Acessibilidade / Reportar erro

Contribuições do organizar (organizing) para os Estudos Organizacionais

Contributions of organizing for Organizational Studies

Resumo

Ancorado em um estilo de pensamento pós-moderno, este artigo fomenta uma discussão acerca dos processos de organizar (organizing), como uma abordagem que lança um novo olhar sobre as organizações e seus fenômenos, os quais passam a ser compreendidos como realizações, como resultados de processos heterogêneos contínuos e precários que, por estarem em constante produção, geram uma aparente estabilidade. Apresentamos a noção do organizar, suas origens, algumas perspectivas sobre o tema e quais seriam suas possíveis contribuições e implicações para o campo dos Estudos Organizacionais (EO), em termos de prática de pesquisa e ensino. Concluímos que a perspectiva do organizar pode contribuir para a desnaturalização da noção de organização enquanto estrutura rígida, homogênea e não problemática, alinhando-se também à discussão acerca da predominância das metanarrativas organizacionais. Assim, o organizar se apresenta como uma alternativa para o estudo das organizações e suas complexidades, gerando reflexões e esforços em termos de ensino e pesquisa.

Palavras-chave:
Organizar; Organizing; Ontologia; Pós-modernismo; Pós-estruturalismo

Abstract

Based on a postmodern style of thought, this article encourages a discussion about the processes of organizing as an approach that takes a fresh look at the organizations and its phenomena, which are to be understood as achievements, as results of heterogeneous, continuous and precarious processes which, for being in constant production, generate an apparent stability. We seek to present the notion of organizing, its origins, some of its perspectives and what could be their potential contributions and implications for the field of organizational studies, in terms of research and teaching practice. We conclude that organizing can contribute to the denaturalization of the notion of organization as rigid, homogeneous and unproblematic structure. It is also aligned to the discussion about the prevalence of organizational metanarratives. Thus, organizing is presented as an alternative to the study of organizations and their complexities, generating ideas and efforts in terms of teaching and research.

Keywords:
Organizing; Ontology; Postmodernism; Post-structuralism

Introdução

O que é uma organização? Para muitos estudantes de Administração, grande parte dos pesquisadores, praticantes e tantas outras pessoas inseridas em organizações (alguém não está?) das mais variadas formas, a resposta parece ser tão óbvia e natural que tal questionamento chega inclusive a causar profundo estranhamento. Tradicionalmente, uma organização é entendida como um sistema social limitado, com estruturas e objetivos específicos e que atua de forma mais ou menos racional e coerente (COOPER; BURRELL, 1988COOPER, R.; BURRELL, G. Modernism, postmodernism and organizational analysis: an introduction. Organization Studies , v. 9, n. 1, p. 91-112, 1988.), como uma espécie de ferramenta ou estrutura voltada para que um grupo atinja seus objetivos (CZARNIAWSKA, 2013CZARNIAWSKA, B. Organizations as obstacles to organizing. In: ROBICHAUD, D.; COOREN, F. (Org.). Organization and organizing : materiality, agency and discourse. New York: Routledge, 2013. cap. 1. p. 3-22.).

Se parecemos ter como certa essa definição, é de se esperar que alunos e pesquisadores do campo da Administração passem a assumir essa noção como ponto de partida de sua compreensão acerca dos mais variados fenômenos organizacionais e passem a pensar, produzir e reproduzir conhecimento alicerçado nessa ideia ou concepção de organização. Compreendida dessa maneira, a noção de organização em si funciona como um metadiscurso ou metanarrativa (COOPER; BURRELL, 1988COOPER, R.; BURRELL, G. Modernism, postmodernism and organizational analysis: an introduction. Organization Studies , v. 9, n. 1, p. 91-112, 1988.; CALÁS; SMIRCICH, 1999CALÁS, M.; SMIRCICH, L. Past postmodernism? Reflections and tentative directions. Academy of Management Review, v. 24, n. 4, p. 649-671, 1999.) para legitimar a ideia de que ela é uma ferramenta social e uma extensão da agência humana (COOPER; BURRELL, 1988COOPER, R.; BURRELL, G. Modernism, postmodernism and organizational analysis: an introduction. Organization Studies , v. 9, n. 1, p. 91-112, 1988.). Tal perspectiva encontrou abrigo na predisposição acadêmica dominante de tratar como não problemáticas noções tais como “a organização”, “seus objetivos”, “ambiente” e “estratégias” (CHIA, 1996CHIA, R. The problem of reflexivity in organizational research: towards a postmodern science of organization. Organization, v. 3, n. 1, p. 31-59, 1996.).

Mas e se essa noção naturalizada e reificada do que viria a ser uma organização não fosse tão neutra, natural e não problemática quanto parece? E se sozinha ela não for suficiente ou capaz de nos aproximar da compreensão de fenômenos organizacionais complexos? Ou então, se tal abordagem nos distanciasse do entendimento do que seria uma organização, de como ela acontece ou de como são realizadas as ações e processos de organizar? Esses são alguns dos questionamentos que norteiam os estudos sobre o organizar (organizing), os quais representam uma abordagem processual em que as organizações e os fenômenos organizacionais são compreendidos como processos de organização e não como entidades fixas, homogêneas e estáveis (WEICK, 1979WEICK, K. E. The social psychology of organizing . Reading: Addison-Wesley, 1979.; CHIA, 1995CHIA, R. From modern to postmodern organizational analysis. Organization Studies , v. 16, n. 4, p. 579-604, 1995.; COOPER; LAW, 1995COOPER, R.; LAW, J. Organization: distal and proximal views. Research in the Sociology of Organizations, v. 13, p. 237-74, 1995.; TSOUKAS; CHIA, 2002TSOUKAS, H.; CHIA, R. On organizational becoming: rethinking organizational change. Organization Science, v. 13, n. 5, p. 567-582, 2002.; CZARNIAWSKA, 2004CZARNIAWSKA, B. On time, space, and action nets. Organization, v. 11, n. 6, p. 773-791, 2004.). O foco da análise a partir do organizar (vide:ALCADIPANI; TURETA, 2009ALCADIPANI, R.; TURETA, C. Teoria Ator-rede e análise organizacional: contribuições e possibilidades de pesquisa no Brasil. Organizações & Sociedade , v. 16, n. 51, p. 647-664, 2009.) representa esforços de pesquisa para entender as organizações “como elas acontecem” (SCHATZKI, 2006SCHATZKI, T. R. Organizations as they happen. Organization Studies , v. 27, n. 12, p. 1863-1873, 2006.), como verbos (organizar) e não substantivos (COOPER; LAW, 1995COOPER, R.; LAW, J. Organization: distal and proximal views. Research in the Sociology of Organizations, v. 13, p. 237-74, 1995.), sugerindo assim uma lente temporal e processual. Esse olhar oferece novas possibilidades para explorarmos e buscarmos compreender a produção da organização e não a organização da produção (COOPER; BURRELL, 1988COOPER, R.; BURRELL, G. Modernism, postmodernism and organizational analysis: an introduction. Organization Studies , v. 9, n. 1, p. 91-112, 1988.), pois, nela, a organização é compreendida como um resultado ou produto final e não como ponto de partida (CZARNIAWSKA, 2004CZARNIAWSKA, B. On time, space, and action nets. Organization, v. 11, n. 6, p. 773-791, 2004.), pois se assume que “as organizações nunca explicaram nada; são as organizações que precisam ser explicadas” (CZARNIAWSKA, 2006CZARNIAWSKA, B. Bruno Latour: reassembling the social – an introduction to Actor-Network Theory. Organization Studies , v. 27, n. 10, p. 1553-1557, 2006., p. 1557).

Embora essa abordagem processual não seja algo exatamente recente no campo dos Estudos Organizacionais (CZARNIAWSKA, 2013CZARNIAWSKA, B. Organizations as obstacles to organizing. In: ROBICHAUD, D.; COOREN, F. (Org.). Organization and organizing : materiality, agency and discourse. New York: Routledge, 2013. cap. 1. p. 3-22.; CORRADI; GHERARDI; VERZELLONI, 2010CORRADI, G.; GHERARDI, S.; VERZELLONI, L. Through the practice lens: where is the bandwagon of practice-based studies heading? Management Learning , p. 1-19, 2010.), os últimos 20 anos testemunharam certo retorno do conceito de prática à referida área (GHERARDI, 2009GHERARDI, S. Introduction: the critical power of the practice lens. Management Learning , v. 40, n. 2, p. 115-128, 2009.; CORRADI; GHERARDI; VERZELLONI, 2010CORRADI, G.; GHERARDI, S.; VERZELLONI, L. Through the practice lens: where is the bandwagon of practice-based studies heading? Management Learning , p. 1-19, 2010.). Assim, este artigo tem por objetivo abordar o conceito do organizar, buscando resgatar suas origens, apresentando uma ontologia do organizar, bem como algumas abordagens sobre o tema e como essas poderiam trazer um novo olhar à análise organizacional e quais seriam as implicações dessa perspectiva, em termos de pesquisa e ensino no campo dos Estudos Organizacionais.

Ontologia do organizar (organizing)

As pesquisas e teorias contemporâneas sobre as organizações foram desenvolvidas a partir de um compromisso com uma postura ontológica do ser (being ontology), a qual postula que a realidade existe a priori, independentemente da observação, e que as coisas, entidades e eventos, por exemplo, constituem o nosso mundo material e social e são entendidos como estáticos, discretos e identificáveis (CHIA, 1996CHIA, R. The problem of reflexivity in organizational research: towards a postmodern science of organization. Organization, v. 3, n. 1, p. 31-59, 1996.). Seu foco reside, assim, nas organizações, sua estrutura e seus atributos (CHIA, 1995CHIA, R. From modern to postmodern organizational analysis. Organization Studies , v. 16, n. 4, p. 579-604, 1995.). Tal visão privilegia a estabilidade, a rotina e a ordem (CHIA, 2003CHIA, R. Ontology: organization as “world-making”. In: WESTWOOD, R.; CLEGG, S. (Org.). Debating organization : point-counterpoint in organization studies. Oxford: Blackwell Publishing, 2003. cap. 3b. p. 98-112.) e insiste em tratar como não problemáticas as noções de “organização”, “seus objetivos”, “ambiente”, “estratégias” e outros aspectos, como se esses fossem objetos de análise teoricamente legítimos. Em outras palavras, os metateóricos organizacionais tentam impor uma existência objetiva às suas tipologias e esquemas, procedendo como se seus objetos de análise fossem acríticos ou livres de problemas ou conflitos (CHIA, 1996CHIA, R. The problem of reflexivity in organizational research: towards a postmodern science of organization. Organization, v. 3, n. 1, p. 31-59, 1996.).

Essa perspectiva de compreensão das organizações não está presente apenas na visão tradicional e dominante do campo como, por exemplo, nas Teorias dos Sistemas, Custos e Transação e Ecologia Populacional, mas também na maneira que áreas como Estratégia, Marketing e Operações assumem a existência das organizações.

Tais preocupações e suposições alinham-se à problemática moderna (CHIA, 1995CHIA, R. From modern to postmodern organizational analysis. Organization Studies , v. 16, n. 4, p. 579-604, 1995.) acerca das organizações. Conforme Cooper e Burrell (1988)COOPER, R.; BURRELL, G. Modernism, postmodernism and organizational analysis: an introduction. Organization Studies , v. 9, n. 1, p. 91-112, 1988., embora se apresente em diferentes versões, o modernismo tem como foco a crença em um mundo intrinsecamente lógico e repleto de sentido, constituído pela “razão” como fundamento universal. Essa crença teria dois desdobramentos para a construção do conhecimento: a suposição de que a linguagem espelha a razão e de que a realidade seria dada de antemão, ou seja, estaria “lá fora”, à espera de ser elucidada. Há, ainda, a suposição de que haveria um sujeito, um agente pensante e consciente dessa ordem externa que seria capaz de representá-la por meio da linguagem. Assim, o modernismo depende de uma “forte” ontologia que privilegia o pensamento em termos de “estados” discretos de fenômenos, “atributos” estáticos e “eventos” sequenciais (CHIA, 1995CHIA, R. From modern to postmodern organizational analysis. Organization Studies , v. 16, n. 4, p. 579-604, 1995.). E é exatamente nessa sua tendência em lidar com os resultados ou com estados organizados, e não com os processos sociais complexos que geram esses resultados ou efeitos, que reside a crítica básica aos “modernos” estudos sociológicos da organização (COOPER; LAW, 1995COOPER, R.; LAW, J. Organization: distal and proximal views. Research in the Sociology of Organizations, v. 13, p. 237-74, 1995.). Nessa sociologia idealizada, o “estático” é visto como normal, sendo implicitamente privilegiado nas análises sociais, enquanto a “mudança” é considerada acidental, transitória e até disfuncional. Assim, propriedades como unidade, identidade, permanência e estrutura são privilegiadas em detrimento da dissonância, disparidade, pluralidade, transição e mudança. Mais que isso, tais processos são concebidos como aspectos secundários em vez de serem tratados como base (COOPER; LAW, 1995COOPER, R.; LAW, J. Organization: distal and proximal views. Research in the Sociology of Organizations, v. 13, p. 237-74, 1995.).

