Resumo
O manual La sociedad y la educación en América Latina, de 1962, de autoria principal de Robert Havighurst, da Universidade de Chicago, é objeto e fonte principal de análise deste artigo, que tem como objetivo analisar e refletir sobre os discursos construídos acerca dos projetos de educação e de sociedade engendrados para a América Latina, pensados no interior da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura). Para tanto, entende-se esta fonte como um manual didático construído para ser utilizado em cursos de formação de professores pela América Latina, atendendo aos propósitos de divulgar e de uniformizar determinado discurso interpretativo acerca da realidade latino-americana.
Palavras-chave:
educação; desenvolvimento; América Latina; Unesco; redes de sociabilidade
Abstract
The 1962 manual La sociedad y la educación en América Latina, by Robert Havighurst, of the University of Chicago, is the object and main source of analysis of this article, that aims to analyze and reflect on the discourses built about education and society projects engendered for Latin America, thought within Unesco (United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization). Therefore, this source is understood as a didactic manual built to be used in teacher training courses in Latin America, taking into account the purposes of disseminating and standardizing a certain interpretive discourse about the Latin American reality.
Keywords:
education; development; Latin America; Unesco; networks of sociability
Resumen
El manual La sociedad y la educación en América Latina, de 1962, de autoría principal de Robert Havighurst, de la Universidad de Chicago, es objeto y fuente principal de análisis de este artículo, que tiene como objetivo analizar y reflejar sobre los discursos creados a respecto de los proyectos de educación y de sociedad, engendrados para la América Latina, pensados en el interior de la Unesco (Organización de las Naciones Unidas para la Educación, Ciencia y Cultura). Por lo tanto, se entiende esta fuente como un manual didáctico hecho para ser utilizado en cursos de formación de profesores por la América Latina, teniendo en cuenta los propósitos de difundir y estandarizar un determinado discurso interpretativo sobre la realidad latinoamericana.
Palabras clave:
educación; desarrollo; América Latina; Unesco; redes de sociabilidad
Introdução
O presente trabalho propõe-se ao exercício de ampliar o olhar para além da educação brasileira e pensar nos discursos construídos no bojo de projetos engendrados para educação e sociedade na América Latina, especialmente os que estiveram voltados à formação de professores. No período analisado havia uma forte presença e influência dos organismos internacionais na região, como da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), da Cepal (Comissão Econômica para América Latina), da Divisão de Ciências Sociais da União Panamericana, todos estes procurando fomentar e articular estudos entre a educação e as ciências sociais.
Justamente o período pós-Segunda Guerra Mundial foi marcado por discussões em torno da educação e do desenvolvimento econômico, com destaque, por exemplo, para a teoria do capital humano, a qual apontava a necessidade de investimentos em seres humanos e encontrava seus pressupostos em teóricos como Adam Smith, Alfred Marshall e Irving Fisher.
Encontrava-se, nessa conjuntura, a educação como o caminho para se alcançar o desenvolvimento da economia e da sociedade dos países, justificando-se a interferência destes organismos em discursos políticos que deveriam agora estar ancorados em preceitos científicos estabelecidos por pesquisas relacionadas entre a educação e as ciências sociais. Pretendia-se, assim, “[...] a formação de uma elite dirigente, capaz de implementar o projeto desenvolvimentista para toda a América Latina, comprometida com os interesses gerais da nação e atuando acima dos interesses dos diferentes grupos” (Oliveira, 2005Oliveira, L. L. (2005). Diálogos intermitentes: relações entre Brasil e América Latina. Sociologias, 7(14), 110-129., p. 116).
A Sociologia, nessa perspectiva, assumia papel central nas pesquisas educacionais, com um caráter mais interdisciplinar. Os sociólogos latino-americanos, dentre eles Luiz de Aguiar Costa Pinto1 1 Luiz Aguiar da Costa Pinto foi um sociólogo brasileiro que dirigiu o Centro Latino Americano de Pesquisas Educacionais (CLAPCS), de 1958 a 1961, produzindo o Boletim do Centro Latino Americano de Pesquisas em Ciências Sociais (depois chamada de revista América Latina), articulando a interlocução com os mais diversos sociólogos latino-americanos (Daniel, 2019). , Gino Germani2 2 Gino Germani era italiano, mas viveu grande parte de sua vida na Argentina, onde se formou em Filosofia pela Universidade de Buenos Aires, na década de 1950. Desenvolveu, ao longo de sua trajetória, a Teoria de Transição para a Modernidade (Domingues & Maneiro, 2004; Cortés, 2012). e José Mediana Echevarría3 3 O sociólogo mexicano José Medica Echevarría (1903-1977) se destaca como um dos mais importantes intelectuais responsáveis pela institucionalização das ciências sociais na América Latina, desenvolvendo uma reflexão sobre os efeitos do projeto desenvolvimentista e as razões de seu fracasso (López, 2016). , pensavam as Ciências Sociais a partir do teórico Karl Mannheim, concebendo-a como ‘ciência de orientação’, ao acreditar no papel transformador do Estado. Para Mannheim (1946), os intelectuais eram os responsáveis pela condução da nação, não constituindo uma classe, estando, sim, acima das classes. Ainda segundo Mannheim (1946), os intelectuais constituiriam o único grupo social capaz de realizar a síntese das perspectivas parciais. Assim, “[…] em todas as esferas da vida cultural, a função das minorías é expresar as forças culturais e psíquicas em uma forma primária e orientar a extroversão e a intraversão coletivas. Eles são responsáveis pela iniciativa e tradição cultural” (p. 87, tradução nossa)4 4 “[...] en todas las esferas de la vida cultural, la función de las minorías selectas es expresar las fuerzas culturales y psíquicas en una forma primaria y orientar la extraversión y la intraversión colectivas. Son los responsables de la iniciativa y de la tradición culturales”. .
Em especial, a Unesco, órgão que compunha a Organização das Nações Unidas (ONU), tornou-se instância fundamental para o fomento de pesquisas que integravam estudos entre a educação e as ciências sociais, especialmente. Nesse caso, a institucionalização da Sociologia passou a ganhar maiores contornos com a ampliação dos espaços de socialização intelectual latino-americana, construindo uma ‘sociologia científica’, a partir, por exemplo, da criação de associações, reuniões etc. Vale destacar a criação da Associación Latinoamerica de Sociología (ALAS). Desde os anos 40 do século XX, a Sociologia na América Latina vinha passando por um processo crescente de institucionalização, rompendo as fronteiras do ensino nas universidades, no qual predominava a chamada ‘sociologia de cátedra’ ou ‘sociologia dos advogados’ (Vila, 2016Vila, E. E. (2016). El concepto de “desarrollo” y el proceso de institucionalización de las ciencias sociales latinoamericanas: instituciones, actores e ideas. In 9ª Jornadas de Sociología de la UNLP. La Plata, AR.)5 5 O período entre 1950-1973 é considerado o período da ‘sociologia científica’ e da configuração da Sociologia Crítica. Nesse período destacam-se duas iniciativas da Unesco: a criação do Centro Latino Americano de Pesquisas em Ciências Sociais (CLAPCS) e a fundação da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (FLACSO), em 1957. Nesse momento, vários intelectuais, como o sociólogo Luiz Aguiar da Costa Pinto, constroem uma crítica a essa ‘sociologia da modernização’ (Tavares-dos-Santos & Baumgarten, 2005). .
O debate educacional na América Latina, nesse sentido, foi sendo crivado por questões em torno de uma determinada organização dos sistemas de ensino, a partir de questões particulares em torno da relação educação e desenvolvimento, procurando explorar os fatores favoráveis ou desfavoráveis ao desenvolvimento econômico, bem como temáticas como a estratificação social e a mobilidade social, a urbanização, dentre outras. Dentre as teses sobre a educação, estava a de que esta era um instrumento básico do desenvolvimento, o qual, por sua vez, era condição essencial para gerar mais e melhor educação, assim como a de que os problemas educacionais deviam ser pensados como parte integrante de um processo e de uma política geral de desenvolvimento.
