Acessibilidade / Reportar erro

Avaliação do conhecimento sobre neurofisiologia da dor e autopercepção de habilidades para atender indivíduos com dor em graduandos e graduados em fisioterapia no Brasil: estudo transversal

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

Abordagens para o enfrentamento da dor, como educação do paciente, estão diretamente relacionadas ao nível de habilidades dos profissionais. A identificação de possíveis lacunas do aprendizado nas diferentes fases de formação pode contribuir para o desenvolvimento de novas estratégias e métodos de ensino. O objetivo deste estudo foi avaliar e comparar o nível de conhecimento sobre neurofisiologia da dor e a autopercepção de habilidades para atender indivíduos com dor em alunos de graduação e graduados em fisioterapia no Brasil.

MÉTODOS:

Trata-se de um estudo observacional analítico do tipo transversal, em que foi aplicado o Questionário Neurofisiológico de Dor (QND) para avaliar o nível de conhecimento sobre neurofisiologia da dor. Também foi utilizado um questionário autoaplicado para coletar os dados sociodemográficos da amostra e avaliar a autopercepção de habilidades para atender indivíduos com dor. As características da população do estudo foram definidas pela estatística descritiva. Para a análise da distribuição do escore QND e da autopercepção de habilidades para atender indivíduos com dor foi utilizado o teste Shapiro-Wilk. Na análise bivariada para a comparação de distribuição do escore QND e da autopercepção de habilidades para atender indivíduos com dor entre as fases dos graduandos e a escolaridade após a formação foi utilizado o teste de Kruskal-Wallis, nível de significância de 5% e intervalo de confiança de 95%. A declaração Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE) foi utilizada como guia para relatar os resultados do estudo.

RESULTADOS:

Um total de 306 voluntários participaram do estudo, sendo 208 alunos de graduação (22,3 ± 3,2 anos) e 98 fisioterapeutas (31,7± 8,7 anos). A pontuação média do QND para os alunos de graduação foi 6,17 e de 8,56 para os fisioterapeutas, considerando um total de 12 pontos. Observou-se uma diferença significativamente superior na pontuação obtida no QND pelos graduandos da fase intermediária e do último ano (p<0,05), bem como na autopercepção de habilidades para atender indivíduos com dor e realizar uma abordagem biopsicossocial do paciente entre as diferentes fases do curso. Contudo, entre os fisioterapeutas, não foi observada diferença significativa na pontuação total do QND e na autopercepção de habilidades para atender indivíduos com dor.

CONCLUSÃO:

Por meio dos achados deste estudo, foi possível observar que o nível de conhecimento sobre neurofisiologia da dor e autopercepção de habilidades para atender indivíduos com dor difere entre acadêmicos e profissionais de fisioterapia. Entretanto, a pontuação baixa do QND dos graduandos de fisioterapia, bem como a ausência de diferenças significativas do QND entre os diferentes níveis de formação dos fisioterapeutas, sugere que a implementação curricular e capacitações específicas sobre dor são indispensáveis para ampliar o nível de conhecimento e habilidades dos fisioterapeutas no tratamento de indivíduos com dor.

Descritores:
Dor; Educação em saúde; Especialidade de Fisioterapia; Neurofisiologia

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVES:

Approaches to coping with pain, such as patient education, are directly related to the professionals’ skill level. The identification of possible learning gaps in the different stages of training can contribute to the development of new teaching strategies and methods. This study aimed to evaluate and compare the level of knowledge about the neurophysiology of pain and the self-perception of abilities to care for individuals with pain in undergraduate and graduate students in physiotherapy in Brazil.

METHODS:

This is a cross-sectional analytical observational study, in which the Neurophysiological Pain Questionnaire (QND) was applied to assess the level of knowledge about the neurophysiology of pain. A self-administered questionnaire was also used to collect sociodemographic data from the sample and to assess self-perception of abilities to care for individuals with pain. The characteristics of the study population were defined by descriptive statistics. For the analysis of QND score distribution and self-perception of abilities to care for individuals with pain, the Shapiro-Wilk test was used. In the bivariate analysis to compare the distribution of the QND score and self-perception of abilities to care for individuals with pain between the stages of undergraduates and schooling after graduation, the Kruskal-Wallis test was used, with a significance level of 5% and 95% confidence interval. The statement Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE) was used as a guide for reporting the results of the study.

RESULTS:

A total of 306 volunteers participated in the study, 208 undergraduate students (22.3 ± 3.2 years) and 98 physiotherapists (31.7± 8.7 years). The average QND score for undergraduate students was 6.17 and 8.56 for physiotherapists, considering a total of 12 points. There was a significantly higher difference in the scores obtained on the QND by undergraduates in the intermediate phase and in the last year (p<0.05), as well as in the self-perception of abilities to care for individuals with pain and perform a biopsychosocial approach to the patient, between the different phases of the course. However, among physiotherapists, no significant difference was observed in the total QND score, and in the self-perception of abilities to care for individuals with pain.

