e fundamentação.
  • 28
    Azevedo, H. “Kant e a antropologia assimétrica: Cosmopolitismo e dependência da ‘natureza’ humana”. Kant e-Prints, Campinas, Série 2, v. 15, n. 2, pp. 125-153, maio.-ago., 2020AZEVEDO, H. 2020. Kant e a antropologia assimétrica: Cosmopolitismo e dependência da ‘natureza’ humana. Kant e-Prints, Campinas, Série 2, 15(2): p. 125-153.. Além deste nosso artigo, há boa literatura sobre a noção de raça em Kant, contudo, como resumo, indicamos Robert Bernasconi: Who Invented the Concept of Race? Kant’s Role in the Enlightenment Construction of Race. In: BERNASCONI, R. Race. Malden: Blackwell, 2001BERNASCONI, R. 2001. Who Invented the Concept of Race? Kant’s Role in the Enlightenment Construction of Race. In: BERNASCONI, R. Race. Malden: Blackwell. . Também: Kant as an Unfamiliar Source of Racism. In: WARD, J.; LOTT, T. Philosophers on race: critical essays. Oxford: Blackwell, 2002BERNASCONI, R. 2002. Kant as an Unfamiliar Source of Racism. In: WARD, J.; LOTT, T. Philosophers on race: critical essays. Oxford: Blackwell. . Sem esquecer de: Kant’s Third Thoughts on Race. In: MENDIETA, E.; ELDEN, S. Reading Kant’s Geography. New York: Suny Press, 2011BERNASCONI, R. 2011. Kant’s Third Thoughts on Race. In: MENDIETA, E.; ELDEN, S. Reading Kant’s Geography. New York: Suny Press..
  • 29
    “While beginnings in intellectual history are never so simple, it might be argued that the discourse of anthropology, and the cultural ideology of progress are approximately coeval. Genealogies of anthropology commonly find their apical ancestors in the same mid-eighteenth-century period when the idea of progress is said to fave achieved explicit articulation. Rousseau’s second essay “On the origin of human inequality” was at one and the same time a contribution to the debate on progress and, in the often quoted tenth footnote, a call for an empirically based science of mankind (Rousseau 1755: 203-13). The same discursive overlap may be found among the Scottish moral philosophers who are sometimes claimed as forefathers of the Anglo-American anthropological tradition. Thus, the major topic headings of Lord Kame’s Sketches of the history of Man included “the progress of men as individuals”, “The progress of men in society” and “The progress of the sciences”.”.
  • 30
    “In the early nineteenth century, anthropological thought about the progress of European civilization was complicated by the reaction against the French Revolution, by the reassertion of traditional Christian views of world historical process, and, as Europeans came into increasing contact with and violently dispossessed the varieties of humankind at the ends of the earth, by elaboration of biologically oriented racial explanations of human cultural difference. The peoples stigmatized as savages were now less likely to be seen as representatives of the original human condition and more as products of cultural (and even physical) degeneration accompanying the migration of mankind outward from Babel.” (Stocking Jr., 2001STOCKING Jr., G. 2001. Rousseau Redux. In: STOCKING Jr., G. Delimiting Anthropology: Occasional Essays and Reflections. Madison: The University of Wisconsin Press., p.268).