No entanto, desde a década de 1970, as ciências sociais, incluindo os EO, têm sido influenciadas por perspectivas teóricas diversas que enfatizam a necessidade de maior reflexividade acerca da produção de conhecimento (CALÁS; SMIRCICH, 1999CALÁS, M.; SMIRCICH, L. Past postmodernism? Reflections and tentative directions. Academy of Management Review, v. 24, n. 4, p. 649-671, 1999.). Nesse sentido, Chia (1996)CHIA, R. Introduction. In: CHIA, R. (Org.). The Realm of Organizations – essays for Robert Cooper. Londres: Routledge, 1998. p. 1-11. explica que abordagens alternativas às metateorias da análise organizacional têm se voltado para a natureza perspectiva das realidades organizacionais, desafiando a hegemonia do mainstream da teoria organizacional, destacando a natureza paradigmática da pesquisa organizacional (vide:BURRELL; MORGAN, 1979BURRELL, G.; MORGAN, G. Sociological paradigms and organisational analysis . Vermont: Ashgate Publishing, 1979.; MORGAN; SMIRCICH, 1980MORGAN, G.; SMIRCICH, L. The case for qualitative research. Academy of Management Review, v. 5, p. 491-500, 1980.; CUNLIFFE, 2010aCUNLIFFE, A. L. Crafting qualitative research: Morgan and Smircich 30 years on. Organizational Research Methods , p. 1-27, 2010a.). Tais pesquisas têm sido relevantes no sentido de levantarem questões importantes sobre o status epistemológico do nosso conhecimento acerca das organizações e do caráter de “verdade” associado a ele (CHIA, 1996CHIA, R. The problem of reflexivity in organizational research: towards a postmodern science of organization. Organization, v. 3, n. 1, p. 31-59, 1996.).

Fundamental nesse sentido tem sido a inserção das ideias pós-modernas (COOPER; BURRELL, 1988COOPER, R.; BURRELL, G. Modernism, postmodernism and organizational analysis: an introduction. Organization Studies , v. 9, n. 1, p. 91-112, 1988.) e pós-estruturalistas (CALÁS; SMIRCICH, 1999CALÁS, M.; SMIRCICH, L. Past postmodernism? Reflections and tentative directions. Academy of Management Review, v. 24, n. 4, p. 649-671, 1999.) no campo, desafiando as noções rígidas das metanarravitas organizacionais e sugerindo o abandono da concepção de organização enquanto uma entidade fixa, sólida, com fronteiras bem delimitadas e com racionalidade e objetivos claros. Assim, tais abordagens oferecem novas possibilidades para explorar a análise organizacional a partir de uma perspectiva processual e reflexiva, voltando as atenções para “a produção da organização e não para a organização da produção” (COOPER; BURRELL, 1988COOPER, R.; BURRELL, G. Modernism, postmodernism and organizational analysis: an introduction. Organization Studies , v. 9, n. 1, p. 91-112, 1988., p. 106). Cooper (1976)COOPER, R. The open field. Human Relations , v. 29, n. 11, p. 999-1017, 1976. foi um dos precursores nesse sentido, ao propor uma epistemologia do processo como uma base necessária para o desenvolvimento de ações humanas, destacando a necessidade de se pensar a ação humana e o exercício do pensamento em termos difusos e processuais, e não os tratando como fenômenos definidos por uma realidade previamente construída e entendida como racional e objetiva. Essa contribuição de Cooper (vide:CAVALCANTI, 2012CAVALCANTI, M. F. R. O grau zero da organização : diálogos entre Deleuze e Robert Cooper. 2012. 146 p. Dissertação (Mestrado em Administração de Empresas). EAESP, São Paulo, 2012.) teria sido um marco na abertura do campo dos EO para as abordagens pós-estruturalistas (CHIA, 1998CHIA, R. Introduction. In: CHIA, R. (Org.). The Realm of Organizations – essays for Robert Cooper. Londres: Routledge, 1998. p. 1-11.).

A postura pós-estruturalista assume uma visão na qual as organizações possuem fronteiras pouco definidas, com partes ou funções mais ou menos discretas, e que a questão ou problema organizacional é gerir uma série de dependências funcionais com o intuito de atingir objetivos aparentemente bem definidos, fazendo isso por meio de planos ou programas mais ou menos bem estabelecidos (COOPER; LAW, 1995COOPER, R.; LAW, J. Organization: distal and proximal views. Research in the Sociology of Organizations, v. 13, p. 237-74, 1995.).

Esse pensamento pós-moderno ressalta, assim, a natureza efêmera e transitória do que é real, privilegiando uma ontologia de movimento (becoming ontology), redirecionando o foco de análise, o qual se volta não para os estados sociais ou entidades, mas sim para as interações e padrões relacionais envolvidos no fluxo e transformação de nossos mundos (CHIA, 1995CHIA, R. From modern to postmodern organizational analysis. Organization Studies , v. 16, n. 4, p. 579-604, 1995.). Buscando enfatizar tais diferenças entre as abordagens moderna e pós-moderna acerca da análise organizacional, Cooper e Law (1995)COOPER, R.; LAW, J. Organization: distal and proximal views. Research in the Sociology of Organizations, v. 13, p. 237-74, 1995. propuseram uma sociologia do “vir a ser”, “tornar-se” ou “devir” (sociology of becoming), na qual os estados estáticos tidos como certos são vistos como efeitos de processos sociais complexos, contrastando com a abordagem que prima pelo estático, que chamaram de sociologia do ser (sociology of being). Assim, Cooper e Law (1995)COOPER, R.; LAW, J. Organization: distal and proximal views. Research in the Sociology of Organizations, v. 13, p. 237-74, 1995. usaram essa oposição básica para distinguir entre os modos distal (um resultado de uma sociologia do ser ou dos estados estáticos) e proximal (um resultado de uma sociologia do tornar-se ou do processo). Tais noções correspondem ao que Chia (1995)CHIA, R. From modern to postmodern organizational analysis. Organization Studies , v. 16, n. 4, p. 579-604, 1995. denomina estilos de pensamento moderno e pós-moderno, ou being e becoming ontologies. Essa última se apresenta como “a base para reconceitualizarmos a organização como um processo emergente e não como um fenômeno estático” (CHIA, 2003CHIA, R. Ontology: organization as “world-making”. In: WESTWOOD, R.; CLEGG, S. (Org.). Debating organization : point-counterpoint in organization studies. Oxford: Blackwell Publishing, 2003. cap. 3b. p. 98-112., p. 100). Representa assim uma ontologia alternativa, na qual as organizações são entendidas como um agregado, um resultado não intencional de esforços locais, como “ilhas de regularidade atingida ou alcançada em meio a um oceano de caos” (CHIA, 2003CHIA, R. Ontology: organization as “world-making”. In: WESTWOOD, R.; CLEGG, S. (Org.). Debating organization : point-counterpoint in organization studies. Oxford: Blackwell Publishing, 2003. cap. 3b. p. 98-112., p. 112).

O compromisso com essa ontologia do “vir a ser” ou “tornar-se” implica consequências radicais para o estudo das organizações, pois, ao deslocar a ênfase das tradicionais análises de estruturas, culturas, gênero, ética, etc., a postura pós-moderna enfatiza a miríade de micropráticas heterogêneas de organizar, as quais geram efeitos estabilizados, tais como indivíduos, organizações e sociedade (CHIA, 1995CHIA, R. From modern to postmodern organizational analysis. Organization Studies , v. 16, n. 4, p. 579-604, 1995.; 1996CHIA, R. The problem of reflexivity in organizational research: towards a postmodern science of organization. Organization, v. 3, n. 1, p. 31-59, 1996.). Em vez de “serem” organizações, elas estão constantemente “se tornando” organizações (COOPER; LAW, 1995COOPER, R.; LAW, J. Organization: distal and proximal views. Research in the Sociology of Organizations, v. 13, p. 237-74, 1995.; TSOUKAS; CHIA, 2002TSOUKAS, H.; CHIA, R. On organizational becoming: rethinking organizational change. Organization Science, v. 13, n. 5, p. 567-582, 2002.), estão continuamente sendo construídas, estão “in the making” (TSOUKAS; CHIA, 2002TSOUKAS, H.; CHIA, R. On organizational becoming: rethinking organizational change. Organization Science, v. 13, n. 5, p. 567-582, 2002.). Caso voltemos nossas atenções ao que é tido como uma entidade estática, nos arriscamos a ofuscar o subterrâneo, as pequenas mudanças e rotinas que não chegam a atingir o status de organizações formais, mas que são relevantes para o organizar (TSOUKAS; CHIA, 2002TSOUKAS, H.; CHIA, R. On organizational becoming: rethinking organizational change. Organization Science, v. 13, n. 5, p. 567-582, 2002.). Falar de organizar, assim, é considerar que as organizações estão sempre em curso ativo de ações, como um contínuo resultado de processos precários e parciais; é entendê-las enquanto fenômenos heterogêneos emergentes, ressaltando que o nome “organização” existe somente como um resultado contínuo do organizar ou organizing, entendido como ordenamentos locais de práticas de organizar que coletivamente formam a realidade social (COOPER; LAW, 1995COOPER, R.; LAW, J. Organization: distal and proximal views. Research in the Sociology of Organizations, v. 13, p. 237-74, 1995.).

Dessa forma, conforme a ontologia do vir a ser (becoming ontology), a qual se alinha a uma abordagem pós-estruturalista, assumimos uma visão processual das organizações, de modo que essas não mais são entendidas como substantivos, no sentido de serem entidades fixas, homogêneas e estáveis, mas sim como verbos ou processos, ou seja, passam a ser compreendidas como processos ou práticas de organização (organizing), os quais se mostram heterogêneos, difusos e complexos, em constantes fluxo e transformações. É essa a postura ontológica que sustenta a noção do organizar, cujas origens serão exploradas a seguir.

Origens da noção de organizing

Embora a noção de organizing esteja hoje associada às perspectivas pós-moderna e pós-estruturalista, ela foi introduzida no campo por Karl E. Weick, em 1969, na primeira edição de The Social Psychology of Organizing(CZARNIAWSKA, 2008bCZARNIAWSKA, B. A theory of organizing . Cheltenham: Edward Elgar Press, 2008b.).

Para Weick (1979)WEICK, K. E. The social psychology of organizing . Reading: Addison-Wesley, 1979., o nome ou substantivo “organização” denota que tais entidades são rígidas e estáticas. Assim, ele argumentou que as organizações seriam melhor compreendidas enquanto verbos (organizing), ressaltando a sua natureza processual. Sob essa perspectiva, propôs que os estudiosos do campo deveriam se voltar mais para os processos do que para as estruturas e no organizar mais que nas organizações, defendendo, dessa forma, um retorno ao organizar como o estudo do que as pessoas fazem quando agem coletivamente a fim de se atingir algo. Precisamos ter claro, então, que a visão processual não é necessariamente pós-estruturalista.

Conforme Cooren, Brummans e Charrieras (2008)COOREN, F.; BRUMMANS, B.; CHARRIERAS, D. The coproduction of organizational presence: a study of médecins sans frontières in action. Human Relations , v. 61, n. 10, p. 1339-1370, 2008., essa proposta de Weick chamou a atenção para um duplo movimento dominante na época: a reificação e a naturalização das organizações. Reificação no sentido de como o processo pelo qual uma formação social é abstraída do contexto instável, complexo e heterogêneo da sua origem e tratada como uma entidade concreta, homogênea e relativamente estável. A naturalização, por sua vez, refere-se a uma ilusão de que as organizações são objetos naturais e não um fenômeno produzido em circunstâncias históricas, envolvendo relações de poder específicas.