CONCLUSION:

The findings of this study suggest that the level of knowledge about the neurophysiology of pain and self-perception of skills to care for individuals with pain differs between academics and physiotherapy professionals. However, the low QND score of physiotherapy undergraduates, as well as the absence of significant differences in the QND between the different levels of physiotherapist training, suggest that curricular implementation and specific training on pain may be indispensable to increase the level of knowledge and skills of physiotherapists in the treatment of individuals with pain.

Keywords
Health knowledge; Pain; Neurophysiology; Physiotherapy

DESTAQUES

  • Fisioterapeutas apresentam maior conhecimento sobre neurofisiologia da dor e autopercepção de habilidades para atender indivíduos com dor quando comparados a graduandos.

  • A pontuação baixa do Questionário Neurofisiológico de Dor sugere que a implementação curricular de disciplinas voltadas para a dor é necessária na graduação em fisioterapia.

  • Capacitações específicas sobre dor devem ser realizadas para ampliar o nível de conhecimento e habilidades dos fisioterapeutas no tratamento de indivíduos com dor.

DESTAQUES

  • Fisioterapeutas apresentam maior conhecimento sobre neurofisiologia da dor e autopercepção de habilidades para atender indivíduos com dor quando comparados a graduandos.

  • A pontuação baixa do Questionário Neurofisiológico de Dor sugere que a implementação curricular de disciplinas voltadas para a dor é necessária na graduação em fisioterapia.

  • Capacitações específicas sobre dor devem ser realizadas para ampliar o nível de conhecimento e habilidades dos fisioterapeutas no tratamento de indivíduos com dor.

INTRODUÇÃO

A dor crônica (DC) é considerada um importante problema global de saúde pública devido a sua alta prevalência e por interferir significativamente na capacidade física e emocional e na qualidade de vida dos indivíduos, levando ao uso indevido e dependência de fármacos opioides11 O’Brien T, Christrup LL, Drewes AM, Fallon MT, Kress HG, McQuay HJ, Mikus G, Morlion BJ, Perez-Cajaraville J, Pogatzki-Zahn E, Varrassi G, Wells JC. European Pain Federation position paper on appropriate opioid use in chronic pain management. Eur J Pain. 2017;21(1):3-19.

2 de Souza JB, Grossmann E, Perissinotti DMN, de Oliveira Junior JO, da Fonseca PRB, Posso IP. Prevalence of chronic pain, treatments, perception, and interference on life activities: Brazilian Population-Based Survey. Pain Res Manag. 2017.2017:4643830.

3 Treede RD, Rief W, Barke A, Aziz Q, Bennett MI, Benoliel R, Cohen M, Evers S, Finnerup NB, First MB, Giamberardino MA, Kaasa S, Korwisi B, Kosek E, Lavand’homme P, Nicholas M, Perrot S, Scholz J, Schug S, Smith BH, Svensson P, Vlaeyen JWS, Wang SJ. Chronic pain as a symptom or a disease: the IASP Classification of Chronic Pain for the International Classification of Diseases (ICD-11). Pain. 2019;160(1):19-27.
-44 Glare P, Aubrey KR, Myles PS. Transition from acute to chronic pain after surgery. Lancet. 2019;393(10180):1537-46.. Dentre as abordagens no enfrentamento da dor, destaca-se e educação do paciente. Acredita-se que a ressignificação da dor através da educação pode reduzir crenças limitantes, promover mudanças comportamentais e aumentar a adesão ao tratamento, refletindo na evolução clínica e na qualidade de vida do indivíduo55 Goldberg DS, McGee SJ. Pain as a global public health priority. BMC Public Health. 2011;11:770.,66 Cheatle MD. Biopsychosocial approach to assessing and managing patients with chronic pain. Med Clin North Am. 2016;100(1):43-53..

A educação do paciente depende diretamente do nível de conhecimento e das habilidades dos profissionais de saúde, como o fisioterapeuta. Entretanto, estudos apontam que alunos de graduação e profissionais de saúde apresentam déficit de conhecimento sobre os mecanismos neurofisiológicos da dor, considerando-se despreparados para atender pacientes com DC, atribuindo esse fato ao período de qualificação profissional77 Sereza TW, Dellaroza MSG. O que está sendo aprendido a respeito da dor na UEL? Semina: Ciências Biológicas e da Saúde. 2003;24(1):55-66.