Entende-se, assim, que as ideias e políticas educacionais transcendiam, no período analisado, o limite dos países envolvidos, pensadas junto aos organismos internacionais, mostrando, por exemplo, que “[...] houve um esforço para estabelecer uma racionalidade científica que permitisse formular ‘leis gerais’ capazes de guiar, em cada país, a acção reformadora” (Teodoro, 2001Teodoro, A. (2001). Organizações internacionais e políticas educativas nacionais: a emergência de novas formas de regulação transnacional, ou uma globalização de baixa intensidade. In S. R. Stoer, L. Cortesão, J. A. Correia (Orgs.), Transnacionalização da educação - da crise da educação á ‘educação’ da crise (p. 1-23). Porto, PT: Edições Afrontamento., p. 127, grifo do autor).
Encontra-se, no interior desta discussão, a justificativa da proposta deste trabalho, que busca justamente refletir, tendo como fonte principal a obra La sociedad y la educación en América Latina, publicada em 1962, sobre: como essa obra foi produzida no interior do projeto da Unesco para pensar a educação e a sociedade, expressando determinadas concepções para a formação dos professores latino-americanos; como foi construída uma rede de sociabilidades para a construção dessa obra, considerada um manual a ser utilizado pelos professores na região; e compreender alguns dos principais entendimentos acerca do papel da escola e da educação na construção de uma determinada sociedade latino-americana.
Para tanto, entende-se essa fonte como um manual didático construído para ser utilizado em cursos de formação de professores pela América Latina, de acordo com as seguintes perspectivas: como produto objeto de um projeto de formação de professores articulado pela Unesco; como artefato construído com determinados propósitos e concepções; e como resultado de articulações intelectuais tecidas no interior de objetivos supranacionais, advindas dos organismos internacionais. Dessa forma, o Manual é analisado como discurso construído e compartilhado por uma ‘comunidade linguística’, que tem como propósito divulgar e uniformizar determinado discurso interpretativo acerca da realidade latino-americana (Pocock, 2003Pocock, J. G. A. (2003). Linguagens do ideário político. São Paulo, SP: EDUSP.).
Diante do exposto, o presente estudo propõe-se a oferecer alguns elementos para pensar materiais e manuais engendrados por organismos internacionais e que deveriam ser inseridos na formação de professores pela América Latina, entendendo-se que “[...] a estrutura do manual escolar é uma ordem da leitura. O manual é portador de uma memória de uma formação e de uma projeção. Há no complexo teórico e na configuração do manual uma modelação do aluno e uma idealização da sociedade” (Magalhães, 2008Magalhães, J. (2008). O manual escolar como fonte historiográfica. In J. V. Costa, M. L. Felgueiras, & L. G. Correia (Coord.), Manuais escolares da Biblioteca Pública Municipal do Porto (p. 13-22). Porto, PT: Faculdade de Letras do Porto., p. 7).
O manual e seus propósitos
Foi dentro do Proyecto principal de educación6 6 O Projeto Principal nº 1 foi apresentado em 1956, na Conferência Regional Latino-Americana sobre Educação Primária Gratuita e Obrigatória, com plano de execução de 10 anos. Dentre as iniciativas do governo brasileiro para colaborar com o projeto, está a organização de cursos de formação de especialistas em organização, com convênio firmado entre o Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP), o Centro Regional de Pesquisas Educacionais de São Paulo (CRPE/SP) e a Universidade de São Paulo (USP) (Maluhy, 2010). da Unesco para América Latina que La sociedad y la educación en América Latina foi idealizada e produzida, sendo editada pelo Editorial Universitaria de Buenos Aires, em convênio especial com a Unesco. O projeto foi construído por diversos especialistas de diferentes países e pretendia: estimular o planejamento sistemático da educação nos países da América Latina; fomentar a extensão de serviços de educação primária; revisar os planos e programas de estudos da escola primária; melhorar os sistemas de formação do professor primário7 7 A preocupação com a formação de professores primários nos países latino-americanos era latente no interior do Projeto Principal. Era propósito aumentar o número de professores, bem como a qualidade da sua formação, que deveria passar por ‘uma renovação na doutrina formativa’, com formação cultural sólida, formação em novas orientações pedagógicas, como a sociologia, psicologia social, dentre outras (Boletín do Proyecto Principal de Educación Unesco-América Latina, 1959). ; e preparar dirigentes e especialistas em educação no nível superior (Boletín do Proyecto Principal de Educación Unesco-América Latina, 1959).
Para Xavier (1999Xavier, L. N. (1999). O Brasil como laboratório: educação e ciências sociais no projeto do Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais: CBPE/INEP/MEC (1950-1960). São Paulo, SP: IFAN/CDAPH/EDUSF., p. 134), em especial, essa preocupação com a especialização do magistério demonstrada pelo projeto respondia à necessidade de racionalização requerida pela sociedade naquele momento, acreditando-se que o aumento de lideranças tecnicamente preparadas “[...] constituiria a base sobre a qual o sistema escolar e a vida educacional dos países da América Latina se ajustariam às necessidades de desenvolvimento cultural e econômico”.
A obra foi encomendada pela Unesco ao professor Robert Havighurst (1900-1991)8 8 Em 1940 Havighusrt assumiu o cargo de professor de Educação e de Secretário Executivo do Comitê de Desenvolvimento Infantil na Universidade de Chicago, desenvolvendo pesquisas na área da educação, psicologia e sociologia, abordando temas como educação juvenil, processos de envelhecimento, educação urbana, dentre outros (Daniel, 2009). , da Universidade de Chicago9 9 A Universidade de Chicago foi criada em 1895, mediante doação de um milionário americano chamado John D. Rockefeler. No interior da universidade, a sociologia passou a ser tomada como ciência capaz de direcionar uma reforma social na sociedade americana, voltando-se para o “[...] equacionamento dos problemas sociais que afligiam as grandes cidades americanas” (Becker, 1996, p. 178). , uma das instituições que, ao lado de Columbia, Harvard e Berkeley, “[...] se converteram nos novos centros das ciências sociais e no lugar de assimilação do seu métier” (Blanco, 2007Blanco, A. (2007). Ciências sociais no Cone Sul e a gênese de uma elite intelectual (1940-1965). Tempo Social, Revista de Sociologia da USP, 19(1), 89-114., p. 95, grifo do autor).
Em diversos momentos, ainda na década de 1950, o professor Havighusrt participou de pesquisas e projetos, por exemplo, no interior do Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais (CBPE) ao lado de João Roberto Moreira. Havighusrt traduziu para o inglês o livro Educação e desenvolvimento no Brasil, de autoria de Moreira e publicado pelo Centro Latino-Americano de Pesquisas Educacionais (CLAPCS). O livro em inglês foi intitulado Society and education in Brazil e publicado em 1965 pela Universidade de Pittsburgh, fazendo parte da coleção Comparative Education Series. Moreira e Havighurst estiveram intimamente relacionados em projetos pela Unesco, estando também interligados pelo desenvolvimento de estudos de educação comparada em diversos países latino-americanos (Daniel, 2009Daniel, L. S. (2009). O intelectual João Roberto Moreira (1912-1967): itinerários para uma racionalidade ativa (Tese de Doutorado). Universidade Federal do Paraná, Curitiba.). Entende-se, para tanto, que Havighust atuou como intelectual mediador, na medida em que
[...] esse intelectual muitas vezes, ocupa um cargo estratégico numa instituição cultural, pública ou privada, numa associação ou organização política, ou atua desde um lugar privilegiado numa rede de sociabilidades, de onde protagoniza projetos de mediação cultual de enormes impactos políticos (Gomes & Hansen, 2006Gomes, Â. C., & Hansen, P. S. (2006). Apresentação: intelectuais, mediação cultural e projetos políticos: uma introdução para a delimitação do objeto de estudo. In Â. C. Gomes, & P. S. Hansen (Orgs.), Intelectuais mediadores: práticas culturais e ação política (p. 7-37). Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira., p. 19).