Mas, se a noção de organizing conforme a proposta de Karl Weick representa uma retomada pelo interesse de uma abordagem processual das organizações, podemos nos questionar em que momento ou de que maneira as teorias das organizações abandonaram esse foco nas ações e processos e assumiram a organização como uma estrutura. Czarniawska (2010)CZARNIAWSKA, B. Going back to go forward: on studying organizing in action nets. In: HERNES, T.; MAITLIS, S. (Org.). Process, sensemaking, & organizing : perspectives on process organization studies. New York: Oxford University Press, 2010. p. 140-160. sugere, assim, a necessidade de darmos alguns passos para trás, resgatando uma certa “virada histórica” composta por eventos que moveram o foco da teoria organizacional dos processos para as estruturas, a fim de que possamos compreender se e como o organizing pode trazer algo de novo aos EO. Ainda conforme a autora, esse retorno ao significado genérico do termo “organização” como sinônimo de ordem construída pode revelar meandros dos processos de organizar que foram obscurecidos pelo conceito dominante.

Para explicar a transição de uma Teoria da Administração para uma Teoria da Organização, Czarniawska (2013)CZARNIAWSKA, B. Organizations as obstacles to organizing. In: ROBICHAUD, D.; COOREN, F. (Org.). Organization and organizing : materiality, agency and discourse. New York: Routledge, 2013. cap. 1. p. 3-22. recorre à obra de Dwight Waldo que, em 1961, argumentou que a transição da primeira para a segunda teria sido resultado de um paradigma emergente na metodologia das ciências sociais, o behaviorismo. Tal abordagem não se adequava à Teoria Administrativa, a qual entendia a administração como uma ciência aplicada, com foco na ação, ao passo que a Teoria da Organização não era uma teoria da ação, mas sim de uma unidade existente “lá fora”.

Nesse cenário, a compreensão e o uso do termo organização como um rótulo para se referir ao estado alcançado por ações de organização ou de organizar (STARBUCK, 2003STARBUCK, W. H. The origins of organization theory. In: TSOUKAS, H.; KNUDSEN, C. (Org.). The Oxford handbook of organization theory. Oxford: Oxford University Press, 2003. p. 143-182.), a qual teria persistido por quase 150 anos, a partir mais ou menos do ano 1800, parecia não ter utilidade para se unir à principal moda da pesquisa da década de 1950, a Teoria dos Sistemas (CZARNIAWSKA, 2008aCZARNIAWSKA, B. Organizing: how to study it and how to write about it. Qualitative Research in Organizations and Management : an international journal, v. 3, n. 1, p. 4-20, 2008a.; 2010CZARNIAWSKA, B. Going back to go forward: on studying organizing in action nets. In: HERNES, T.; MAITLIS, S. (Org.). Process, sensemaking, & organizing : perspectives on process organization studies. New York: Oxford University Press, 2010. p. 140-160.; 2013CZARNIAWSKA, B. Organizations as obstacles to organizing. In: ROBICHAUD, D.; COOREN, F. (Org.). Organization and organizing : materiality, agency and discourse. New York: Routledge, 2013. cap. 1. p. 3-22.). Segundo essa teoria, a organização passou a ser entendida como um organismo, um sistema aberto cuja sobrevivência dependeria do quanto ela seria capaz de atingir uma relação apropriada com o ambiente (MORGAN, 1996MORGAN, G. Images of organizations . Thousand Oaks: Sage Publications, 1996.). Dessa maneira, a aplicação da Teoria dos Sistemas ao estudo das organizações exigiu mudanças e redefinições no campo. Mais especificamente, exigiu a criação das “organizações”: unidades separadas que apresentavam “limites/fronteiras” de seus “ambientes”, com os quais elas se relacionavam por meio de adaptação (CZARNIAWSKA, 2010CZARNIAWSKA, B. Going back to go forward: on studying organizing in action nets. In: HERNES, T.; MAITLIS, S. (Org.). Process, sensemaking, & organizing : perspectives on process organization studies. New York: Oxford University Press, 2010. p. 140-160.; 2013CZARNIAWSKA, B. Organizations as obstacles to organizing. In: ROBICHAUD, D.; COOREN, F. (Org.). Organization and organizing : materiality, agency and discourse. New York: Routledge, 2013. cap. 1. p. 3-22.). Assim, o particípio “organizado” foi substituído pelo adjetivo “organizacional” (CZARNIAWSKA, 2008aCZARNIAWSKA, B. Organizing: how to study it and how to write about it. Qualitative Research in Organizations and Management : an international journal, v. 3, n. 1, p. 4-20, 2008a.). Essa mudança conceitual parece ter sido atraente na década de 1960, pois promovia um meio termo entre o taylorismo mecanicista e uma teoria da administração idealizada, além de ir ao encontro da cibernética, um modismo da ciência moderna (CZARNIAWSKA, 2008aCZARNIAWSKA, B. Organizing: how to study it and how to write about it. Qualitative Research in Organizations and Management : an international journal, v. 3, n. 1, p. 4-20, 2008a.; 2013CZARNIAWSKA, B. Organizations as obstacles to organizing. In: ROBICHAUD, D.; COOREN, F. (Org.). Organization and organizing : materiality, agency and discourse. New York: Routledge, 2013. cap. 1. p. 3-22.).

Assim, ao moldarem as organizações enquanto sistemas, os teóricos organizacionais contribuíram para a reificação do seu conceito. Tal como pontua Czarniawska (2013)CZARNIAWSKA, B. Organizations as obstacles to organizing. In: ROBICHAUD, D.; COOREN, F. (Org.). Organization and organizing : materiality, agency and discourse. New York: Routledge, 2013. cap. 1. p. 3-22., não queremos afirmar que a aplicação da Teoria dos Sistemas por 50 anos tenha sido um erro na área de EO, visto que ela representou e ainda se mantém como a principal inspiração para a teoria organizacional. No entanto, é necessário reconhecer que a noção de organização e seus fenômenos não são tão neutros e não problemáticos, e que esse conjunto de metáforas e suas noções de ambiente e adaptação não são mais capazes de, sozinhos, nos levarem à compreensão dos mais variados fenômenos organizacionais.

Neste início de século XXI, por exemplo, o ambiente não mais representa um conjunto preexistente de problemas para os quais uma organização deve encontrar soluções; as próprias organizações criam problemas (CZARNIAWSKA, 2010CZARNIAWSKA, B. Going back to go forward: on studying organizing in action nets. In: HERNES, T.; MAITLIS, S. (Org.). Process, sensemaking, & organizing : perspectives on process organization studies. New York: Oxford University Press, 2010. p. 140-160.) e seu ambiente consiste quase que inteiramente de outras organizações (PERROW, 1991PERROW, C. A society of organizations. Theory and Society , v. 20, p. 725-762, 1991.). A própria noção de adaptação também merece ser revista, pois, embora possa ser alegado que as organizações possuem fronteiras delimitadas separando-as de seus ambientes, fica cada vez mais difícil estabelecer essa ideia de limites diante de fenômenos como fusões, aquisições e colaboração entre organizações (CZARNIAWSKA, 2013CZARNIAWSKA, B. Organizations as obstacles to organizing. In: ROBICHAUD, D.; COOREN, F. (Org.). Organization and organizing : materiality, agency and discourse. New York: Routledge, 2013. cap. 1. p. 3-22.), além do fato de que as tentativas de estabelecer esses limites podem provocar conflitos que, geralmente, são ocultados pelas teorias organizacionais.

Além disso, outros aspectos mostram como a noção de organização pode contribuir para obscurecer questões críticas acerca do organizar. Isso porque os Estudos Organizacionais convencionais tendem a: ignorar o fato de que as ações de organizar não estão restritas às organizações formais, pois também são praticados por grupos informais; a não enfatizar a interação e a colaboração entre organizações; e, por fim, a ofuscar o fato de que as organizações e seus objetivos podem ultrapassar as intenções para as quais foram criadas, de modo que suas ações podem ter consequências inesperadas (CZARNIAWSKA, 2010CZARNIAWSKA, B. Going back to go forward: on studying organizing in action nets. In: HERNES, T.; MAITLIS, S. (Org.). Process, sensemaking, & organizing : perspectives on process organization studies. New York: Oxford University Press, 2010. p. 140-160.).

Como vimos na seção anterior, mesmo com tais contradições, as pesquisas e teorias organizacionais contemporâneas foram e continuam sendo desenvolvidas a partir do compromisso com uma ontologia do ser, na qual as organizações são tratadas como entidades fixas, homogêneas e estáveis, sendo essa a predisposição acadêmica dominante do campo (CHIA, 1996CHIA, R. The problem of reflexivity in organizational research: towards a postmodern science of organization. Organization, v. 3, n. 1, p. 31-59, 1996.), a qual corresponde às abordagens mainstream nos EO. No entanto, o retorno ao organizing mostra-se como uma abordagem alternativa às metateorias organizacionais, no sentido de lançar um novo olhar sobre as organizações a partir da sua perspectiva processual, heterogênea e precária, com o intuito de chamar a atenção para o fato de que as diferentes realidades organizacionais devem ser compreendidas como resultados do organizar e não como conceitos tidos como certos, naturalizados ou não passíveis de questionamentos.

Alguns olhares sobre o organizar

Nesta seção, apresentaremos algumas abordagens alinhadas à ontologia do tornar-se e à noção de processos de organizar, buscando destacar suas principais propostas e como essas podem contribuir para uma compreensão processual acerca das organizações e, consequentemente, como inspirações para pesquisas que visem adotar essa nova perspectiva. Daremos destaque aqui a três abordagens: a malha de práticas e arranjos materiais, a Teoria Ator-Rede e as redes de ação.

Práticas e arranjos materiais

Conforme Theodore Schatzki (2001)SCHATZKI, T. R. Introduction: practice theory. In: SCHATZKI, T. R.; KNORRCETINA, K.; SAVIGNY, E. V. (Org.). The practice turn in contemporary . London: Routledge, 2001. p. 10-23., fenômenos como conhecimento, significados, atividades humanas, ciência, poder, linguagem, instituições sociais e transformações históricas são manifestações ou componentes do campo das práticas; portanto, só podem ser compreendidos e analisados a partir dele. Antes de avançarmos no sentido de entender o que são práticas e como as organizações podem ser compreendidas a partir de tal perspectiva, é necessário apresentar a concepção ontológica do autor acerca dos fenômenos sociais, com a noção de site ontology, segundo a qual a vida social (convivência e coexistência humana) está intrinsecamente ligada a um tipo de contexto (site) do qual é inerentemente uma parte (SCHATZKI, 2003SCHATZKI, T. R. A new societist social ontology. Philosophy of the Social Sciences , v. 33, n. 2, p. 174-202, 2003.; 2005SCHATZKI, T. R. The sites of organizations. Organization Studies , v. 26, n. 3, p. 465-484, 2005.). Assim, o exame ou consideração de certo tipo de contexto é fundamental para analisarmos e explicarmos os fenômenos sociais (SCHATZKI, 2003SCHATZKI, T. R. A new societist social ontology. Philosophy of the Social Sciences , v. 33, n. 2, p. 174-202, 2003.; 2005SCHATZKI, T. R. The sites of organizations. Organization Studies , v. 26, n. 3, p. 465-484, 2005.).