8 Alves RC, Tavares JP, Funes RA, Gasparetto GA, Silva KC, Ueda TK. Análise do conhecimento sobre dor pelos acadêmicos do curso de Fisioterapia em centro universitário. Rev Dor. 2013;14(4):272-9.

9 Capellini VK, Daré MF, Castral TC, Christoffel MMC, Leite AM, Scochi CGS. Conhecimento e atitudes de profissionais de saúde sobre avaliação e manejo da dor neonatal. Rev Eletrônca Enferm. 2014;16(2):361-9.
-1010 Santos LT, Otávio RV, Junior JLMM, Correa LA, Nogueira LAC. Avaliação do nível de conhecimento sobre neurofisiologia da dor em estudantes de fisioterapia - um estudo observacional. Cad Educ Saúde Fisioter. 2018;5(10).. Pesquisas anteriores, ao compararem as crenças biomédicas e psicossociais de alunos do primeiro e último ano de graduação em fisioterapia, mostraram que o sistema educacional parece não agir como modificador das crenças que os alunos apresentam no início da graduação1111 Gomes AS, de Sá Ferreira A, Reis FJJ, de Jesus-Moraleida FR, Nogueira LAC, Meziat-Filho N. Association between low back pain and biomedical beliefs in academics of physiotherapy. Spine. 2020;45(19):1354-9.. Dessa forma, esse cenário de despreparo pode ser justificado como consequência de um ensino falho sobre dor nos cursos de graduação em saúde.

O ensino sobre dor para profissionais de saúde em todos os níveis de formação é considerado um meio importante para a mudança de práticas ineficazes no manejo da dor1212 Marques ES, Xarles T, Antunes TM, Silva KK, Reis FJ, Oliveira LA, Nogueira LA. Evaluation of physiologic pain knowledge by physiotherapy students. Rev Dor. 2016;17(1):29-33.. Tendo em vista essa necessidade, a comissão de fisioterapeutas da Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor (SBED) elaborou um currículo específico de dor para graduação em fisioterapia com base nas recomendações propostas pela Associação Internacional para o Estudo da Dor (IASP) e adaptou seu conteúdo à realidade da população e à práxis profissional brasileira1313 DeSantana JM, Souza JB, Reis FJ, Gosling AP, Paranhos E, Barboza HF, Baptista AF. Currículo em dor para graduação em Fisioterapia no Brasil. Rev Dor. 2017;18(1):72-8..

Mesmo diante dessa recomendação, ainda há carência de disciplinas específicas para o ensino da dor, sendo que apenas 7% das instituições de ensino superior apresentam alguma disciplina específica sobre dor no curso de fisioterapia1414 Venturine JS, Reis FJJ. O ensino sobre dor nos cursos de fisioterapia do Brasil: identificação e análise dos currículos. Cad Educ Saúde Fisioter. 2016;3(6).. Portanto, a dor não é vista como um tema central, e sim como um conceito complementar em algumas disciplinas. Isto resulta em um aprendizado precário, de conteúdo fragmentado, em que a complexidade do assunto e suas dimensões psicossociais são frequentemente negligenciadas1515 Hoeger Bement MK, Sluka KA. The current state of physical therapy pain curricula in the United States: a faculty survey. J Pain. 2015;16(2):144-52.,1616 Springer S, Gleicher H, Hababou H. Attitudes and beliefs about musculoskeletal pain and its association with pain neuroscience knowledge among physiotherapy students in Israel. Isr J Health Policy Res. 2018;7(1):67..

Considerando que todo indivíduo tem o direito de receber um tratamento adequado, planejado e executado por um profissional devidamente treinado, e sendo o fisioterapeuta um profissional habilitado para o manejo da dor, torna-se de suma importância avaliar o nível de conhecimento desses profissionais, tanto sobre os aspectos neurofisiológicos da dor, quanto acerca da autopercepção de habilidades para atender indivíduos com dor. Assim, acredita-se que a identificação de possíveis lacunas no aprendizado nas diferentes fases de formação possa contribuir para o desenvolvimento de estratégias, conteúdos e métodos de ensino sobre dor, proporcionando um ensino efetivo aos acadêmicos e profissionais de saúde, bem como um tratamento adequado e assertivo ao paciente, diminuindo o ônus causado pela inabilidade técnica-científica e por práticas clínicas ineficazes no manejo da dor1717 George SZ, Fritz JM, Silfies SP, Schneider MJ, Beneciuk JM, Lentz TA, Gilliam JR, Hendren S, Norman KS. Interventions for the management of acute and chronic low back pain: revision 2021. J Orthop Sports Phys Ther. 2021;51(11):CPG1-CPG60.

