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A ESCATOLOGIA DO TOMÁS DE AQUINO MADURO

The Eschatology of the Mature Thomas Aquinas

RESUMO

A renovação da Escatologia é um processo ecumênico iniciado no século XIX que se estende até hoje. Ela permite a expressão mais precisa daquilo que a revelação cristã realmente manifesta nesse campo. A renovação da Escatologia também instiga ao conhecimento aprofundado da história da Teologia em vista de nos enriquecermos com os valores dessa história e não incidirmos em lacunas já verificadas no passado. Este artigo tem três objetivos: (1) examinar os elementos antropológicos sobre os quais Tomás de Aquino construiu sua Escatologia; (2) expor as grandes linhas da Escatologia que ele formulou no último decênio de sua vida (3) à luz de uma intuição de Tomás, apresentar a analogia da mutilação como sendo ferramenta para melhor compreensão do estado intermediário. Na conclusão indicam-se valores e lacunas da Escatologia do Tomás de Aquino maduro.

PALAVRAS-CHAVE
Suma contra os Gentios; Antropologia; Escatologia; Renovação; Estado intermediário

ABSTRACT

The renewal of Eschatology has been an ecumenical process that began at the end of the 19th century and continues to the present day. It is marked by a more precise expression of what Christian revelation really demonstrates in this regard. Also, it encourages an in-depth knowledge of the history of Theology, in order to be enriched with its values and not to dwell on deficiencies already verified in the past. This article has three aims: (1) to provide an overview of the anthropological elements upon which Aquinas based his Eschatology; (2) to summarize the main features of the Eschatology he wrote in the last decade of his life; (3) in the light of Aquinas’ insight, to introduce the analogy of mutilation as a tool for a better understanding of the intermediate state. The conclusion identifies the values and deficiencies of the Eschatology of the mature Thomas Aquinas.

KEYWORDS
Summa contra Gentiles; Anthropology; Eschatology; Renewal; Intermediate state

Introdução

Os méritos irrenunciáveis da renovação da Escatologia assinalam toda apresentação séria desse tratado hoje em dia. Ao longo de mais de um século uma série de teólogos e biblistas de várias confissões cristãs contribuíram para tal revitalização1 1 As obras teológicas relevantes para esse processo são apresentadas em NITROLA, 2001, p. 34-90; ANCONA, 2013, p. 205-222; O’CALLAGHAN, 2011, p. 46-53. . Esse processo ecumênico renovador que se iniciou no final do século XIX e se prolonga até hoje permite à Escatologia uma expressão mais precisa daquilo que a revelação cristã realmente manifesta nesse campo.

A renovação da Escatologia urge outrossim a nos empenharmos no conhecimento aprofundado da história da Teologia. Isso se requer para enriquecermo-nos com os valores dessa história e não incidirmos em lacunas já verificadas no passado. Nesses tempos acelerados em que grassam as polarizações, a pós-verdade, as fake-news e a superficialidade das redes sociais, tal aprofundamento é no mínimo vantajoso; nele fazemos “como um pai de família, que tira do seu tesouro coisas novas e velhas” (Mt 13,52).

Dentre as “coisas velhas” que despontam do “tesouro” estão as apresentações de Escatologia feitas por São Tomás de Aquino no século XIII. Por um lado, antes de completar trinta anos o jovem professor Tomás escreveu sobre Escatologia na sua obra Scriptum super libros Sententiarum (Comentário sobre as Sentenças de Pedro Lombardo). Luis Ladaria examinou o tema nessa obra menos teologicamente consolidada da juventude de Tomás (LADARIA, 2003LADARIA, L. Fim do homem e fim dos tempos. In: SESBOÜÉ, B. (Ed.). História dos dogmas: o homem e sua salvação. São Paulo: Loyola, 2003. t.2, p. 345-397., p. 379-384). Por outro lado, ao morrer Tomás de Aquino havia deixado incompleta a Suma Teológica (ST); faltava ali precisamente a abordagem do tema da Escatologia. Após a morte do mestre, seus ajudantes redigiram o que faltava, que recebeu o nome de Supplementum. Ao redigir tais páginas, aqueles primeiros editores de Tomás, “trabalhando sob a direção de Reginaldo de Piperno depois do dia 7 de março de 1274, ano da morte do Aquinate, juntaram partes de escritos a respeito que se encontravam nas Sentenças” (ANCONA, 2013ANCONA, G. Escatologia cristã. São Paulo: Loyola, 2013., p. 172). Giovanni Ancona optou por expor o tema da Escatologia de Tomás a partir desse complemento redigido pelos discípulos (ANCONA, 2013ANCONA, G. Escatologia cristã. São Paulo: Loyola, 2013., p. 173-178). Contudo, no campo da Escatologia, será que não haveria uma concepção mais amadurecida redigida pelo próprio Tomás? A resposta é afirmativa. A exposição de Escatologia feita pelo Tomás de Aquino maduro encontra-se no último volume da Suma contra os Gentios (ScG). Essa obra do Aquinate foi finalizada no último decênio de sua vida (CAMELLO, 2015CAMELLO, M.O. Introdução geral. In: TOMÁS DE AQUINO. Suma contra os Gentios I. São Paulo: Loyola, 2015. v.1, p. 9-29., p. 10) e por isso manifesta sua reflexão amadurecida. Em nosso contexto não dispomos de um estudo dessa exposição mais tardia da Escatologia de Tomás. A apresentação e o comentário do pensamento amadurecido do Doutor angélico nesse campo, feitos a seguir, têm por isso relevância e ineditismo.

Este artigo tem três objetivos: (1) Considerar os elementos antropológicos sobre os quais Tomás ergueu sua Escatologia. (2) Expor as grandes linhas da Escatologia do Tomás de AquinoTOMÁS DE AQUINO. Suma Teológica. São Paulo: Loyola, 2001-2006. 8 v. maduro. (3) À luz de uma intuição de Tomás, apresentar a analogia da mutilação como sendo ferramenta para compreender melhor o estado intermediário. A conclusão do artigo indicará os valores e lacunas da sua Escatologia.

1 A Antropologia de S. Tomás de Aquino

A antropologia de São Tomás de Aquino é uma ciência que tematiza o que está por detrás de toda a complexa atividade humana. “Ela consiste numa interpretação do ser humano que, pressupondo que este age desta ou daquela forma, visa responder às perguntas: O que ele é? Qual é seu sentido? Ele destina-se a quê?” (HISLOP, 1950HISLOP, I. The Anthropology of St Thomas. Oxford: Blackfriars, 1950., p. 3). Com esses objetivos, Tomás utilizou criticamente os conceitos da Filosofia de Aristóteles para expressar a mensagem cristã a tal respeito. Ele transpôs afirmações bíblicas sobre a criação e sobre o ser humano para uma linguagem conforme os conceitos da metafísica aristotélica. Na época isso representou uma ousada inculturação da fé. É necessário nos familiarizarmos com alguns elementos da Antropologia de Tomás para compreendermos melhor suas afirmações em Escatologia; eventualmente faremos recurso à Suma Teológica, também obra do Tomás de Aquino maduro. O objetivo não é oferecer uma visão abrangente da sua Antropologia2 2 Apresentações abrangentes encontram-se em HISLOP, 1950, p. 2-10; WAWRYKOW, 2005, p. 4-8. .

O pensamento de S. Tomás tem como matriz a terminologia aristotélica do hilemorfismo (ὕλη, hýle = “matéria”; μορφή, morphé = “forma”). O hilemorfismo assumido por Tomás parte da distinção metafísica fundamental entre potência e ato e entre matéria e forma.