Schatzki (2005)SCHATZKI, T. R. The sites of organizations. Organization Studies , v. 26, n. 3, p. 465-484, 2005. nos lembra que outras abordagens, como as ontologias individualistas e societistas, também enfatizam o papel do contexto, mas com ênfases distintas. Para as primeiras, a realidade e os fenômenos sociais são formados pelas ações, estados mentais e relações e interações entre as pessoas. Para a última, as ações dos indivíduos podem ser determinadas e até mesmo consideradas inseparáveis do fenômeno social, mas não contribuem para sua composição. As site ontologies se apresentam como um caminho alternativo entre essas duas perspectivas. Tal como os societistas, elas consideram que as características relevantes dos indivíduos estão imersas em um contexto macro, sem o qual as pessoas com tais características não existiriam; assim como os individualistas, elas negam a ideia de que esses contextos nos quais as características individuais existem têm um caráter fundamentalmente diferente delas (SCHATZKI, 2005SCHATZKI, T. R. The sites of organizations. Organization Studies , v. 26, n. 3, p. 465-484, 2005.). Portanto, as site ontologiesconsideram que os fenômenos sociais não estão inseridos em um contexto, fazendo parte dele; tais fenômenos são o próprio contexto (SCHATZKI, 2002SCHATZKI, T. R. The site of the social : a philosophical account of the constitution of social life and change. Pennsylvania: Pennsylvania State University Press, 2002.; 2005SCHATZKI, T. R. The sites of organizations. Organization Studies , v. 26, n. 3, p. 465-484, 2005.).

A partir dessa ontologia, Schatzki (2003SCHATZKI, T. R. A new societist social ontology. Philosophy of the Social Sciences , v. 33, n. 2, p. 174-202, 2003.; 2005)SCHATZKI, T. R. The sites of organizations. Organization Studies , v. 26, n. 3, p. 465-484, 2005. argumenta que o lócus do social (o site ou contexto no qual a existência humana se desenrola) é composto por uma malha de práticas e arranjos. Isso significa que a vida social transparece como parte inerente dessa malha (SCHATZKI, 2005SCHATZKI, T. R. The sites of organizations. Organization Studies , v. 26, n. 3, p. 465-484, 2005.). No âmbito das teorias sociais, a abordagem proposta por Schatzki (2001)SCHATZKI, T. R. Introduction: practice theory. In: SCHATZKI, T. R.; KNORRCETINA, K.; SAVIGNY, E. V. (Org.). The practice turn in contemporary . London: Routledge, 2001. p. 10-23., por estar centrada nas práticas, promove uma ontologia social distinta: o social é compreendido como um campo de práticas incorporadas, materialmente entrelaçadas e organizadas em torno de entendimentos práticos compartilhados. Essa concepção contrasta com as demais teorias sociais por não privilegiar indivíduos, (inter)ações, linguagem, sistemas de significado, instituições/funções ou estruturas, como se fossem fenômenos sociais básicos. Tais fenômenos só podem ser analisados por meio do campo das práticas (SCHATZKI, 2001SCHATZKI, T. R. Introduction: practice theory. In: SCHATZKI, T. R.; KNORRCETINA, K.; SAVIGNY, E. V. (Org.). The practice turn in contemporary . London: Routledge, 2001. p. 10-23.), sendo o social considerado uma rede entre práticas e arranjos materiais (SCHATZKI, 2003SCHATZKI, T. R. A new societist social ontology. Philosophy of the Social Sciences , v. 33, n. 2, p. 174-202, 2003.; 2005SCHATZKI, T. R. The sites of organizations. Organization Studies , v. 26, n. 3, p. 465-484, 2005.).

Práticas são definidas por Schatzki (2003SCHATZKI, T. R. A new societist social ontology. Philosophy of the Social Sciences , v. 33, n. 2, p. 174-202, 2003.; 2005)SCHATZKI, T. R. The sites of organizations. Organization Studies , v. 26, n. 3, p. 465-484, 2005. como atividades humanas organizadas, tais como práticas políticas, religiosas, econômicas, educacionais, de jogar baseball, de cozinhar e de gestão, por exemplo. Cada uma dessas práticas forma um conjunto de ações ligadas entre si por compreensões acerca de como fazer as coisas, uma coleção de regras (formulações explícitas) e uma estrutura teleoafetiva (uma série de fins, projetos, usos e emoções que são aceitas e ordenadas) (SCHATZKI, 2003SCHATZKI, T. R. A new societist social ontology. Philosophy of the Social Sciences , v. 33, n. 2, p. 174-202, 2003.). Já a segunda dimensão do social é formada pelos arranjos materiais (SCHATZKI, 2003; 2005; 2006), os quais são conjuntos de objetos materiais – pessoas, artefatos, organismos e coisas (SCHATZKI, 2005SCHATZKI, T. R. The sites of organizations. Organization Studies , v. 26, n. 3, p. 465-484, 2005.; 2006)SCHATZKI, T. R. Organizations as they happen. Organization Studies , v. 27, n. 12, p. 1863-1873, 2006. que formam configurações nas quais possuem significado e identidade (SCHATZKI, 2003SCHATZKI, T. R. A new societist social ontology. Philosophy of the Social Sciences , v. 33, n. 2, p. 174-202, 2003.). “Sempre que alguém age e com isso exerce uma prática, ele(a) o faz em um ambiente que é composto por entidades materiais” (SCHATZKI, 2005SCHATZKI, T. R. The sites of organizations. Organization Studies , v. 26, n. 3, p. 465-484, 2005., p. 472). Assim, tanto como as atividades humanas mentais e corporais, indispensáveis são também os objetos, pois o desenrolar de uma prática envolve, quase sempre, a “agência” de um conjunto particular de objetos e/ou instrumentos (SCHATZKI, 2002SCHATZKI, T. R. The site of the social : a philosophical account of the constitution of social life and change. Pennsylvania: Pennsylvania State University Press, 2002.).

A partir dessa ontologia, uma organização, como fenômeno social, é um conjunto de práticas entrelaçadas por arranjos materiais (SCHATZKI, 2005SCHATZKI, T. R. The sites of organizations. Organization Studies , v. 26, n. 3, p. 465-484, 2005.; 2006)SCHATZKI, T. R. Organizations as they happen. Organization Studies , v. 27, n. 12, p. 1863-1873, 2006.. Compreendida dessa forma, a organização é um produto de ações realizadas em meio às práticas existentes; é uma malha ou rede que abrange as práticas (tanto as existentes, que continuam a ser realizadas como foram implementadas, como aquelas que foram modificadas ou alteradas) e uma mistura de novos e antigos arranjos materiais; continua existindo por meio de uma perpetuação de suas práticas e manutenção de seus arranjos materiais; e acomoda evolução e mudança na malha de práticas e arranjos que a compõem (SCHATZKI, 2005SCHATZKI, T. R. The sites of organizations. Organization Studies , v. 26, n. 3, p. 465-484, 2005.).

Schatzki (2006)SCHATZKI, T. R. Organizations as they happen. Organization Studies , v. 27, n. 12, p. 1863-1873, 2006. ainda ressalta a importância de compreendermos as “organizações como elas acontecem”. Além de considerar que o acontecimento ou a realização da organização envolve o desempenho ou o desenrolar das ações ou práticas que a constituem e os arranjos materiais que abrigam tais atividades, o autor expande a análise com a dimensão tempo, afirmando assim que a compreensão de uma organização enquanto ela acontece abrange: (a) o seu acontecimento em tempo real e os desdobramentos das realizações de suas ações; (b) a memória organizacional, a persistência da estrutura organizacional do passado no presente, juntamente com o conjunto de ações, pensamentos, experiências e habilidades que asseguram essa memória; (c) o envolvimento potencial de ordens materiais na realização das ações que são o futuro acontecimento da organização; e (d) a infraestrutura causal que suporta o acontecimento e a memória da organização (SCHATZKI, 2006SCHATZKI, T. R. Organizations as they happen. Organization Studies , v. 27, n. 12, p. 1863-1873, 2006.).

A partir dessa compreensão ou perspectiva acerca das organizações, Schatzki (2003SCHATZKI, T. R. A new societist social ontology. Philosophy of the Social Sciences , v. 33, n. 2, p. 174-202, 2003.; 2005)SCHATZKI, T. R. The sites of organizations. Organization Studies , v. 26, n. 3, p. 465-484, 2005. sugere que o estudo delas deveria envolver quatro tarefas fundamentais: identificar as ações ou eventos, episódios e interações que compõem o fenômeno a ser estudado – as práticas de organizar (organizing) gerais ou específicas; (b) identificar a malha formada por práticas e arranjos da qual essas atividades (eventos, episódios, interações) fazem parte; (c) determinar possíveis outras malhas com as quais essa malha específica (em estudo ou análise) possa estar conectada – outras malhas de prática e arranjos da mesma organização ou outras organizações; (d) traçar as cadeias de ação dos agentes humanos e não humanos que circulam nessa malha, que passam por meio dela e/ou que a conectam com outras e ajudam a reforçar as suas características atuais ou a alterar o fenômeno de interesse.

Portanto, a noção de que fenômenos sociais são constituídos por práticas e arranjos materiais parece uma proposta ontológica viável para o estudo do organizar, pois, a partir disso, podemos considerar os mais diversos fenômenos organizacionais, como a realização de ações e atividades e os materiais que as suportam, revelando assim uma perspectiva processual. Ao mesmo tempo, reforçamos o não privilégio de conceitos ou definições anteriores à análise, posto que são constituídos no campo das práticas. A seguir, trataremos da Teoria Ator-Rede.

Teoria Ator-Rede

A Teoria Ator-Rede (TAR) ou Sociologia da Translação, desenvolvida a partir da Sociologia da Ciência e Tecnologia (SST) (LAW, 1992LAW, J. Notes on the theory of the actor-network: ordering, strategy, and heterogeneity. Systems Practice , v. 5, n. 3, p. 379-373, 1992.; CALÁS; SMIRCICH, 1999CALÁS, M.; SMIRCICH, L. Past postmodernism? Reflections and tentative directions. Academy of Management Review, v. 24, n. 4, p. 649-671, 1999.), é uma abordagem que busca compreender como certos ordenamentos foram gerados e como esses se mantêm estáveis e outros não (LAW, 1992LAW, J. Notes on the theory of the actor-network: ordering, strategy, and heterogeneity. Systems Practice , v. 5, n. 3, p. 379-373, 1992.; 1994LAW, J. Organizing modernity. Oxford: Blackwell, 1994.). Sendo entendida como uma versão empírica do pós-estruturalismo e fundamentada em estudos empíricos (LAW, 2007LAW, J. Actor network theory and material semiotics. 2007. Disponível em: <http://www.heterogeneities.net/publications/Law2007ANTandMaterialSemiotics.pdf>. Acesso em: 18 abr. 2012.
http://www.heterogeneities.net/publicati...
), a TAR preconiza que as entidades são constituídas e adquirem seus atributos por meio de uma rede de relações que estabelecem umas com as outras, existindo somente por meio dessas relações (LAW, 1999LAW, J. After ANT: complexity, naming and topology. In: LAW, J.; HASSARD, J. (Org.). Actor network theory and after. Oxford: Blackwell, 1999. cap. 1. p. 1-14.). Nessa perspectiva, o social é constituído por um tipo de ordenamento momentâneo, caracterizado pela associação de elementos materialmente heterogêneos, humanos e não humanos (LATOUR, 2012LATOUR, B. Reagregando o social . São Paulo: Edusc, 2012.). Sendo apontada por alguns de seus estudiosos como uma aplicação radical da semiótica (LAW, 1999LAW, J. After ANT: complexity, naming and topology. In: LAW, J.; HASSARD, J. (Org.). Actor network theory and after. Oxford: Blackwell, 1999. cap. 1. p. 1-14.), a TAR descreve as relações materialmente e discursivamente heterogêneas que produzem e re(ordenam) todos os tipos de atores, incluindo objetos, seres humanos, máquinas, animais, natureza, ideias, textos, organizações, desigualdades e arranjos geográficos, entre outros (LAW, 1992LAW, J. Notes on the theory of the actor-network: ordering, strategy, and heterogeneity. Systems Practice , v. 5, n. 3, p. 379-373, 1992.; 2007LAW, J. Actor network theory and material semiotics. 2007. Disponível em: <http://www.heterogeneities.net/publications/Law2007ANTandMaterialSemiotics.pdf>. Acesso em: 18 abr. 2012.
http://www.heterogeneities.net/publicati...
).

