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Economia Solidária - Em busca dos elementos essenciais da sustentabilidade e solidariedade

Solidarity Economy - In search of essential elements of sustainability and solidarity

Resumos

Este artigo aborda os temas sustentabilidade e solidariedade sob a forma de um levantamento bibliográfico da literatura nacional relativa ao campo Economia Solidária (ES), buscando extrair dela os requisitos que denotam os empreendimentos econômicos solidários quanto a esses construtos. Verificou-se que 16 grupos de análise podem ser adequados para encampar os elementos e traços característicos preconizados pelos pesquisadores da ES incluídos na revisão bibliográfica efetuada. Esses grupos se distribuem pelas dimensões sociopolítica, econômica e ambiental. Adicionalmente, tendo sido constatada a existência de fatores relevantes que perpassam as três dimensões, eles foram reunidos sob a denominação transversal, constituindo uma quarta vertente de observação. Percebeu-se ser viável transformar os resultados da pesquisa em insumo para futuras investigações que ensejem a criação de métodos de avaliação do estágio de sustentabilidade e solidariedade das organizações dessa outra economia.

Desenvolvimento sustentável; Economia solidária; Pesquisa bibliográfica; Solidariedade; Sustentabilidade


This article discusses the topics sustainability and solidarity in the form of a bibliography research of the Brazilian literature on the field Solidarity Economy, trying to extract from it the requirements to denote solidarity economic enterprises such as constructs. It was found that 16 groups of analysis may be adequate to encompass the elements and traits advocated by the researchers included in the ES literature review performed. These groups are divided by the dimensions of sociopolitical, economic and environmental. Additionally, having found the existence of relevant factors that cut across the three dimensions, they were grouped under the name transversal, constituting a fourth sphere of observation. It was noted be viable to transform the results of research into an input for future investigations that led to the creation of methods for evaluation the stage of sustainability and solidarity of organizations in the other economy.

Sustainable development; Solidarity economy; Bibliographic research; Solidarity; Sustainability


Introdução

O campo da chamada Economia Solidária (ES) engloba atividades desenvolvidas sob variados formatos organizacionais, como cooperativas, associações, clubes de troca, movimentos sociais rurais e urbanos, assentamentos agrários, bancos populares e empresas autogeridas, dentre outros. (FRANÇA FILHO; LAVILLE, 2004FRANÇA FILHO, G. C.; LAVILLE J. L. Economia solidária: uma abordagem internacional. Porto Alegre: Editora UFRGS, 2004.; SINGER, 2002SINGER, P. Introdução à economia solidária. São Paulo: Perseu Abramo, 2002.) Suas formas de manifestação encontram-se na produção, comercialização e financiamento de produtos e serviços que apresentam como traços característicos o mutualismo, a cooperação e a autogestão (AG). Essa configuração lhe imprime uma racionalidade especial, com comportamentos sociais e pessoais novos, diversa das racionalidades econômicas tradicionais (RAZETO, 1999RAZETO, L. Economia de solidariedade e organização popular. In: GADOTTI, M; GUTIERREZ F. (Org.). Educação comunitária e economia popular. São Paulo: Cortez, 1999. p. 34-58.) centradas na lógica do "[...] produzir para acumular, acumular para dominar". (CATTANI et al., 2009, p. 177CATTANI, A. D. et al. (Org.). Dicionário internacional da outra economia. São Paulo: Almedina, 2009.)

Gaiger (2009) conceitua Empreendimento Econômico Solidário (EES) como a organização econômica que, podendo contemplar múltiplas modalidades e emanando da espontânea associação de trabalhadores, tem na cooperação o arrimo de sua eficiência e viabilidade. Assume, "[...] em proporção variável, arranjos coletivos na posse dos meios de produção, no processo de trabalho e na gestão do empreendimento, minimizando a presença de relações assalariadas". (GAIGER, 2009, p. 181GAIGER, L. I. Empreendimento econômico solidário. In: CATTANI, A. D. et al. (Org.). Dicionário internacional da outra economia. São Paulo: Almedina, 2009. p. 181-7.)

As bases históricas sobre as quais se assenta a ES são identificadas com o cooperativismo do século XIX na Europa, que propugnava um "[...] novo modelo de vida e a busca pela emancipação, com a proposta de modelos alternativos de produção". (PINHEIRO, 2010, p. 32PINHEIRO, D. C. A educação e a gestão na economia solidária: um estudo sobre os processos de formação das incubadoras tecnológicas de cooperativas populares. 2010. 270 f. Dissertação (Mestrado em Administração) - CEPEAD, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2010.) No Brasil, o crescimento da ES é associado à crise econômica e social deflagrada na década de 1970, abrindo espaço para o surgimento do cooperativismo popular, o qual se orienta pela exclusiva aproximação com camadas populares da sociedade que, vivendo sob situação de precariedade e risco, buscam formas alternativas de geração de renda e condições para o exercício da cidadania. (GUIMARÃES, 2000GUIMARÃES, G. Incubadoras tecnológicas de cooperativas populares: contribuição para um modelo alternativo de geração de trabalho e renda. In: SINGER, P.; SOUZA, A. (Org.). A economia solidária no Brasil: a autogestão como resposta ao desemprego. São Paulo: Contexto. 2000. p. 111-22.) Não obstante, a ES desprendeu-se das esferas desse movimento, avançando em direção a outras instâncias de articulação, como verificado por Singer (2002)SINGER, P. Introdução à economia solidária. São Paulo: Perseu Abramo, 2002., França Filho e Laville (2004)FRANÇA FILHO, G. C.; LAVILLE J. L. Economia solidária: uma abordagem internacional. Porto Alegre: Editora UFRGS, 2004..

Os princípios derivados pela ES, a partir das concepções defendidas pelo movimento cooperativista, incluem a autonomia institucional, a democracia nos processos decisórios, a autogestão como modelo administrativo e a ocupação pelo empreendimento de um espaço plural nas esferas social, política, econômica e ambiental. (FRANÇA FILHO; LAVILLE, 2004FRANÇA FILHO, G. C.; LAVILLE J. L. Economia solidária: uma abordagem internacional. Porto Alegre: Editora UFRGS, 2004.; SINGER, 2002SINGER, P. Introdução à economia solidária. São Paulo: Perseu Abramo, 2002.)

Na busca de uma melhor compreensão desse fenômeno social, França Filho e Laville (2004)FRANÇA FILHO, G. C.; LAVILLE J. L. Economia solidária: uma abordagem internacional. Porto Alegre: Editora UFRGS, 2004. propõem cinco macrocritérios para definição de empreendimentos da ES, buscando refletir os principais traços característicos das iniciativas nesse campo:

Pluralidade de princípios econômicos - as experiências da ES se articulam a partir de fontes de recursos distintas, a saber: o mercado (venda de produtos e serviços), os poderes públicos (subsídios governamentais e não governamentais) e as práticas reciprocitárias (trabalho voluntário, doações e múltiplas formas de troca-dádiva); Autonomia institucional - diz respeito à necessidade de que as iniciativas da ES se mantenham independentes em relação ao controle de outras instituições, notadamente aquelas que lhe são fonte de recursos. Ressalta-se, no entanto, o importante papel que a interdependência com outras organizações, as parcerias e os arranjos institucionais de cooperação exercem na ES; Democratização dos processos decisórios - o fluxo de tomada de decisão numa organização da ES deve possuir caráter coletivo ou estar baseado em práticas de participação democrática de seus integrantes. Reitera-se, assim, a prevalência da autogestão como modo de condução dos empreendimentos, em detrimento de formas heteronômicas de gestão; Sociabilidade comunitário-pública - as formas de organização da ES incorporam modos de relacionamento social singulares. Sua dinâmica não comporta a simples redução de suas práticas à formalidade e impessoalidade costumeiras às atividades econômicas empresariais tradicionais. O alcance das propostas da ES se estende ao espaço comunitário-social na rotina diária da organização. De modo diverso, nas organizações tradicionais, a relação com o social é apenas mais uma prática integrante da estratégia de comunicação com o público; Finalidade multidimensional - Na ES, as iniciativas e empreendimentos assumem, de forma imanente, outras dimensões além da econômica - a social, a cultural, a ecológica e a política. Isso se dá em função de sua natural projeção sobre o espaço público, uma vez que suas finalidades não se voltam prioritariamente para a busca de resultado monetário e que elas possuem um caráter multicêntrico. Significa dizer que as ações de uma organização da ES "[...] não se limitam apenas aos seus membros internos, voltando-se para questões que estão no seu próprio entorno ou na sociedade mais ampla, portanto, questões públicas". (FRANÇA FILHO; LAVILLE, 2004, p. 169)

Segundo dados do último censo da Secretaria Nacional de Economia Solidária (BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego, Secretaria Nacional de Economia Solidária, 2007BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. Secretaria Nacional de Economia Solidária. O atlas da economia solidária no Brasil (consolidado 2005/2007). Disponível em: <http://consulta.mte.gov.br/atlas/AtlasESmenu.html> Acesso em: 29.maio 2014.
http://consulta.mte.gov.br/atlas/AtlasES...
), o número de organizações da ES no Brasil chegava a 21.859 empreendimentos em 2007. Em 1970, eram 139. Embora tenha ocorrido esse expressivo crescimento, grandes desafios se fazem ainda presentes, tais como a persistência de elementos característicos do trabalho alienado, a falta de inovação quanto às formas de organização dos processos de trabalho, a divisão social do trabalho, o problema da meritocracia e distribuição dos retornos, a pouca intensidade de uso de recursos tecnológicos e a limitada capacitação em cooperativismo e autogestão. (PINHEIRO, 2010PINHEIRO, D. C. A educação e a gestão na economia solidária: um estudo sobre os processos de formação das incubadoras tecnológicas de cooperativas populares. 2010. 270 f. Dissertação (Mestrado em Administração) - CEPEAD, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2010.)