Ainda em 1959, em publicação do Boletín do Proyecto Principal de Educación Unesco-América Latina, de nº 1, aponta-se o projeto da obra10 10 Além dessa obra, havia a intenção de publicação de um Manual sobre Fundamentos de Educação, encomendado ao professor Larroyo, da Universidade do México, além de um volume sobre o estado da educação na América Latina, a ser preparado pelo Departamento de Educação da Unesco e Centro Regional de Havana. O Manual de Fundamentos da Educação teria como colaboradores Antonio Ballesteros, Robert Dottrens, Lourenço Filho, Juan Mantovani e Domingo Tirado Beneti (Boletín do Proyecto Principal de Educación Unesco-América Latina, 1959). , indicando que “[...] “Um Manual de Sociologia e Educação para professores será publicado em meados de 1959. Dirigido pelo Dr. Havighurt, da Universidade de Chicago, nele colaboraram ilustres sociólogos e colaboradores latino-americanos” (1959, p. 15, tradução nossa)11 11 “[...] un Manual sobre Sociología y Educación destinado a los maestros será publicado a mediados del año 1959. Dirigido por el Dr. Havighurt, de la Universidad de Chicago, han colaborado en él distinguidos sociólogos y colaboradores latinoamericanos”. .
Como uma das preocupações da Unesco para esse projeto, estava a necessidade de criação de um vocabulário comum com referenciais teóricos e metodológicos advindos das Ciências Sociais com objetivo de orientação na criação das políticas educacionais em cada país. Para tanto, entende-se que essa obra vai ao encontro deste propósito, articulando intelectuais da região, integrando questões e explicações comuns e uniformizando um discurso interpretativo acerca da realidade latino-americana. Destinada aos professores, a divulgação e o uso do manual colaborariam para a construção de uma determinada explicação e, por conseguinte, para a proposição de soluções ancoradas nas perspectivas ideológicas da UNESCO construídas para a região latino-americana12 12 Ao final da obra, encontra-se um glossário, contendo palavras próprias do campo da pesquisa em ciências sociais. São elas: aculturação, associação, cultura, ecologia, função, instituição, personalidade, classe social, papel social, estratificação social e socialização. . Dessa forma,
[...] o ato de comunicação expõe nossos textos a leitores que irão interpretá-los a partir de pontos de referência que não são os nossos, e o ato da publicação, no sentido normal de ‘tornar público’, representa um abandono da tentativa de determinar quem esses leitores devem ser, ao mesmo tempo em que tenta maximizar o número de leitores sobre os quais nossos escritos devem atuar (Pocock, 2003Pocock, J. G. A. (2003). Linguagens do ideário político. São Paulo, SP: EDUSP., p. 53, grifo do autor).
Em sua introdução, deixa-se claro que o livro serviria como um manual para os educadores latino-americanos e para ser usado em Escolas Normais e Universidades da América Latina, no qual aponta que “[...] Este Manual pretende apenas servir de complemento aos grandes tratados de sociologia da educação escritos por autoridades latino-americanas, como a ‘Sociologia da Educação’ de Fernando de Azevedo”. (Havighusrt, 1962, p. 7, tradução nossa, grifo do autor)13 13 “[...] el presente Manual sólo aspira a servir de complemento a los grandes tratados de sociología de la educación escritos por autoridades latino-americanas, tales como la Sociología de la Educación, de Fernando de Azevedo”. .
Aos professores, por conseguinte, era necessário fornecer instrumentos científicos para pensar o papel da escola e intervir nos problemas educacionais e sociais que eles encontrariam. Um projeto, portanto, de formação de professores singular para todos os países da América Latina, com os mesmos entendimentos e conceitos a serem difundidos, ancorados em uma perspectiva sociológica de cunho estrutural-funcionalista de pensar a sociedade e a escola, no qual “[...] tendem a ver a sociedade como ontologicamente anterior ao homem, colocando o homem e suas atividades dentro deste contexto maior” (Cabral, 2004Cabral, A. (2004). A sociologia funcionalista nos estudos organizacionais: foco em Durkheim. Cadernos EBAPE.BR, 2(2), 1-15., p. 12).
O MANUAL, SUA ORGANIZAÇÃO E SEUS COLABORADORES
A obra, publicada em espanhol, mas escrita originalmente em inglês e português, foi feita por Robert Havighurst com a participação de vários colaboradores: Andrew Pearse (sociólogo, especialista da UNESCO e integrante do CBPE), profa. Dalilla C. Sperb (professora e orientadora de ensino primário do estado do Rio Grande do Sul), Julio de la Fuente (do Instituto Nacional Indigenista do México), Adolfo Maillo (diretor do Centro de Documentação e Orientação Didática do Ensino Primário de Madri) e Egidio Orellan (Universidade do Chile).
Havighurst, assim, configura-se como um articulador na construção do Manual, utilizando uma rede de sociabilidade, na qual pesquisadores da região e suas pesquisas são utilizadas para a construção retórica da obra (Sirinelli, 2003Sirinelli, J.-F. (2003) Os intelectuais. In R. Rémond (Org.), Por uma histórica política (2a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Editora FGV.). Parte-se, assim, do entendimento de que ele se caracteriza como um intelectual mediador, o qual
[...] se volta para práticas culturais de difusão e transmissão, ou seja, práticas que fazem ‘circular’ os produtos culturais em grupos sociais mais amplos e não especializados. Tais intelectuais seriam aquele voltados para a construção de representações que têm grande impacto numa sociedade (Gomes & Hansen, 2016, p. 26, grifo do autor).
Organizada em 16 capítulos, com um total de 336 páginas, a obra possui um caráter notadamente didático, com assunto específico tratado em cada parte, com os seguintes títulos: 1. Sociedad y socialización; 2. Socialización y aprendizaje de las lealtades sociales; 3. Grupos Étnicos y culturales indígenas en la América Latina; 4. Caracteres nacionales y subculturas em América Latina; 5. Los cambios demográficos y sus consecuencias educativas; 6. Desarrollo económico y educación; Los cambios sociales y la educación; 7. Los cambios sociales en la América Latina; 8. Las clases sociales en la América Latina; 9. La familia y la mujer en América Latina; 10. Las diversidades sociales y culturales y la educación; 11. Política social y educativa en relación con la población indígena; 12. Las grandes asociaciones y sus funciones educativas; 13. Escuela y comunidad; 14. La escuela, factor de integración social y cultural; 15. La escuela como grupo social; 16. El maestro.
Além da introdução, o manual também apresenta, ao final, um glossário com 11 conceitos próprios da área das Ciências Sociais, que são: Aculturación, Asociación, Cultura, Ecología, Función, Institución, Personalidad, Clase Social, Papel Social, Estratificación Social, Socialización.
A partir das explicações sobre determinados conceitos utilizados ao longo da obra, permite-se inferir que estes eram compartilhados pelos autores que colaboravam na obra e que faziam parte de um determinado contexto linguístico partilhado, de maneira que
[...] cada contexto linguístico indica um contexto político, social ou histórico, no interior do qual a própria linguagem se situa. Contudo, neste mesmo ponto, somos obrigados a reconhecer que cada linguagem, em certa medida, seleciona e prescreve o contexto dentro do qual ela deverá ser reconhecida (Pocock, 2003Pocock, J. G. A. (2003). Linguagens do ideário político. São Paulo, SP: EDUSP., p. 37).
O texto também apresenta uma forma narrativa de cunho científico, mesclando momentos de uma discussão mais teórica de determinado assunto com excertos significativos de relatos e pesquisas de autores, majoritariamente, latino-americanos, tratando de questões sobre a América Latina e sua educação. No Quadro 1 a seguir, apresentam-se autores e obras referenciados no Manual.