O termo ator-rede é paradoxal por incluir, na mesma expressão, a representação do ator e da rede, reforçando que, ao contrário de serem duais (ator/rede), as entidades só existem em redes de relações, assumindo os atributos das entidades que as integram (LAW, 1999LAW, J. After ANT: complexity, naming and topology. In: LAW, J.; HASSARD, J. (Org.). Actor network theory and after. Oxford: Blackwell, 1999. cap. 1. p. 1-14.). Essa associação, na qual “muitos se tornam um”, quando várias entidades ou atuantes formam um “macroator”, adquirindo um caráter relativamente estável (CALLON; LATOUR, 1981CALLON, M.; LATOUR, B. Unscrewing the big Leviathan: how actors macro-structure reality and how sociologists help them do so. In: KNORR-CETINA, K.; CICOUREL, A. V. (Org.). Advances in social theory and methodology . London: Routledge and Kegan Paul, 1981. cap. 10. p. 277-303.), ocorre por meio da translação, processo no qual ocorre a combinação de variados interesses, até então distintos, em um único objetivo composto (LATOUR, 2001LATOUR, B. A esperança de pandora : ensaios sobre a realidade dos estudos científicos. São Paulo: Edusc, 2001.). Quaisquer alterações nessas relações gera, assim, transformações na configuração da própria rede (CALLON, 1987CALLON, M. Society in the making: the study of technology as a tool for social analysis. In: BIJKER, W.; HUGHES, T.; PINCH, T. (Org.). The social construction of technological systems : new directions in the sociology and history of technology. London: MIT Press, 1987.; LAW, 2002LAW, J. Objects and spaces. Theory, culture & society , v. 19, p. 91-105, 2002.). Consequentemente, tudo passa a ser instável e reversível, pelo menos em princípio (LAW, 1999LAW, J. After ANT: complexity, naming and topology. In: LAW, J.; HASSARD, J. (Org.). Actor network theory and after. Oxford: Blackwell, 1999. cap. 1. p. 1-14.), pois, se tudo é relacional, é a configuração da rede que produz a sua durabilidade; a estabilidade adquirida é resultado de uma associação momentânea (LATOUR, 2012LATOUR, B. Reagregando o social . São Paulo: Edusc, 2012.), precária (CALÁS; SMIRCICH, 1999CALÁS, M.; SMIRCICH, L. Past postmodernism? Reflections and tentative directions. Academy of Management Review, v. 24, n. 4, p. 649-671, 1999.), e não é inerente aos seus componentes, mas sim às relações existentes na rede (LAW, 2007LAW, J. Actor network theory and material semiotics. 2007. Disponível em: <http://www.heterogeneities.net/publications/Law2007ANTandMaterialSemiotics.pdf>. Acesso em: 18 abr. 2012.
http://www.heterogeneities.net/publicati...
). Dessa forma, as entidades não têm qualidades inerentes, ou seja, são suprimidas as distinções e divisões essencialistas ou dualismos entre agência e estrutura, humano e não humano, antes e depois, conhecimento e poder, materialidade e sociabilidade, atividade e passividade. Isso porque, nessa visão de mundo semiótica, não há divisões; essas passam a ser compreendidas como efeitos ou resultados, não são dadas a priori ou como algo tido como certo (LAW, 1999LAW, J. After ANT: complexity, naming and topology. In: LAW, J.; HASSARD, J. (Org.). Actor network theory and after. Oxford: Blackwell, 1999. cap. 1. p. 1-14.).

A TAR se opõe à forma como a realidade é tradicionalmente representada na sociologia, como algo independente, existente “lá fora” (LATOUR, 2001LATOUR, B. A esperança de pandora : ensaios sobre a realidade dos estudos científicos. São Paulo: Edusc, 2001.); em vez disso, considera que os fenômenos são “fabricados”, no sentido de serem constantemente construídos por meio de conjuntos de atividades materialmente heterogêneas e que suas representações são constituídas enquanto a realidade também o é (LATOUR, 2001LATOUR, B. A esperança de pandora : ensaios sobre a realidade dos estudos científicos. São Paulo: Edusc, 2001.; 2012LATOUR, B. Reagregando o social . São Paulo: Edusc, 2012.). Assim, conforme a TAR, nós devemos buscar traçar a construção dessas entidades, investigando os processos pelos quais humanos e não humanos associam-se uns aos outros e como os ordenamentos e fatos emergem a partir desses processos (LATOUR, 2012LATOUR, B. Reagregando o social . São Paulo: Edusc, 2012.).

Ao trazer essas suposições para o estudo dos processos de organizar, Latour (2011)LATOUR, B. What's the story? Organizing as a mode of existence. In: PASSOTH, J. H.; PEUKER, B.; SCHILLMEIER, M. (Org.). Agency without actors? New approaches to collective action. London: Routledge, 2011. p. 124-169. argumenta que as organizações estão em permanente construção, de modo que sua existência é continuamente articulada e ordenada, não havendo assim uma inércia organizacional: “you stop carrying it on: it drops dead” (LATOUR, 2011LATOUR, B. What's the story? Organizing as a mode of existence. In: PASSOTH, J. H.; PEUKER, B.; SCHILLMEIER, M. (Org.). Agency without actors? New approaches to collective action. London: Routledge, 2011. p. 124-169., p. 4). Organizações assim permanecem sempre imanentes ao instrumental que promove a sua existência, de modo que, caso paremos de realizá-la ou performá-la, ela atingirá um impasse. Organizar é sempre reorganizar (LATOUR, 2011LATOUR, B. What's the story? Organizing as a mode of existence. In: PASSOTH, J. H.; PEUKER, B.; SCHILLMEIER, M. (Org.). Agency without actors? New approaches to collective action. London: Routledge, 2011. p. 124-169.). Ainda conforme o autor, o organizar é também caracterizado por uma “pulsação rítmica”, entendida como uma constante mudança de uma sequência na qual nós inserimos instruções em um scriptorganizacional para a próxima sequência, em que nós seguimos as mesmas instruções, e para outra sequência na qual, muitas vezes, em estado de crise, passamos a verificar se atendemos ou não às condições. Assim, ao seguirmos um curso de ação designado na forma de um script (abaixo), ainda assim prestamos atenção para ver para onde tais ações estão nos guiando (acima), de forma que nunca estamos “servilmente seguindo uma ordem” (LATOUR, 2011LATOUR, B. What's the story? Organizing as a mode of existence. In: PASSOTH, J. H.; PEUKER, B.; SCHILLMEIER, M. (Org.). Agency without actors? New approaches to collective action. London: Routledge, 2011. p. 124-169., p. 8). Essa variação rítmica representa, conforme Latour (2011)LATOUR, B. What's the story? Organizing as a mode of existence. In: PASSOTH, J. H.; PEUKER, B.; SCHILLMEIER, M. (Org.). Agency without actors? New approaches to collective action. London: Routledge, 2011. p. 124-169., um esforço para superar a dicotomia indivíduo-sistema, pois, na prática, nós nunca estamos completamente abaixo ou acima de um script.

No campo dos EO, a TAR permite que compreendamos as organizações, seus fenômenos e componentes como efeitos gerados por múltiplas interações, ou seja, por relações entre entidades heterogêneas em permanente construção ou ordenamento (LAW, 1992LAW, J. Notes on the theory of the actor-network: ordering, strategy, and heterogeneity. Systems Practice , v. 5, n. 3, p. 379-373, 1992.; 1994LAW, J. Organizing modernity. Oxford: Blackwell, 1994.; 1999LAW, J. After ANT: complexity, naming and topology. In: LAW, J.; HASSARD, J. (Org.). Actor network theory and after. Oxford: Blackwell, 1999. cap. 1. p. 1-14.; CZARNIAWSKA, 2006CZARNIAWSKA, B. Bruno Latour: reassembling the social – an introduction to Actor-Network Theory. Organization Studies , v. 27, n. 10, p. 1553-1557, 2006.; LATOUR, 2012LATOUR, B. Reagregando o social . São Paulo: Edusc, 2012.). Assim, por colocar as práticas e os processos de organizar (organizing) como foco fundamental da pesquisa (BLOOMFIELD; VURDUBAKIS, 1999BLOOMFIELD, B. P.; VURDUBAKIS, T. The outer limits: monsters, actor networks and the writing of displacement. Organization , v. 4, n. 4, p. 625-647, 1999.; CZARNIAWSKA, 2004CZARNIAWSKA, B. On time, space, and action nets. Organization, v. 11, n. 6, p. 773-791, 2004.), os estudos da translação têm contribuído ao oferecer uma base para pesquisas cujo propósito é redirecionar o foco das “organizações” para o organizing (CZARNIAWSKA, 2008bCZARNIAWSKA, B. A theory of organizing . Cheltenham: Edward Elgar Press, 2008b.). A TAR é também particularmente relevante no campo dos EO, o qual tende a subestimar como o organizar é entrelaçado pela materialidade (ORLIKOWSKI, 2007ORLIKOWSKI, W. Sociomaterial practices: exploring technology at work. Organization Studies , v. 28, n. 9, p. 1435-1448, 2007.), que tem encontrado crescente interesse de autores nacionais (vide:ALCADIPANI; TURETA, 2009ALCADIPANI, R.; TURETA, C. Teoria Ator-rede e análise organizacional: contribuições e possibilidades de pesquisa no Brasil. Organizações & Sociedade , v. 16, n. 51, p. 647-664, 2009.). Por fim, argumentar que a realidade está em permanente construção sugere não apenas uma perspectiva ontológica, tratando-se também de uma afirmação política (LAW; URRY, 2004LAW, J. After method: mess in social science research. London: Routledge, 2004.; LAW, 2007LAW, J. Actor network theory and material semiotics. 2007. Disponível em: <http://www.heterogeneities.net/publications/Law2007ANTandMaterialSemiotics.pdf>. Acesso em: 18 abr. 2012.
http://www.heterogeneities.net/publicati...
), de modo que a TAR possui assim uma ontologia política (MOL, 1999MOL, A. Ontological politics: a word and some questions. In: LAW, J.; HASSARD, J. (Org.). Actor network theory and after. Oxford: Blackwell, 1999., 2002MOL, A. The body multiple : atherosclerosis in practice. Durham: Duke University Press, 2002.; LAW, 2004LAW, J. After method: mess in social science research. London: Routledge, 2004.; LAW; URRY, 2004LAW, J.; URRY, J. Enacting the social. Economy and Society , v. 33, n. 3, p. 390-410, 2004.) ao considerar que as condições de possibilidades nunca são dadas de antemão (MOL, 1999MOL, A. Ontological politics: a word and some questions. In: LAW, J.; HASSARD, J. (Org.). Actor network theory and after. Oxford: Blackwell, 1999.). No âmbito dos EO, essa ontologia política pode ser expressa em termos de uma política do organizar, o que significa pesquisar o lado obscuro e problemático inerente às formas de organizar dominantes, buscando assim compreender como fenômenos tais como imperativos pelo lucro, patriarcado, desigualdade racial e irresponsabilidade ecológica, por exemplo, podem ser considerados resultados de processos de organizar, de ordenamentos heterogêneos e continuamente performados (ALCADIPANI; HASSARD, 2010ALCADIPANI, R.; HASSARD, J. Actor-network theory, organizations and critique: towards a politics of organizing. Organization , v. 17, n. 4, p. 419-345, 2010.).

Redes de ação

Por mais de pelo menos uma década, Bárbara Czarniawska (2010)CZARNIAWSKA, B. Going back to go forward: on studying organizing in action nets. In: HERNES, T.; MAITLIS, S. (Org.). Process, sensemaking, & organizing : perspectives on process organization studies. New York: Oxford University Press, 2010. p. 140-160. tem defendido que os pesquisadores organizacionais deveriam voltar seus esforços para estudar o organizing(enquanto conexões entre ações) e não as organizações (unidades estabelecidas ou redes com componentes bem definidos). Conforme a autora, as dificuldades de pôr o postulado de Karl Weick em prática residem no fato de que, quando tentam estudar o organizing, os pesquisadores geralmente se deparam com processos que já atingiram um “final feliz” sob a forma de “organizações” (CZARNIAWSKA, 2004CZARNIAWSKA, B. On time, space, and action nets. Organization, v. 11, n. 6, p. 773-791, 2004.). No entanto, estudar o organizing significa salientar que “organizações” são reificações temporárias, pois o organizar nunca cessa e, estudar “organizações” significa negar ou ignorar esse fato (CZARNIAWSKA, 2004CZARNIAWSKA, B. On time, space, and action nets. Organization, v. 11, n. 6, p. 773-791, 2004.).