Por um lado, potência é a possibilidade de existir ou atuar. No alcance de nossa reflexão, que é antropológico, podemos ter potência como semelhante à hýle, matéria, embora, rigorosamente falando, Tomás distinga entre os dois3 3 Tomás escreve: "a matéria e a forma se relacionam como potência e ato" (TOMÁS, ScG II, c.71). Rigorosamente falando, contudo, Tomás realmente distingue potência de matéria, e ato de forma: "A composição de ato e potência é mais frequente do que a composição de forma e matéria. Por isso, matéria e forma dividem a substância natural, mas a potência e o ato dividem o ente comum" (TOMÁS, ScG II, c.54). . Matéria não significa para Tomás de Aquino o que hoje designamos assim, mas aquilo que é possibilidade, ou em potência. Tomás escreve: “materia est id quod est in potentia” (“matéria é aquilo que é em potência”) (TOMÁS, ST I q.3 a.2 c)4 4 Ver também: "matéria é ser em potência" (TOMÁS, ScG II, c.16). .

Por outro lado, ato é a existência de fato, ou a atuação, em si. No alcance de nossa reflexão, que é antropológico, podemos ter o ato como semelhante à morphé, forma, embora, rigorosamente falando, Tomás também distinga entre os dois. Forma não significa para Tomás de AquinoTOMÁS DE AQUINO. Suma contra os Gentios. São Paulo: Loyola, 2015-2016. 4 v. o que hoje compreendemos assim, mas aquilo que existe já em ato, e não só como possibilidade. Tomás expressa-se desse modo: “forma est actus” (“forma é o ato”) (ST I q.50, a.2, obi.3)5 5 A expressão também aparece em ST I q.90, a.1, obi.2. Ver também: "forma [... é] o princípio de existência" (TOMÁS, ScG I, c.27). .

Tomás articula os binômios de distinção potência x ato e matéria x forma deste modo: “a matéria não é senão potência, já a forma é aquilo pelo qual algo é, pois é o ato” (TOMÁS, ScG II, c.43)6 6 Ver também: "forma é o ato, enquanto a matéria é em potência" (TOMÁS, ST I-II q.10, a.1, ad 2). . Essas categorias fornecem a distinção metafísica fundamental. Antropologicamente, uma coisa é a possibilidade de existir ou atuar: potência ou matéria; outra coisa é de fato existir ou atuar: ato ou forma.

Por vezes há integração entre a possibilidade de existir e a existência de fato, ou entre matéria e forma. Trata-se de unidade vigorosa e o resultado é um corpo, que pode ser vivo ou não vivo. Para Tomás, portanto, corpo é algo que só pode ser bom e positivo. Condição de existência de um corpo é a união entre possibilidade de existir e existência de fato, entre matéria e forma, que é também união entre potência e ato. Tomás escreve: “unumquodque ex materia et forma compositum est corpus” (“tudo o que é composto de matéria e forma é corpo” (TOMÁS, ScG II, c.50)7 7 Ver também: "[Um corpo] é composto de matéria, que é ente em potência, e de forma, que é ato" (TOMÁS, ScG III, c.69). . Sem a existência de fato ou forma (ato), não há corpo, mas apenas a possibilidade de existir ou matéria (potência). Havendo ambos – a possibilidade de existir e a existência de fato – então existe corpo. No corpo, a unidade de matéria e forma é radical, já que tal unidade é condição metafísica necessária para a existência de qualquer corpo.

Há algo que existe de fato e que não pode ser só como possibilidade: Deus. Deus é existência de fato, forma (ato), não é possibilidade de existência ou potência (matéria). Tomás escreve: “Se Deus é eterno, é necessário que não esteja em potência. [...] Ora, Deus, de acordo com o que é, não pode não existir, uma vez que é eterno. Logo, em Deus não há potência para existir” (TOMÁS, ScG I, c.16). Deus é só ato, existência de fato, forma. Deus é forma (ato) que não pode ser recebida na matéria (potência), isto é, só como possibilidade. Deus é o único que existe de fato e que não pode existir só em possibilidade. Por isso Deus não é corpo, o qual implica em possibilidade de existir ou potência (matéria). Tomás escreve: “Aquela forma que não pode ser recebida na matéria [isto é, que não pode existir só em potência], mas que se mantém por si mesma, [...] tal forma é Deus” (TOMÁS, ST I q.3 a.2 ad 3)8 8 Ver também: "Todo corpo é em potência. Deus, porém, não está em potência, como foi demonstrado, mas é ato puro. Logo, não é corpo" (TOMÁS, ScG I, c.20). .

Para passar da possibilidade de existir (potência) à existência de fato (ato), todo outro ato ou matéria depende de uma primeira causa ou ser (Deus) que não é em potência. Tomás observa que Deus é a existência de fato que é absolutamente anterior a qualquer possibilidade de existir, já que as demais possibilidades de existir – potências – não passam por si mesmas à existência de fato, mas necessitam que sejam passadas ao ato por algo prévio que esteja já em ato. Ele então escreve: “Tudo que de alguma maneira está em potência tem alguma coisa que é anterior a si. Ora, é Deus o primeiro ente e a primeira causa, como está claro pelo que foi dito. Logo, não tem em si alguma mescla de potência” (TOMÁS, ScG I, c.16).

Os corpos em geral, isto é, aquela unidade vigorosa entre possibilidade de existir e existência de fato (entre matéria e forma) podem ser vivos ou não vivos. É fundamental nesta altura compreender corretamente o significado do conceito de alma em Tomás de Aquino. Para Tomás, em todos os corpos vivos (mesmo não humanos) aquilo que existe já em ato (a forma) recebe um nome especial: alma. Trata-se de um conceito de alma bem diferente daquele que a representa como resto etéreo de um ser humano morto vagando pelo espaço. Por outro lado, nos seres não vivos a existência de fato (forma) não se chama alma (anima); um ser não vivo é inanimado, inanimatus, sem alma. Tomás escreve: “O corpo ou é vivo, ou é não vivo. É claro, porém, que o corpo vivo é mais nobre que o não vivo. Mas o corpo vivo não vive enquanto corpo, pois assim todos os corpos seriam vivos. É necessário, portanto, que ele viva devido a algo diferente, como o nosso corpo vive devido à alma” (TOMÁS, ST I q.3 a.1 c).

O ser humano, como em todo os corpos vivos ou não vivos, é unidade vigorosa daquilo que é só em potência (matéria) e daquilo que existe já em ato (forma). Como é corpo vivo, no ser humano aquilo que existe já em ato (forma) chama-se também alma. Característica do ser humano, que o distingue dos demais seres vivos e o coloca acima destes, é que sua alma seja intelectiva. Nele, a existência de fato (forma) é alma intelectiva, ou simplesmente intelecto. Tomás escreve: “O princípio pelo qual nós, acima de tudo, compreendemos, seja ele chamado intelecto ou alma intelectiva, é a forma do corpo” (TOMÁS, ST I q.76, a.1 c). Desse modo, no corpo vivo que é humano, a existência de fato (forma) chama-se alma intelectiva, que é imortal. A alma intelectiva pode ser também chamada de alma racional, isto é, alma dotada da faculdade do raciocínio. A alma intelectiva ou racional possui intelecto (compreensão) e vontade (querer) e ocupa uma posição única em toda a criação. O fato da existência do ser humano ser existência dotada de intelecto e vontade faz com que ele transcenda e vá além das demais criaturas como, por exemplo, aquelas criaturas que são corpos vivos, mas não humanos. Outra maneira de Tomás expressar essa transcendência do ser humano é sua designação como imagem de Deus. Embora todos os seres tenham alguma analogia com Deus pelo fato de participarem da existência de Deus, essa analogia geral de todos os seres com Deus não os torna imagem de Deus. Tomás recorda:

Agostinho diz, em Gen. ad litt. 6: “Aquilo que, no ser humano, o faz sobressair pelo fato de Deus o ter feito à sua imagem, é devido a isto: Ele deu uma mente dotada de intelecto que o coloca acima dos animais que pastam”. Portanto, aquilo que não tem intelecto, não é [feito] à imagem de Deus. [...] Portanto, se a semelhança se limita [à pertença ao mesmo] gênero, ou a um acidente em comum, só devido a isso não se poderá dizer que algo é imagem de um outro

(TOMÁS, ST I q.93 a.2 s.c. c).