Autores e obras presentes no Manual14 14 A organização desse quadro tem como objetivo principal dar visibilidade a esses autores, em grande parte, latino-americanos, que realizaram estudos em universidades americanas e que colaboraram para os trabalhos da Unesco no continente. Como já destacado, um dos objetivos deste texto foi procurar tratar aspectos do objeto, o Manual, de forma transnacional, a partir de perspectivas supranacionais. Contudo, até o momento, não se localizaram outros estudos que tenham se debruçado sobre esse material ou sobre muitos dos autores mencionados. Vislumbra-se, assim, em futuras pesquisas, realizar intercâmbio com outros pesquisadores e avançar nessas análises mais abrangentes. .
As referências podem ser categorizadas de duas formas: autores latino-americanos referências nos seus países e autores de maior vulto intelectual, como de universidades norte-americanas. Na escrita do manual, Havighurst normalmente introduz uma discussão e, em seguida, cita longos excertos destes textos. Muitos desses autores latino-americanos estudaram ou estavam estudando em universidades americanas, mostrando uma sintonia entre as concepções e os conceitos utilizados nos estudos, coadunados a um projeto de formação de especialistas latino-americanos para pensar e atuar nos seus países, em geral, a serviço da Unesco.
A obra ainda apresenta, ao final de cada capítulo, um resumo e uma lista de exercícios acerca das principais questões tratadas naquele item. Os exercícios, ao longo do livro, mostram um caráter prático, procurando levar o futuro professor a pensar e atuar na realidade escolar no próprio país, assim como na América Latina, como no seguinte enunciado: “Após a leitura das descrições do processo de socialização na classe média alta do Brasil e em uma família camponesa pertencente à classe baixa, residente em uma favela da cidade, escreva uma redação indicando as principais diferenças que se percebem entre esses dois grupos culturais” (Havighurst, 1962Havighurst, R. J. (1962). La sociedad y la educación en América Latina. Buenos Aires, AR: Editorial Universitaria de Buenos Aires., p. 44, tradução nossa)17 17 “Después de leer las descripciones del proceso de socialización en la clase media superior del Brasil y en una familia campesina perteneciente a la clase inferior, que vive en un barrio bajo de la ciudad, escriba una composición indicando las diferencias principales que se advierten entre esos dos grupos culturales”. .
As perguntas têm um caráter notadamente marcado pelas diferenças culturais e sociais presentes nos países, mas que buscam levar o licenciando a comparar e buscar pensar soluções para determinadas questões em suas terras natais, a partir de estudos de outros países, como o evidenciado na questão seguinte: “[...] estudar os grupos de aculturação espontânea que podem ocorrer em seu país, comparando o processo ao qual obedecem com aquele que o Dr. León Portilla menciona para o México” (Havighurst, 1962Havighurst, R. J. (1962). La sociedad y la educación en América Latina. Buenos Aires, AR: Editorial Universitaria de Buenos Aires., p. 57, tradução nossa)18 18 “[...] estudie los grupos de aculturación espontánea que pueden darse en su país, comparando el proceso a que obedezcan con el que menciona para México, el Dr. León Portilla”. .
Questões sobre os desafios e problemas da educação latino-americana são a maioria, as quais tratam de temas como educação da mulher, educação rural, escola e mobilidade social, classes sociais e tipos de escolaridade, dentre outros.
Por fim, os problemas sociais enfrentados em cada país são colocados de forma articulada às possibilidades da educação em resolvê-los. As políticas educacionais, assim como o papel a ser assumido pela escola na sociedade, são temáticas recorrentes no interior dos organismos internacionais nesse período, as quais são levadas diretamente para serem pensadas também pelos futuros professores. Conceitos sociológicos, assim, são mobilizados para serem divulgados e utilizados no interior do campo educacional latino-americano.
O MANUAL E SUAS PRINCIPAIS TESES ACERCA DA RELAÇÃO EDUCAÇÃO E SOCIDADE
O Manual fora escrito em meio aos desafios que se colocavam naquele momento para o continente, principalmente depois da Segunda Guerra Mundial. No campo da Sociologia, a partir da década de 1950, surgia uma nova categoria para pensar os países latino-americanos, na qual o termo ‘atraso’ foi substituído pelo ‘subdesenvolvimento’ em análises realizadas, em especial, pela Comissão Econômica para América Latina (Cepal), órgão das Nações Unidas. No interior da sociologia:
O grande tema passa a ser a Mudança Social. A sociologia voltou-se para a pesquisa sobre os condicionantes sociais do desenvolvimento; as resistências à mudança, a dicotomia arcaico versus moderno. Explicar como a sociedade se desenvolve passou então a ser questão central das ciências sociais da época - como definir claramente entre tradição e modernidade; como encontrar os substitutos funcionais da ética protestante para localizar as modernizações que teriam condições de dar certo; como entender as diferentes etapas deste processo. As mazelas sociais - personalismo, familismo, patrimonialismo - explicariam, por sua pré-modernidade, as dificuldades e diferenças no processo nas etapas do desenvolvimento. Tudo isso valeu para o Brasil e para a América Latina e conformou o pensamento e as propostas dos intelectuais e dos cientistas sociais (Oliveira, 2005Oliveira, L. L. (2005). Diálogos intermitentes: relações entre Brasil e América Latina. Sociologias, 7(14), 110-129., p. 116).
Nesse momento, a Sociologia marcadamente de viés europeu e norte-americano contribuiu para moldar uma visão etapista do mundo ocidental, reforçando a ideologia colonizadora, devendo os países ‘subdesenvolvidos’ tomar como modelo a modernização dos países mais desenvolvidos. Para tanto, colocava-se a necessidade de investimento em avanços tecnológicos, científicos, econômicos e políticos, tornando a educação um meio para alcance desses objetivos (Martins, 2019Martins, P. H. (2019). Sociologia na América Latina: giros epistemológicos e epistêmicos. Revista Sociedade e Estado, 34(3), 689-718.). A tese era de que a modernização pudesse fazer desaparecer o subdesenvolvimento, assim como os desequilíbrios regionais e as injustiças sociais.
Tais perspectivas perpassam a obra analisada e trazem determinados entendimentos acerca da sociedade e da educação, no interior, como já destacado, da tradição sociológica funcionalista, que tem como procedimento básico a objetividade na compreensão das relações sociais. Seu principal representante e fundador é Émile Durkheim, “[...] que inaugurou os estudos sociológicos sobre educação [...] e estabeleceu as bases teóricas para a sociologia da educação como um ramo específico da sociologia” (Costa, 2019Costa, E. G. (2019). A educação na tradição sociológica funcionalista: uma análise comparativa entre Durkheim, Parsons e Luhmann. Revista del Magíster em Análisis Sistémico Aplicado a la Sociedade, (39), 83-99., p. 85).
Para tanto, com uma linguagem de cunho sociológico, o Manual se organiza de forma a apontar, já nos títulos, os principais problemas culturais e educacionais dos países latino-americanos, numa perspectiva discursiva que se organiza de forma a evidenciar o problema, analisar sociologicamente (à luz de conceitos do campo) e encaminhar apontamentos para solução. Nesse caso, o principal propósito da Sociologia é identificar, por meio dos métodos científicos, os problemas sociais e buscar soluções para eles, pois o desconhecimento deles dificulta o desenvolvimento da sociedade.
Ao analisar a narrativa da obra, destacamos quatro teses presentes e que colaboram para a elucidação das concepções em torno da idealização de educação e sociedade expressas para o continente latino-americano, que são: a relação entre educação e o desenvolvimento social-econômico; a escola como fator essencial para a promoção da integração social e cultural da região; a educação formal como função do Estado; e o papel social desempenhado pelo professor na organização da escola.
