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Um patrimônio étnico: os prenomes de batismo

Resumos

O artigo estuda os prenomes de batismo atribuídos a meninos e meninas de uma comunidade luterana e evangélica em Curitiba, constituída na origem por imigrantes alemães e seus descendentes. Os dados colhidos junto aos registros de batismos, que se estendem de 1866 a 1987, foram objeto de uma classificação em tipos e de uma análise frequencial. Os resultados permitiram estabelecer relações entre as práticas onomasiológicas e o processo de integração desse agrupamento étnico e religioso à sociedade receptora. Submetidos à tensão entre a lealdade a suas origens e a necessidade de se adaptar ao novo mundo, os membros da comunidade exploraram dois procedimentos de ambiguidade: utilizar prenomes que podiam ser interpretados quer como germânicos quer como brasileiros, e intensificar a internacionalização dos prenomes femininos, compensando assim a preservação dos prenomes masculinos germânicos. Dessa maneira alcançaram uma solução de compromisso que, nessa área organização social, lhes permitiu a integração sem a perda da identidade.

Demografia Histórica; Paraná - Brasil.


This article carries out a study of the baptismal names given to the boys and girls of a Lutheran and evangelical community in Curitiba, originally composed of German immigrants and their descendants. The data gathered from the baptism registries dating from 1866 to 1987 were classified by types and were the object of a frequential analysis. The results helped establish relationships between the onomasiological practices and the integration process of this ethnic and religious group into the receiving society. Subjected to the tension between their loyalty to their origins and the need to adjust to the new world, the members of this community used two different ambiguous procedures: using first names that could be considered both Germanic and Brazilian, and intensifying the internationalization of feminine baptismal names, thus preserving Germanic masculine first names. Therefore, they found a compromise solution which, in this area of social organization allowed them to be integrated without losing their identity.

Historical Demography; Paraná - Brasil.


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  • DAUAT, Albert. Les noms de personnes. 4a ed.Paris: L. Delagrave, 1934.
  • KLAPISCH-UBER, Christiane. Constitution et variations temporelles des stocks de prénoms. In: BIDEAU, Alainet al. (Orgs.). Entretiens de Malher (1980). Le prénom, mode et histoire. Paris: Ed. de l'Ecole des Hautes Études en Sciences Sociales, 1984.
  • SCHNAPPER, Dominique. Essai de lecture sociologique. BIDEAU, Alain et al. (Orgs.). Entretiens de Malher (1980). Le prénom, mode et histoire. Paris: Ed. de l'Ecole des Hautes Études en Sciences Sociales, 1984.
  • SEYFERT, Giralda. A identidade teuto-brasileira numa perspectiva histórica. In: MAUCH, Cláudia; VASCONCELLOS, Naira. Os alemães no sul do Brasil. Canoas: Ed. Ulbra, 1994.
  • SHAKESPEARE, William. Romeu e Julieta, cena II, ato II. In:.SHAKESPEARE, William Obra completa. Rio de Janeiro: Aguilar, v. 1, 1969.
  • SIEMENS, João Udo. Os prenomes dos descendentes de alemães em Curitiba. São Paulo: Tese de Doutorado, Universidade de São Paulo, Curso de Pós-Graduação em Letras, 1992.
  • WARNIER, Jean-Pierre. A mundialização da cultura. Bauru: Edusc (Editora Universidade do Sagrado Coração), 2003.
  • 1
    Pergunta que Julieta faz a Romeu com a intenção de reduzir a importância de ser o sobrenome dele o de família rival. SHAKESPEARE, W. Romeu e Julieta, cena II, ato II. In: Obra completa. Rio de Janeiro: Aguilar, 1969. (v. 1, p. 307).
  • 2
    SCHNAPPER, 1984 :14.
  • 3
    Para Jean-Pierre Wanier, a identidade é definida como o conjunto dos repertórios de ação, de língua e de cultura que permitem a uma pessoa reconhecer sua vinculação a certo grupo social e identificar-se com ele. (WARNIER, 2003:16).
  • 4
    Na tradição alemã, as pessoas são individuadas pelos prenomes no ambiente doméstico e nas relações de proximidade social, ficando o sobrenome com essa função nas relações mais distantes. Já entre os brasileiros, a individuação pelo sobrenome é rara e, em geral, ocorre em situações revestidas de cerimônia. Portanto, os migrantes tiveram que fazer também esse ajuste de uso, que representava uma valorização do prenome.
  • 5
    Um mesmo indivíduo pode pertencer a vários grupos, assumindo dessa forma identidades diferentes, com diferentes pesos sociais. Portanto, a correlação entre um prenome e um determinado grupo não exclui que sua escolha seja multideterminada.
  • 6
    A etnicidade teuto-brasileira, ou a ideia de uma germanidade teuto-brasileira imposta por meio de uma ideologia (Deutschbrasilianertum), foi concebida a partir do século XIX e "está vinculada à ideia do pertencimento nacional pelo direito de sangue - uma formulação do nacionalismo alemão". "Como ideologia étnica, traz consigo uma inequívoca proposta de pluralismo étnico-cultural - cada grupo de imigrantes com direito de manter seus costumes, suas (sic) culturas e língua, e todos igualmente cidadãos brasileiros". (SEYFERT, 1994:17-18).
  • 7
    A rigor, a integração da comunidade imigrante não significa nem sua dissolução nem a perda completa de elementos diferenciadores. O processo é mais lento: a primeira fase da integração consiste na substituição do fundo original por um novo, teuto-brasileiro, que é uma recriação da cultura original no quadro de contradições resultantes do fenômeno de contato (Deutschbrasilianertum). Nessa etapa, os membros da comunidade estarão relativamente integrados, mas ainda conservarão traços próprios. Ultrapassando a integração, a completa "assimilação" constitui, de modo geral, a última etapa de contato do grupo com a sociedade receptora, a qual se cumpre em prazo mais longo.
  • 8
    Os prenomes bíblicos estão entre os mais antigos elementos alógenos da onomástica germânica.
  • 9
    SIEMENS, 1992:IX-X.
  • 10
    É preciso admitir o caráter aproximativo da metodologia empregada, que procura se adequar à realidade dos registros paroquiais e não à realidade viva da comunidade. O registro pode atestar o batismo de um menino com o nome de Friedrich, mas nada assegura que, no dia-a-dia, não fosse chamado Frederico. Ou o inverso. As diferenças de grafia também são duvidosas: acaso se desfaziam na pronúncia?
  • 11
    Na Tabela 1, colunas 2, 3, 7, 8 e 9.
  • 12
    São duas listas anuais, uma de prenomes masculinos, outra de prenomes femininos, com igual número de itens, que pode variar de 25 a 35 até 1939.
  • 13
    Disponíveis no citado sítio http://www.beliebte-vornamen.de.
  • 14
    KLAPISCH-UBER, 1984:41.
  • 15
    DAUAT, 1934:36.
  • 16
    L'innovation dans le choix des prénoms - prénoms "nouveaux", doubles ou multiples - s'est-elle portée d'abord sur les prénoms des filles ou sur ceux des garçons ? Le statut dévalorisé des filles a-t-il conduit à limiter l'imagination de ceux qui attribuent le prénom, ou bien doit-on penser que les règles de transmission des biens matériels et symboliques concernant de manière privilégiée les garçons, l'imagination peut se déployer à propos des filles puisque, dans ce cas, elle "elle tire moins à conséquence", la pression sociale étant moins forte ? (SCHNAPPER, 198417).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Dez 2008
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