Um aspecto dessa transcendência é que no corpo humano a existência de fato (forma ou alma intelectiva) é imortal, ao contrário do que acontece com os demais corpos vivos não humanos. Ela é imortal devido ao seu intelecto e vontade, que a levam a participar da imortalidade de Deus criador.

A antropologia de São Tomás de Aquino é vigorosamente unitária. Como em todos os corpos (nos quais a unidade entre possibilidade de existir – matéria – e existência de fato – forma – é vigorosa) também no corpo humano isso se verifica. Também no ser humano a condição de existência de um corpo é a união entre a potência e o ato, entre a matéria e a forma. Também no ser humano, sem a existência de fato (forma) o corpo nem sequer existe, mas só a possibilidade de existir (potência). Existindo a potência e o ato, aí então o corpo humano existe. Também no ser humano a unidade dos dois é radical, já que condição necessária para a existência do corpo. O fato de que neste ser possam se distinguir conceitualmente aspectos ou princípios não desfaz sua unidade. Tais aspectos ou princípios não são entidades separadas. Tal unidade intrínseca e vigorosa caracteriza o ser humano. Isso é crucial para não se compreender dualisticamente a seguinte afirmação de Tomás no campo da distinção metafísica: “O ser humano não é apenas alma, mas algo composto de alma e corpo” (TOMÁS, ST I q.75 a.4 c). Essa concepção é o contrário de qualquer dualismo concebido em chave platônica segundo o qual o corpo é negativo. Vimos que, para Tomás, quando matéria e forma se verificam, o resultado é um corpo e que, assim, corpo para ele é algo que só pode ser bom e positivo. Vimos também que é indevida a compreensão de alma em Tomás como sendo resto etéreo de ser humano morto que vaga pelo espaço. A existência de fato – alma – precisa realizar-se mediante o corpo, pois só assim a pessoa se aperfeiçoa no conhecimento e na virtude (TOMÁS, ScG III, c.144). Ele comenta também que a existência de fato – alma – do ser humano que venha a se dar separadamente do corpo “é de algum modo imperfeita” (TOMÁS, ScG IV, c.79) e é contra a natureza de tal existência de fato. Para Tomás, é inaceitável uma concepção adequada de ser humano apenas como alma. O ser humano pensado sem o corpo, mas apenas como alma, está como que mutilado.

Segundo Tomás de Aquino, nos corpos vivos humanos a existência de fato (forma, denominada alma intelectiva) é imortal, ao contrário dos demais corpos vivos não humanos, cuja existência tem início e fim. Mas a experiência demonstra que os humanos morrem. Para Tomás, a morte é uma deficiência provisória pela qual o ser humano passa. Nesse caso a existência de fato (forma) é imortal mesmo na deficiência radical do corpo vivo, que é a morte. Tomás afirma: “Que a alma permanece após o corpo, isto acontece por uma deficiência do corpo [per defectum corporis], que é a morte. Deficiência [defectus] esta que não havia quando a alma foi inicialmente criada” (TOMÁS, ST I q.90 a.4 ad 3). Para Tomás, portanto, mesmo em tal fase provisória deficiente do ser humano, a existência de fato (forma, denominada alma intelectiva) prossegue, pois participa da imortalidade de Deus. Mas será fase provisória, a ser superada por ocasião do juízo final e da ressurreição da carne.

2 A Escatologia de S. Tomás de Aquino

Os termos escatologia ou escatológico não se encontram nos escritos de Tomás. Ali, porém, encontra-se clara concepção da vida após a morte e do futuro tempo da parusia. Na Suma contra os Gentios, o quarto e último livro é dedicado exclusivamente ao exame dos assuntos que são acessíveis apenas pela revelação divina e que não podem ser provados só pela razão. No final desse quarto livro é que se encontra a exposição de Tomás no campo do que hoje denominamos Escatologia. O fato de que a derradeira parte da Suma Teológica tenha permanecido incompleta leva a recomendar esse quarto e último volume da Suma contra os Gentios, que oferece visão ágil e abrangente dos princípios da Escatologia de Tomás (WAWRYKOW, 2005WAWRYKOW, J. The SCM Press A-Z of Thomas Aquinas. London: SCM Press, 2005., p. 147). Nessa obra, sua concepção a esse respeito herda a atenção fulcral sobre a ressurreição da carne, que já era uma constante tanto na reflexão dos Padres da Igreja como na síntese de Juliano de Toledo (Prognosticum futuri saeculi) redigida cinco séculos antes de Tomás. Assim como nesses autores, o interesse do Aquinate na maioria dos capítulos dedicados à Escatologia se concentra na ressurreição final, cujo paradigma é a ressurreição de Cristo.

2.1 Escatologia realizada e Escatologia presente

Nesse volume da Suma contra os Gentios, a abordagem do que hoje chamamos de Escatologia realizada (o evento de Jesus Cristo como acontecimento escatológico crucial) e Escatologia presente (Cristo que se manifesta na vida atual) pode ser indicada em três temas.

Primeiramente, a Escatologia realizada é abordada mediante o exame da encarnação da segunda pessoa do Deus-Trindade. Tal exame preocupa-se sobretudo em explicar metafisicamente a possibilidade da união entre natureza divina e humana em Cristo.

Em segundo lugar, ambas são encontradas na definição de Reino de Deus. Já Agostinho de Hipona havia interpretado a passagem de Ap 20,1-12 (o “reino com Cristo durante mil anos”) em chave eclesiológica segundo a qual esse reino de mil anos significaria a era cristã e da Igreja Católica. “Assim, traduzindo a visão milenarista de Ap 20 em termos eclesiológicos, Agostinho estabeleceu os fundamentos para a tendência bastante difundida da teologia latina posterior de identificar o reino de Deus, pelo menos neste primeiro estágio de existência, com a Igreja Católica institucional” (DALEY, 1994DALEY, B. Origens da escatologia cristã: esperança da Igreja primitiva. São Paulo: Paulus, 1994., p. 196). Oito séculos depois, e refletindo o auge da noção de cristandade, a Escatologia de Tomás expressava essa identificação. Ele escreve: “por mil anos entende-se todo o tempo da Igreja, no qual os mártires e os outros santos reinam com Cristo, tanto na presente Igreja, que se chama reino de Deus, quanto na pátria celeste das almas. Com efeito, o número mil significa perfeição” (TOMÁS, ScG IV c.83).

Em terceiro lugar, se por um lado Tomás sublinha no presente a justiça da adoração e do louvor a Deus que nos permitem responder com fé, esperança e caridade expressadas em atos de religião que concretizam as virtudes teologais (LAMB, 2004LAMB, M.L. The Eschatology of St Thomas Aquinas. In: WEINANDY, T. et al. (Ed.). Aquinas on Doctrine: a critical introduction. London: T&T Clark, 2004, p. 225-240., p. 229), por outro lado na vida presente a manifestação de Cristo como o definitivo de Deus (Escatologia presente) é concebida só na ação dos sacramentos. Para Tomás, antes da morte a efetivação do benefício trazido pela morte de Cristo acontece nos sacramentos dentro da Igreja Católica. Fora dos sacramentos, a efetivação da ação salvífica de Cristo só se realizará, e isso na sua dimensão máxima, na Escatologia futura: “É nos sacramentos que conseguimos o efeito da morte de Cristo quanto à remissão da culpa, porque já foi dito que os sacramentos obram segundo o poder da paixão de Cristo. Mas, é no fim dos tempos que nós conseguiremos o efeito da ressurreição de Cristo quanto à liberação da morte” (TOMÁS, ScG IV c.79).