A autogestão se destaca como um dos eixos principais em torno do qual se desenha, sem unanimidade teórica, a caracterização da ES. (CATTANI, 2009CATTANI, A. D. Emancipação social. In: CATTANI, A. D. et al. (Org.). Dicionário internacional da outra economia. São Paulo: Almedina, 2009. p. 175-80.; LISBOA, 2005LISBOA, A. de M. Economia solidária e autogestão: imprecisões e limites. Revista de Administração de Empresas (RAE), São Paulo, v. 45, n. 3, p. 109-15, jul./set., 2005.) O conceito central por ela veiculado promove a fusão de trabalhadores e dirigentes em uma única e solidária classe de operários-proprietários. Com essa configuração, a ES prefigura, então, o estabelecimento de novas referências de racionalidade sobre as práticas administrativas em curso nas organizações produtivas mercantis, reafirmando a multidimensionalidade que deve orientar a finalidade das iniciativas humanas. (GAIGER, 2004bGAIGER, L. I. As emancipações no presente e no futuro. In: GAIGER, L. I. (Org.). Sentidos e experiências da economia solidária no Brasil. Porto Alegre: UFRGS Editora, 2004b. p. 371-402.) Essas referências assumem contornos de contraposição e crítica ao sistema de produção dominante, como assinalam Cattani (2009)CATTANI, A. D. Emancipação social. In: CATTANI, A. D. et al. (Org.). Dicionário internacional da outra economia. São Paulo: Almedina, 2009. p. 175-80., Gaiger (2004c)GAIGER, L. I. (Org.). Sentidos e experiências da economia solidária no Brasil. Porto Alegre: UFRGS Editora, 2004c. e Singer (2002)SINGER, P. Introdução à economia solidária. São Paulo: Perseu Abramo, 2002. dentre outros autores.

Tais críticas ao modelo de desenvolvimento exploratório que o sistema de produção corrente engendrou e a visão de que é necessário um novo formato para os mecanismos econômicos, pautado por valores como a cooperação em detrimento da competição sistemática e por uma análise de viabilidade que leve em conta não somente retornos financeiros, ampliando sua atenção para as demais dimensões (social, ambiental e cultural dentre outras), levam à procura por novos modos de produção e consumo que possam fornecer meios para se alcançar um desenvolvimento efetivamente sustentável. Nesse sentido, a economia solidária torna-se um objeto de estudo importante enquanto alternativa que coexiste com o próprio sistema hegemônico. (SINGER, 2002SINGER, P. Introdução à economia solidária. São Paulo: Perseu Abramo, 2002.)

Todo esse cenário justifica o esforço de pesquisa e as contribuições que os acadêmicos buscam oferecer à área. O processo de expansão da ES tem despertado o interesse de estudiosos para compreender sua evolução, seus contornos delineadores e, notadamente, o escopo e alcance de suas propostas. (BEHR; PAES DE PAULA, 2008BEHR, R.; PAES DE PAULA, A. P. Autogestão e lógica de mercado: a experiência da colônia Cecília e os dilemas da economia solidária. In: ENCONTRO DE ESTUDOS ORGANIZACIONAIS, 5., 2008, Belo Horizonte. Anais... Rio de Janeiro: ANPAD, 2008. 1 CD-ROM.; CAVEDON; FERRAZ, 2006CAVEDON, N. R.; FERRAZ, D. L. da S. Tricotando as redes de solidariedade: as culturas organizacionais de uma loja autogestionada de economia popular solidária de Porto Alegre. Revista Organizações & Sociedade (O&S), Salvador, v. 13, n. 39, p. 93-111, out./dez. 2006.; FERRAZ; DIAS, 2008FERRAZ, D. L. da S.; DIAS, P. Discutindo autogestão: um diálogo entre os pensamentos clássicos e contemporâneos e as influências nas práticas autogestionárias da economia popular solidária. Revista Organizações & Sociedade (O&S), Salvador, v. 15, n. 46, p. 99-117, jul./set. 2008.; GOMES; PESSOA; FARIA, 2008GOMES, D. M. O. A.; PESSOA, R. A.; FARIA, M. V. C. M. Formação de redes de economia solidária: o caso da Rede Abelha Ceará. In: ENCONTRO DE ESTUDOS ORGANIZACIONAIS, 5., 2008, Belo Horizonte. Anais... Rio de Janeiro: ANPAD, 2008. 1 CD-ROM.; PASSOS, 2008PASSOS, Ó. A. V. D. Explorando novas práticas organizacionais em economia solidária: conceito e características dos bancos comunitários. In: ENCONTRO DE ESTUDOS ORGANIZACIONAIS, 5., 2008, Belo Horizonte. Anais... Rio de Janeiro: ANPAD, 2008. 1 CD-ROM.; PINHEIRO; PAES DE PAULA, 2010PINHEIRO, D. C.; PAES DE PAULA, A. P. O fracasso das revoluções na óptica de Marcuse e Freire: uma reflexão sobre a economia solidária como uma possível alternativa emancipatória. In: ENCONTRO DE ESTUDOS ORGANIZACIONAIS, 6., 2010, Florianópolis. Anais... Rio de Janeiro: ANPAD, 2010. 1 CD-ROM.; VARGAS 2002VARGAS, E. R. Empresa autogestionária: uma inovação organizacional competitiva? In: ENCONTRO DE ESTUDOS ORGANIZACIONAIS, 2., 2002, Recife. Anais... Rio de Janeiro: ANPAD, 2002. 1 CD-ROM.)

A ausência de instrumentos e ferramentas de análise e gestão específicos para a ES tem sido, também, constatada pelos pesquisadores desse tema. (COSTA; CARRION, 2008; FARIA et al., 2008COSTA, P. A; CARRION, R. S. M. Situando a economia solidária no campo dos estudos organizacionais. In: ENCONTRO DE ESTUDOS ORGANIZACIONAIS, 5., 2008, Belo Horizonte. Anais... Rio de Janeiro: ANPAD, 2008. 1 CD-ROM.) Nesse sentido, o objetivo da investigação relatada no presente artigo foi escrutinar a literatura brasileira1 1 O material nacional consultado foi acrescido de duas obras com origem estrangeira (POLANYI, 2000; SANTOS, 2005), conforme apresentado na seção Metodologia. no campo ES, visando responder ao seguinte problema de partida: Quais devem ser os critérios de avaliação do alinhamento de uma organização produtiva frente aos princípios do Desenvolvimento Sustentável (DS) e da Economia Solidária? Pretendeu-se, a partir do levantamento feito, obter insumos que permitam avaliar as organizações da ES quanto ao seu nível de aderência aos princípios da sustentabilidade (ST) e da solidariedade (SO), conforme elencados pela academia.

O artigo foi, então, estruturado com o seguinte formato: além desta introdução que dá os contornos iniciais da problemática da ES, há outras três divisões. Na seção 2, estão os procedimentos metodológicos adotados na pesquisa bibliográfica e, no tópico seguinte, são mostrados e analisados os resultados do trabalho. Na última parte, são expostas as considerações finais dos autores.

Metodologia

Visando atingir o objetivo proposto, foi realizada a revisão bibliográfica da literatura em torno da ES no Brasil. Os textos analisados foram selecionados por meio de um levantamento bibliométrico prévio que envolveu 6.418 artigos veiculados no período 2005-2010 nos principais eventos e periódicos científicos nacionais em administração (EnANPAD, EnEO, O&S, RAC, RAC-e, RAE, RAE-e, RAP e RAUSP).2 2 Os resultados da primeira etapa desse trabalho podem ser consultados em Ribeiro e De Müylder (2012). Desse conjunto inicial de artigos, 107 foram identificados como correlacionados, especificamente, ao campo temático desejado. Em seguida, procedeu-se a catalogação das referências neles indicadas (o que representou um total de 3.315 entradas). Tal atividade permitiu identificar as obras e autores mais citados pelos pesquisadores da área. Do resultado obtido, optou-se por assimilar, para a presente pesquisa, as seguintes contribuições: Cattani (2003)CATTANI, A. D. (Org.). A outra economia. Porto Alegre: Veraz Editores, 2003.; França Filho e Laville (2004)FRANÇA FILHO, G. C.; LAVILLE J. L. Economia solidária: uma abordagem internacional. Porto Alegre: Editora UFRGS, 2004.; Gaiger (2004c)GAIGER, L. I. (Org.). Sentidos e experiências da economia solidária no Brasil. Porto Alegre: UFRGS Editora, 2004c.; Kraychete, Lara e Costa (2000)KRAYCHETE, G.; LARA, F.; COSTA, B. (Org.). Economia dos setores populares: entre a realidade e a utopia. Petrópolis: Vozes, 2000.; Lisboa (2005)LISBOA, A. de M. Economia solidária e autogestão: imprecisões e limites. Revista de Administração de Empresas (RAE), São Paulo, v. 45, n. 3, p. 109-15, jul./set., 2005., Polanyi (2000)POLANYI, Karl. A grande transformação: as origens da nossa época. 2. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2000.; Santos (2005)SANTOS, B. de S.; RODRÍGUEZ, C. Introdução: para ampliar o cânone da produção. In: SANTOS, B. de S. (Org.). Produzir para viver: os caminhos da produção não capitalista. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005. p. 23-77.; Serva (1996)SERVA, M. Racionalidade e organizações: o fenômeno das organizações substantivas. 1996. 618 p. Tese (Doutorado em Administração) - Escola de Administração de Empresas em São Paulo, Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, 1996., Singer (2002)SINGER, P. Introdução à economia solidária. São Paulo: Perseu Abramo, 2002. e Singer e Souza (2000)SINGER, P.; SOUZA, A. R. (Org.). A economia solidária no Brasil: a autogestão como resposta ao desemprego. São Paulo: Contexto, 2000..

A partir daí, a revisão bibliográfica necessária para atingir o objetivo firmado englobou o rol de publicações acima - tomado aqui como básico - e foi acrescida de Barbieri e outros (2010)BARBIERI, J. C.et al. Inovação e sustentabilidade: novos modelos e proposições. Revista de Administração de Empresas (RAE), São Paulo, v. 50, n. 2, p. 146-54, abr./jun. 2010., Cattani e outros (2009)CATTANI, A. D. et al. (Org.). Dicionário internacional da outra economia. São Paulo: Almedina, 2009., Lima e Teixeira (1994)LIMA, J. B. de; TEIXEIRA, A. L. O cotidiano administrativo de pequenos produtores de hortigranjeiros. In: ENCONTRO DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM ADMINISTRAÇÃO, 18., 1994, Curitiba. Anais... Rio de Janeiro: ANPAD, 1994, p. 224-36., Oliveira (2002)OLIVEIRA, J. H. R. de. Mais: método para avaliação de indicadores de sustentabilidade organizacional. 2002. 217 f. Tese (Doutorado em Engenharia de Produção) - Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2002., Paes de Paula (2007)PAES DE PAULA, A. P. Guerreiro Ramos: resgatando o pensamento de um sociólogo crítico das organizações. Revista Organizações & Sociedade (O&S), Salvador, v. 14, n. 40, p. 169-88, jan./mar., 2007., Reis (2005)REIS, T. A. A sustentabilidade em empreendimentos da economia solidária: pluralidade e interconexão de dimensões. 2005. 217 p. Dissertação (Mestrado em Administração) - NPGA, Universidade Federal da Bahia, Salvador., Rodrigues (2008)RODRIGUES, D. M. L. A racionalidade nas práticas administrativas das cooperativas de trabalho: um estudo de caso em uma cooperativa de trabalho de Belo Horizonte. 2008. 123 p. Dissertação (Mestrado em Administração) - Faculdade Novos Horizontes, Belo Horizonte, 2008., Serva (1993SERVA, M. O fenômeno das organizações substantivas. Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v. 33, n. 2, p. 36-43, mar./abr. 1993., 1997SERVA, M. A racionalidade substantiva demonstrada na prática administrativa. Revista de Administração de Empresa, São Paulo, v. 37, n. 2, p. 18-30, abr./jun. 1997.) e Severo e Pedrozo (2006). O contato com esses trabalhos adveio da leitura parcial dos 107 artigos já mencionados e sua inserção na pesquisa justificou-se pelo subsídio oferecido quanto à identificação dos fatores relevantes para a caracterização dos construtos ST/SO e dos próprios EES, como será apresentado na próxima seção.