18 King R, Robinson V, Elliott-Button HL, Watson JA, Ryan CG, Martin DJ. Pain reconceptualisation after pain neurophysiology education in adults with chronic low back pain: a qualitative study. Pain Res Manag. 2018:3745651.
-1919 Alhowimel A, Alodiabi F, Alamam D, Alotaibi M, Fritz J. Current understanding of pain neurophysiology among physiotherapists practicing in Saudi Arabia. Healthcare. 2021;9(9):1242..

Estudos prévios realizados na Europa, África, Ásia e Oceania investigaram o conhecimento sobre a neurofisiologia da dor em estudantes, fisioterapeutas e outros profissionais de saúde, além da sua aplicação em populações específicas, como a dor lombar, não sendo identificados até o momento estudos que abordaram os estudantes ou profissionais das diversas regiões do Brasil1616 Springer S, Gleicher H, Hababou H. Attitudes and beliefs about musculoskeletal pain and its association with pain neuroscience knowledge among physiotherapy students in Israel. Isr J Health Policy Res. 2018;7(1):67.,1919 Alhowimel A, Alodiabi F, Alamam D, Alotaibi M, Fritz J. Current understanding of pain neurophysiology among physiotherapists practicing in Saudi Arabia. Healthcare. 2021;9(9):1242., 2020 Alodaibi F, Alhowimel A, Alsobayel H. Pain neurophysiology knowledge among physical therapy students in Saudi Arabia: a cross-sectional study. BMC Med Educ. 2018;18(1):228.

21 Adillón C, Lozano È, Salvat I. Comparison of pain neurophysiology knowledge among health sciences students: a cross-sectional study. BMC Res Notes. 2015;8:592.
-2222 Mukoka G, Olivier B, Ravat S. Level of knowledge, attitudes and beliefs towards patients with chronic low back pain among final year School of Therapeutic Sciences students at the University of the Witwatersrand - A cross-sectional study. S Afr J Physiother. 2019;75(1):683..

Dentro deste contexto, o objetivo da presente pesquisa foi avaliar e comparar o nível de conhecimento sobre neurofisiologia da dor e a autopercepção de habilidades para atender indivíduos com dor entre alunos de graduação e graduados em fisioterapia no Brasil.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo observacional analítico do tipo transversal, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina (nº 4.460.023). A declaração Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE) foi utilizada como guia para relatar os resultados do estudo. O procedimento de coleta de dados foi realizado no período de março a julho de 2021, por meio do preenchimento de um questionário eletrônico, utilizando a plataforma Google Forms®. O link do questionário foi divulgado através das mídias sociais, dos conselhos regionais de fisioterapia e terapia ocupacional e da Associação Brasileira de Fisioterapia Traumato-ortopédica (ABRAFITO).

A amostra se deu por meio de conveniência, a partir da demanda espontânea dos participantes que aceitaram participar da pesquisa. Foram incluídos acadêmicos e profissionais de fisioterapia residentes no Brasil, com idade igual ou maior que 18 anos. Os participantes que cursavam ou possuíam outra formação em cursos da área da saúde, que não preencheram o questionário corretamente e que não aceitaram participar da pesquisa foram excluídos do estudo. Os que atenderam aos critérios de inclusão assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), onde receberam informações sobre os objetivos e procedimentos do estudo.

Para estratificação dos dados, a amostra foi dividida em subgrupos, sendo os alunos de graduação em: primeiro ano, fases intermediárias e alunos do último ano da graduação. Os fisioterapeutas foram divididos em quatro subgrupos, conforme o último título de formação, sendo: graduação, especialização, mestrado e doutorado.

Variáveis do estudo

As variáveis analisadas no presente estudo foram: 1) o conhecimento sobre neurofisiologia da dor (QND); 2) a autopercepção de habilidades para atender indivíduos com dor.

Instrumentos de coleta de dados

Para o levantamento dos dados necessários à pesquisa, foi utilizado como instrumento um questionário autoaplicado que constava de três sessões:

1) Dados sociodemográficos: foram coletados dados para identificação da amostra por meio de um questionário estruturado, elaborado pelos autores, incluindo informações quanto a idade, sexo, estado de residência, nível de formação, dados específicos para graduandos (quantidade de fases cursadas) e graduados (tempo de atuação, tipo de instituição de trabalho, nível de pós-graduação e área de atuação).

2) Autopercepção de habilidades para atender indivíduos com dor, por meio de um questionário estruturado, elaborado pelos autores: avaliou-se o nível de interesse sobre dor (nenhum, baixo, médio e alto), a habilidades para atender indivíduos com DC e para realizar abordagem biopsicossocial (nenhuma, baixa, média e alta).