A primeira tese trata da relação estabelecida entre a educação e o desenvolvimento social-econômico. Em diversos momentos da obra, é explicitada, por meio de dados econômicos, a situação de atraso econômico da região, principalmente comparada ao continente europeu. Como principais desafios desse processo, estavam: o aumento gradativo da população; o aumento rápido da população urbana, devido à imigração da zona rural; à mudança da estrutura social, com o surgimento de uma classe média mais numerosa e uma redução da classe trabalhadora dedicada aos trabalhos manuais; e ao aumento da renda per capita na maioria dos países latino-americanos.
No interior dessas questões, apareciam, ao mesmo tempo, o grande número de analfabetos e a dificuldade para gerar mão de obra qualificada para novas ocupações. O Manual aponta que na América Latina a diversidade cultural era complexa e, para tanto, a escola, considerada precária na região, precisava se adequar a essa realidade, da mesma forma que atender às necessidades do capitalismo. A tese era de que a escola precisava ser reformada com o objetivo de atender a essas necessidades, proporcionando mobilidade social aos indivíduos, à medida que estes aproveitassem suas experiências educativas, evidenciando uma relação “[...] muito estreita entre a educação e o desenvolvimento econômico de um país” (Havighurst, 1962Havighurst, R. J. (1962). La sociedad y la educación en América Latina. Buenos Aires, AR: Editorial Universitaria de Buenos Aires., p. 95, tradução nossa)19 19 “[...] muy estrecha entre la educación y el desarrollo económico de un país”. .
A educação, assim como o sistema de ensino nos países latino-americanos, precisava se adequar, construindo um determinado ideal de sujeito e assumindo a função adaptadora, moralista e disciplinadora, na qual a meritocracia regularia as funções a serem desempenhadas pelos indivíduos, bem como sua mobilidade social ou ascensão social. Como proposta, a educação primária deveria ser estendida a toda a população, porque melhoraria a qualidade da força de trabalho e favoreceria o desenvolvimento da economia. O ensino secundário também deveria ser ampliado, mas não deveria ser estendido a toda a população, estabelecendo um ‘tipo funcional de educação’, atendendo às funções comerciais e técnicas, sendo de cunho mais prático (Havighurst, 1962Havighurst, R. J. (1962). La sociedad y la educación en América Latina. Buenos Aires, AR: Editorial Universitaria de Buenos Aires.).
O ensino superior, por fim, também deveria ser expandido na região, preparando os indivíduos para a área da tecnologia e do comércio, instruindo os professores e profissionais da saúde. Assim, segundo tais indicações, haveria
Uma tendência geral em favor de um tipo ‘funcional’ de educação destinada à preparação de numerosos indivíduos que podem encarregar-se dos assuntos próprios da sociedade, em contrate com uma educação dirigida a manter o status social da clase alta e de uma pequena classe média alta (Havighurst, 1962Havighurst, R. J. (1962). La sociedad y la educación en América Latina. Buenos Aires, AR: Editorial Universitaria de Buenos Aires., p. 95, tradução nossa, grifo nosso, p. 212)20 20 “Una tendencia general en favor de un tipo ‘funcional’ de educación destinada a la preparación de numerosos individuos que pueden encargarse de los asuntos prácticos de la sociedad, en contraste con una educación dirigida a mantener el status social de la clase superior y de una pequeña clase media superior”. .
Para tanto, o que o texto mostra são os fundamentos da Teoria de capital humano do autor Theodor Schultz, a qual afirma que, à medida que ocorre o crescimento econômico e a diversificação das produções, tornam-se necessárias capacitações técnicas mais altas, devendo a educação ser flexível para o fornecimento de serviços educacionais de forma suficiente para a sociedade (Schultz, 1973)21 21 Theodor Schultz é citado ao longo do Manual, destacando os artigos: This New Word: The Civilization of Latin America, de 1956; The economic test in Latin America, de 1956; dentre outros. . A educação, assim, assumia uma função central no alcance desse projeto de sociedade, no qual “[…] a educação é, simultaneamente, um ‘espelho’ que reflete o status que existe em uma determinada sociedade e uma força aplicada a mudar esta mesma sociedade” (Havighurst, 1962Havighurst, R. J. (1962). La sociedad y la educación en América Latina. Buenos Aires, AR: Editorial Universitaria de Buenos Aires., p. 163, tradução nossa, grifo do autor) 22 22 “[…] la educación es, simultáneamente, un ‘espejo’ que refleja el status que existe en una determinada sociedad y una fuerza aplicada a cambiar esa misma sociedad”. .
Destacamos, nesse sentido, a segunda tese explicitada na obra, a qual considera a escola fator essencial para a promoção da integração social e cultural da região, bem como para provocar a mobilidade social, principalmente por meio de suas funções essenciais de socialização e de aculturação dos indivíduos. A educação é entendida, tal como expresso por Durkheim, como elemento adaptador dos indivíduos à sociedade, de forma que o sistema social funcionasse de forma harmônica e sistêmica, sendo a escola primária esse elemento ‘unificador’ ou ‘integrador’ das populações latino-americanas, já que deveria ser estendida a toda a população, visto que, para ele, “[....] a educação existe para atender a uma necessidade eminentemente social. Ela tem como sua principal tarefa modelar os indivíduos, garantindo um estado de ordem e coalescência social, totalmente necessário ao desenvolvimento da sociedade” (Costa, 2019Costa, E. G. (2019). A educação na tradição sociológica funcionalista: uma análise comparativa entre Durkheim, Parsons e Luhmann. Revista del Magíster em Análisis Sistémico Aplicado a la Sociedade, (39), 83-99. p. 87).
A aculturação (processo em que duas culturas se encontram e, como resultado, uma ou ambas passam a se transformar ou ser modificada), termo cunhado no interior da Antropologia, também é utilizada, principalmente ao se referir aos grupos étnicos e culturas indígenas latino-americanos (Panoff & Perrin, 1973Panoff, M., & Perrin, M. (1973). Dicionário de etnologia. Lisboa, PT: Edições 70.). Para tanto, “[…] não existe um único tipo familiar latinoamericano” (Havighurst, 1962Havighurst, R. J. (1962). La sociedad y la educación en América Latina. Buenos Aires, AR: Editorial Universitaria de Buenos Aires., p. 155, tradução nossa)23 23 “[…] no existe un solo tipo familiar latinoamericano”. . A escola, considerada instituição social especializada, também nesse caso tem papel central ao promover integração social e cultural da região de forma pacífica, já que “[…] no cerne de uma sociedade complexa, a educação é chamada a desempeñar um grande papel. É necessário tanto para reducir prejuízos entre os grupos, como para promover as práticas integradoras positivas dentro da sociedade” (Havighurst, 1962, p. 177, tradução nossa)24 24 “[…] en el seno de una sociedad compleja, la educación está llamada a desempeñar un gran papel. Es necesaria tanto para reducir prejuicios entre los grupos, como para promover las prácticas integradoras positivas dentro de la sociedad”. .
A aculturación, nesse sentido, é entendida, conforme indicado no seu glossário, como
[…] o processo pelo meio do qual um individuo adquire uma cultura até então nova e estranha para ele. O término se aplica geralmente ao proceso mediante ao qual um membro de uma cultura popular aprende uma cultura mais complexa ou ‘moderna’, mas poderia ser também aplicado ao proceso mediante ao qual a criança se faz membro de um grupo cultural. Neste sentido, o termo é sinónimo de ‘socialização’. (Havighusrt et al., 1962, p. 7, tradução nossa, grifo do autor)25 25 […] el proceso por medio del cual un individuo adquiere una cultura hasta entonces nueva y extraña para él. El término se aplica generalmente al proceso mediante el cual un miembro de una cultura popular aprende una cultura más compleja o ‘moderna’, pero podría ser también aplicado al proceso mediante el cual el niño se hace miembro de un grupo cultural. En este sentido el término es sinónimo de ‘socialización’. .