Apresentação, análise e discussão dos resultados

O primeiro passo na direção da avaliação dos EES quanto ao seu nível de aderência aos princípios da sustentabilidade e da solidariedade é identificar os eixos temáticos relevantes para tal análise. Constatou-se, durante a revisão bibliográfica efetuada, que há propostas distintas acerca das dimensões a serem consideradas nessa tarefa, mas que, em última instância, elas apresentam complementariedade em suas perspectivas, permitindo visualizar a ES sob contornos holísticos (SANTOS; RODRÍGUEZ, 2005SANTOS, B. de S.; RODRÍGUEZ, C. Introdução: para ampliar o cânone da produção. In: SANTOS, B. de S. (Org.). Produzir para viver: os caminhos da produção não capitalista. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005. p. 23-77.), o que se mostra adequado face aos múltiplos polos de ação que circundam essa alternativa. Aspectos sociais, econômicos, políticos, ecológicos, culturais e administrativo-gerenciais reverberam na literatura (FRANÇA FILHO; LAVILLE, 2004FRANÇA FILHO, G. C.; LAVILLE J. L. Economia solidária: uma abordagem internacional. Porto Alegre: Editora UFRGS, 2004.; LISBOA, 2005LISBOA, A. de M. Economia solidária e autogestão: imprecisões e limites. Revista de Administração de Empresas (RAE), São Paulo, v. 45, n. 3, p. 109-15, jul./set., 2005.; OLIVEIRA, 2002OLIVEIRA, J. H. R. de. Mais: método para avaliação de indicadores de sustentabilidade organizacional. 2002. 217 f. Tese (Doutorado em Engenharia de Produção) - Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2002.; REIS, 2005REIS, T. A. A sustentabilidade em empreendimentos da economia solidária: pluralidade e interconexão de dimensões. 2005. 217 p. Dissertação (Mestrado em Administração) - NPGA, Universidade Federal da Bahia, Salvador.; SANTOS, 2005SANTOS, B. de S. (Org.). Produzir para viver: os caminhos da produção não capitalista. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005.) como elementos essenciais para uma compreensão do fenômeno e para o estabelecimento de critérios de definição para os EES. No presente trabalho, resolveu-se agrupar as contribuições extraídas da literatura em quatro dimensões (sociopolítica, econômica, ambiental e transversal), visando encampar, sob essa abordagem, as variantes categóricas e os contextos convergentes observados no material estudado. A caracterização e o conteúdo de tais dimensões são tratados nas quatro subseções a seguir.

Dimensão sociopolítica

A dimensão sociopolítica no âmbito dos empreendimentos da ES assume um significado próprio e incorpora duas instâncias de articulação: uma interna e outra externa. A camada interna diz respeito aos modos e sentidos da interação entre os sócios-trabalhadores, aos contratos simbólico-afetivos firmados entre eles, às relações que estabelecem voltadas para o desenvolvimento do ser humano, à organização dos processos decisórios e operacionais, à intensidade da participação de cada um nesses processos e à responsabilidade (comprometimento) com resultados. Na interface externa, trata-se de considerar a autonomia do EES frente a agentes governamentais e não governamentais, a sua inserção em redes cooperativas com organismos congêneres e sua atuação projetada no espaço público.

Um aspecto relevante no plano da dimensão sociopolítica da ES é o caráter democrático dos processos decisórios praticado no interior dos empreendimentos. Esse fator está imbricado com a temática da autogestão3 3 A autogestão é um componente central para essa dimensão (a sociopolítica), mas não se reduz somente a ela (ALBUQUERQUE, 2003), como será visto logo a seguir. e tem nela a sua origem. (FRANÇA FILHO, LAVILLE, 2004FRANÇA FILHO, G. C.; LAVILLE J. L. Economia solidária: uma abordagem internacional. Porto Alegre: Editora UFRGS, 2004.) A autogestão é representada pelo "[...] conjunto de práticas sociais que se caracteriza pela natureza democrática das tomadas de decisão, que propicia a autonomia de um 'coletivo'. É um exercício de poder compartilhado" (ALBUQUERQUE, 2003, p. 20ALBUQUERQUE, P. P. de. Autogestão. In: CATTANI, A. D. (Org.). A outra economia. Porto Alegre: Veraz, 2003. p. 20-6.), cujo escopo assume uma perspectiva multidimensional4 4 O componente econômico da autogestão se expressa pelas relações sociais de produção firmadas sobre práticas que destacam o fator trabalho em relação ao capital. A esfera técnica está associada à viabilização de novas formas de organização e divisão do trabalho. (ALBUQUERQUE, 2003) , alcançando repercussões nas esferas social, econômica, política e técnica.

No contexto sociopolítico, a autogestão deve ser compreendida, em primeiro lugar, como um meio pelo qual se geram ações e materializam-se resultados para todos aqueles que dela dependem (indivíduos e grupos). Em segundo lugar, sua adoção implica obter o equilíbrio de forças entre os atores dentro da organização, estruturando modelos de representação que garantam aos processos de tomada de decisões o caráter de autêntica elaboração coletiva de compartilhamento de poder. (ALBUQUERQUE, 2003ALBUQUERQUE, P. P. de. Autogestão. In: CATTANI, A. D. (Org.). A outra economia. Porto Alegre: Veraz, 2003. p. 20-6.) Trata-se de uma configuração com contornos de originalidade, uma vez que dá lugar a uma

[...] forma particular de organização coletivista, cujo traço principal está em sua referência a princípios de diversas filosofias econômicas, aparentemente irreconciliáveis: a superação, de um lado, da apropriação privada da mais-valia e, conseqüentemente, da relação do sistema com o parâmetro do lucro; do outro, a manutenção da livre iniciativa das unidades econômicas. (FOLLIS, 1998, p. 75)

A autonomia dos empreendimentos é, também, um critério de definição para se compreender a ES. (FRANÇA FILHO; LAVILLE, 2004FRANÇA FILHO, G. C.; LAVILLE J. L. Economia solidária: uma abordagem internacional. Porto Alegre: Editora UFRGS, 2004.) Num plano mais abrangente, Cattani (2009, p. 175)CATTANI, A. D.; SALMON, A. Responsabilidade social empresarial. In: CATTANI, A. D. et al. (Org.). Dicionário internacional da outra economia. São Paulo: Almedina, 2009. p. 289-92. contextualiza a questão da autonomia por meio de um resgate histórico da problemática da emancipação social. Para ele, "[...] emancipar remete à liberdade concedida, adquirida ou conquistada". Em sua concepção, na sociedade emancipada, deve estar disponível aos seus membros o máximo grau de liberdade. Esta, no entanto, deve estar balizada pela reciprocidade de deveres e direitos, pela igualdade, ou seja, pelo "[...] processo civilizador que garante a livre expressão respeitosa da diferença e da liberdade do outro". (CATTANI, 2009, p. 175CATTANI, A. D.; SALMON, A. Responsabilidade social empresarial. In: CATTANI, A. D. et al. (Org.). Dicionário internacional da outra economia. São Paulo: Almedina, 2009. p. 289-92.)

Em seu curso, esse estado social tem enfrentado agentes que buscam reorientar a vida coletiva e dirigir o processo histórico. Modernamente, tais agentes apresentam como substrato o pensamento elitista de controle das massas populares, ora expresso em variantes progressistas, ora em modalidades assumidamente tutelares - ambas sempre se manifestando de modo não explícito e dissimulado. As primeiras se revestem de redentoras das camadas populares, as quais consideram como insuficientemente capacitadas para desenvolver uma consciência da realidade concreta de si mesmas e de seus interesses (é o caso das políticas keynesianas e social-democratas). As segundas rejeitam a participação independente das massas que, em sua concepção política, demandam proteção e assistência (enquadram-se aqui os governos e lideranças populistas). (CATTANI, 2009CATTANI, A. D.; SALMON, A. Responsabilidade social empresarial. In: CATTANI, A. D. et al. (Org.). Dicionário internacional da outra economia. São Paulo: Almedina, 2009. p. 289-92.)

Entretanto, segundo esse mesmo autor, uma forma de controle social ainda mais complexa e sofisticada prevalece na contemporaneidade, servindo-se das relações capitalistas para legitimar a dominação, recobri-la como a forma natural das estruturas sociais vigentes e, por fim, configurar o espaço para a "[...] servidão voluntária". (CATTANI, 2009, p. 179CATTANI, A. D.; SALMON, A. Responsabilidade social empresarial. In: CATTANI, A. D. et al. (Org.). Dicionário internacional da outra economia. São Paulo: Almedina, 2009. p. 289-92.) Para Cattani (2009), tal perspectiva é corroborada pela própria base educacional estabelecida (a qual exige uma renovação e transformação para efetivação de seu potencial libertário) e se assenta no fato de que tais relações capitalistas

[...] têm a figura do mercado como auto-referente, auto-institucionalizante e ordenadora suprema das relações entre os indivíduos. As imagens clássicas do poder (Estado, tirano, líder) e suas ações são identificáveis, ao passo que a figura do mercado é diluída, vaga, engendrando a ficção imprecisa da 'individualidade soberana'. (CATTANI, 2009, p. 177)

Na esfera dos EES, a ação autônoma evidencia-se por meio da não sujeição ao controle de outras organizações e instituições, do domínio das decisões que os afetam municiado pela adequada capacidade de gestão e pela independência de posição em relação a eventuais provedores e financiadores. (FRANÇA FILHO; LAVILLE, 2004FRANÇA FILHO, G. C.; LAVILLE J. L. Economia solidária: uma abordagem internacional. Porto Alegre: Editora UFRGS, 2004.)