Nessa tentativa de combinar nome e verbo, Czarniawska (2004CZARNIAWSKA, B. On time, space, and action nets. Organization, v. 11, n. 6, p. 773-791, 2004.; 2008b)CZARNIAWSKA, B. A theory of organizing . Cheltenham: Edward Elgar Press, 2008b.sugeriu o conceito de redes de ação. O termo representa um compromisso concebido para abraçar aspectos e suposições acerca dos processos de organizar, tais como: seu caráter contínuo – o organizing nunca cessa (CZARNIAWSKA, 2004CZARNIAWSKA, B. On time, space, and action nets. Organization, v. 11, n. 6, p. 773-791, 2004.), indo ao encontro de uma perspectiva construcionista, no sentido de que nada está organizado para sempre (CZARNIAWSKA, 2008bCZARNIAWSKA, B. A theory of organizing . Cheltenham: Edward Elgar Press, 2008b.); seus aparentes efeitos estabilizados, permitindo que as coisas pareçam imutáveis por um momento (CZARNIAWSKA, 2004CZARNIAWSKA, B. On time, space, and action nets. Organization, v. 11, n. 6, p. 773-791, 2004.); e sua temporalidade – em um dado tempo e lugar, há “organizações” que parecem eternas, mas que podem perecer em breve (CZARNIAWSKA, 2008bCZARNIAWSKA, B. A theory of organizing . Cheltenham: Edward Elgar Press, 2008b.).

Sem ambições analíticas, o conceito de redes de ação representa uma tentativa inicial de minimizar o que é tido como certo antes que a análise seja iniciada. Geralmente, um estudo ou pesquisa é iniciado com a localização dos “atores” ou “organizações”; uma rede de ação nos permite perceber que esses são os produtos ou efeitos do organizar, e não sua fonte ou insumos de entrada (CZARNIAWSKA, 2004CZARNIAWSKA, B. On time, space, and action nets. Organization, v. 11, n. 6, p. 773-791, 2004.; 2008bCZARNIAWSKA, B. A theory of organizing . Cheltenham: Edward Elgar Press, 2008b.). Assim, as identidades são produzidas por e em uma rede de ação, e não o contrário (CZARNIAWSKA, 2004CZARNIAWSKA, B. On time, space, and action nets. Organization, v. 11, n. 6, p. 773-791, 2004.), ou seja, as conexões entre as ações, quando estabilizadas, é que formam a identidade dos atores (CZARNIAWSKA, 2008bCZARNIAWSKA, B. A theory of organizing . Cheltenham: Edward Elgar Press, 2008b.). Como exemplo, temos que alguém se torna um editor quando começa a publicar livros e periódicos, o que significa que conexões já foram feitas com ações como escrever e imprimir. Um escritor é alguém que escreveu e não alguém com um cartão de visitas com a palavra “escritor” (CZARNIAWSKA, 2008bCZARNIAWSKA, B. A theory of organizing . Cheltenham: Edward Elgar Press, 2008b.).

Nessa abordagem, o organizar é visto como a conexão, reconexão e desconexão de várias ações coletivas em relação umas às outras, ou de acordo com os padrões ditados por uma determinada ordem institucional ou de uma maneira inovadora. Tais ações coletivas não precisam ser executadas dentro dos limites de uma organização formal; uma rede de ação pode envolver ações realizadas por várias organizações formais ou por agrupamentos/ordenamentos de atuantes humanos e não humanos. Adicionalmente, ressalta-se que as ações conectadas são precárias e temporárias (CZARNIAWSKA, 2010CZARNIAWSKA, B. Going back to go forward: on studying organizing in action nets. In: HERNES, T.; MAITLIS, S. (Org.). Process, sensemaking, & organizing : perspectives on process organization studies. New York: Oxford University Press, 2010. p. 140-160.).

O conceito de redes de ação surgiu a partir da combinação entre o novo institucionalismo e a TAR (Sociologia da Translação) (CZARNIAWSKA, 2004CZARNIAWSKA, B. On time, space, and action nets. Organization, v. 11, n. 6, p. 773-791, 2004.; 2008bCZARNIAWSKA, B. A theory of organizing . Cheltenham: Edward Elgar Press, 2008b.; 2010CZARNIAWSKA, B. Going back to go forward: on studying organizing in action nets. In: HERNES, T.; MAITLIS, S. (Org.). Process, sensemaking, & organizing : perspectives on process organization studies. New York: Oxford University Press, 2010. p. 140-160.), mas foi concebido especificamente para o campo dos EO (CZARNIAWSKA, 2004CZARNIAWSKA, B. On time, space, and action nets. Organization, v. 11, n. 6, p. 773-791, 2004.). Sua relação com o novo institucionalismo reside no fato de que a rede de ação está fundamentada na ideia de que, em cada tempo e lugar, é possível falar de uma “ordem institucional”, um conjunto (não um sistema) de instituições (não necessariamente coerentes) que prevalecem naquele local e contexto (CZARNIAWSKA, 2004CZARNIAWSKA, B. On time, space, and action nets. Organization, v. 11, n. 6, p. 773-791, 2004.; 2008bCZARNIAWSKA, B. A theory of organizing . Cheltenham: Edward Elgar Press, 2008b.; 2010CORRADI, G.; GHERARDI, S.; VERZELLONI, L. Through the practice lens: where is the bandwagon of practice-based studies heading? Management Learning , p. 1-19, 2010.). Na ordem institucional vigente nas economias ocidentais, por exemplo, aqueles que produzem, vendem seus produtos; e aqueles que ganham dinheiro, o investem. Em ordens institucionais anteriores, os produtores podiam trocar seus produtos ou consumi-los e aqueles que tinham dinheiro podiam colocá-lo embaixo do colchão. Essas últimas possibilidades ainda existem, mas não prevalecem, sendo consideradas excêntricas (CZARNIAWSKA, 2008bCZARNIAWSKA, B. A theory of organizing . Cheltenham: Edward Elgar Press, 2008b.). Tais instituições moldam o organizar na medida em que ditam as ações que, convencionalmente, devem ser postas em conjunto (CZARNIAWSKA, 2004CZARNIAWSKA, B. On time, space, and action nets. Organization, v. 11, n. 6, p. 773-791, 2004.), ou seja, certas conexões entre ações são legitimadas enquanto outras não, ou não ainda (CZARNIAWSKA, 2008bCZARNIAWSKA, B. A theory of organizing . Cheltenham: Edward Elgar Press, 2008b.). Assim, organizações se tornam atores por causa de um tipo de ação repetida e legitimada (CZARNIAWSKA, 2004CZARNIAWSKA, B. On time, space, and action nets. Organization, v. 11, n. 6, p. 773-791, 2004.).

Czarniawska (2013)CZARNIAWSKA, B. Organizations as obstacles to organizing. In: ROBICHAUD, D.; COOREN, F. (Org.). Organization and organizing : materiality, agency and discourse. New York: Routledge, 2013. cap. 1. p. 3-22. salienta que a relação entre a noção de rede de ação e a TAR é mais forte que sua afinidade com a teoria institucional. Isso porque, para a TAR, são as conexões/relações que criam os atores. A rede de ação, como a TAR, propõe que as ações podem produzir os atores (CZARNIAWSKA, 2004CZARNIAWSKA, B. On time, space, and action nets. Organization, v. 11, n. 6, p. 773-791, 2004.). Como tais ações são diferentes, precisam ser conectadas por meio do processo de translação, no qual ocorrem as conexões entre elas. Nesse processo, palavras, números, objetos e pessoas são transladados uns pelos outros, de maneira dispersa (CZARNIAWSKA, 2004CZARNIAWSKA, B. On time, space, and action nets. Organization, v. 11, n. 6, p. 773-791, 2004.). No entanto, Czarniawska (2010)CZARNIAWSKA, B. Going back to go forward: on studying organizing in action nets. In: HERNES, T.; MAITLIS, S. (Org.). Process, sensemaking, & organizing : perspectives on process organization studies. New York: Oxford University Press, 2010. p. 140-160. explica que a TAR não abrange todos os casos de organizing, pois foi concebida com o propósito de mostrar como macroatores foram constituídos, não se voltando para o organizar que não levou à construção de atores ou de macroatores que já foram desassociados. As redes de ação são distintas por considerarem que o organizar pode ou não levar à construção de macroatores, dependendo do grau em que as conexões entre as ações tornam-se estabilizadas e se há ou não um porta-voz legítimo para representar esse ator-rede (CZARNIAWSKA, 2008bCZARNIAWSKA, B. A theory of organizing . Cheltenham: Edward Elgar Press, 2008b.; 2013CZARNIAWSKA, B. Organizations as obstacles to organizing. In: ROBICHAUD, D.; COOREN, F. (Org.). Organization and organizing : materiality, agency and discourse. New York: Routledge, 2013. cap. 1. p. 3-22.).

Portanto, estudar o organizing como construção, manutenção e destruição de redes de ação pode levar a conclusões que vão de encontro à maior parte da “teoria das organizações convencional” (CZARNIAWSKA, 2013CZARNIAWSKA, B. Organizations as obstacles to organizing. In: ROBICHAUD, D.; COOREN, F. (Org.). Organization and organizing : materiality, agency and discourse. New York: Routledge, 2013. cap. 1. p. 3-22.). Compreendidas dessa forma, as redes de ação são uma maneira de olhar as coisas, e não outro elemento ontológico da realidade social, pelo menos ainda não. Estudar redes de ação significa responder a uma pergunta dupla: o que está sendo feito e como isso se conecta a outras coisas que estão sendo feitas no mesmo contexto? É uma forma de questionamento que visa captar os traços do passado, mas não lhes permitindo decidir o futuro; redes de ação, mesmo as fortemente institucionalizadas, são constantemente refeitas e renovadas (CZARNIAWSKA, 2004CZARNIAWSKA, B. On time, space, and action nets. Organization, v. 11, n. 6, p. 773-791, 2004.). Nesse sentido, Czarniawska (2008b)CZARNIAWSKA, B. A theory of organizing . Cheltenham: Edward Elgar Press, 2008b. sugere que o estudo de uma rede de ação aconteça enquanto ela está sendo formada/conectada ou por meio de uma genealogia de uma rede de ação já existente. Nesse último caso, deve-se partir de um ator-rede existente e voltar no tempo até um período em que nada existia, a não ser tentativas de conectar as ações (CZARNIAWSKA, 2008bCZARNIAWSKA, B. A theory of organizing . Cheltenham: Edward Elgar Press, 2008b.).

Implicações do foco nos processos de organizar

Voltar o foco da análise para o organizar implica mudanças onto-epistemológicas, as quais se refletem na prática da pesquisa e no ensino no campo dos EO. Nesse sentido, essa seção abordará algumas alternativas metodológicas sugeridas por pesquisadores do organizing, mas sem a intenção de prescrever caminhos e determinar como os estudos necessariamente devam ser conduzidos, o que iria de encontro a uma epistemologia pós-estruturalista.

Primeiramente, o organizar traz consigo uma mudança ontológica, pois compreender as organizações enquanto realizações (CHIA, 1995CHIA, R. From modern to postmodern organizational analysis. Organization Studies , v. 16, n. 4, p. 579-604, 1995.; CZARNIAWSKA, 2004CZARNIAWSKA, B. On time, space, and action nets. Organization, v. 11, n. 6, p. 773-791, 2004.), como verbos (COOPER; LAW, 1995COOPER, R.; LAW, J. Organization: distal and proximal views. Research in the Sociology of Organizations, v. 13, p. 237-74, 1995.) e não como entidades fixas, estáveis e homogêneas, significa uma alteração da perspectiva temporal da pesquisa: é a organização que deverá ser explicada (COOPER; BURRELL, 1988COOPER, R.; BURRELL, G. Modernism, postmodernism and organizational analysis: an introduction. Organization Studies , v. 9, n. 1, p. 91-112, 1988.; CZARNIAWSKA, 2006CZARNIAWSKA, B. Bruno Latour: reassembling the social – an introduction to Actor-Network Theory. Organization Studies , v. 27, n. 10, p. 1553-1557, 2006.), sendo interpretada como um tipo de produto final e não um ponto de partida (CZARNIAWSKA, 2004CZARNIAWSKA, B. On time, space, and action nets. Organization, v. 11, n. 6, p. 773-791, 2004.; 2008bCZARNIAWSKA, B. A theory of organizing . Cheltenham: Edward Elgar Press, 2008b.) para a análise. Sob essa perspectiva, as diferentes realidades organizacionais não precedem as práticas, mas sim são moldadas, performadas por elas (MOL, 1999MOL, A. Ontological politics: a word and some questions. In: LAW, J.; HASSARD, J. (Org.). Actor network theory and after. Oxford: Blackwell, 1999.). Ao mesmo tempo, como explica Law (2004)LAW, J. After method: mess in social science research. London: Routledge, 2004., nós pesquisadores também contribuímos para a construção da realidade em estudo, pois as pesquisas transcendem as representações dos fenômenos, de forma que não apenas descrevem o que foi estudado, mas também contribuem para produzir a realidade que se está buscando compreender; ou seja, a realidade não é exterior, mas sim performada pelos métodos de pesquisa utilizados.