3) Questionário Neurofisiológico de Dor (QND): a versão brasileira do QND, traduzida e adaptada culturalmente2323 Colleary G, O’Sullivan K, Griffin D, Ryan CG, Martin DJ. Effect of pain neurophysiology education on physiotherapy students’ understanding of chronic pain, clinical recommendations and attitudes towards people with chronic pain: a randomised controlled trial. Physiotherapy. 2017;103(4):423-9., é um instrumento autoaplicado contendo 12 itens que avaliam o nível de conhecimento relacionado à neurofisiologia da dor, em que cada item contém três opções de resposta, sendo elas: verdadeiro, falso e não sei. Os resultados do QND são interpretados com cada acerto correspondendo a um ponto, enquanto respostas incorretas ou indecisas não são pontuadas. Respostas incorretas permitem a identificação de crenças inadequadas, enquanto a opção “não sei” permite a identificação de lacunas no conhecimento, evitando suposições e falsos acertos. Portanto, a pontuação total varia de zero a 12, e, quanto maior a pontuação, maior o nível de compreensão dos mecanismos fisiopatológicos da dor.

Análise estatística

Para análise dos resultados, o banco de dados foi organizado em planilhas do Microsoft Excel®-Windows 2010, e analisado pelo software Stata® 16.1. A descrição das características da população do estudo foram dadas por medidas de tendência central e dispersão, para variáveis quantitativas, e frequências absolutas e relativas para as variáveis qualitativas. Para a análise da distribuição do escore QND e da autopercepção de habilidades para atender indivíduos com dor, foi utilizado o teste Shapiro-Wilk. Na análise bivariada para a comparação de distribuição do escore QND e da autopercepção de habilidades para atender indivíduos com dor entre as fases dos graduandos, e, a escolaridade após a formação, foi utilizado o teste de Kruskal-Wallis, nível de significância de 5% e intervalo de confiança de 95%.

RESULTADOS

A amostra foi composta por 306 participantes. Inicialmente, 319 indivíduos responderam ao questionário e, após aplicação dos critérios de exclusão, 13 foram excluídos (1 não aceitou participar, 1 resposta foi duplicada e 11 tinham formação em outros cursos da área da saúde). A tabela 1 apresenta as características sociodemográficas e acadêmicas dos alunos de graduação e dos fisioterapeutas.

Tabela 1
Dados sociodemográficos e características acadêmicas dos alunos de graduação e dos fisioterapeutas.

Principais resultados

Autopercepção de habilidades para atender indivíduos com dor

Graduandos

A figura 1A apresenta a descrição das habilidades e interesse em dor dos estudantes. A maioria relatou alto interesse no tema dor (62%), entretanto, 44,7% apontaram média habilidades para atender indivíduos com DC, bem como para realizarem uma abordagem biopsicossocial (39,4%). Observou-se uma diferença estatisticamente significativa (p<0,05) entre a habilidades autorrelatada dos graduandos para atender indivíduos com DC e realizar abordagem biopsicossocial do paciente, entre as diferentes fases do curso.

Figura 1A
Descrição das habilidades e interesse em dor dos estudantes

Fisioterapeutas

A figura 1B apresenta a frequência de respostas dos fisioterapeutas de acordo com os níveis de escolaridade. Sobre o tema dor, a maioria tem alto interesse sobre dor (76,5%), entretanto, baixo percentual (21,43%) relata ter alta habilidades para atender indivíduos com DC. Para a abordagem biopsicossocial, especialistas e graduados tem percentual maior de alta habilidades. Não foi observada diferença estatística entre os percentuais de respostas de acordo com a escolaridade.

Figura 1B
Frequência de respostas dos fisioterapeutas de acordo com os níveis de escolaridade.

Questionário neurofisiológico de dor (QND)

Alunos de graduação

A pontuação total dos alunos de graduação foi de 6,17 de 12 pontos. A pontuação por grupo foi: primeiro ano: 4,79; fases intermediárias: 6,57 e último ano: 7,15. Na comparação intragrupos, houve diferença significativamente superior na pontuação obtida no QND pelos discentes da fase intermediária e do último ano (p<0,05). A prevalência de acerto de cada questão por grupo está apresentada na figura 2A.

Figura 2A
Prevalência de acerto

Fisioterapeutas

A pontuação total dos fisioterapeutas foi de 8,56 de 12 pontos. A pontuação por grupo foi: graduação: 7,63; especialização: 8,60; Mestrado/Doutorado 8,81. Não foi observada diferença entre a pontuação total dos grupos. A prevalência de acerto de cada questão de acordo com os grupos encontra-se na figura 2B.

Figura 2B
Prevalência de acerto de cada questão.