Democracia interna e autonomia (vistas sob a cobertura da autogestão e da emancipação, respectivamente) fornecem uma configuração propícia à elevação do moral e da participação dos envolvidos. (OLIVEIRA, 2004OLIVEIRA, A. A. de. Significado e inferências sobre a economia solidária a partir do quadro empírico do Ceará. In: GAIGER, Luiz Inácio (Org.). Sentidos e experiências da economia solidária no Brasil. Porto Alegre: UFRGS Editora, 2004. p. 323-69.) Percebe-se um movimento sinérgico entre as interfaces interna e externa dos EES, de maneira que os vínculos estabelecidos internamente - ancorados nos valores e na vivência prática do trabalho e da gestão partilhados - estimulam as iniciativas em benefício da comunidade. (GAIGER, 2004cGAIGER, L. I. (Org.). Sentidos e experiências da economia solidária no Brasil. Porto Alegre: UFRGS Editora, 2004c.) Essa base psicossocial forma e legitima a identidade do grupo. Sua projeção no espaço público o habilita ao exercício da capacidade de disputar recursos e obter conquistas no contexto das políticas públicas. Esse cenário retroalimenta o processo de inserção social e o impulsiona a reafirmar tal identidade, "[...] aprofundando as práticas de autogestão e de cooperação no trabalho, em círculos que se repetem". (GAIGER, 2004c, p. 391GAIGER, L. I. (Org.). Sentidos e experiências da economia solidária no Brasil. Porto Alegre: UFRGS Editora, 2004c.)

Dadas essas condições, poder-se-ia alocar à dimensão sociopolítica requisitos que contemplem os grupos de análise indicados no Quadro 1. Também são apresentados os seus possíveis componentes, bem como os temas-chave discutidos pela literatura revisada, os quais podem permitir uma visão sobre o comportamento e atributos da ES na mencionada dimensão.

Quadro 1
Elementos para análise da dimensão sociopolítica da ESFonte - elaborado pelos autores.

Dimensão econômica

A avaliação dos resultados econômicos de uma organização produtiva que participa de um espaço de mercado5 5 Entendido como o espaço de oferta de produtos e/ou serviços a um público-alvo sob o regime de competição entre agentes com livre iniciativa e que devem observar as delimitações regulatórias emanadas pelo Estado. (REIS, 2005) , em última instância, diz respeito a aferir sua capacidade de se manter operando continuamente no tempo. Para as organizações da ES, a dimensão econômica está baseada numa perspectiva de economia plural, como salientam França Filho e Laville (2004)FRANÇA FILHO, G. C.; LAVILLE J. L. Economia solidária: uma abordagem internacional. Porto Alegre: Editora UFRGS, 2004.. Isso significa que, em seu interior, podem e devem conviver diferentes princípios econômicos consubstanciados a partir dos eixos componentes dessa economia: o mercantil, o não mercantil e o não monetário. (POLANYI, 2000POLANYI, Karl. A grande transformação: as origens da nossa época. 2. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2000.) Essa visão demonstra a concepção de que os EES têm um contorno econômico diferenciado e abrangente, ou seja, a avaliação de seu desempenho não deve se restringir à sua rentabilidade, sua habilidade em gerar riqueza ou maximizar recursos. Nesse sentido também é a percepção de Caillé (2003 apud GAIGER, 2004b, p. 391GAIGER, L. I. As emancipações no presente e no futuro. In: GAIGER, L. I. (Org.). Sentidos e experiências da economia solidária no Brasil. Porto Alegre: UFRGS Editora, 2004b. p. 371-402.) ao analisar a potencial eficácia econômica contida nos empreendimentos coletivos movidos por vínculos de cooperação e solidariedade:

Por outro ângulo, parece - e nisto reside o paradoxo central a assumir - que esta eficácia econômica na produção de riquezas para o mercado apenas se realiza enquanto sua obtenção estiver subordinada ao ideal de uma outra riqueza, propriamente humana e social - o amor da família, a amizade dos cooperados, o senso de justiça, a solidariedade diante do infortúnio, etc. - e enquanto ela levar a viver momentos de gratuidade e de dádiva que, apenas eles, dão sentido ao conjunto do processo. (CAILLÉ, 2003 apud GAIGER, 2004b, p. 391)

Verifica-se, a partir desses discursos, que a ES tem uma função integrativa, em que os aspectos econômicos devem ser contemplados sob um prisma ampliado que destaque os componentes não utilitários da produção em si. Caminhando no sentido de definir indicadores mais pragmáticos em relação ao contexto econômico dos EES, Lisboa (2005)LISBOA, A. de M. Economia solidária e autogestão: imprecisões e limites. Revista de Administração de Empresas (RAE), São Paulo, v. 45, n. 3, p. 109-15, jul./set., 2005. insere, em sua relação de pontos de investigação fundamentais, as questões da repartição do excedente e da prática de preços justos na cadeia produtiva. Em trabalho anterior, Oliveira (2004, p. 340)OLIVEIRA, A. A. de. Significado e inferências sobre a economia solidária a partir do quadro empírico do Ceará. In: GAIGER, Luiz Inácio (Org.). Sentidos e experiências da economia solidária no Brasil. Porto Alegre: UFRGS Editora, 2004. p. 323-69. também alocava a "[...] distribuição igualitária dos resultados e benefícios [como um dos atributos essenciais para aferição da] densidade do solidarismo praticado pelos empreendimentos associativistas". Para o autor, esse fator (solidarismo) "[...] pressupõe a definição democrática da distribuição da produção e da renda gerada, incluindo-se a destinação e a partilha do excedente e a busca de benefícios para todos os produtores livremente associados".6 6 O pensamento de Vieitez e Nakano (2004) também se alinha com o de Oliveira (2004) e Lisboa (2005). Para os autores, "[...] a vigência de políticas equitativas de distribuição dos rendimentos" (VIEITEZ; NAKANO, 2004, p. 142) é um parâmetro a ser adotado como critério de identificação dos empreendimentos da economia solidária. (OLIVEIRA, 2004, p. 341OLIVEIRA, A. A. de. Significado e inferências sobre a economia solidária a partir do quadro empírico do Ceará. In: GAIGER, Luiz Inácio (Org.). Sentidos e experiências da economia solidária no Brasil. Porto Alegre: UFRGS Editora, 2004. p. 323-69.) Um atributo adicional de investigação sugerido por Oliveira (2004, p. 342)OLIVEIRA, A. A. de. Significado e inferências sobre a economia solidária a partir do quadro empírico do Ceará. In: GAIGER, Luiz Inácio (Org.). Sentidos e experiências da economia solidária no Brasil. Porto Alegre: UFRGS Editora, 2004. p. 323-69. refere-se à verificação da existência de "[...] relações solidárias de comércio, troca e intercâmbio com empreendimentos congêneres".

Outros dois aspectos relevantes para uma adequada avaliação da dimensão econômica dos EES podem ser apreendidos de Gaiger (2004b)GAIGER, L. I. As emancipações no presente e no futuro. In: GAIGER, L. I. (Org.). Sentidos e experiências da economia solidária no Brasil. Porto Alegre: UFRGS Editora, 2004b. p. 371-402.. Ao identificar na capacidade de trabalho a principal fonte de sustentação das experiências da ES e, ao mesmo tempo, a origem de muitas de suas vulnerabilidades, o pesquisador assinala aqueles que, em sua concepção, são os principais fatores causadores de desvantagens aos EES, a saber: (1) a defasagem tecnológica e (2) o despreparo técnico-profissional dos trabalhadores associados. Segundo ele,

[...] os novos empreendedores [...], acostumados ao trabalho braçal, pouco qualificado e imbuídos de uma 'cultura da firma', de empregado que segue prescrições, [...] necessitam lidar agora com o mundo desconhecido da administração cotidiana e da gestão a longo prazo. Cedo percebem que não basta simplesmente repetir críticas à economia dominante, tampouco as boas intenções de dotar o empreendimento de admirável índole social. Sofrem as consequências da divisão social do trabalho instaurada pela lógica da produção capitalista - em sociedades como a nossa, de modo incompleto e contraditório - cuja expressão material são os diferentes arranjos técnico-produtivos, em suas variantes pré-fordistas, fordistas e pós-fordistas. Ademais, por conta de sua insuficiente ou nula capitalização - uma razão a mais, desta feita negativa, da centralidade do trabalho - os empreendimentos solidários necessitam realizar a sua acumulação primitiva, sem contarem com outra alternativa razoável senão [...] gerar excedentes coletivamente sobre o seu próprio trabalho. Para tanto, precisam acionar os circuitos da gestão e do trabalho partilhados, provendo-se ao mesmo tempo de recursos sociopolíticos e sabendo tirar proveito máximo da própria experiência. (GAIGER, 2004b, p. 392, grafos no original)

Dessa forma, fica caracterizada a necessidade de embutir na avaliação da dimensão econômica, também, requisitos relacionados à qualidade da gestão na organização.

Quadro 2
Elementos para análise da dimensão econômica da ES Fonte - elaborado pelos autores do artigo

Observando-se tais considerações, seria adequado associar à dimensão econômica os grupos de análise indicados no Quadro 2. Também são apresentados os seus possíveis componentes, bem como os temas-chave discutidos pela literatura revisada, os quais podem permitir uma visão sobre o comportamento e atributos da ES na mencionada dimensão.

Dimensão ambiental

A dimensão ambiental assume uma posição central dentre os elementos catalisadores do movimento em torno do desenvolvimento sustentável. (MILANEZ, 2003MILANEZ, F. Desenvolvimento sustentável. In: CATTANI, A. D. (Org.). A outra economia. Porto Alegre: Veraz Editores, 2003. p. 76-84.) A partir da preocupação com o modo de exploração dos recursos naturais adotado nas sociedades industriais e, principalmente, com os seus efeitos nocivos constatados a partir da segunda metade do século XX, deflagram-se as iniciativas de discussão e mobilização para a mudança acerca do tema. (BARBIERI et al., 2010BARBIERI, J. C.et al. Inovação e sustentabilidade: novos modelos e proposições. Revista de Administração de Empresas (RAE), São Paulo, v. 50, n. 2, p. 146-54, abr./jun. 2010.; OLIVEIRA, 2004OLIVEIRA, A. A. de. Significado e inferências sobre a economia solidária a partir do quadro empírico do Ceará. In: GAIGER, Luiz Inácio (Org.). Sentidos e experiências da economia solidária no Brasil. Porto Alegre: UFRGS Editora, 2004. p. 323-69.)