2.2 Escatologia futura

O foco da Escatologia do Tomás de Aquino maduro é a abordagem dos acontecimentos futuros, no arco compreendido entre o pós-morte e a parusia. Segundo ele, no futuro que advém com a morte a pessoa experimenta um estado deficiente que perdura até a ressurreição. Aqui é importante ter presente o significado de corpo e alma para Tomás. Na sua abordagem antropológica, corpo é a unidade radical entre possibilidade de existir (potência ou matéria) e existência de fato (ato ou forma): “Tudo o que é composto de matéria e forma é corpo” (TOMÁS, ScG II, c.50). No caso dos corpos vivos, a existência de fato (forma) recebe nome especial: alma; para Tomás, alma não é resto etéreo de pessoa morta. A característica do ser humano, que o distingue dos demais seres vivos, é que sua existência de fato – forma ou alma – seja intelectiva e, portanto, imortal, ao contrário dos demais corpos vivos não humanos. A experiência, porém, mostra que os corpos vivos humanos morrem. Tomás apresenta a morte humana como um defeito: “A necessidade de morrer é um defeito [est defectus] na natureza humana proveniente do pecado” (TOMÁS, ScG IV c.82). Após a morte inicia-se uma fase provisória deficiente, resultado de um defeito na natureza humana. Nessa fase deficiente, a humana existência de fato – forma ou alma – se mantém já que participa da imortalidade de Deus. Na Suma contra os Gentios Tomás expõe que então essa existência de fato da pessoa – alma – já recebe prêmio ou punição de acordo com o que fez antes de morrer: “Logo após a morte, as almas dos homens recebem, segundo seus méritos, [...] o prêmio ou a pena pelo que fizeram enquanto estavam no corpo” (TOMÁS, ScG IV c. 91).

A fase provisória entre morte e ressurreição pode ser período de purificar as faltas que a pessoa cometeu antes de morrer. Tal depuração é feita através de sofrimento que vem infligido por penas capazes de compensar ou reparar as faltas cometidas. Tomás de Aquino emprega a lógica jurídica antiga da compensação ou reparação dos crimes e delitos cometidos através de sanções que trazem dor ou prejuízo a quem os cometeu. Essa lógica já se encontrava na reflexão de vários autores da época patrística e remontava a figuras jurídicas da Antiguidade. Nesse sentido, já encontramos em Tomás de Aquino inclusive o termo purgatório:

Às vezes acontece que a purificação não se realiza totalmente nesta vida, e que o homem permanece ainda devedor de pena, ou por alguma negligência ou ocupação, ou, também, porque foi surpreendido pela morte. Entretanto, por esta razão, a alma não merece ser excluída totalmente do prêmio, porque estas coisas podem acontecer sem pecado mortal, [...] É necessário, pois, que as almas sejam purificadas após esta vida, antes de alcançar o prêmio final. Mas, esta purificação [purgatio] se faz por penas, assim como nesta vida a purificação completa teria sido feita por penas satisfatórias [...]. A consecução do prêmio será retardada para as almas dos bons, que têm algo a satisfazer neste mundo, até que sofram as penas purificadoras. E esta é razão pela qual afirmamos existir o Purgatório [Purgatorium]

(TOMÁS, ScG IV c.91).

A situação dos falecidos no purgatório é a razão pela qual se costuma rezar por eles. Tomás recorda essas preces pelos falecidos e comenta: “[essa] oração seria inútil se não se afirma existir o Purgatório após a morte. A Igreja não ora por aqueles que já estão no término do bem ou do mal, mas por aqueles que ainda não chegaram ao término” (TOMÁS, ScG IV c.91).

Antes da morte, a liberdade do indivíduo podia converter-se do mal para o bem, ou passar do bem para o mal. Logo após a morte, porém, Tomás expõe que a liberdade do sujeito não muda mais de direção: “As almas, após se separarem do corpo, se tornam imutáveis quanto à vontade, a saber, posteriormente, a vontade do homem não pode mudar-se, nem do bem para o mal, nem do mal para o bem” (TOMÁS, ScG IV c.92). Isso acontece também com aquelas que estão no processo de purificação: “Há algumas almas que, logo após a separação, não chegam à bem-aventurança, e que, entretanto, não são condenadas, pois trazem consigo algo a purificar; [... elas] não se diferenciam das almas bem-aventuradas quanto ao fim [...]. Portanto, também essas almas terão a vontade imutável” (TOMÁS, ScG IV c. 94).

A abordagem metafísica – a consideração sobre a essência das coisas – característica do pensamento de São Tomás de Aquino deixa marcas visíveis na sua Escatologia. A meta final do cosmo, apresentada pela revelação cristã originalmente com outra matriz de pensamento, é tematizada por Tomás mediante categorias metafísicas. Para os justos, o que se verifica após a morte, mesmo antes da ressurreição, é uma relação direta com a essência de Deus. Tomás escreve: “Não estamos presentes [diante de Cristo] senão quando vemos Deus em sua essência, pois enquanto caminhamos pela fé e não pela sua essência, estamos ausentes do Senhor. Portanto, imediatamente depois de separar-se a alma do corpo, vê a Deus em sua essência, que é a última bem-aventurança” (TOMÁS, ScG IV c.91). O tema de uma visão pós-morte compreendida em chave metafísica é bastante caro ao Doutor angélico, que sublinha: “Desde que a alma se separa do corpo, torna-se capaz da visão divina, à qual não podia chegar, enquanto estivesse unida a um corpo corruptível. É na visão de Deus que consiste a última bem-aventurança do homem” (TOMÁS, ScG IV c.91).

Na exposição sobre o final escatológico da criação Tomás de Aquino inclui: “(1) Seu cumprimento em eterna felicidade no reino beatífico de Deus. (2) A ressurreição de toda a humanidade em Cristo. (3) Cristo que julga os vivos e os mortos, punição eterna ou felicidade eterna no novo céu e nova terra” (LAMB, 2004LAMB, M.L. The Eschatology of St Thomas Aquinas. In: WEINANDY, T. et al. (Ed.). Aquinas on Doctrine: a critical introduction. London: T&T Clark, 2004, p. 225-240., p. 225). Na Suma contra os Gentios, de grande importância é a notável extensão dedicada ao primeiro tema, a felicidade. O enfoque do Aquinate considera três patamares nos quais, em níveis crescentes, a felicidade pode ser atingida. O patamar mais elementar situa-se nesta vida antes da morte. Tomás observa: “é impossível que esteja nesta vida a felicidade última do homem” (TOMÁS, ScG III, c.48). Mais elevado, o segundo patamar de felicidade situa-se no estado intermediário entre a morte e a ressurreição. Tomás escreve: “o homem pode chegar à verdadeira felicidade depois desta vida, estando a alma do homem como imortal naquele estado em que a alma conhecerá pelo modo como conhecem as substâncias separadas” (TOMÁS, ScG III, c.48). Contudo, para Tomás, essa felicidade maior no estado intermediário não é o nível máximo de felicidade reservado aos seres humanos. Ele frisa que a existência de fato – alma – sem corpo é contra a natureza e que em tal estado a bem-aventurança máxima é impossível. O nível máximo de felicidade só pode dar mediante a ressurreição da carne, que é superação desse estado contra a natureza (TOMÁS, ScG IV c.79).

Na Suma contra os Gentios, a maior parte das considerações no campo da Escatologia é dedicada à ressurreição futura. Esta não será mero fenômeno natural, pois o estado de natureza não tem capacidade de operar por si mesmo a revivificação do corpo morto. Tomás escreve: “A restauração de um corpo morto para a vida excede a capacidade de ação da natureza” (TOMÁS, ScG IV c.82). Ele enumera argumentos para a razoabilidade da ressurreição. Por exemplo, afirma que a existência de fato – alma – no estado deficiente após a morte é contrária ao que de mais profundo Deus quis para o ser humano. Tomás argumenta também que a felicidade mais elevada se dá quando quem é feliz é perfeito, mas que a existência de fato – alma – no estado deficiente pós-morte é imperfeição, o que exigiria a ressurreição da carne (TOMÁS, ScG IV c.79).