Questão 1: “Quando parte do seu corpo está lesionado, receptores especiais da dor levam a mensagem da dor para seu cérebro.”; Questão 2: “Dor somente ocorre quando você está lesionado ou está correndo risco de se lesionar.”; Questão 3: “Nervos especiais na sua medula espinhal levam mensagens de perigo para o seu cérebro.”; Questão 4: “Dor ocorre sempre que você está lesionado.”; Questão 5: “O cérebro decide quando você vai sentir dor.”; Questão 6: “Os nervos se adaptam aumentando seu nível de excitabilidade em repouso.”; Questão 7: “Dor crônica significa que uma lesão não foi curada corretamente.”; Questão 8: “Piores lesões resultam sempre em pior dor.”; Questão 9: “Neurônios descendentes são sempre inibitórios.”; Questão 10: “Quando você se lesiona, o ambiente em que você está não afetará a quantidade de dor que você sente, desde que a lesão seja exatamente a mesma.”; Questão 11: “É possível sentir dor e não saber disso.”; Questão 12: “Quando você está lesionado, receptores especiais levam a mensagem de perigo para a sua medula espinhal.”

DISCUSSÃO

Os resultados mostram que a maioria da amostra apresentou alto nível de interesse em dor e média habilidades para atender indivíduos com DC e abordar o tratamento de maneira biopsicossocial.

As questões 1, 5, 9 e 11 do QND foram as que receberam menor índice de respostas corretas. Esses itens envolvem o mecanismo de nocicepção, modulação e percepção da dor. O QND não possui uma pontuação de corte determinada para definir níveis de conhecimento. Alguns estudos determinaram o valor de 65% como o mínimo para considerar um conhecimento satisfatório em neurofisiologia da dor, mas não demonstraram o método utilizado para qual consideraram esse valor, portanto, para comparação de resultados, foi considerado o percentual de acertos e a pontuação relatada em estudos1010 Santos LT, Otávio RV, Junior JLMM, Correa LA, Nogueira LAC. Avaliação do nível de conhecimento sobre neurofisiologia da dor em estudantes de fisioterapia - um estudo observacional. Cad Educ Saúde Fisioter. 2018;5(10).,1212 Marques ES, Xarles T, Antunes TM, Silva KK, Reis FJ, Oliveira LA, Nogueira LA. Evaluation of physiologic pain knowledge by physiotherapy students. Rev Dor. 2016;17(1):29-33..

Em relação aos estudantes, os das fases intermediárias obtiveram uma pontuação 37,14% maior em relação ao grupo primeiro ano e 8,91% menor em relação ao grupo último ano. Em geral, os alunos de graduação pontuaram 6,17 pontos, representando 51,44% de respostas corretas, a qual é similar aos achados de um estudo anterior, onde os indivíduos pontuaram 6,20 pontos, representando 52%2020 Alodaibi F, Alhowimel A, Alsobayel H. Pain neurophysiology knowledge among physical therapy students in Saudi Arabia: a cross-sectional study. BMC Med Educ. 2018;18(1):228.. Adicionalmente autores relataram que o conhecimento foi limitado em relação à neurofisiologia da dor entre os estudantes. O percentual de respostas corretas do grupo primeiro ano (39,93%) foi semelhante à pontuação de 42,7% dos alunos do primeiro ano. Nesse mesmo estudo, os alunos do último ano pontuaram 68,90%, representando 15,53% a mais de acertos que a amostra do grupo último ano do presente estudo (59,64%). Os autores concluíram que a compreensão dos alunos sobre a dor pode não ser suficiente e não garantir uma abordagem da DC que ajude o paciente a reconceitualizar sua dor2121 Adillón C, Lozano È, Salvat I. Comparison of pain neurophysiology knowledge among health sciences students: a cross-sectional study. BMC Res Notes. 2015;8:592..

Os alunos do último ano da Universidade de Witwatersrand, na África do Sul, obtiveram a pontuação de 6,97 (58,08%), similar ao resultado encontrado no presente estudo de 7,15 (59,64%) para o grupo último ano. Os autores concluíram que quanto maior o conhecimento dos alunos sobre a dor, melhores serão suas atitudes em relação aos pacientes com lombalgia crônica e maior será a probabilidade de utilizar um modelo biopsicossocial em vez de um modelo biomédico2222 Mukoka G, Olivier B, Ravat S. Level of knowledge, attitudes and beliefs towards patients with chronic low back pain among final year School of Therapeutic Sciences students at the University of the Witwatersrand - A cross-sectional study. S Afr J Physiother. 2019;75(1):683..