No entanto, como identificam Jesus e outros (2004), a questão da preservação ambiental diz respeito à relação dos homens com a natureza e está indissociavelmente ligada à forma e sentido das relações dos homens entre si mesmos (sendo estas, também, expressas pelas dimensões política, social e econômica).7 7 É sempre interessante enfatizar que os três setores (Estado, mercado e sociedade) aparecem aqui como agentes atuantes em cada uma dessas dimensões. Isso se dá porque os esquemas de dominação que se estabelecem no interior das sociedades determinam a distribuição de riquezas e as possibilidades com que cada grupo poderá buscar melhores condições de sobrevivência e de usufruto daquilo que está disponível. A defesa de um modo de vida específico das sociedades (e classes) ditas desenvolvidas, notadamente alicerçada no que se entendeu como progresso tecnológico, implicou a subsunção de outras sociedades (e classes sociais) a regras orientadas por uma desigual configuração de poder. Nesse sentido, manifestam-se Jesus e outros (2004, p. 280)JESUS, P. et al. Introdução ao estudo da economia solidária em Pernambuco. In: GAIGER, L. I. (Org.). Sentidos e experiências da economia solidária no Brasil. Porto Alegre: UFRGS Editora, 2004. p. 267-322. ao afirmarem: "[...] acredita-se, no caso brasileiro, que não se pode falar em consciência ecológica quando se vive em pobreza absoluta, o que evidencia a íntima relação entre modelo econômico e estímulo-desestímulo às práticas nocivas ao ambiente".

No âmbito das organizações mercantis, a internalização de limites ao modelo de produção em voga se traduziu na adoção de novos procedimentos e técnicas socialmente mais bem aceitos. Ainda que esse comportamento dos grupos empresariais tenha motivações controversas (a saber: institucionalização e construção da imagem) - como bem advertem Barbieri e outros. (2010)BARBIERI, J. C.et al. Inovação e sustentabilidade: novos modelos e proposições. Revista de Administração de Empresas (RAE), São Paulo, v. 50, n. 2, p. 146-54, abr./jun. 2010. e Cattani e Salmon (2009)CATTANI, A. D.; SALMON, A. Responsabilidade social empresarial. In: CATTANI, A. D. et al. (Org.). Dicionário internacional da outra economia. São Paulo: Almedina, 2009. p. 289-92. - é fato que a temática ambiental, emoldurada no quadro da responsabilidade social empresarial (RSE), tem se mantido na pauta corporativa nas duas últimas décadas.

Basicamente, os mesmos requisitos ambientais aplicáveis às empresas capitalistas cabem no contexto da ES. No entanto, na perspectiva de Milanez (2003)MILANEZ, F. Desenvolvimento sustentável. In: CATTANI, A. D. (Org.). A outra economia. Porto Alegre: Veraz Editores, 2003. p. 76-84., uma diferença marcante está no alinhamento das diretrizes de cada esfera econômica com esses requisitos. No modo de produção e desenvolvimento capitalista, prefere-se "[...] o caminho da mitigação dos impactos, [o qual] nos mantém por mais tempo negando as evidências e rumando à destruição. Ele não melhora a qualidade de vida, diminui sua perda" (MILANEZ, 2003, p. 83MILANEZ, F. Desenvolvimento sustentável. In: CATTANI, A. D. (Org.). A outra economia. Porto Alegre: Veraz Editores, 2003. p. 76-84.) Sua preocupação está na persistência das relações de poder vigentes e foca, prioritariamente, a aparência das mudanças, relegando o seu conteúdo a um plano subjacente. Na aplicação de novos procedimentos e métodos produtivos, pauta-se pela busca da evolução de produtos, não pelo questionamento deles. Para atingir um ponto de inflexão nessa tendência, outros parâmetros precisariam ser incorporados à dinâmica da busca por inovações, orientados por autênticas interrogações: Por quê? Para quê? Para quem? 8 8 Com relação a esse ponto, é importante citar a contribuição de Bonilla (1993), ao explicitar a forma instrumental e utilitária com que as empresas do Ocidente assimilaram a proposta da Qualidade Total originada no Japão. (MILANEZ, 2003MILANEZ, F. Desenvolvimento sustentável. In: CATTANI, A. D. (Org.). A outra economia. Porto Alegre: Veraz Editores, 2003. p. 76-84.)

Do outro lado encontra-se a mudança paradigmática, na qual a estratégia do corrigir danos no fim do tubo9 9 A filosofia de fim de tubo refere-se às ações das esferas governamental e empresarial direcionadas para a instalação de estações de tratamento de esgotos, filtros nas torres de emissão de poluentes gasosos e aterros sanitários para resíduos sólidos em resposta (ou reação) às reivindicações dos movimentos ambientalistas - exigentes de mudanças mais aprofundadas - iniciados na década de 1970. (MILANEZ, 2003) dá lugar, primeiramente, a uma rediscussão

[...] dos nossos valores e costumes, [procurando soluções sobre] como refazer nossa sociedade em direção à sustentabilidade, com suas diversas facetas: a inclusão total, a cooperação, a competição geradora, a diversidade / complementariedade, a flexibilidade, a interdependência e a conservação da matéria / energia. [...] A essência desta mudança, que é política, está na relação entre as pessoas e delas com o meio, pois o segredo do fracasso de nossa sociedade está na fragmentação / separação. Para esta nova relação teremos que construir uma sociedade onde todos participem de uma nova forma de produzir / distribuir o conhecimento, os bens, as decisões, a educação e a comunicação. (MILANEZ, 2003, p. 84)

Quadro 3
Elementos para análise da dimensão ambiental da ES Fonte - elaborado pelos autores do artigo

Alinhada com esse panorama, uma avaliação da dimensão ambiental poderia ser estruturada a partir dos grupos de análise registrados no Quadro 3. Também são apresentados os seus possíveis componentes, bem como os temas-chave discutidos pela literatura revisada, os quais podem permitir uma visão sobre o comportamento e atributos da ES na mencionada dimensão.

Dimensão transversal

A dimensão transversal para análise dos EES visa a abrigar os elementos que, por sua natureza ético-valorativa, perpassam os demais ângulos de observação (sociopolítico, econômico e ambiental), não se indicando a realização de sua investigação sob o compartimento específico de uma delas somente.

Nesse contexto (ou configuração), o primeiro elemento a se considerar na abordagem transversal é a finalidade da organização. Para França Filho e Laville (2004)FRANÇA FILHO, G. C.; LAVILLE J. L. Economia solidária: uma abordagem internacional. Porto Alegre: Editora UFRGS, 2004., um dos grandes traços característicos das iniciativas da ES é a sua vinculação a múltiplos polos de ação, sinalizando que,

[...] ao lado da dimensão econômica, a organização internaliza uma dimensão social, cultural, ecológica e política, no sentido de projetar-se no espaço público. O econômico aqui acaba servindo como um meio para a realização do objetivo do empreendimento que se define, prioritariamente, em termos sociais, políticos ou ecológicos. (FRANÇA FILHO; LAVILLE, 2004, p. 169)

Sob esse ponto de vista, reitera-se que o raio de atuação dos EES não se restringe aos seus integrantes, alcançando, também, a comunidade e a sociedade em que está inserido. Configura-se, assim, uma autêntica dimensão pública de realização, na qual a existência e finalidade do EES vão além da luta por retorno exclusivamente para o grupo que o compõe.

Nessa linha, Santos e Rodríguez (2005)SANTOS, B. de S.; RODRÍGUEZ, C. Introdução: para ampliar o cânone da produção. In: SANTOS, B. de S. (Org.). Produzir para viver: os caminhos da produção não capitalista. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005. p. 23-77., ao indicarem suas nove teses sobre as alternativas de produção ao sistema dominante, ressaltam o matiz holístico que impregna as iniciativas da ES, posicionando a dimensão econômica como substrato que ativa a sua sobrevivência e, em interação com os elementos não econômicos, gera condições de mútua sustentação. Para os autores, embora

[...] a produção seja uma parte essencial das iniciativas porque providencia o incentivo econômico para a participação dos atores, a decisão de empreender um projeto alternativo e a vontade diária de o manter dependem igualmente das dinâmicas não-econômicas - culturais, sociais, afetivas, políticas, etc. - associadas à atividade de produção. Neste sentido, as alternativas são holísticas e seu êxito depende em parte de processos econômicos e não econômicos que dentro dela se sustentam mutuamente. (SANTOS; RODRÍGUEZ, 2005, p. 64, tese 1)

Desse modo, êxito e fracasso na ES devem ser observados sob o prisma da integralidade que tal alternativa retrata, pois remonta a contribuições advindas de polos que transbordam a instrumentalidade peculiar da esfera econômica. Essas considerações não afastam a importância dessa dimensão, apenas assinalam que a ES busca não apenas o resultado financeiro, agregando outras variáveis que ampliam os objetivos e a complexidade do projeto e modelam o seu raio de ação. (REIS, 2005REIS, T. A. A sustentabilidade em empreendimentos da economia solidária: pluralidade e interconexão de dimensões. 2005. 217 p. Dissertação (Mestrado em Administração) - NPGA, Universidade Federal da Bahia, Salvador.)

O segundo aspecto em conta nessa abordagem transversal está associado às formas de conduta e ao sentido das ações ocorridas no cotidiano do empreendimento. Essas questões se desnudam quando se busca interpretar a racionalidade que orienta ou predomina no interior da organização. (SERVA, 1993SERVA, M. O fenômeno das organizações substantivas. Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v. 33, n. 2, p. 36-43, mar./abr. 1993., 1996SERVA, M. Racionalidade e organizações: o fenômeno das organizações substantivas. 1996. 618 p. Tese (Doutorado em Administração) - Escola de Administração de Empresas em São Paulo, Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, 1996., 1997SERVA, M. A racionalidade substantiva demonstrada na prática administrativa. Revista de Administração de Empresa, São Paulo, v. 37, n. 2, p. 18-30, abr./jun. 1997.)

A racionalidade é o filtro aplicado para, com base em requisitos de consciência moral, escrutinar fatos, estruturar conceitos e associá-los de modo a lhes dar sentido no contexto daqueles que os compartilham. Ela é, portanto, constituinte das camadas que sedimentam as ações e o comportamento dos indivíduos e dos coletivos que formam. (SEVERO; PEDROZO, 2006SEVERO, L. S.; PEDROZO, E. Á. A citricultura orgânica na região do vale do caí - RS: racionalidade substantiva ou instrumental? In: ENCONTRO DE ESTUDOS ORGANIZACIONAIS, 4., 2006, Porto Alegre. Anais... Rio de Janeiro: ANPAD, 2006. 1 CD-ROM.)

Morin (2002 apud RODRIGUES, 2008, p. 28RODRIGUES, D. M. L. A racionalidade nas práticas administrativas das cooperativas de trabalho: um estudo de caso em uma cooperativa de trabalho de Belo Horizonte. 2008. 123 p. Dissertação (Mestrado em Administração) - Faculdade Novos Horizontes, Belo Horizonte, 2008.) caracteriza assim as diferenças entre razão, racionalidade e racionalismo: a primeira é um método de conhecimento ancorado na lógica e cálculo objetivos; a segunda refere-se ao equilíbrio entre coerência lógica e realidade empírico-concreta e, por último, racionalismo remete à concepção de uma realidade universal suportada por uma visão que se pretende completa e coerente a partir de um grupo de princípios primário e único.