Ao optarem por essa abordagem com foco no organizar, sem se aterem às amarras e conceitos concebidos a priori, alguns pesquisadores sugerem certos princípios metodológicos que podem contribuir com os estudos empíricos, bem como com a análise do fenômeno. Um deles é o princípio da simetria. Ser simétrico significa assumir que tanto o conhecimento considerado como verdadeiro quanto o falso merecem uma análise em termos sociais, utilizando os mesmos termos (LAW, 1994LAW, J. Organizing modernity. Oxford: Blackwell, 1994.), e que não devemos estabelecer privilégios entre os diferentes elementos que compõem uma rede heterogênea, de modo que os seres humanos não possuem uma instância privilegiada assumida a priori, pois tanto pessoas como objetos possuem agência (LAW, 1992LAW, J. Notes on the theory of the actor-network: ordering, strategy, and heterogeneity. Systems Practice , v. 5, n. 3, p. 379-373, 1992.; 1994LAW, J. Organizing modernity. Oxford: Blackwell, 1994.; LATOUR, 2012LATOUR, B. Reagregando o social . São Paulo: Edusc, 2012.).

Outro princípio refere-se ao que Latour (2012)LATOUR, B. Reagregando o social . São Paulo: Edusc, 2012.chamou de “seguir os atores”. Tal princípio, uma das orientações metodológicas da TAR, sugere que o pesquisador deve aprender com os atores não apenas o que eles fazem, mas como e porque fazem determinadas coisas (LATOUR, 1999LATOUR, B. On recalling ANT. In: LAW, J.; HASSARD, J. Actor network theory and after . Oxford: Blackwell, 1999. cap. 2. p. 15-25.). Essa orientação está relacionada ao que Law (1994)LAW, J. Organizing modernity. Oxford: Blackwell, 1994. chamou de não reducionismo, princípio segundo o qual o pesquisador não pode ir a campo com conceitos e definições prontas, preconcebidas ou reduzidas. Ao mesmo tempo, essas orientações estão intimamente ligadas a outro princípio, o da reflexividade (LAW, 1994LAW, J. Organizing modernity. Oxford: Blackwell, 1994.), o qual sugere que o pesquisador não deve assumir uma postura diferenciada ou privilegiada em relação à análise ou aos atores pesquisados (LAW, 1994LAW, J. Organizing modernity. Oxford: Blackwell, 1994.; LATOUR, 1999LATOUR, B. On recalling ANT. In: LAW, J.; HASSARD, J. Actor network theory and after . Oxford: Blackwell, 1999. cap. 2. p. 15-25.; 2012LATOUR, B. Reagregando o social . São Paulo: Edusc, 2012.).

O esforço de compreender o organizar sugere que o pesquisador “vá a campo”, estando presente nos vários cenários em que as práticas de organizar acontecem (SCHATZKI, 2003SCHATZKI, T. R. A new societist social ontology. Philosophy of the Social Sciences , v. 33, n. 2, p. 174-202, 2003.). Sobre esse aspecto, a etnografia é sugerida como um caminho adequado para o estudo empírico do organizar (LATOUR; WOOLGAR, 1997LATOUR, B.; WOOLGAR, S. A vida de laboratório : a produção dos fatos científicos. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1997.). Isso porque a abordagem etnográfica possui algumas características que podem contribuir para o estudo dos processos de organizar, tais como a experiência direta e pessoal em determinado contexto cultural ou social (ATKINSON et al., 2007ATKINSON, P. et al. Handbook of ethnography. London: Sage Publications, 2007.), vivência e envolvimento intensos no campo por um longo período (CUNLIFFE, 2010bCUNLIFFE, A. L. Retelling tales of the field in search of organizational ethnography 20 Years on. Organizational Research Methods, v. 13, n. 2, p. 224-239, 2010b.) e busca pela compreensão das ações das pessoas naquele contexto e período específicos (VAN MAANEN, 2011VAN MAANEN, J. Ethnography as work: some rules of engagement. Journal of Management Studies , v. 48, n. 1, p. 218-234, 2011.).

Por outro lado, como argumenta Czarniawska (2004)CZARNIAWSKA, B. On time, space, and action nets. Organization, v. 11, n. 6, p. 773-791, 2004., a abordagem etnográfica também apresenta certas limitações que a impedem de se aproximar da compreensão do organizing, pois sua principal característica – a necessidade de permanência em campo durante um longo período – a faz se deparar com questões ou problemas relacionados ao tempo e ao espaço. Isso se deve ao fato de as etnografias tradicionais, por serem centradas em um só local, não se apresentarem como a melhor abordagem para se estudar as práticas de organizar, posto que elas ocorrem simultaneamente, em diferentes espaços e em contextos fragmentados e múltiplos (CZARNIAWSKA, 2008bCZARNIAWSKA, B. A theory of organizing . Cheltenham: Edward Elgar Press, 2008b.), de modo que os participantes das práticas se movem rapidamente e frequentemente (CZARNIAWSKA, 2004CZARNIAWSKA, B. On time, space, and action nets. Organization, v. 11, n. 6, p. 773-791, 2004.; 2007CZARNIAWSKA, B. Shadowing and other techniques for doing fieldwork in modern societies. Copenhagen: Malmö Liber & Copenhagen Business School Press, 2007.). Isso porque o organizing contemporâneo é móvel, disperso, heterogêneo e apresenta um caráter mediado pela tecnologia (CZARNIAWSKA, 2008bCZARNIAWSKA, B. A theory of organizing . Cheltenham: Edward Elgar Press, 2008b.). Além disso, certos objetos de pesquisa ou certas realidades mostram-se “confusas”, exigindo que aprendamos a tratar na prática a sua complexidade do organizar, caso desejemos nos aproximar de sua compreensão (LAW; SINGLETON, 2005LAW, J.; SINGLETON, V. Object Lessons. Organization, v. 12, n. 3, p. 331-355, 2005.).

Como uma alternativa para a observação tradicional realizada pelos etnógrafos, Czarniawska (2007) sugere o shadowing, uma abordagem metodológica para seguir as pessoas durante sua rotina de trabalho e, em alguns casos, em outros momentos. A principal vantagem dessa técnica sobre a observação estacionária é sua mobilidade (CZARNIAWSKA, 2004CZARNIAWSKA, B. On time, space, and action nets. Organization, v. 11, n. 6, p. 773-791, 2004.; 2008aCZARNIAWSKA, B. Organizing: how to study it and how to write about it. Qualitative Research in Organizations and Management : an international journal, v. 3, n. 1, p. 4-20, 2008a.). O shadowing também cria uma dualidade entre o seguidor e a pessoa seguida, na qual há uma observação mútua, um estabelecimento de similaridades e diferenças, de forma que o pesquisador infere e faz perguntas conforme sua percepção dos eventos, ao mesmo tempo em que também é percebido (CZARNIAWSKA, 2008aCZARNIAWSKA, B. Organizing: how to study it and how to write about it. Qualitative Research in Organizations and Management : an international journal, v. 3, n. 1, p. 4-20, 2008a.).

Em relação à forma de análise de dados, essa pode ser realizada inspirando-se na maneira como se estudam fenômenos novos ou ainda pouco estudados, tal como ocorre na Grounded Theory (CZARNIAWSKA, 2007CZARNIAWSKA, B. Shadowing and other techniques for doing fieldwork in modern societies. Copenhagen: Malmö Liber & Copenhagen Business School Press, 2007.), no sentido de não se estabelecer ou forçar pressuposições ou categorias de conceitos teóricos preexistentes (GLASER; STRAUSS, 1967GLASER, B.; STRAUSS, A. The discovery of grounded theory : strategies for qualitative research. New York: Aldine, 1967.). Nesse caso, é necessário ressaltar que não devemos utilizar outros elementos presentes na referida metodologia, ligados a uma visão positivista de ciência (STRAUSS; CORBIN, 1998STRAUSS, A.; CORBIN, J. Basics of qualitative research : grounded theory procedures and techniques. Newbury Park: Sage Publications, 1998.).

A escrita ou relato da pesquisa se apresenta também como um desafio a ser superado nos estudos etnográficos de forma geral e também em relação ao organizing. Nesse sentido, uma abordagem que pode ser utilizada é o que Latour (1996)LATOUR, B. Aramis , or the love of technology. Cambridge: MIT Press, 1996. chamou de scientifiction, um gênero híbrido que consiste no processo de “ficcionalizar” o relato de pesquisa. Czarniawska (2008b)CZARNIAWSKA, B. A theory of organizing . Cheltenham: Edward Elgar Press, 2008b. também ressalta o papel das narrativas nos processos de organizar, reforçando a relevância das estórias na transmissão das experiências e na construção dos significados. Ainda conforme a autora, os textos são relevantes para o organizar porque eles estabilizam as ações, como também o fazem os números, as figuras e imagens, as ferramentas e as máquinas.

Por fim, poderíamos nos questionar como a ontologia do organizar poderia ser incorporada aos métodos de ensino e aos textos no campo de EO. Buscando responder tal questionamento, Czarniawska (2008b)CZARNIAWSKA, B. A theory of organizing . Cheltenham: Edward Elgar Press, 2008b.enfatiza que as duas abordagens ou visões acerca das organizações (a lógica da prática e a da representação) não são excludentes. Adotar ambas as perspectivas tende a contribuir para a área, porque resultados de pesquisas focadas nas práticas de organizar tendem a contradizer o mito da racionalidade e, como tal, podem gerar reflexões relevantes para aqueles que estão em busca de uma formação na área de organizações. Para tanto, Czarniawska (2008b)CZARNIAWSKA, B. A theory of organizing . Cheltenham: Edward Elgar Press, 2008b.sugere que um maior número de professores pesquisadores ministre aulas nos cursos de graduação e não apenas na pós-graduação; que esses apresentem seus resultados de pesquisa como materiais didáticos, e que métodos de pesquisa na área sejam ensinados por docentes que, de fato, pratiquem pesquisa.

Conclusões

Este artigo teve como objetivo fomentar uma discussão acerca dos processos de organizar, buscando resgatar as origens do tema, seu significado, algumas visões sobre ele e quais seriam as suas implicações para o campo dos Estudos Organizacionais. Para tanto, primeiramente, apresentamos duas ontologias opostas, do ser e do vir a ser, as quais apresentam compreensões diferentes sobre as organizações. Enquanto a primeira alinha-se ao pensamento moderno, o qual defende que a realidade é dada a priori e que prima pela estabilidade, ausência de conflitos e pelos substantivos, a segunda vai ao encontro do pensamento pós-moderno, segundo o qual a realidade é processual, heterogênea e precária. Vimos ainda que a ontologia do ser é a mais frequente em nosso campo, tendendo a tratar como não problemáticas e neutras as noções de organização e seus fenômenos, de modo que grande parte dos pesquisadores da área desenvolvem suas pesquisas ancorados nessa ontologia, em um ciclo que a legitima continuamente.

A partir daí, nos questionamos em que momento da história da Teoria das Organizações essa noção de organização enquanto estrutura ou como substantivo teria atingido força e se consolidado no campo. Mostramos que esse marco ocorreu quando a Teoria dos Sistemas aportou na análise organizacional, demandando uma noção de organização como uma entidade fixa, com fronteiras bem definidas. Estudos posteriores reforçaram essa concepção, contribuindo assim para uma espécie de aprisionamento do campo em torno de uma noção reificada de organização. Discutimos que esse conceito engessado não é neutro e que, sozinho, não mais consegue nos aproximar da compreensão das diferentes realidades organizacionais, cada vez mais complexas e dinâmicas. É nesse cenário que emerge no campo a noção de organizing, proposta por Karl Weick, em uma espécie de retomada, de retorno do foco para os processos, para as ações que constituem as diferentes realidades organizacionais.