A pontuação geral dos alunos de graduação foi ligeiramente maior que uma amostra composta por alunos de duas universidades da Irlanda e do Reino Unido, os quais obtiveram a média de 45%. Eles demonstraram um aumento para 79% no conhecimento após uma sessão de educação em neurofisiologia da dor de 70 minutos para alunos da graduação em fisioterapia2424 Nogueira LAC, Chaves AO, Oliveira N, Almeida RS, Reis JFF, Andrade FG, Catley MJ. Cross-cultural adaptation of the Revised Neurophysiology of Pain Questioannaire into Brazilian Portuguese language. J Bras Psiquiatr. 2018;67(4):273-7.. Outro estudo relatou a pontuação de 7,5 (65%) em alunos do quinto semestre de um curso de fisioterapia no estado do Rio de Janeiro. Após passarem por metodologias ativas de ensino-aprendizagem, a pontuação aumentou para 10,8 (90%), sugerindo que uma disciplina que aborde conteúdos de maneira específica pode ser ideal para aperfeiçoar o conhecimento em neurofisiologia da dor1212 Marques ES, Xarles T, Antunes TM, Silva KK, Reis FJ, Oliveira LA, Nogueira LA. Evaluation of physiologic pain knowledge by physiotherapy students. Rev Dor. 2016;17(1):29-33.. Esses resultados indicam que após passarem por estratégias de ensino sobre o assunto, os alunos de graduação podem aumentar seu conhecimento em neurofisiologia da dor de forma semelhante ou até maior que fisioterapeutas treinados no assunto, conforme pontuações relatadas em estudos que utilizaram o QND para avaliar fisioterapeutas após sessões educativas em dor2525 Cox T, Louw A, Puentedura EJ. An abbreviated therapeutic neuroscience education session improves pain knowledge in first-year physical therapy students but does not change attitudes or beliefs. J Man Manip Ther. 2016;25(1):11-21.

26 Hush JM, Nicholas M, Dean CM. Embedding the IASP pain curriculum into a 3-year pre-licensure physical therapy program: redesigning pain education for future clinicians. Pain Rep. 2018;3(2):e645.
-2727 Bareiss SK, Nare L, McBee K. Evaluation of pain knowledge and attitudes and beliefs from a pre-licensure physical therapy curriculum and a stand-alone pain elective. BMC Med Educ. 2019;19(1)375..

Alguns estudos avaliaram o conhecimento em neurofisiologia da dor em outros cursos da área da saúde, além da fisioterapia, onde a fisioterapia obteve uma pontuação maior. Isso pode sugerir que as mesmas limitações na educação sobre dor estão presentes em outros cursos da saúde2121 Adillón C, Lozano È, Salvat I. Comparison of pain neurophysiology knowledge among health sciences students: a cross-sectional study. BMC Res Notes. 2015;8:592.,2222 Mukoka G, Olivier B, Ravat S. Level of knowledge, attitudes and beliefs towards patients with chronic low back pain among final year School of Therapeutic Sciences students at the University of the Witwatersrand - A cross-sectional study. S Afr J Physiother. 2019;75(1):683.. A pontuação média dos fisioterapeutas (8,56 pontos; 71,37%) foi semelhante à de 211 osteopatas australianos que acertaram 72,2% do questionário em um estudo, e maior que a de outros estudos mais recentes que avaliaram o QND em fisioterapeutas não treinados em neurofisiologia da dor2828 Fitzgerald K, Vaughan B, Fleischmann M, Austin P. Pain knowledge, attitudes and beliefs of Australian osteopaths drawn from a nationally representative sample of the profession. J Bodyw Mov Ther. 2020;24(4):43-50.. Outro estudo encontrou a pontuação de 6,7 (55,8%) em um grupo de 111 fisioterapeutas árabes, considerando o resultado como conhecimento limitado em neurofisiologia da dor1919 Alhowimel A, Alodiabi F, Alamam D, Alotaibi M, Fritz J. Current understanding of pain neurophysiology among physiotherapists practicing in Saudi Arabia. Healthcare. 2021;9(9):1242..