Na literatura10 10 A questão das racionalidades nos sistemas sociais foi introduzida por Max Weber, sendo discutida, posteriormente, por outros estudiosos com destaque, na Europa, para Karl Mannhein e, no Brasil, para Guerreiro Ramos. (PAES DE PAULA, 2007PAES DE PAULA, A. P. Guerreiro Ramos: resgatando o pensamento de um sociólogo crítico das organizações. Revista Organizações & Sociedade (O&S), Salvador, v. 14, n. 40, p. 169-88, jan./mar., 2007.; SERVA, 1993SERVA, M. O fenômeno das organizações substantivas. Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v. 33, n. 2, p. 36-43, mar./abr. 1993.; 1996SERVA, M. Racionalidade e organizações: o fenômeno das organizações substantivas. 1996. 618 p. Tese (Doutorado em Administração) - Escola de Administração de Empresas em São Paulo, Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, 1996.; 1997SERVA, M. A racionalidade substantiva demonstrada na prática administrativa. Revista de Administração de Empresa, São Paulo, v. 37, n. 2, p. 18-30, abr./jun. 1997.), duas racionalidades básicas divergentes emergem como categorias que visam descrever os conjuntos de comportamentos dos sistemas sociais: 1. a racionalidade instrumental, a qual está associada a julgamentos funcionais, ao cálculo utilitário de fins e meios e ao alcance (mediante a eficientização dos recursos disponíveis) de metas subordinadas a interesses econômicos ou poder social; 2. a racionalidade substantiva, cuja expressão se dá em duas dimensões - grupal e individual. (SERVA, 1996SERVA, M. Racionalidade e organizações: o fenômeno das organizações substantivas. 1996. 618 p. Tese (Doutorado em Administração) - Escola de Administração de Empresas em São Paulo, Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, 1996.; SEVERO, PEDROZO, 2006SEVERO, L. S.; PEDROZO, E. Á. A citricultura orgânica na região do vale do caí - RS: racionalidade substantiva ou instrumental? In: ENCONTRO DE ESTUDOS ORGANIZACIONAIS, 4., 2006, Porto Alegre. Anais... Rio de Janeiro: ANPAD, 2006. 1 CD-ROM.) Na primeira, ela está vinculada a julgamentos morais e éticos, à crença de que a ação humana é movida por valores (antes do que pela perseguição de resultados), à integridade nas relações, ao entendimento e ao desenvolvimento do bem-estar coletivo. Na segunda, refere-se "[...] à autorealização, compreendida como concretização de potencialidades e satisfação". (SERVA, 1997, p. 22SERVA, M. A racionalidade substantiva demonstrada na prática administrativa. Revista de Administração de Empresa, São Paulo, v. 37, n. 2, p. 18-30, abr./jun. 1997.)

Serva (1996, 1997SERVA, M. A racionalidade substantiva demonstrada na prática administrativa. Revista de Administração de Empresa, São Paulo, v. 37, n. 2, p. 18-30, abr./jun. 1997.), com referência na obra de Guerreiro Ramos, A nova ciência das organizações, argumenta que a racionalidade substantiva deve orientar as organizações substantivas11 11 A respeito do trabalho desse estudioso, Paes de Paula (2007, p. 176) tece o seguinte comentário "[...] as definições sociológicas de Guerreiro Ramos atribuíram maior rigor ao campo [da administração], mas é com a elaboração do conceito de ação administrativa que o autor realiza sua maior contribuição: a discussão das racionalidades a partir do resgate e do aprofundamento da definição weberiana de racionalidade substantiva. Analisando a tipologia weberiana de ação social a partir da visão de Mannheim, Guerreiro Ramos [...] recupera a distinção realizada por Weber entre racionalidade funcional e racionalidade substantiva". , o que significa dizer que elas estão permeadas por elementos como a autenticidade, a emancipação, a autonomia e a responsabilidade e satisfação sociais. Como assentou Rodrigues (2008, p. 14)RODRIGUES, D. M. L. A racionalidade nas práticas administrativas das cooperativas de trabalho: um estudo de caso em uma cooperativa de trabalho de Belo Horizonte. 2008. 123 p. Dissertação (Mestrado em Administração) - Faculdade Novos Horizontes, Belo Horizonte, 2008., "[...] trata-se de uma organização que se preocupa com a eliminação [ou redução] de descontentamentos, da alienação e de compulsões desnecessárias à vida humana".

Todavia, o olhar adequado sobre essa dinâmica deve levar em conta que uma ação ou decisão humana não devem ser tomadas como totalmente instrumentais ou substantivas. No desenrolar dos processos sociais e organizacionais, constata-se a recombinação dos elementos que as constituem, com diferentes graus de participação e predominância ora de uma, ora de outra racionalidade. Verifica-se, então, que a organização instrumental ou a substantiva refletem, em sumo, tipos ideais contidos na teoria administrativa e na sociológica. (SERVA, 1996SERVA, M. Racionalidade e organizações: o fenômeno das organizações substantivas. 1996. 618 p. Tese (Doutorado em Administração) - Escola de Administração de Empresas em São Paulo, Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, 1996.; SEVERO, PEDROZO, 2006SEVERO, L. S.; PEDROZO, E. Á. A citricultura orgânica na região do vale do caí - RS: racionalidade substantiva ou instrumental? In: ENCONTRO DE ESTUDOS ORGANIZACIONAIS, 4., 2006, Porto Alegre. Anais... Rio de Janeiro: ANPAD, 2006. 1 CD-ROM.)

O terceiro aspecto da abordagem transversal refere-se às questões da reprodução dos valores da ES e do contínuo propósito em se manter aderente aos princípios que regem e caracterizam essa forma alternativa de arranjo socioeconômico. Para Albuquerque (2003)ALBUQUERQUE, P. P. de. Autogestão. In: CATTANI, A. D. (Org.). A outra economia. Porto Alegre: Veraz, 2003. p. 20-6., a autogestão é a energia propulsora que vincula a ES a outro tipo de ação social, a qual busca, por intermédio da retomada para si da força produtiva outrora feita mercadoria, 1. a intensificação do crescimento do indivíduo enquanto sujeito social; 2. a revisão dos significados das "[...] práticas sociais relacionadas à organização do trabalho, associando-as à idéia-força de mudança radical e de transformação da sociedade capitalista". (ALBUQUERQUE, 2003, p. 25ALBUQUERQUE, P. P. de. Autogestão. In: CATTANI, A. D. (Org.). A outra economia. Porto Alegre: Veraz, 2003. p. 20-6.)

Tal dinâmica ganha essa vertente transformadora quando a ação social ora descrita logra êxito em alcançar instâncias de articulação interorganizacionais que, em mútua cooperação, estendem, reproduzem e reaplicam sua racionalidade (necessariamente) substantivada no cotidiano do espaço público e de mercado nos quais atuem. (CATTANI, 2003CATTANI, A. D. (Org.). A outra economia. Porto Alegre: Veraz Editores, 2003.; 2009CATTANI, A. D.; SALMON, A. Responsabilidade social empresarial. In: CATTANI, A. D. et al. (Org.). Dicionário internacional da outra economia. São Paulo: Almedina, 2009. p. 289-92.; FRANÇA FILHO, LAVILLE, 2004FRANÇA FILHO, G. C.; LAVILLE J. L. Economia solidária: uma abordagem internacional. Porto Alegre: Editora UFRGS, 2004.; GAIGER, 2004cGAIGER, L. I. (Org.). Sentidos e experiências da economia solidária no Brasil. Porto Alegre: UFRGS Editora, 2004c.; SINGER, 2002SINGER, P. Introdução à economia solidária. São Paulo: Perseu Abramo, 2002.) Corroborando tal perspectiva, Oliveira (2004) afirma que, em paralelo à composição de um cenário de avaliação dos empreendimentos da ES com visão para além dos circuitos e limites internos de sua atividade produtiva e de vida,

[...] ganha importância crucial o desenvolvimento de relações solidárias de comércio, de troca e de intercâmbio entre congêneres, tendo em vista criar condições para a viabilidade econômica e social de um conjunto maior de empreendimentos. Nesse sentido, a divulgação e a demonstração de práticas de solidarismo serão importantes para estimular a multiplicação de outros EEAs [Empreendimentos Econômicos Associativistas12] e fazer parte de um processo de transformações sociais mais amplas. (OLIVEIRA, 2004, p. 338)

Gaiger (2004b)GAIGER, L. I. As emancipações no presente e no futuro. In: GAIGER, L. I. (Org.). Sentidos e experiências da economia solidária no Brasil. Porto Alegre: UFRGS Editora, 2004b. p. 371-402. destaca que o estabelecimento de mecanismos de retroalimentação13 13 Para o autor, esses mecanismos referem-se a pressões objetivas e subjetivas que compelem o indivíduo e o coletivo para a reprodução das condutas esperadas (no caso, os princípios e valores solidários). exerce papel fundamental para a manutenção do estado de equilíbrio entre as causas14 14 Gaiger (2004b) identifica quatro causas essenciais: (a) um custo de oportunidade que afeta os trabalhadores envolvidos em aspectos materiais e identitários; (b) a condição de necessidade desses trabalhadores; (c) o grau de adesão aos princípios do solidarismo e, (d) a competência do empreendimento para captar recursos e legitimar-se socialmente. que contribuem para a evolução das experiências dos EES em direção a um estágio maduro de sustentação. O autor assinala, com base nas pesquisas empíricas registradas na obra em questão, que tal estado é determinante para a obtenção de êxito nas iniciativas da ES, canalizando suas energias de modo a propiciar que "[...] as relações internas constitutivas dos princípios de autogestão e de solidariedade [ajam] como uma mola propulsora do empreendimento, introduzindo uma racionalidade interna capaz de sustentá-lo e viabilizá-lo". (GAIGER, 2004b, p. 387GAIGER, L. I. As emancipações no presente e no futuro. In: GAIGER, L. I. (Org.). Sentidos e experiências da economia solidária no Brasil. Porto Alegre: UFRGS Editora, 2004b. p. 371-402.)