Para tanto, encontra-se a terceira tese destacada, que é a de que a oferta da educação formal cabe ao Estado, estabelecendo uma relação íntima com a garantia dos regimes democráticos nos países. Ainda destaca que o Estado é responsável por manter as escolas públicas, mas por ajudar também economicamente as escolas privadas e religiosas. Tal tese está presente nos discursos dos principais intelectuais do período, que se colocam como a ‘elite esclarecida’ a realizar as reformas educacionais necessárias para a nova realidade colocada, cunhando uma espécie de ‘neutralidade científica’ diante dos encaminhamentos políticos indicados, colocando-se os pensadores sociais como intérpretes do significado da construção de uma determinada sociedade (Tavares-dos-Santos & Baumgarten, 2005Tavares-dos-Santos, J. V., & Baumgarten, M. (2005). Contribuições da sociologia da América Latina à imaginação sociológica: análise, crítica e compromisso social. Sociologias, 7(14), 178-243.).
Em tal caso, também o professor desempenhava função importante, com papéis sociais estratégicos, sendo peça-chave na construção dessa escola idealizada para a América Latina.
A obra dedica seu último capítulo, intitulado El Maestro, à discussão do perfil e da função do professor latino-americano. Dentre as principais características destacadas, estavam as diferenças sociais entre professores primários e secundários e a predominância do gênero feminino, sendo estas mulheres casadas e com filhos. Diante disso, aponta-se como problema o fato de a mulher ter muitos afazeres para além da escola e não conseguir ser ‘profissional’ o bastante para se envolver nas questões da escola e da comunidade. Assim, “[…] a professora primaria tende a ser menos ‘profissional’ em suas atividades que o profesor secundário e não pertenece tão próxima como este à organização dos profesores, não lê revistas educativas, etc” (Havighurst, 1962Havighurst, R. J. (1962). La sociedad y la educación en América Latina. Buenos Aires, AR: Editorial Universitaria de Buenos Aires., p. 326, tradução nossa, grifo do autor)26 26 “[…] la maestra primaria tiende a ser menos ‘profesional’ em sus actividades que el profesor secundario y no pertenece tan a menudo como éste a las organizaciones de maestros, no le revistas educativas, etc”. .
Assim, mostra-se o intuito principal com o Manual, que é o de fornecer ao professor normalista os instrumentos necessários para sua intervenção social e, desse modo, conseguir lograr a construção de uma determinada sociedade.
Ao professor é atribuída uma série de papéis sociais, assim como na comunidade e na escola, entendendo que “[...] o trabalho do professor pode ser concebido como um complexo de papéis sociais” (Havighurst, 1962Havighurst, R. J. (1962). La sociedad y la educación en América Latina. Buenos Aires, AR: Editorial Universitaria de Buenos Aires., p. 325, tradução nossa)27 27 “[...] el trabajo del profesor pude ser concebido como un complejo de papeles sociales”. . Na comunidade, ele assume uma série de subpapéis, como: o participante dos assuntos da comunidade, a pessoa erudita, a pessoa de cultura, o representante da moralidade da classe média e o ‘forasteiro sociológico’. Este último papel entendido como:
Ao mesmo tempo em que se deseja que o professor participe da comunidade, se considera que seja ‘forasteiro’ nesta e não se inteire dos problemas correntes da comunidade nem participe das rivalidades locais. Em geral, considera-se que os professores jovens sejam somente residentes temporários e que logo partam para outras comunidades. A imagem da professora primária que se desloca de bicicleta da cidade com o objetivo de ensinar a ler e escrever às crianças e que logo retorne ao seu lugar, é a imagem de um forasteiro sociológico (Havighurst, 1962Havighurst, R. J. (1962). La sociedad y la educación en América Latina. Buenos Aires, AR: Editorial Universitaria de Buenos Aires., p. 317, tradução nossa, grifo do autor)28 28 “Al mismo tiempo que se desea que el profesor participe en la comunidad, se confía que sea ‘forastero’ en ella y no se entere de los chismes corrientes en la comunidad ni participe en las rivalidades locales. Por lo general, se piensa que los profesores jóvenes sólo serán residentes temporales y que luego se irán a vivir en otras comunidades. La imagen de la maestra rural que viene en bicicleta desde la ciudad con el objectivo de enseñar a leer y escribir a los niños y que luego vuelve a su hogar, es la imagen de un forastero sociológico”. .
Mostra-se uma diferenciação e propõe-se um distanciamento do professor com relação à sua realidade, com um viés, de alguma forma, ‘científico’, tanto na leitura dos fatos sociais, como na sua intervenção, mediante função educativa.
Na escola, da mesma forma, o professor assume uma série de subpapéis, que são: o professor como instrutor, o professor como organizador de uma situação de aprendizagem, o professor como mantenedor da disciplina, o professor como substituto dos pais, o professor como juiz e o professor como confidente. Nesse caso:
[…] estes papéis por vezes entram em conflito, de modo que o professor habilidoso combina os subpapéis que são mais apropriados à situação actual, isto é, aqueles que são mais satisfatórios para a comunidade e, ao mesmo tempo, mais adequados à sua personalidade (Havighurst, 1962Havighurst, R. J. (1962). La sociedad y la educación en América Latina. Buenos Aires, AR: Editorial Universitaria de Buenos Aires., p. 326, tradução nossa)29 29 “[…] estos papeles entran a veces em conflicto, de modo que el profesor hábil combina los sub-papeles que resultan más apropiados a la situación presente, o sea aquellos que son más satisfactorios para la comunidad, y que, al mismo tiempo, se adaptan mejor a suja personalidad traducir”. .
As leituras sociológicas engendradas no Manual inserem-se, portanto, numa perspectiva pouco crítica da realidade, que só vai ser de fato modificada no final da década de 1960, quando se inicia a configuração de uma ‘Sociologia Crítica’, que passa a questionar os pressupostos da ‘Sociologia da Modernização’, estabelecendo diálogos múltiplos entre autores inconformistas americanos, marxistas heterodoxos franceses e ingleses (Tavares-dos-Santos & Baumgarten, 2005Tavares-dos-Santos, J. V., & Baumgarten, M. (2005). Contribuições da sociologia da América Latina à imaginação sociológica: análise, crítica e compromisso social. Sociologias, 7(14), 178-243.).
Considerações finais
Considera-se que as concepções de escola e de sociedade expressas nesse Manual mostram a realidade de uma região compreendida como atrasada, culturalmente diversa e que não estava em consonância com as demandas do capitalismo mundial. Sinônimos como rudimentar e arcaico serviam como parâmetro para caracterizar o continente latino-americano e, assim, pautar determinadas mudanças expressas e direcionadas por organismos internacionais, como a Unesco, articulando as ciências sociais para pesquisar e direcionar as políticas educacionais no período para a região.
O esforço deste artigo, além de trazer discussões e concepções presentes, foi o de exercitar análises para além de fronteiras nacionais e buscar articulações pensadas para os países do continente latino-americano, ao mesmo tempo tão diverso, mas também permeado pelas mesmas questões desafiadoras que atravessaram e ainda atravessam os últimos séculos pós-colonização. Nesse sentido, discutir, por exemplo, a função do professor na sociedade parece elucidar questões profícuas, que poderiam ultrapassar os ditames oficiais e vislumbrar na prática como se deram tais propostas.
O Manual analisado insere-se numa matriz de poder marcadamente colonialista, baseada no racismo como forma de poder e na supremacia branca, no qual os povos originários latino-americanos são subjugados e submetidos a processos de aculturação e socialização no interior da chamada sociedade capitalista, a partir especialmente da função da escola (Reis, 2022Reis, D. S. (2022). A colonialidade do saber: perspectivas decoloniais para repensar a univers(al)idade. Revista Educação & Sociedade, 43, 1-12.).
O discurso analisado permite compreender um projeto encampado pela Unesco, que visava à formação e conformação de consciências, pautado por léxicos científicos, especialmente, advindos das Ciências Sociais e compartilhados por determinados intelectuais construtores de sentidos.