Tomás de Aquino reflete sobre uma série de características dos ressuscitados. Por exemplo, por um lado ele ressalta a continuidade de natureza entre o corpo ressuscitado e o corpo de antes da morte. O corpo ressuscitado não será aéreo ou etéreo, como aconteceria se o corpo anterior à morte fosse descartável; será concreto e material. Ele escreve a esse respeito:

O corpo do homem ressuscitado deve ser dotado de tato, porque todo animal tem tato. E o ressuscitado, se é homem, deve ser animal. Ora, o corpo aéreo não pode ser dotado de tato, [...] uma vez que é necessário que o corpo mediante o qual se dá o tato, seja o meio entre as qualidades tangíveis, de tal modo que esteja em potência para elas [...]. Portanto, é impossível que o corpo do homem ressuscitado seja aéreo e semelhante aos ventos

(TOMÁS, ScG IV c.84).

Por outro lado, outra característica é que haverá também certa diferença entre os corpos de antes da morte e os corpos ressuscitados. A principal delas é que o corpo ressuscitado não apodrecerá. Tomás observa: “Embora os corpos dos ressuscitados serão da mesma espécie que os nossos corpos agora, entretanto terão outra disposição. Em primeiro lugar, todos os corpos dos ressuscitados, seja dos bons, seja dos maus, serão incorruptíveis” (TOMÁS, ScG IV c.85). Além dessas, Tomás desenvolve no campo da metafísica uma série de outros elementos que serão diferentes entre os corpos de antes da morte e os ressuscitados: “o corpo será sublimado às propriedades dos corpos celestes, a saber, será claro, impassível, móvel, sem dificuldade e trabalho, e grandemente perfeito em sua forma” (TOMÁS, ScG IV c.86). Outra diferença que ele destaca num extenso capítulo é que os ressuscitados não se valerão nem de alimentos nem de sexo. No que diz respeito à nutrição, Tomás observa que, se os ressuscitados precisassem se alimentar regularmente, ficariam imensos e aumentariam constantemente de tamanho devido à incorruptibilidade. Ele observa: “Se sempre se utilizar do alimento, uma vez que o alimento é transformado em corpo do qual nada se dissolve, é necessário que o crescimento se faça segundo alguma dimensão e dever-se-á dizer que o corpo do homem ressuscitado aumentará ao infinito. O que é impossível” (TOMÁS, ScG IV c.83). Sobre Jesus ter se valido de alimentos após a ressurreição, Tomás apresenta a distinção: “Quanto a Cristo deve-se dizer que, após a ressurreição, ele comeu não por necessidade, mas para demonstrar a verdade de sua ressurreição” (TOMÁS, ScG IV c.83). Tomás faz uma observação hermenêutica a respeito de passagens da Sagrada Escritura que parecem prever a utilização dos alimentos na Escatologia futura: “elas devem ser entendidas espiritualmente. Com efeito, a Escritura divina nos propõe coisas inteligíveis sob a semelhança de coisas sensíveis, para que o nosso espírito, por estas coisas que conhece, aprenda a amar o que não conhece” (TOMÁS, ScG IV c.83). Ele lembra que a bem-aventurança final trará prazeres que serão comuns entre os humanos e os anjos, ao passo que os prazeres da alimentação e do sexo são comuns entre nós e os animais. Ele argumenta então que pensar na bem-aventurança humana com tais prazeres comuns com os animais equivaleria dizer que a bem-aventurança dos anjos não seria já perfeita. Tomás escreve:

Se alguém diz que os ressuscitados se utilizarão de alimentos e de sexo, não para a conservação ou o crescimento do corpo, nem para a conservação da espécie ou a multiplicação dos homens, mas por algum prazer que existe nesses atos a fim de que os homens não careçam de algum prazer na recompensa última, está claro de muitas maneiras que essa afirmação é inconveniente. Primeiro, porque a vida dos ressuscitados será mais ordenada que a nossa vida, como já se disse. Nesta vida é desordenado e vicioso se alguém se utiliza dos alimentos e do sexo só pelo prazer, e não pela necessidade de sustentar o corpo ou procriar a prole. E isso é razoável porque os prazeres que existem nas ações citadas não são fins das ações, antes o contrário; a natureza ordenou os prazeres nesses atos a fim de que os animais, por causa do trabalho, não desistissem desses atos necessários para a natureza, o que aconteceria se não fossem provocados pelo prazer. Logo, a ordem é invertida e inconveniente se essas ações são exercidas somente pelos prazeres. Portanto, de nenhuma maneira haverá tais coisas nos ressuscitados, cuja vida se afirma ordenadíssima. Ainda. A vida dos ressuscitados ordena-se para a conservação da bem-aventurança perfeita. Ora, a bem-aventurança e a felicidade do homem não consistem nos prazeres corporais [...]. Ademais. Os atos das virtudes se ordenam à bem-aventurança como a um fim. Portanto, se no estado da bem-aventurança futura existissem prazeres de alimento e de sexo como pertencentes à bem-aventurança, seguir-se-ia que na intenção daqueles que agem virtuosamente haveria, de algum modo, esses prazeres. E isso exclui a razão de temperança, porque é contra a razão de temperança que alguém agora se abstenha dos prazeres para que possa desfrutar mais deles depois. Tornaria, assim, toda castidade impudica e toda abstinência gulosa

(TOMÁS, ScG IV c.83).

Na exposição sobre a Escatologia futura, Tomás de Aquino concede grande importância ao julgamento universal que se verificará no final dos tempos. Naquela ocasião, tendo acontecido a ressurreição da carne de todos os falecidos, haverá em seguida a avaliação crítica das condutas de vida. O Doutor angélico afirma que há duas fases de retribuição pelo que se fez durante a vida. Uma, imediatamente após a morte; a outra, “quando os corpos forem reassumidos [...]. Ora, a primeira retribuição se faz a cada um separadamente, já que separadamente morre cada qual. A segunda retribuição se fará a todos simultaneamente, pois todos ressuscitarão simultaneamente” (TOMÁS, ScG IV c.96). O juiz universal será Cristo, junto com outros muito próximos dele. Após o julgamento universal, a grande atividade dos justos ressuscitados será a contemplação de Deus. O prêmio máximo da virtude, que já havia sido expresso em chave metafísica – visão da essência ontológica de Deus – vem sublinhado por Tomás também deste modo: “Todas as ocupações da vida ativa cessarão, as que são ordenadas ao uso de alimentos e de sexo, e de outras coisas necessárias para a vida corruptível. Somente a ocupação da vida contemplativa permanecerá nos ressuscitados” (TOMÁS, ScG IV c.83). Para os justos haverá grande diferença também no campo dos desejos e da submissão ao Espírito Santo. Tomás enfatiza os desejos e sublinha que aqueles sublimes serão todos realizados. Unido ao seu fim último, o ressuscitado “fluirá da visão divina [...] e experimentará em tudo o seu desejo realizado. E porque é pelo desejo da alma que o corpo se move, seguir-se-á que o corpo obedecerá totalmente ao sinal do Espírito” (TOMÁS, ScG IV c.86). No desejo não haverá sombra de mal, pois assim como o ressuscitado que “frui de Deus terá o desejo completo quanto à aquisição de todo bem, assim também terá o desejo completo quanto à remoção de todo mal, porque não há lugar para algum mal onde está o sumo bem” (TOMÁS, ScG IV c.86). O corpo ressuscitado será espiritual não no sentido de consistência vaporosa ou etérea. Tomás esclarece que a passagem de São Paulo em 1Cor 15,44 deve ser compreendida no sentido de um corpo físico totalmente submetido a Deus: “O corpo ressuscitado será, pois, espiritual não porque seja um espírito, como alguns entenderam mal, a saber, considerando o espírito uma substância espiritual como o ar ou o vento, mas porque o corpo ressuscitado estará sujeito totalmente ao Espírito Santo” (TOMÁS, ScG IV c.86).