Por fim, o quarto ponto a apreciar na dimensão transversal remete à capacidade da organização em alcançar um estágio econômico que lhe permita sobreviver e reproduzir as estruturas e os valores que a constroem e lhe dão sentido no contexto do solidarismo. (FRANÇA FILHO, LAVILLE, 2004FRANÇA FILHO, G. C.; LAVILLE J. L. Economia solidária: uma abordagem internacional. Porto Alegre: Editora UFRGS, 2004.; GAIGER, 2004cGAIGER, L. I. (Org.). Sentidos e experiências da economia solidária no Brasil. Porto Alegre: UFRGS Editora, 2004c.; SANTOS, RODRÍGUEZ, 2005SANTOS, B. de S.; RODRÍGUEZ, C. Introdução: para ampliar o cânone da produção. In: SANTOS, B. de S. (Org.). Produzir para viver: os caminhos da produção não capitalista. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005. p. 23-77.; SINGER, 2002SINGER, P. Introdução à economia solidária. São Paulo: Perseu Abramo, 2002.) Como sublinhado mais acima por França Filho e Laville (2004)FRANÇA FILHO, G. C.; LAVILLE J. L. Economia solidária: uma abordagem internacional. Porto Alegre: Editora UFRGS, 2004., o polo econômico, na ES, subordina-se às demais dimensões e opera como um meio para a consecução dos objetivos mais amplos do projeto alternativo. Visto sob esses ângulos, o estágio econômico assume, também, um caráter interpenetrante nas esferas social, política e ambiental, uma vez que se coloca como o substrato que fornece as condições para a materialização das concepções enraizadas nessa outra economia. (CATTANI, 200, 2009)

Em consonância com esse cenário, seria adequado associar a uma avaliação da dimensão transversal os grupos de análise constantes do Quadro 4. Também, são apresentados os seus possíveis componentes, bem como os temas-chave discutidos pela literatura revisada, os quais podem permitir uma visão sobre o comportamento e atributos da ES na mencionada dimensão.

Quadro 4
Elementos para análise da dimensão transversal da ES Fonte - elaborado pelos autores

Especificamente quanto ao Ciclo de vida, a avaliação do estágio econômico dos empreendimentos da ES poderia acompanhar a classificação mencionada em Reis15 15 Reis (2005) atribui esse enquadramento a Joaquim Melo - Diretor do Banco Palmas (instituição vinculada à ASMOCONP - Associação dos moradores do Conjunto Palmeiras - Fortaleza/CE, Set./2004). (2005, p. 100-2): assistência, subsistência, sustentabilidade ou escala financeira.16 16 Um quadro descritivo detalhado dessa classificação pode ser visto em Ribeiro (2011, p. 74).

Em relação ao grupo Ação cotidiana, a avaliação do grau de racionalidade presente em uma organização poderia se estruturar em torno do modelo sugerido por Serva (1996, 1997) e aplicar o continuum de intensidade de racionalidade por ele desenvolvido17 17 Uma análise condensada do mecanismo elaborado por Serva pode ser consultada em Ribeiro (2011, p. 74-80). .

Por uma lógica apropriada para o desenvolvimento solidário e duradouro18 18 Enquanto mecanismo ampliado de produção e consumo, a ES traz embutida nela uma doutrina que se alinha com o discurso em torno do développement durable, reafirmando e condicionando a existência dos empreendimentos econômicos a objetivos de avanço social. Para Barbieri e outros (2010), a expressão em uso no ambiente francofônico é mais consistente para representar esse movimento, uma vez que "[...] 'duradouro' é um termo mais adequado do que 'sustentável' para qualificar um projeto de transformação global, pois, como sustentável não especifica uma dimensão temporal, pode referir-se a qualquer prazo futuro, inclusive os prazos políticos subordinados aos calendários eleitorais e os [reduzidos] horizontes de planejamento empresarial." (BARBIERI et al., 2010, p. 149) : as quatro dimensões

O conjunto teórico até aqui apresentado para as quatro dimensões caracterizadoras da ES descreve e prescreve o conteúdo das ações dos empreendimentos que nela se inserem, revelando as racionalidades distintivas que denotam e acentuam os contrastes entre a outra economia (CATTANI, 2003CATTANI, A. D. (Org.). A outra economia. Porto Alegre: Veraz Editores, 2003.) e a economia tradicional de mercado - construção hodierna esculpida na (e pela) modernidade em que se operou a desvinculação do campo econômico da completitude das demais instituições sociais e cuja proposta enseja o domínio destas a partir da transmutação do trabalho, dos recursos naturais e da riqueza em mercadoria. (POLANYI, 2000POLANYI, Karl. A grande transformação: as origens da nossa época. 2. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2000.) De modo adverso, entretanto, a ES evoca um outro formato, com valores e concepções de caráter agregador para as relações coletivas. A (re)colocação da solidariedade no cerne das atividades de produção - as quais sustentam, ampliam, e (re)elaboram, continuamente, o sentido do viver humano e demonstraram ter potencial técnico para propiciar níveis crescentes de bem-estar e conforto -, torna-se um

[...] aspecto [que] parece bastante salutar e nos lembra um traço histórico característico da organização dos grupos sociais em diferentes culturas, no passado, e mesmo no presente, em certas sociedades, isto é, o fato de a esfera das atividades econômicas encontrar-se imbricada junto às demais dimensões da prática (como o social, o político, o cultural ou o estético etc.). [Pode-se afirmar que] é apenas na modernidade capitalista que a esfera econômica se autonomiza em relação às demais dimensões da vida em sociedade, através do advento do princípio do mercado auto-regulado. (FRANÇA FILHO; LAVILLE, 2004, p. 16)

De fato, o (re)afloramento de diversificadas iniciativas e organizações da sociedade civil - sob variados contextos19 19 França Filho e Laville (2004) analisam em sua obra, de modo comparativo, os casos europeu e latino-americano. No primeiro, destacam como formas de manifestação da ES, as cooperativas sociais, as sociedades cooperativas de interesse público, as empresas sociais e os sistemas de troca locais. No segundo, identificam as cooperativas de produção e de prestação de serviços, os bancos populares e os clubes de troca. regionais e nacionais e, portanto, com inspirações e características próprias de cada cenário - tendo em comum as marcas da cooperação e da solidariedade ao se empenharem na produção de atividades econômicas, é o que motiva o surgimento (nos anos 90 do século passado) do termo Economia Solidária, de forma simultânea, no Brasil e na França. (FRANÇA FILHO; LAVILLE, 2004FRANÇA FILHO, G. C.; LAVILLE J. L. Economia solidária: uma abordagem internacional. Porto Alegre: Editora UFRGS, 2004.) Notadamente, verifica-se nelas o resgate de uma concepção que resiste historicamente: a de que o empreender econômico não é um fim em si mesmo, mas um substrato para consecução de outros propósitos em extensões que complementam e integralizam a convivência humana (a social, a política, a cultural etc.). É na soma dessas instâncias, cujo conteúdo os quadros de análise anteriormente discutidos intentaram capturar, que se busca a reposição de valores que (re)orientem a conduta (ethos) tanto no plano individual - da existência do homem capacitado, desenvolvido e engajado - quanto no plano coletivo - da livre associação de pessoas para a geração de riqueza, em sentido amplo, que favoreça a construção de uma humanidade mais equilibrada.

Mas, não se trata de pensar apenas na espécie humana, enquanto indivíduo ou coletivo. O seu viver inclui as interações com as outras espécies vivas e com toda a realidade material na qual estão imersas. A dimensão ambiental reflete não somente a procura por preservar a natureza para desfrute das gerações futuras. Aduz, também, a um modo respeitoso de lidar e interatuar com o mundo natural que remete ao comportamento cotidiano observado em sociedades que não seguiram o dito padrão de progresso e desenvolvimento industrial de origem europeia (como as indígenas, por exemplo).

Se, ao se analisar a ES sob as ópticas sociopolítica, econômica e ambiental, assume-se, por um lado, recortes similares aos que a RSE apregoa para as organizações capitalistas tradicionais (OCT), por outro, clarifica-se o conteúdo distinto de cada proposta nessas mesmas vertentes. E, nesse ponto, torna-se indicado aceitar, então, um referencial de mútua comparação. A agregação, por fim, de uma quarta dimensão (a transversal) que reitera os valores e racionalidades fundadores da cultura e prática solidárias aprofunda a demarcação e contraposição com o modelo hegemônico, alicerçado na competição sistemática, na perseguição da acumulação e na apropriação enviesada do excedente.20 20 Qual seria o conteúdo de uma eventual dimensão transversal para as OCT? Tal esfera reafirma, numa visão ampliada, o projeto de sociedade incrustado nas formas solidárias de produção, o qual não comporta o abandono das conexões indissolúveis, imanentes e naturais (embora tenham de ser historicamente reconstruídas) que, numa acepção oikonômica aristotélica, vicejam entre o econômico e o social, rejeitando a autonomização lançada na modernidade. Reconhecer e sublinhar valores que trespassam essas camadas (e alcançam, também, o ambiental), fundindo sinergicamente os elementos delineadores da outra economia, configura-se como a explicitação do ethos solidário, cujos efeitos pretendidos devem se dar em sentido oposto à institucionalização do discurso da sustentabilidade fincada nas práticas correntes de mercado. (BARBIERI et al., 2010BARBIERI, J. C.et al. Inovação e sustentabilidade: novos modelos e proposições. Revista de Administração de Empresas (RAE), São Paulo, v. 50, n. 2, p. 146-54, abr./jun. 2010.)

Avançando um pouco mais, entretanto, percebe-se, por meio do quadro analítico geral que emerge dessa investigação, que o próprio horizonte do DS carece de revisão. Assim, vislumbra-se que, para além dos limites do desenvolvimento sustentável do establishment (que não se mostra capaz de ir mais profundamente e questionar o modo de apropriação da riqueza gerada, o modelo de consumo esgotador dos recursos naturais, a contribuição do trabalho para a reconstituição de um ser humano integral, dentre outras externalidades), encontra-se a proposição de uma socioeconomia renovada, cujos alicerces estão ancorados na mobilização para a mudança a partir da própria sociedade (e não mais, exclusivamente, do Estado) que, interrompendo e invertendo o fluxo ideológico (agora, de baixo para cima), incorpora novos paradigmas às relações advindas da produção.

Considerações finais

O presente trabalho permitiu levantar os possíveis requisitos aplicáveis aos EES com o objetivo de aferir o seu nível de sustentabilidade e solidariedade. Verificou-se que 16 grupos de análise (Quadro 5) podem ser adequados para encampar os elementos e traços característicos desses construtos conforme preconizados pelos pesquisadores da ES incluídos na revisão bibliográfica efetuada. Como visto, tais grupos se distribuem pelas dimensões sociopolítica, econômica e ambiental. Uma vez que se constatou a existência de fatores relevantes que perpassam as três dimensões, estes foram reunidos sob a denominação transversal, constituindo uma quarta vertente de observação.