Ainda que uma fonte ancorada e produzida numa perspectiva colonial, ela pode ser interessante ponto de partida para recuperar observações realizadas pelos pesquisadores do Manual, as quais podem ser reinterpretadas numa perspectiva de descolonização dos saberes, a partir de novas problemáticas e concepções.
Referências
- Becker, H. (1996). A escola de Chicago. MANA, (2), 177-188.
- Blanco, A. (2005). La Asociación Latinoamericana de Sociología: una historia de sus primeros congresos. Sociologias, 7(14), 22-49.
- Blanco, A. (2007). Ciências sociais no Cone Sul e a gênese de uma elite intelectual (1940-1965). Tempo Social, Revista de Sociologia da USP, 19(1), 89-114.
- Boletín Proyecto Principal de Educación Unesco-América Latina. (1959). 1(1), 1-56.
- Cabral, A. (2004). A sociologia funcionalista nos estudos organizacionais: foco em Durkheim. Cadernos EBAPE.BR, 2(2), 1-15.
- Cortés, A. (2012). Modernización, dependência y marginalidad: itinerario conceptual de la sociología latino-americana. Sociologias, 29(14), 214-238.
- Costa, E. G. (2019). A educação na tradição sociológica funcionalista: uma análise comparativa entre Durkheim, Parsons e Luhmann. Revista del Magíster em Análisis Sistémico Aplicado a la Sociedade, (39), 83-99.
- Daniel, L. S. (2019). Boletim do Centro Latino Americano de Pesquisas em Ciências Sociais (1959-1961): escritos do intelectual João Roberto Moreira. Revista Olhares, 3 (7), 133-146.
- Daniel, L. S. (2009). O intelectual João Roberto Moreira (1912-1967): itinerários para uma racionalidade ativa (Tese de Doutorado). Universidade Federal do Paraná, Curitiba.
- Domingues, J. M., & Maneiro, M. (2004). Revisitando Germani: a interpretação da modernidade e a teoria da ação. DADOS, Revista de Ciências Sociais, 4(47), 643-668.
- Gomes, Â. C., & Hansen, P. S. (2006). Apresentação: intelectuais, mediação cultural e projetos políticos: uma introdução para a delimitação do objeto de estudo. In Â. C. Gomes, & P. S. Hansen (Orgs.), Intelectuais mediadores: práticas culturais e ação política (p. 7-37). Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira.
- Havighurst, R. J. (1962). La sociedad y la educación en América Latina. Buenos Aires, AR: Editorial Universitaria de Buenos Aires.
- López, L. A. M. (2016). José Medina Echevarría: una mirada sobre América Latina desde la sociología económica y la teoría (1952-1977). Tempo Social, Revista de Sociologia da USP, 28(3), 95-116.
- Magalhães, J. (2008). O manual escolar como fonte historiográfica. In J. V. Costa, M. L. Felgueiras, & L. G. Correia (Coord.), Manuais escolares da Biblioteca Pública Municipal do Porto (p. 13-22). Porto, PT: Faculdade de Letras do Porto.
- Maluhy, C. V. (2010). Os especialistas em educação para a América Latina (1958-1966) (Dissertação de Mestrado). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo.
- Mannheim, K. (1946). Liberdad y planificación social. México, MX: Fondo de Cultura Económica.
- Martins, P. H. (2019). Sociologia na América Latina: giros epistemológicos e epistêmicos. Revista Sociedade e Estado, 34(3), 689-718.
- Oliveira, L. L. (2005). Diálogos intermitentes: relações entre Brasil e América Latina. Sociologias, 7(14), 110-129.
- Panoff, M., & Perrin, M. (1973). Dicionário de etnologia. Lisboa, PT: Edições 70.
- Pocock, J. G. A. (2003). Linguagens do ideário político. São Paulo, SP: EDUSP.
- Schultz, T. (1973). O capital humano. Rio de Janeiro, RJ: Zahar.
- Tavares-dos-Santos, J. V., & Baumgarten, M. (2005). Contribuições da sociologia da América Latina à imaginação sociológica: análise, crítica e compromisso social. Sociologias, 7(14), 178-243.
- Teodoro, A. (2001). Organizações internacionais e políticas educativas nacionais: a emergência de novas formas de regulação transnacional, ou uma globalização de baixa intensidade. In S. R. Stoer, L. Cortesão, J. A. Correia (Orgs.), Transnacionalização da educação - da crise da educação á ‘educação’ da crise (p. 1-23). Porto, PT: Edições Afrontamento.
- Reis, D. S. (2022). A colonialidade do saber: perspectivas decoloniais para repensar a univers(al)idade. Revista Educação & Sociedade, 43, 1-12.
- Sirinelli, J.-F. (2003) Os intelectuais. In R. Rémond (Org.), Por uma histórica política (2a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Editora FGV.
- Vila, E. E. (2016). El concepto de “desarrollo” y el proceso de institucionalización de las ciencias sociales latinoamericanas: instituciones, actores e ideas. In 9ª Jornadas de Sociología de la UNLP. La Plata, AR.
- Xavier, L. N. (1999). O Brasil como laboratório: educação e ciências sociais no projeto do Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais: CBPE/INEP/MEC (1950-1960). São Paulo, SP: IFAN/CDAPH/EDUSF.
-
Rodadas de avaliação:
R1: 3 convites: 1 parecer recebido;R2: 3 convites: 1 parecer recebido;R3: 2 convites: 1 parecer recebido. -
Financiamento:
A RBHE conta com apoio da Sociedade Brasileira de História da Educação (SBHE) e do Programa Editorial (Chamada Nº 12/2022) do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
-
1
Luiz Aguiar da Costa Pinto foi um sociólogo brasileiro que dirigiu o Centro Latino Americano de Pesquisas Educacionais (CLAPCS), de 1958 a 1961, produzindo o Boletim do Centro Latino Americano de Pesquisas em Ciências Sociais (depois chamada de revista América Latina), articulando a interlocução com os mais diversos sociólogos latino-americanos (Daniel, 2019Daniel, L. S. (2019). Boletim do Centro Latino Americano de Pesquisas em Ciências Sociais (1959-1961): escritos do intelectual João Roberto Moreira. Revista Olhares, 3 (7), 133-146.).
-
2
Gino Germani era italiano, mas viveu grande parte de sua vida na Argentina, onde se formou em Filosofia pela Universidade de Buenos Aires, na década de 1950. Desenvolveu, ao longo de sua trajetória, a Teoria de Transição para a Modernidade (Domingues & Maneiro, 2004Domingues, J. M., & Maneiro, M. (2004). Revisitando Germani: a interpretação da modernidade e a teoria da ação. DADOS, Revista de Ciências Sociais, 4(47), 643-668.; Cortés, 2012Cortés, A. (2012). Modernización, dependência y marginalidad: itinerario conceptual de la sociología latino-americana. Sociologias, 29(14), 214-238.).
-
3
O sociólogo mexicano José Medica Echevarría (1903-1977) se destaca como um dos mais importantes intelectuais responsáveis pela institucionalização das ciências sociais na América Latina, desenvolvendo uma reflexão sobre os efeitos do projeto desenvolvimentista e as razões de seu fracasso (López, 2016López, L. A. M. (2016). José Medina Echevarría: una mirada sobre América Latina desde la sociología económica y la teoría (1952-1977). Tempo Social, Revista de Sociologia da USP, 28(3), 95-116.).
-
4
“[...] en todas las esferas de la vida cultural, la función de las minorías selectas es expresar las fuerzas culturales y psíquicas en una forma primaria y orientar la extraversión y la intraversión colectivas. Son los responsables de la iniciativa y de la tradición culturales”.