Tomás pressupõe uma cosmologia na qual, acima da terra, está o céu com sete camadas. Os justos ressuscitados estarão num lugar ainda mais alto. A concepção metafísica de Escatologia futura transparece novamente quando Tomás expõe que ali eles viverão sem quaisquer outros seres vivos como animais ou plantas: “Terminado o juízo final [...], os homens serão incorruptíveis [e] se suprimirá de toda criatura corpórea o estado de geração e de corrupção. [...] Os outros animais e as plantas [...], que são corruptíveis, de modo algum permanecerão, seja total, seja parcialmente, naquele estado de não corrupção” (TOMÁS, ScG IV c. 97). A concepção metafísica de futuro externa-se também na indicação da inexistência de tempo após a ressurreição. A atemporalidade final do cosmo é explicada pela ausência geral de movimento. Segundo Tomás, isso é metafisicamente necessário para a imutabilidade do mundo definitivo. Ele vale-se de uma citação do livro do Apocalipse tomada inesperadamente em outro sentido:

Para que cessem a geração e a corrupção nos corpos inferiores, será necessário, também, que cesse o movimento do céu. Por isso diz o Apocalipse: “Não haverá mais tempo” [Ap 10,6 ...]. Cessando o movimento do céu, a geração e a corrupção causadas pelos elementos, a substância de tudo isso permanecerá pela imutabilidade da bondade divina

(TOMÁS, ScG IV, c.97).

3 A analogia da mutilação: ferramenta para compreender o estado intermediário

A reflexão contemporânea lançou dúvidas sobre a possibilidade de felicidade para o ser humano num estado intermediário entre a morte e a ressurreição. Esforçando-se em solucionar os problemas que levantava, essa linha de reflexão formulou a teoria da ressurreição na morte, difundida no ambiente acadêmico teológico brasileiro9 9 Expoente da teoria da ressurreição na morte em nosso contexto é a obra de BLANK, 2000, p. 71-164. O autor mais representativo dessa teoria no âmbito europeu é Gisbert Greshake (GRESHAKE; LOHFINK, 1978, p. 156-184; GRESHAKE, 1981, p. 101-105). . Exposições e críticas abrangentes encontram-se disponibilizadas10 10 Uma exposição abrangente e a crítica da teoria da ressurreição na morte encontra-se em OLIVEIRA, 2017, p. 653-680. Também um documento da Comissão Teológica Internacional oferece a exposição e a crítica da ideia (CTI, 1990, 2 e 3). .

No que diz respeito à retribuição ao ser humano naquele estado intermediário, a teoria da ressurreição na morte objeta que a retribuição não poderia ser feita só à alma. Para rejeitar tal retribuição, a teoria argumenta que o sujeito do prêmio ou castigo após a morte deve ser a pessoa toda e que, portanto, qualquer retribuição só pode ser concedida ao ser humano todo e não apenas a uma parte dele, a alma. Tal proposta raciocina que, como o ser humano é na sua inteireza o sujeito do mérito e do demérito, é também ele por inteiro que está sujeito à retribuição na existência após a morte.

O problema dessa objeção está na compreensão da premissa do raciocínio: o ser humano é na sua inteireza – a pessoa toda – o sujeito do mérito e do demérito. A expressão na sua inteireza, ou os equivalentes na sua totalidade e a pessoa toda, é ambígua. A analogia da mutilação é uma ferramenta que ajuda a perceber tal ambiguidade e a compreender a retribuição no estado intermediário. Ela vale-se de uma realidade da etapa humana provisória de antes da morte para entender figuradamente um elemento da etapa humana provisória depois da morte.

Antes da morte há pessoas a quem faltam partes. Essa ausência pode acontecer porque tais partes não se formaram antes do nascimento ou porque foram amputadas após. Tal ausência de partes pode ser de reduzida a extensa abrangência. Dificilmente se ousaria afirmar que uma pessoa nessa condição é menos pessoa que uma outra à qual não falta nenhuma parte. Essa pessoa a quem faltam partes é pessoa na sua inteireza e na sua totalidade. Mesmo com ausência de partes, essa pessoa toda é pleno sujeito de mérito ou demérito. Antes da morte essa pessoa pode experimentar consolação divina, intimidade com Deus e a presença de Cristo tanto quanto qualquer outra pessoa a quem não faltam partes.

Analogicamente o estado intermediário pode ser entendido como outra etapa provisória na qual faltam partes da pessoa. Na consideração do ser humano após a morte, essa analogia expressa bem, sem subterfúgios, o alcance da força imensa que é a morte. Esta é capaz de mutilar pesadamente o sujeito, consegue aniquilar uma grande parte do seu ser, mas não toda aquela pessoa. O cadáver que vemos após o falecimento encontra-se liquidado pela imensa força da morte. Contudo, essa força poderosa não consegue liquidar por completo o sujeito. Deste, analogamente, permanece após a morte uma mínima, mutilada e incompleta expressão de algo de toda a vida que aquela pessoa tinha antes de falecer. Tal mínima e mutilada expressão da pessoa, que a morte não consegue aniquilar, é a sede mais profunda da liberdade, da responsabilidade e do sentido de bem e mal. O estado provisório do ser humano após a morte não é nem um pouco mais ideal pelo fato de se ver livre do corpo; pelo contrário, é um estado maximamente mutilado. Quem passa pela morte experimenta a maior mutilação que um ser humano pode sofrer e ainda prosseguir existindo como ser humano. Isso vale tanto para Cristo (“o matarão, mas no terceiro dia ressuscitará”, Mt 17,23)11 11 Outras passagens nessa linha são Mt 16,21; 20,19; Jo 2,19. Também as profissões de fé desde o símbolo apostólico falam que Cristo "morreu [...] e ao terceiro dia ressuscitou dos mortos" (DH 10). como para nós. A respeito da expressão terrivelmente mutilada do sujeito – mínima expressão ativa que permanece após a morte e que esta não tem poder para liquidar totalmente porque criada “à imagem de Deus” (Gn 1,27) –, como designá-la? A revelação cristã e a Tradição eclesial referem muitas vezes essa mínima expressão como alma (ψυχή, psyché). Poderia ser empregada outra palavra, mas essa traz consigo longa tradição de uso (CDF, 1979, 3). Analogamente, essa mínima e mutilada expressão de ser humano não é menos pessoa que uma pessoa à qual, antes da morte, faltam partes. A pessoa morta a quem, analogamente, falta tal parte mutilada é pessoa na sua inteireza e na sua totalidade. Esse ser humano é pleno sujeito de mérito ou demérito mesmo com, analogamente, a ausência de tal parte importante. Assim como o sujeito mutilado antes da morte pode ser beneficiado por retribuições e intimidade com Deus, assim também após a morte, no analógico grau máximo de mutilação, pode o ser humano ser beneficiado. Todo esse sujeito como que mutilado pode já ser alvo de um grau de bem-aventurança que Paulo designa como “estar com Cristo” (Fl 1,23) e “morar junto com o Senhor” (2Cor 5,8). Vimos que para Tomás de Aquino esse grau de bem-aventurança não é, contudo, o grau máximo e que há um patamar de bem-aventurança que o supera: após a ressurreição da carne. Segundo Tomás, o ser humano só pode alcançar a felicidade mais completa quando sua existência de fato – a forma, significado da palavra alma – passa a se fazer novamente no corpo (TOMÁS, ScG IV c.79).