  • 31
    “Underlying this dichotomy was the traditional German separation between the Naturwissenschaten and the Geisteswissenschaten, or, in the words of Boas’ contemporary Hermann Paul, the eminent historical linguist, the distinction between the Gesetzeswissenschaften (the law-giving sciences) and the Geschichtswissenschaften (the historical sciences). […] That this is what Boas had in mind is evident in his examples: the French sociologist Auguste Comte and the British historian of civilization H. T. Buckle for the physical method, and the German explorer and natural historian Alexander von Humboldt for the historical or after Humboldt’s masterpiece Kosmos-”cosmographical” method. While Buckle called our “attention to the laws governing the history of mankind,” he failed to “describe men and their actions as arising from their own character and the events influencing their lives.” Similarly, Comte’s “system of sciences” subordinated individual phenomena to the laws deduced from them. Cosmography, on the other hand, considered “every phenomenon as worthy of being studied for its own sake”; “its mere existence” entitled it to a “full share of our attention” (1887a, p. 642). Illustrating the cosmographical method, Boas quoted Goethe, who had “expressed this idea with admirable clearness: ‘It seems to me that every phenomenon, every fact, itself is the really interesting object ... a single action or event is interesting, not because it is explainable, but because it is true’” (644).” (Bunzl, 1996BUNZL, M. 1996. Franz Boas and the humboldtian tradition: From Volksgeist and Nationalcharakter to an Anthropological Concept of Culture. In: STOCKING Jr., G. Volksgeist as Method and Ethics. Essays on Boasian Ethnography and the German Anthropological Tradition. Madinson: Wisconsin Press., p 17).
  • 32
    “L’idea che l’antropologia pragmatica non rappresenti nulla più di una ruota di scorta nella produzione kantiana sembra aver influenzato la ricezione dell’opera sino ai nostri giorni: dai primi del Novecento ad oggi si possono contare ben pochi studi dedicati ai temi antropologici nella filosofia kantiana e, tra di essi, sono ancor meno quelli che dedicano un’attenzione specifica all’antropologia pragmatica, ovvero a quella disciplina sulla quale Kant tiene un corso per «più di vent’anni» (a partire dal semestre invernale 1772/1773), i cui manoscritti delle lezioni costituiscono la base dell’opera del 1798, una delle ultime pubblicata direttamente da Kant.” (Raimondi, 2002RAIMONDI, I. 2002. L’Antropologia pramatica kantiana: “«Lebenswelt»", «Prassi» O «Autocoscienza Storica»? Note su alcune interpretazioni recenti dell’Antropologia di Kant. Studi Kantiani, 15, p. 211-223., p. 211-223).
  • 33
    O levantamento contendo os títulos de todas as 2994 publicações encontra-se em anexo em nossa tese de doutorado. (Cf. Azevedo, 2019aAZEVEDO, H. 2019a. A Antropologia como Finalidade da Filosofia em Kant. Campinas: Tese de doutorado defendida na Unicamp.).
  • 34
    Agradecemos a gentileza e, principalmente, a competência dos ensinamentos da pesquisadora da UNICAMP Ianca Almeida por gentilmente ter-nos presenteado com a feitura dos gráficos, explicado, didaticamente, como funciona e o que é a metodologia de interpretação de dados feita com pesquisa séria.
  • 35
    Assim a escala do quadro geral é de 100, a escala do quadro formal é 50, a da ampla antropologia é de 10 e a de outros temas kantiano de 2,5; também fizemos um gráfico sobre a pragmática a fim de mostrar o quadro conceitual de publicações dentro desta categoria específica usando a escala de 2,5; não geramos gráficos sobre a grande categoria de outros temas, uma vez que não concernem à filosofia kantiana diretamente.
  • 36
    Em nossa visão, O OP estava sendo reformado para cumprir uma função antropológica, no qual Deus e a Natureza teriam necessariamente de ser sustentados pelo Homem. Cf. AZEVEDO, H. “A Antropologia póstuma de Kant: O Opus Postumum como uma obra de Antropologia.” Studia Kantiana, vol. 17, n. 3 (dez. 2019b): 129-156AZEVEDO, H. 2019b. “A Antropologia póstuma de Kant: O Opus Postumum como uma obra de Antropologia.” Studia Kantiana, 17(3): p. 129-156..

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Set 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    12 Jul 2022
  • Aceito
    31 Jan 2023
Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS Av. Unisinos, 950 - São Leopoldo - Rio Grande do Sul / Brasil , cep: 93022-750 , +55 (51) 3591-1122 - São Leopoldo - RS - Brazil
E-mail: deniscs@unisinos.br