-
5
O período entre 1950-1973 é considerado o período da ‘sociologia científica’ e da configuração da Sociologia Crítica. Nesse período destacam-se duas iniciativas da Unesco: a criação do Centro Latino Americano de Pesquisas em Ciências Sociais (CLAPCS) e a fundação da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (FLACSO), em 1957. Nesse momento, vários intelectuais, como o sociólogo Luiz Aguiar da Costa Pinto, constroem uma crítica a essa ‘sociologia da modernização’ (Tavares-dos-Santos & Baumgarten, 2005Tavares-dos-Santos, J. V., & Baumgarten, M. (2005). Contribuições da sociologia da América Latina à imaginação sociológica: análise, crítica e compromisso social. Sociologias, 7(14), 178-243.).
-
6
O Projeto Principal nº 1 foi apresentado em 1956, na Conferência Regional Latino-Americana sobre Educação Primária Gratuita e Obrigatória, com plano de execução de 10 anos. Dentre as iniciativas do governo brasileiro para colaborar com o projeto, está a organização de cursos de formação de especialistas em organização, com convênio firmado entre o Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP), o Centro Regional de Pesquisas Educacionais de São Paulo (CRPE/SP) e a Universidade de São Paulo (USP) (Maluhy, 2010Maluhy, C. V. (2010). Os especialistas em educação para a América Latina (1958-1966) (Dissertação de Mestrado). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo.).
-
7
A preocupação com a formação de professores primários nos países latino-americanos era latente no interior do Projeto Principal. Era propósito aumentar o número de professores, bem como a qualidade da sua formação, que deveria passar por ‘uma renovação na doutrina formativa’, com formação cultural sólida, formação em novas orientações pedagógicas, como a sociologia, psicologia social, dentre outras (Boletín do Proyecto Principal de Educación Unesco-América Latina, 1959).
-
8
Em 1940 Havighusrt assumiu o cargo de professor de Educação e de Secretário Executivo do Comitê de Desenvolvimento Infantil na Universidade de Chicago, desenvolvendo pesquisas na área da educação, psicologia e sociologia, abordando temas como educação juvenil, processos de envelhecimento, educação urbana, dentre outros (Daniel, 2009Daniel, L. S. (2009). O intelectual João Roberto Moreira (1912-1967): itinerários para uma racionalidade ativa (Tese de Doutorado). Universidade Federal do Paraná, Curitiba.).
-
9
A Universidade de Chicago foi criada em 1895, mediante doação de um milionário americano chamado John D. Rockefeler. No interior da universidade, a sociologia passou a ser tomada como ciência capaz de direcionar uma reforma social na sociedade americana, voltando-se para o “[...] equacionamento dos problemas sociais que afligiam as grandes cidades americanas” (Becker, 1996Becker, H. (1996). A escola de Chicago. MANA, (2), 177-188., p. 178).
-
10
Além dessa obra, havia a intenção de publicação de um Manual sobre Fundamentos de Educação, encomendado ao professor Larroyo, da Universidade do México, além de um volume sobre o estado da educação na América Latina, a ser preparado pelo Departamento de Educação da Unesco e Centro Regional de Havana. O Manual de Fundamentos da Educação teria como colaboradores Antonio Ballesteros, Robert Dottrens, Lourenço Filho, Juan Mantovani e Domingo Tirado Beneti (Boletín do Proyecto Principal de Educación Unesco-América Latina, 1959).
-
11
“[...] un Manual sobre Sociología y Educación destinado a los maestros será publicado a mediados del año 1959. Dirigido por el Dr. Havighurt, de la Universidad de Chicago, han colaborado en él distinguidos sociólogos y colaboradores latinoamericanos”.
-
12
Ao final da obra, encontra-se um glossário, contendo palavras próprias do campo da pesquisa em ciências sociais. São elas: aculturação, associação, cultura, ecologia, função, instituição, personalidade, classe social, papel social, estratificação social e socialização.
-
13
“[...] el presente Manual sólo aspira a servir de complemento a los grandes tratados de sociología de la educación escritos por autoridades latino-americanas, tales como la Sociología de la Educación, de Fernando de Azevedo”.
-
14
A organização desse quadro tem como objetivo principal dar visibilidade a esses autores, em grande parte, latino-americanos, que realizaram estudos em universidades americanas e que colaboraram para os trabalhos da Unesco no continente. Como já destacado, um dos objetivos deste texto foi procurar tratar aspectos do objeto, o Manual, de forma transnacional, a partir de perspectivas supranacionais. Contudo, até o momento, não se localizaram outros estudos que tenham se debruçado sobre esse material ou sobre muitos dos autores mencionados. Vislumbra-se, assim, em futuras pesquisas, realizar intercâmbio com outros pesquisadores e avançar nessas análises mais abrangentes.
-
15
As informações sobre os autores foram coletadas na própria obra.
-
16
As informações acerca dos livros e artigos utilizados foram coligidas na própria obra. Algumas referências não indicam nome do artigo, local ou ano de publicação.
-
17
“Después de leer las descripciones del proceso de socialización en la clase media superior del Brasil y en una familia campesina perteneciente a la clase inferior, que vive en un barrio bajo de la ciudad, escriba una composición indicando las diferencias principales que se advierten entre esos dos grupos culturales”.
-
18
“[...] estudie los grupos de aculturación espontánea que pueden darse en su país, comparando el proceso a que obedezcan con el que menciona para México, el Dr. León Portilla”.
-
19
“[...] muy estrecha entre la educación y el desarrollo económico de un país”.
-
20
“Una tendencia general en favor de un tipo ‘funcional’ de educación destinada a la preparación de numerosos individuos que pueden encargarse de los asuntos prácticos de la sociedad, en contraste con una educación dirigida a mantener el status social de la clase superior y de una pequeña clase media superior”.
-
21
Theodor Schultz é citado ao longo do Manual, destacando os artigos: This New Word: The Civilization of Latin America, de 1956; The economic test in Latin America, de 1956; dentre outros.
-
22
“[…] la educación es, simultáneamente, un ‘espejo’ que refleja el status que existe en una determinada sociedad y una fuerza aplicada a cambiar esa misma sociedad”.
-
23
“[…] no existe un solo tipo familiar latinoamericano”.
-
24
“[…] en el seno de una sociedad compleja, la educación está llamada a desempeñar un gran papel. Es necesaria tanto para reducir prejuicios entre los grupos, como para promover las prácticas integradoras positivas dentro de la sociedad”.
-
25
[…] el proceso por medio del cual un individuo adquiere una cultura hasta entonces nueva y extraña para él. El término se aplica generalmente al proceso mediante el cual un miembro de una cultura popular aprende una cultura más compleja o ‘moderna’, pero podría ser también aplicado al proceso mediante el cual el niño se hace miembro de un grupo cultural. En este sentido el término es sinónimo de ‘socialización’.
-
26
“[…] la maestra primaria tiende a ser menos ‘profesional’ em sus actividades que el profesor secundario y no pertenece tan a menudo como éste a las organizaciones de maestros, no le revistas educativas, etc”.
-
27
“[...] el trabajo del profesor pude ser concebido como un complejo de papeles sociales”.
-
28
“Al mismo tiempo que se desea que el profesor participe en la comunidad, se confía que sea ‘forastero’ en ella y no se entere de los chismes corrientes en la comunidad ni participe en las rivalidades locales. Por lo general, se piensa que los profesores jóvenes sólo serán residentes temporales y que luego se irán a vivir en otras comunidades. La imagen de la maestra rural que viene en bicicleta desde la ciudad con el objectivo de enseñar a leer y escribir a los niños y que luego vuelve a su hogar, es la imagen de un forastero sociológico”.
-
29
“[…] estos papeles entran a veces em conflicto, de modo que el profesor hábil combina los sub-papeles que resultan más apropiados a la situación presente, o sea aquellos que son más satisfactorios para la comunidad, y que, al mismo tiempo, se adaptan mejor a suja personalidad traducir”.
Editado por
Editor-associado responsável:
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
13 Nov 2023 -
Data do Fascículo
2024
Histórico
-
Recebido
24 Ago 2022 -
Aceito
30 Maio 2023 -
Publicado
15 Set 2023