Para Tomás de Aquino era impensável a concepção adequada do ser humano apenas como alma. Corpo para Tomás é algo que só pode ser bom e positivo. Também para ele o ser humano, pensado sem o corpo, mas apenas como alma, estaria como que mutilado. É o contrário de qualquer dualismo platônico de corpo como algo negativo. Tomás escreve: “A alma precisa do corpo para a consecução da sua finalidade já que é pelo corpo que ela se aperfeiçoa tanto no conhecimento como na virtude” (TOMÁS, ScG III, c.144). Ele comenta também: “A alma se une naturalmente ao corpo uma vez que é, segundo a sua essência, a forma do corpo. Portanto, que a alma exista sem o corpo é contra a natureza da mesma alma. [...] A alma separada do corpo é de algum modo imperfeita [aliquo modo imperfecta]” (TOMÁS, ScG IV, c.79). Para o Doutor angélico, a existência de fato (forma) do ser humano é imortal mesmo na deficiência radical do corpo vivo, que é a morte. Ele afirma: “Que a alma permanece após o corpo, isto acontece por uma deficiência do corpo [per defectum corporis], que é a morte. Deficiência [defectus] esta que não havia [no início]” (TOMÁS, ST I q.90 a.4 ad 3). A morte, portanto, pode ser analogamente entendida como a maior mutilação possível que um ser humano pode sofrer sem que cesse de existir, ou, na linguagem de Tomás, sem que deixe de ser ato (existência de fato, forma, que ele chama de alma intelectiva) e se torne apenas potência (possibilidade, matéria).

Assim como havia sido a existência antes da morte, tal estado intermediário será também provisório. Ele não é idêntico à ressurreição da carne no final do cosmo. A ressurreição se manifestará vinculada a evento cósmico inédito, tradicionalmente denominado parusia. Essa fase ressuscitada da pessoa, a segunda após a morte, não será mais provisória. O indivíduo encontrar-se-á novamente no estado integral, não mais mutilado ou incompleto. No entender de Tomás de Aquino, só nessa segunda fase pós-morte é que será possível a felicidade mais completa, a bem-aventurança máxima.

Conclusão

O processo ecumênico que renovou a Escatologia a partir do final do século XIX trouxe de modo irrenunciável a riqueza de uma melhor expressão daquilo que a revelação cristã de fato traz a esse respeito. Essa renovação fomenta também o ímpeto a conhecermos melhor a história da Escatologia, a apropriar-nos de seus valores e a esmerar-nos para não incorrermos em suas lacunas. Do tesouro dessa história desponta o que o Tomás de Aquino maduro refletiu no tocante ao assunto. “A maior contribuição de Tomás para a Escatologia é sua profunda análise da bem-aventurança como desejo mais profundo das criaturas inteligentes e de toda a criação” (LAMB, 2004LAMB, M.L. The Eschatology of St Thomas Aquinas. In: WEINANDY, T. et al. (Ed.). Aquinas on Doctrine: a critical introduction. London: T&T Clark, 2004, p. 225-240., p. 225). Ele fez exame cuidadoso, sob os pontos de vista cognitivo e metafísico, do que implica dizer que o coração da criatura só terá repouso realmente em Deus. Tomás expôs que tal felicidade tem três patamares. Os dois primeiros se dão nesta vida antes da morte e no estado intermediário. Ele deixa claro que o patamar máximo de bem-aventurança só pode se dar após a ressurreição da carne porque, no estado intermediário, a existência de fato – o ato, a forma, nesse sentido a “alma” – da pessoa é de algum modo imperfeita e deficiente. Nesse ponto específico, se fosse vivo o Doutor angélico discordaria da afirmação de Bento XII na Constituição Benedictus Deus de 1336, escrita cerca de sessenta anos após a morte de Tomás: que, no estado intermediário, a “visão da essência divina e sua fruição [...] sem alguma interrupção ou privação da mencionada visão e fruição, permanecem ininterruptas e continuarão até o juízo final e, a partir deste, por toda a eternidade” (DH 1001). Essa afirmação sugere igualdade da bem-aventurança anterior e posterior à ressurreição da carne, como se esta fosse inócua e não tivesse impacto sobre a felicidade final.

A reflexão de Tomás de Aquino compõe uma Escatologia sapiencial. Trata-se de sabedoria casada com a justiça. Em linha com a Escatologia patrística, Tomás sublinha o estado final do cosmo como consumação em justiça beatífica da criação e da redenção em Cristo (LAMB, 2004LAMB, M.L. The Eschatology of St Thomas Aquinas. In: WEINANDY, T. et al. (Ed.). Aquinas on Doctrine: a critical introduction. London: T&T Clark, 2004, p. 225-240., p. 226-227). Sua Escatologia também suplanta qualquer dualismo na relação entre alma e corpo. Enxergar dualismo – como se um fosse positivo e o outro negativo e descartável – na Escatologia do Aquinate patenteia falta de compreensão a respeito de sua reflexão e conceitos. Para ele, uma hipotética existência humana maximamente beatífica sem a ressurreição “nesta carne na qual agora vivemos” (DH, n. 72) não corresponderia às promessas da boa-notícia de Cristo (LAMB, 2004LAMB, M.L. The Eschatology of St Thomas Aquinas. In: WEINANDY, T. et al. (Ed.). Aquinas on Doctrine: a critical introduction. London: T&T Clark, 2004, p. 225-240., p. 233). Nesse ponto específico, o Tomás de Aquino maduro ainda está bem à frente da contemporânea teoria da ressurreição na morte que, partindo de argumentação unitária, chega efetivamente a uma proposta dualista: menospreza “esta carne na qual agora vivemos” ao propor uma ressurreição imediata em algum outro corpo que não este de antes da morte. Tomás, pelo contrário, herda e desenvolve a atenção fulcral sobre a ressurreição da carne atual que era frequente na reflexão da época patrística.

Ao utilizar conceitos da Filosofia de Aristóteles para expressar os conteúdos da revelação cristã, Tomás de Aquino sustentou a atemporalidade do cosmo após a ressurreição universal. A passagem bíblica que fala “Não haverá mais tempo” (Ap 10,6) é inesperadamente empregada por ele como fundamentação para sua ideia da inexistência de tempo a partir de então. Na verdade, se trata de expressão a respeito da iminente instauração do tempo final. A concepção do atemporalismo desacredita a dimensão histórica do ser humano; pressupõe outrossim que a história da salvação, em algum ponto do futuro, deixará de ser história. O ser humano seria então retirado da história da salvação. Não menos importante, o atemporalismo “não parece levar em conta suficientemente a verdadeira corporeidade da ressurreição, pois não se pode chamar de verdadeiro um corpo alheio a toda noção de tempo” (CTI, 1990, 2.2).

A partir sobretudo da síntese de Escatologia elaborada por Juliano de Toledo em 688 (Prognosticum futuri saeculi) e da apresentação nesse campo elaborada metafisicamente no século XIII pelo Tomás de Aquino maduro, algumas ênfases e silêncios formatarão, até o século XX, as abordagens nesse campo e darão origem a lacunas: (1) Ênfase sobre a Escatologia futura do pós-morte e do final do cosmo. (2) Emprego de hermenêutica bíblica factual para ler as passagens que tratam da Escatologia futura, ao invés da interpretação simbólica original do Novo Testamento. (3) Apresentação da Escatologia futura com profusão de detalhes, muito além das sóbrias apresentações bíblicas a esse respeito. (4) Ênfase na metafísica, na consideração das essências, sendo a bem-aventurança escatológica apresentada metafisicamente como relação direta com a essência de Deus. (5) Ênfase na lógica jurídica antiga da reparação de crimes e delitos através de sanções externas que trazem dor ou prejuízo ao sujeito. (6) Compreensão do reino terrestre de mil anos (Ap 20,1-12) como sendo a Igreja Católica. (7) O acesso à definitividade de Deus em Cristo no tempo presente como sendo possível só a partir dos sacramentos mediados por ministros ordenados. (8) Silêncio sobre a vida, morte e ressurreição de Jesus como evento escatológico já realizado e causador de ruptura que culminou na Paixão e morte de Cristo. (9) Silêncio sobre a manifestação do reino de Deus como “grão de mostarda” (Mc 4,31; Mt 13,31; Lc 13,19) em todo o arco de tempo que antecede a parusia. A respeito das lacunas daí originadas, muito trabalho de correção e aperfeiçoamento foi exigido no movimento de renovação da Escatologia do qual hoje somos irrenunciavelmente devedores.