Os quadros analíticos21 21 É importante salientar que os resultados mostrados nesses quadros referem-se à leitura interpretativa dos autores do artigo em relação ao conteúdo das obras analisadas. Isso ocorre porque a fundamentação de um dado componente pode se dar de modo difuso em um determinado trabalho e pode estar entrelaçada com abordagens contidas em outra obra do rol estudado. elaborados para cada dimensão originam-se no reconhecimento das variáveis indicadas, precipuamente, pela literatura administrativa brasileira no campo da ES. Os aspectos descritivos e prescritivos contidos nesse material foram, então, reunidos sob dois níveis categóricos (componentes22 22 Procurou-se preservar e absorver para tais componentes, tanto quanto possível, a mesma nomenclatura aplicada na(s) obra(s) de origem. Nesse sentido, contribuições significativas foram fornecidas por Oliveira (2002) e Reis (2005), pois são trabalhos voltados para estabelecimento de modelos de análise de sustentabilidade (quantitativo e qualitativo, respectivamente). e grupos de análise), possibilitando a formação de estruturas que aglutinam temas-chave correlatos debatidos pela academia. Esse formato, alinhado com o caráter multifacetado da ES apresentado pelos textos absorvidos, condensa diferentes argumentações e perspectivas do fenômeno, comportando a abordagem de suas variadas manifestações concretas.

De modo geral, as limitações percebidas na investigação referem-se ao recorte temporal (2005-2010) selecionado para o levantamento bibliométrico inicial e ao estreitamento do rol de meios de divulgação científica (publicações e eventos) escolhido como ponto de partida (como registrado na seção Metodologia). Ao serem identificadas as obras mais referenciadas pelos pesquisadores da ES, ocorreu, também, uma secção do conjunto apurado, restringindo o exame bibliográfico posteriormente feito àquelas com maior incidência de citações.

Quadro 5
Elementos para análise da ES - Painel globalFonte - elaborado pelos autores

O quadro analítico geral da ES resultante da atividade realizada pode se mostrar útil a futuras explorações qualitativas, quantitativas ou compostas23 23 Uma iniciativa nesse sentido pode ser consultada em Ribeiro (2011). , servindo, por exemplo, como insumo para a proposição de métodos de avaliação das organizações da ES, tendo como substrato a perspectiva, já mencionada, de desenvolvimento inclusivo vinculada a esse contexto socioprodutivo. Esse panorama pode, também, ser objeto de novas elaborações teóricas, fomentando o debate acerca do modelo de crescimento e de sociedade possíveis a partir da proposta solidária.

Como salientaram Wautiez, Soares e Lisboa (2003, p. 183)WAUTIEZ, F.; SOARES, C. L. B.; LISBOA, A. de M. Indicadores da economia solidária. In: CATTANI, A. D. (Org.). A outra economia. Porto Alegre: Veraz, 2003. p. 177-83., "[...] acompanhar o desempenho da economia solidária significa assumir como padrão de medida os valores dessa outra economia". Nessa linha está o esforço empreendido no enquadramento teórico aqui esboçado. Sintetizando contribuições com vistas a expor a ES sob um olhar ampliado, tal desenho coloca-se no plano aberto da necessária discussão, de caráter democrático (como sublinhado pelos mesmos autores), acerca da construção dos indicadores apropriados para a outra economia. Retratando a ES sob os contornos holísticos que lhe cabem (SANTOS, 2005SANTOS, B. de S.; RODRÍGUEZ, C. Introdução: para ampliar o cânone da produção. In: SANTOS, B. de S. (Org.). Produzir para viver: os caminhos da produção não capitalista. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005. p. 23-77.) e atribuindo-lhe quatro dimensões de análise, buscou-se ressaltar a alternativa que ela pode vir a representar para a afirmação de um novo modelo de desenvolvimento: solidário, equilibrado, duradouro, autenticamente sustentável, no qual a economia estará subordinada à sociedade (WAUTIEZ; SOARES; LISBOA, 2003WAUTIEZ, F.; SOARES, C. L. B.; LISBOA, A. de M. Indicadores da economia solidária. In: CATTANI, A. D. (Org.). A outra economia. Porto Alegre: Veraz, 2003. p. 177-83.) e sustentabilidade e solidariedade já não serão mais conceitos distinguíveis entre si.

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  • 1
    O material nacional consultado foi acrescido de duas obras com origem estrangeira (POLANYI, 2000; SANTOS, 2005), conforme apresentado na seção Metodologia.
  • 2
    Os resultados da primeira etapa desse trabalho podem ser consultados em Ribeiro e De Müylder (2012).
  • 3
    A autogestão é um componente central para essa dimensão (a sociopolítica), mas não se reduz somente a ela (ALBUQUERQUE, 2003), como será visto logo a seguir.
  • 4
    O componente econômico da autogestão se expressa pelas relações sociais de produção firmadas sobre práticas que destacam o fator trabalho em relação ao capital. A esfera técnica está associada à viabilização de novas formas de organização e divisão do trabalho. (ALBUQUERQUE, 2003)
  • 5
    Entendido como o espaço de oferta de produtos e/ou serviços a um público-alvo sob o regime de competição entre agentes com livre iniciativa e que devem observar as delimitações regulatórias emanadas pelo Estado. (REIS, 2005)
  • 6
    O pensamento de Vieitez e Nakano (2004) também se alinha com o de Oliveira (2004) e Lisboa (2005). Para os autores, "[...] a vigência de políticas equitativas de distribuição dos rendimentos" (VIEITEZ; NAKANO, 2004, p. 142) é um parâmetro a ser adotado como critério de identificação dos empreendimentos da economia solidária.
  • 7
    É sempre interessante enfatizar que os três setores (Estado, mercado e sociedade) aparecem aqui como agentes atuantes em cada uma dessas dimensões.
  • 8
    Com relação a esse ponto, é importante citar a contribuição de Bonilla (1993), ao explicitar a forma instrumental e utilitária com que as empresas do Ocidente assimilaram a proposta da Qualidade Total originada no Japão.
  • 9
    A filosofia de fim de tubo refere-se às ações das esferas governamental e empresarial direcionadas para a instalação de estações de tratamento de esgotos, filtros nas torres de emissão de poluentes gasosos e aterros sanitários para resíduos sólidos em resposta (ou reação) às reivindicações dos movimentos ambientalistas - exigentes de mudanças mais aprofundadas - iniciados na década de 1970. (MILANEZ, 2003)
  • 10
    A questão das racionalidades nos sistemas sociais foi introduzida por Max Weber, sendo discutida, posteriormente, por outros estudiosos com destaque, na Europa, para Karl Mannhein e, no Brasil, para Guerreiro Ramos.
  • 11
    A respeito do trabalho desse estudioso, Paes de Paula (2007, p. 176) tece o seguinte comentário "[...] as definições sociológicas de Guerreiro Ramos atribuíram maior rigor ao campo [da administração], mas é com a elaboração do conceito de ação administrativa que o autor realiza sua maior contribuição: a discussão das racionalidades a partir do resgate e do aprofundamento da definição weberiana de racionalidade substantiva. Analisando a tipologia weberiana de ação social a partir da visão de Mannheim, Guerreiro Ramos [...] recupera a distinção realizada por Weber entre racionalidade funcional e racionalidade substantiva".
  • 12
    Oliveira (2004) faz uma demarcação em que EES corresponde a um tipo idealizado de organização que encerra na integralidade os princípios da autogestão e do solidarismo, já EEA corresponde à organização manifestada na realidade concreta em que pode ser observada a existência de práticas solidárias.
  • 13
    Para o autor, esses mecanismos referem-se a pressões objetivas e subjetivas que compelem o indivíduo e o coletivo para a reprodução das condutas esperadas (no caso, os princípios e valores solidários).
  • 14
    Gaiger (2004b) identifica quatro causas essenciais: (a) um custo de oportunidade que afeta os trabalhadores envolvidos em aspectos materiais e identitários; (b) a condição de necessidade desses trabalhadores; (c) o grau de adesão aos princípios do solidarismo e, (d) a competência do empreendimento para captar recursos e legitimar-se socialmente.
  • 15
    Reis (2005) atribui esse enquadramento a Joaquim Melo - Diretor do Banco Palmas (instituição vinculada à ASMOCONP - Associação dos moradores do Conjunto Palmeiras - Fortaleza/CE, Set./2004).
  • 16
    Um quadro descritivo detalhado dessa classificação pode ser visto em Ribeiro (2011, p. 74).
  • 17
    Uma análise condensada do mecanismo elaborado por Serva pode ser consultada em Ribeiro (2011, p. 74-80).
  • 18
    Enquanto mecanismo ampliado de produção e consumo, a ES traz embutida nela uma doutrina que se alinha com o discurso em torno do développement durable, reafirmando e condicionando a existência dos empreendimentos econômicos a objetivos de avanço social. Para Barbieri e outros (2010), a expressão em uso no ambiente francofônico é mais consistente para representar esse movimento, uma vez que "[...] 'duradouro' é um termo mais adequado do que 'sustentável' para qualificar um projeto de transformação global, pois, como sustentável não especifica uma dimensão temporal, pode referir-se a qualquer prazo futuro, inclusive os prazos políticos subordinados aos calendários eleitorais e os [reduzidos] horizontes de planejamento empresarial." (BARBIERI et al., 2010, p. 149)
  • 19
    França Filho e Laville (2004) analisam em sua obra, de modo comparativo, os casos europeu e latino-americano. No primeiro, destacam como formas de manifestação da ES, as cooperativas sociais, as sociedades cooperativas de interesse público, as empresas sociais e os sistemas de troca locais. No segundo, identificam as cooperativas de produção e de prestação de serviços, os bancos populares e os clubes de troca.
  • 20
    Qual seria o conteúdo de uma eventual dimensão transversal para as OCT?
  • 21
    É importante salientar que os resultados mostrados nesses quadros referem-se à leitura interpretativa dos autores do artigo em relação ao conteúdo das obras analisadas. Isso ocorre porque a fundamentação de um dado componente pode se dar de modo difuso em um determinado trabalho e pode estar entrelaçada com abordagens contidas em outra obra do rol estudado.
  • 22
    Procurou-se preservar e absorver para tais componentes, tanto quanto possível, a mesma nomenclatura aplicada na(s) obra(s) de origem. Nesse sentido, contribuições significativas foram fornecidas por Oliveira (2002) e Reis (2005), pois são trabalhos voltados para estabelecimento de modelos de análise de sustentabilidade (quantitativo e qualitativo, respectivamente).
  • 23
    Uma iniciativa nesse sentido pode ser consultada em Ribeiro (2011).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2014

Histórico

  • Recebido
    09 Dez 2011
  • Aceito
    30 Maio 2014
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