No esforço de compreender o organizing e seus desdobramentos, apresentamos as colaborações de autores como Theodore Schatzki, John Law e Bruno Latour (Teoria Ator-Rede) e Barbara Czarniawska para o estudo dos processos de organizar, posto que tais pesquisadores lançaram olhares sobre as organizações a partir de uma perspectiva processual, com foco nas ações e processos que as constituem. Em suma, tais abordagens parecem enriquecer a análise organizacional, por compreenderem as organizações e os diversos fenômenos associados a ela como resultados de processos e ações continuamente produzidos. A partir dessa concepção, nada existe de antemão sem preceder os processos de organizar; são esses que compõem as diferentes realidades e contextos organizacionais, os quais estão em permanente construção, e é essa continuidade que revela a sua aparente estabilidade. Assim, passamos a considerar que realidades organizacionais não são imutáveis ou estabelecidas a priori, mas sim construídas a partir de processos de organizar, os quais são permeados por elementos heterogêneos.

Por fim, apontamos algumas das implicações que a ontologia do organizar pode gerar na prática de pesquisa e ensino nos Estudos Organizacionais. Dentre os aspectos mencionados, ressaltamos a necessidade de alterarmos o ponto de partida da análise e nos desfazermos de amarras e conceitos preconcebidos, ao mesmo tempo em que destacamos as dificuldades relacionadas aos esforços para observarmos e nos aproximarmos das ações de organizar, as quais são complexas e acontecem simultaneamente em diferentes lugares. Além disso, mostramos que essa abordagem processual e com foco prático pode contribuir para o ensino na área, por permitir a reflexão e o questionamento acerca da racionalidade. Talvez um dos maiores ganhos ao seguirmos uma perspectiva do organizar é considerar que as organizações estão constantemente em produção e que, por isso, possuem uma estabilidade precária, entendida como uma realização, de forma que sempre há a possibilidade de serem diferentes do que são em um dado momento.

Referências

  • ALCADIPANI, R.; HASSARD, J. Actor-network theory, organizations and critique: towards a politics of organizing. Organization , v. 17, n. 4, p. 419-345, 2010.
  • ALCADIPANI, R.; TURETA, C. Teoria Ator-rede e análise organizacional: contribuições e possibilidades de pesquisa no Brasil. Organizações & Sociedade , v. 16, n. 51, p. 647-664, 2009.
  • ATKINSON, P. et al. Handbook of ethnography London: Sage Publications, 2007.
  • BLOOMFIELD, B. P.; VURDUBAKIS, T. The outer limits: monsters, actor networks and the writing of displacement. Organization , v. 4, n. 4, p. 625-647, 1999.
  • BURRELL, G.; MORGAN, G. Sociological paradigms and organisational analysis . Vermont: Ashgate Publishing, 1979.
  • CALÁS, M.; SMIRCICH, L. Past postmodernism? Reflections and tentative directions. Academy of Management Review, v. 24, n. 4, p. 649-671, 1999.
  • CALLON, M. Society in the making: the study of technology as a tool for social analysis. In: BIJKER, W.; HUGHES, T.; PINCH, T. (Org.). The social construction of technological systems : new directions in the sociology and history of technology. London: MIT Press, 1987.
  • CALLON, M.; LATOUR, B. Unscrewing the big Leviathan: how actors macro-structure reality and how sociologists help them do so. In: KNORR-CETINA, K.; CICOUREL, A. V. (Org.). Advances in social theory and methodology . London: Routledge and Kegan Paul, 1981. cap. 10. p. 277-303.
  • CAVALCANTI, M. F. R. O grau zero da organização : diálogos entre Deleuze e Robert Cooper. 2012. 146 p. Dissertação (Mestrado em Administração de Empresas). EAESP, São Paulo, 2012.
  • CHIA, R. From modern to postmodern organizational analysis. Organization Studies , v. 16, n. 4, p. 579-604, 1995.
  • CHIA, R. Introduction. In: CHIA, R. (Org.). The Realm of Organizations – essays for Robert Cooper. Londres: Routledge, 1998. p. 1-11.
  • CHIA, R. Ontology: organization as “world-making”. In: WESTWOOD, R.; CLEGG, S. (Org.). Debating organization : point-counterpoint in organization studies. Oxford: Blackwell Publishing, 2003. cap. 3b. p. 98-112.
  • CHIA, R. The problem of reflexivity in organizational research: towards a postmodern science of organization. Organization, v. 3, n. 1, p. 31-59, 1996.
  • COOPER, R. The open field. Human Relations , v. 29, n. 11, p. 999-1017, 1976.
  • COOPER, R.; BURRELL, G. Modernism, postmodernism and organizational analysis: an introduction. Organization Studies , v. 9, n. 1, p. 91-112, 1988.
  • COOPER, R.; LAW, J. Organization: distal and proximal views. Research in the Sociology of Organizations, v. 13, p. 237-74, 1995.
  • COOREN, F.; BRUMMANS, B.; CHARRIERAS, D. The coproduction of organizational presence: a study of médecins sans frontières in action. Human Relations , v. 61, n. 10, p. 1339-1370, 2008.
  • CORRADI, G.; GHERARDI, S.; VERZELLONI, L. Through the practice lens: where is the bandwagon of practice-based studies heading? Management Learning , p. 1-19, 2010.
  • CUNLIFFE, A. L. Crafting qualitative research: Morgan and Smircich 30 years on. Organizational Research Methods , p. 1-27, 2010a.
  • CUNLIFFE, A. L. Retelling tales of the field in search of organizational ethnography 20 Years on. Organizational Research Methods, v. 13, n. 2, p. 224-239, 2010b.
  • CZARNIAWSKA, B. A theory of organizing . Cheltenham: Edward Elgar Press, 2008b.
  • CZARNIAWSKA, B. Bruno Latour: reassembling the social – an introduction to Actor-Network Theory. Organization Studies , v. 27, n. 10, p. 1553-1557, 2006.
  • CZARNIAWSKA, B. Going back to go forward: on studying organizing in action nets. In: HERNES, T.; MAITLIS, S. (Org.). Process, sensemaking, & organizing : perspectives on process organization studies. New York: Oxford University Press, 2010. p. 140-160.
  • CZARNIAWSKA, B. On time, space, and action nets. Organization, v. 11, n. 6, p. 773-791, 2004.
  • CZARNIAWSKA, B. Organizations as obstacles to organizing. In: ROBICHAUD, D.; COOREN, F. (Org.). Organization and organizing : materiality, agency and discourse. New York: Routledge, 2013. cap. 1. p. 3-22.
  • CZARNIAWSKA, B. Organizing: how to study it and how to write about it. Qualitative Research in Organizations and Management : an international journal, v. 3, n. 1, p. 4-20, 2008a.
  • CZARNIAWSKA, B. Shadowing and other techniques for doing fieldwork in modern societies Copenhagen: Malmö Liber & Copenhagen Business School Press, 2007.
  • GHERARDI, S. Introduction: the critical power of the practice lens. Management Learning , v. 40, n. 2, p. 115-128, 2009.
  • GLASER, B.; STRAUSS, A. The discovery of grounded theory : strategies for qualitative research. New York: Aldine, 1967.
  • LATOUR, B. A esperança de pandora : ensaios sobre a realidade dos estudos científicos. São Paulo: Edusc, 2001.
  • LATOUR, B. Aramis , or the love of technology. Cambridge: MIT Press, 1996.
  • LATOUR, B. On recalling ANT. In: LAW, J.; HASSARD, J. Actor network theory and after . Oxford: Blackwell, 1999. cap. 2. p. 15-25.
  • LATOUR, B. Reagregando o social . São Paulo: Edusc, 2012.
  • LATOUR, B. What's the story? Organizing as a mode of existence. In: PASSOTH, J. H.; PEUKER, B.; SCHILLMEIER, M. (Org.). Agency without actors? New approaches to collective action. London: Routledge, 2011. p. 124-169.
  • LATOUR, B.; WOOLGAR, S. A vida de laboratório : a produção dos fatos científicos. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1997.
  • LAW, J. Actor network theory and material semiotics 2007. Disponível em: <http://www.heterogeneities.net/publications/Law2007ANTandMaterialSemiotics.pdf>. Acesso em: 18 abr. 2012.
    » http://www.heterogeneities.net/publications/Law2007ANTandMaterialSemiotics.pdf
  • LAW, J. After ANT: complexity, naming and topology. In: LAW, J.; HASSARD, J. (Org.). Actor network theory and after. Oxford: Blackwell, 1999. cap. 1. p. 1-14.
  • LAW, J. After method: mess in social science research. London: Routledge, 2004.
  • LAW, J. Notes on the theory of the actor-network: ordering, strategy, and heterogeneity. Systems Practice , v. 5, n. 3, p. 379-373, 1992.
  • LAW, J. Objects and spaces. Theory, culture & society , v. 19, p. 91-105, 2002.
  • LAW, J. Organizing modernity Oxford: Blackwell, 1994.
  • LAW, J.; SINGLETON, V. Object Lessons. Organization, v. 12, n. 3, p. 331-355, 2005.
  • LAW, J.; URRY, J. Enacting the social. Economy and Society , v. 33, n. 3, p. 390-410, 2004.
  • MOL, A. Ontological politics: a word and some questions. In: LAW, J.; HASSARD, J. (Org.). Actor network theory and after Oxford: Blackwell, 1999.
  • MOL, A. The body multiple : atherosclerosis in practice. Durham: Duke University Press, 2002.
  • MORGAN, G. Images of organizations . Thousand Oaks: Sage Publications, 1996.
  • MORGAN, G.; SMIRCICH, L. The case for qualitative research. Academy of Management Review, v. 5, p. 491-500, 1980.
  • ORLIKOWSKI, W. Sociomaterial practices: exploring technology at work. Organization Studies , v. 28, n. 9, p. 1435-1448, 2007.
  • PERROW, C. A society of organizations. Theory and Society , v. 20, p. 725-762, 1991.
  • SCHATZKI, T. R. A new societist social ontology. Philosophy of the Social Sciences , v. 33, n. 2, p. 174-202, 2003.
  • SCHATZKI, T. R. Introduction: practice theory. In: SCHATZKI, T. R.; KNORRCETINA, K.; SAVIGNY, E. V. (Org.). The practice turn in contemporary . London: Routledge, 2001. p. 10-23.
  • SCHATZKI, T. R. Organizations as they happen. Organization Studies , v. 27, n. 12, p. 1863-1873, 2006.
  • SCHATZKI, T. R. The site of the social : a philosophical account of the constitution of social life and change. Pennsylvania: Pennsylvania State University Press, 2002.
  • SCHATZKI, T. R. The sites of organizations. Organization Studies , v. 26, n. 3, p. 465-484, 2005.
  • STARBUCK, W. H. The origins of organization theory. In: TSOUKAS, H.; KNUDSEN, C. (Org.). The Oxford handbook of organization theory Oxford: Oxford University Press, 2003. p. 143-182.
  • STRAUSS, A.; CORBIN, J. Basics of qualitative research : grounded theory procedures and techniques. Newbury Park: Sage Publications, 1998.
  • TSOUKAS, H.; CHIA, R. On organizational becoming: rethinking organizational change. Organization Science, v. 13, n. 5, p. 567-582, 2002.
  • VAN MAANEN, J. Ethnography as work: some rules of engagement. Journal of Management Studies , v. 48, n. 1, p. 218-234, 2011.
  • WEICK, K. E. The social psychology of organizing . Reading: Addison-Wesley, 1979.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2016

Histórico

  • Recebido
    27 Set 2013
  • Aceito
    04 Fev 2015
Escola de Administração da Universidade Federal da Bahia Av. Reitor Miguel Calmon, s/n 3o. sala 29, 41110-903 Salvador-BA Brasil, Tel.: (55 71) 3283-7344, Fax.:(55 71) 3283-7667 - Salvador - BA - Brazil
E-mail: revistaoes@ufba.br