Siglas CDF = Congregação para a Doutrina da Fé CTI = Comissão Teológica Internacional DH = DENZINGER, H.; HÜNERMANN, P. ScG = Suma contra os Gentios ST = Suma Teológica.
  • 1
    As obras teológicas relevantes para esse processo são apresentadas em NITROLA, 2001NITROLA, A. Trattato di Escatologia 1: spunti per un pensare escatologico. Cinisello Balsamo: San Paolo, 2001., p. 34-90; ANCONA, 2013ANCONA, G. Escatologia cristã. São Paulo: Loyola, 2013., p. 205-222; O’CALLAGHAN, 2011O’CALLAGHAN, P. Christ Our Hope: an Introduction to Eschatology. Washington, D.C.: The Catholic University of America Press, 2011., p. 46-53.
  • 2
    Apresentações abrangentes encontram-se em HISLOP, 1950HISLOP, I. The Anthropology of St Thomas. Oxford: Blackfriars, 1950., p. 2-10; WAWRYKOW, 2005WAWRYKOW, J. The SCM Press A-Z of Thomas Aquinas. London: SCM Press, 2005., p. 4-8.
  • 3
    Tomás escreve: "a matéria e a forma se relacionam como potência e ato" (TOMÁS, ScG II, c.71). Rigorosamente falando, contudo, Tomás realmente distingue potência de matéria, e ato de forma: "A composição de ato e potência é mais frequente do que a composição de forma e matéria. Por isso, matéria e forma dividem a substância natural, mas a potência e o ato dividem o ente comum" (TOMÁS, ScG II, c.54).
  • 4
    Ver também: "matéria é ser em potência" (TOMÁS, ScG II, c.16).
  • 5
    A expressão também aparece em ST I q.90, a.1, obi.2. Ver também: "forma [... é] o princípio de existência" (TOMÁS, ScG I, c.27).
  • 6
    Ver também: "forma é o ato, enquanto a matéria é em potência" (TOMÁS, ST I-II q.10, a.1, ad 2).
  • 7
    Ver também: "[Um corpo] é composto de matéria, que é ente em potência, e de forma, que é ato" (TOMÁS, ScG III, c.69).
  • 8
    Ver também: "Todo corpo é em potência. Deus, porém, não está em potência, como foi demonstrado, mas é ato puro. Logo, não é corpo" (TOMÁS, ScG I, c.20).
  • 9
    Expoente da teoria da ressurreição na morte em nosso contexto é a obra de BLANK, 2000BLANK, R.J. Escatologia da Pessoa: vida, morte e ressurreição. São Paulo: Paulus, 2000., p. 71-164. O autor mais representativo dessa teoria no âmbito europeu é Gisbert Greshake (GRESHAKE; LOHFINK, 1978GRESHAKE, G.; LOHFINK, G. Naherwartung Auferstehung Unsterblichkeit: Untersuchungen zur christlichen Eschatologie. 3.Aufl. Freiburg im Breisgau: Herder, 1978., p. 156-184; GRESHAKE, 1981GRESHAKE, G. Más fuertes que la muerte: lectura esperanzada de los Novísimos. Santander: Sal Terrae, 1981., p. 101-105).
  • 10
    Uma exposição abrangente e a crítica da teoria da ressurreição na morte encontra-se em OLIVEIRA, 2017OLIVEIRA, R.A. Ressurreição na morte ou no “último dia”? O estado intermediário no debate escatológico do século XX. Perspectiva Teológica, v. 49, n. 3, p. 653-680, set.-dez. 2017., p. 653-680. Também um documento da Comissão Teológica InternacionalCOMISSÃO TEOLÓGICA INTERNACIONAL. Algunas cuestiones actuales de Escatología. Roma, 1990. Disponível em: <www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/cti_documents/rc_cti_1990_problemi-attuali-escatologia_sp.html>. Acesso em: 10 nov. 2020.
    www.vatican.va/roman_curia/congregations...
    oferece a exposição e a crítica da ideia (CTI, 1990, 2 e 3).
  • 11
    Outras passagens nessa linha são Mt 16,21; 20,19; Jo 2,19. Também as profissões de fé desde o símbolo apostólico falam que Cristo "morreu [...] e ao terceiro dia ressuscitou dos mortos" (DH 10).

Referências

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  • BLANK, R.J. Escatologia da Pessoa: vida, morte e ressurreição. São Paulo: Paulus, 2000.
  • CAMELLO, M.O. Introdução geral. In: TOMÁS DE AQUINO. Suma contra os Gentios I São Paulo: Loyola, 2015. v.1, p. 9-29.
  • COMISSÃO TEOLÓGICA INTERNACIONAL. Algunas cuestiones actuales de Escatología Roma, 1990. Disponível em: <www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/cti_documents/rc_cti_1990_problemi-attuali-escatologia_sp.html>. Acesso em: 10 nov. 2020.
    » www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/cti_documents/rc_cti_1990_problemi-attuali-escatologia_sp.html
  • CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ. Carta sobre algumas questões referentes à Escatologia Roma, 1979. Disponível em: www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/documents/rc_con_cfaith_doc_19790517_escatologia_po.html Acesso em: 10 nov. 2020.
    » www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/documents/rc_con_cfaith_doc_19790517_escatologia_po.html
  • DALEY, B. Origens da escatologia cristã: esperança da Igreja primitiva. São Paulo: Paulus, 1994.
  • DENZINGER, H.; HÜNERMANN, P. (Ed.). Compêndio dos símbolos, definições e declarações de fé e moral São Paulo: Paulinas / Loyola, 2007.
  • GRESHAKE, G.; LOHFINK, G. Naherwartung Auferstehung Unsterblichkeit: Untersuchungen zur christlichen Eschatologie. 3.Aufl. Freiburg im Breisgau: Herder, 1978.
  • GRESHAKE, G. Más fuertes que la muerte: lectura esperanzada de los Novísimos. Santander: Sal Terrae, 1981.
  • HISLOP, I. The Anthropology of St Thomas Oxford: Blackfriars, 1950.
  • LADARIA, L. Fim do homem e fim dos tempos. In: SESBOÜÉ, B. (Ed.). História dos dogmas: o homem e sua salvação. São Paulo: Loyola, 2003. t.2, p. 345-397.
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  • NITROLA, A. Trattato di Escatologia 1: spunti per un pensare escatologico. Cinisello Balsamo: San Paolo, 2001.
  • O’CALLAGHAN, P. Christ Our Hope: an Introduction to Eschatology. Washington, D.C.: The Catholic University of America Press, 2011.
  • OLIVEIRA, R.A. Ressurreição na morte ou no “último dia”? O estado intermediário no debate escatológico do século XX. Perspectiva Teológica, v. 49, n. 3, p. 653-680, set.-dez. 2017.
  • TOMÁS DE AQUINO. Suma Teológica São Paulo: Loyola, 2001-2006. 8 v.
  • TOMÁS DE AQUINO. Suma contra os Gentios São Paulo: Loyola, 2015-2016. 4 v.
  • WAWRYKOW, J. The SCM Press A-Z of Thomas Aquinas London: SCM Press, 2005.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Maio 2021
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2021

Histórico

  • Recebido
    17 Nov 2020
  • Aceito
    17 Mar 2021
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