O QND foi aplicado antes e após um programa de educação sobre dor em alguns estudos. Um desses estudos avaliou um grupo de fisioterapeutas em um programa de doutorado na Austrália, no qual foram incorporados elementos do currículo de dor da IASP. A amostra obteve 56% de acertos no início e 78% no final do primeiro semestre. Essa melhoria foi mantida em longo prazo, indicado pela reavaliação no terceiro ano, com pontuação média de 77%2525 Cox T, Louw A, Puentedura EJ. An abbreviated therapeutic neuroscience education session improves pain knowledge in first-year physical therapy students but does not change attitudes or beliefs. J Man Manip Ther. 2016;25(1):11-21.. Outro estudo aplicou o QND em doutorandos em fisioterapia americanos, antes e após um curso eletivo sobre dor, baseado nas diretrizes da IASP. Os alunos pontuaram 64% no primeiro semestre e 76,9% no último semestre (terceiro ano). Os alunos que participaram do curso melhoraram seu percentual para 86%2727 Bareiss SK, Nare L, McBee K. Evaluation of pain knowledge and attitudes and beliefs from a pre-licensure physical therapy curriculum and a stand-alone pain elective. BMC Med Educ. 2019;19(1)375.. Americanos que estavam cursando o doutorado em fisioterapia obtiveram 41,3% ao início e 84,2% ao final de uma sessão de educação em neurofisiologia da dor com duração de três horas, em outro estudo2525 Cox T, Louw A, Puentedura EJ. An abbreviated therapeutic neuroscience education session improves pain knowledge in first-year physical therapy students but does not change attitudes or beliefs. J Man Manip Ther. 2016;25(1):11-21.. Dessa forma, sessões de educação e disciplinas específicas em dor parecem ser efetivas para melhorar o conhecimento e atitudes e crenças dos alunos e profissionais em relação aos pacientes com dor2222 Mukoka G, Olivier B, Ravat S. Level of knowledge, attitudes and beliefs towards patients with chronic low back pain among final year School of Therapeutic Sciences students at the University of the Witwatersrand - A cross-sectional study. S Afr J Physiother. 2019;75(1):683.. As estratégias ativas de ensino-aprendizagem demonstraram ser capazes de favorecer essa construção de conhecimento1212 Marques ES, Xarles T, Antunes TM, Silva KK, Reis FJ, Oliveira LA, Nogueira LA. Evaluation of physiologic pain knowledge by physiotherapy students. Rev Dor. 2016;17(1):29-33..

A questão 1 “Quando parte do seu corpo está lesionado, receptores especiais da dor levam a mensagem da dor para seu cérebro” foi a que apresentou menor percentual de acertos, 24 sendo 4,81% dos alunos de graduação e 13,27% dos fisioterapeutas. Em outros estudos, a mesma questão também foi relatada como a de menor índice de acertos (<10%)2020 Alodaibi F, Alhowimel A, Alsobayel H. Pain neurophysiology knowledge among physical therapy students in Saudi Arabia: a cross-sectional study. BMC Med Educ. 2018;18(1):228.,2121 Adillón C, Lozano È, Salvat I. Comparison of pain neurophysiology knowledge among health sciences students: a cross-sectional study. BMC Res Notes. 2015;8:592.. É possível que a questão tenha sido mal interpretada, onde os participantes subentendem “receptores especiais da dor” por “nociceptores”, os quais não são sinônimos, já que nociceptores são receptores de estímulos nocivos reais ou potenciais, e a dor é um produto do cérebro2929 Middleton SJ, Barry AM, Comini M, Li Y, Ray P, Shiers S, Themistocleous AC, Uhelski ML, Yang X, Dougherty PM, Price TJ, Bennett DL. Studying human nociceptors: from fundamentals to clinic. Brain. 2021;144(5):1312-35.. A questão com maior percentual de acertos pelos graduandos foi a 2 “Dor somente ocorre quando você está lesionado ou está correndo risco de se lesionar”, com 86,4% de respostas corretas. Os fisioterapeutas apresentaram percentual de 90,82%, sendo a segunda questão de maior índice de acertos.

É esperado que alunos de graduação do primeiro ano e de fases intermediárias ainda não possuam um grande conhecimento sobre dor, porém, é preocupante que os alunos do último ano tenham apresentado um conhecimento insatisfatório, já que eles serão os próximos fisioterapeutas inseridos no mercado de trabalho, atuando como profissionais de primeiro contato e atendendo pacientes com dor com grande frequência.

Os fisioterapeutas do grupo graduação apresentaram um percentual 23,70% maior que os alunos de graduação do último ano. Fisioterapeutas consideram que a experiência profissional gera maior incremento ao conhecimento sobre dor do que a graduação, o que pode ser prejudicial, já que prática baseada apenas em experiências pode perpetuar conceitos inadequados sobre o tema3030 Ribeiro MC, Costa IN, Ribeiro CJ, Nunes MS, Santos B, DeSantana JM. Knowledge of health professionals about pain and analgesia. Rev Dor. 2015;16(3):204=9.. É de suma importância que fisioterapeutas possuam conhecimento adequado, já que toda técnica com objetivo de analgesia atua por um determinado mecanismo neurofisiológico envolvendo as vias de dor88 Alves RC, Tavares JP, Funes RA, Gasparetto GA, Silva KC, Ueda TK. Análise do conhecimento sobre dor pelos acadêmicos do curso de Fisioterapia em centro universitário. Rev Dor. 2013;14(4):272-9.. O conhecimento dos fatores biológicos, sociais e psicológicos necessários para avaliação e gerenciamento da dor deveria ser adquirido durante a graduação1212 Marques ES, Xarles T, Antunes TM, Silva KK, Reis FJ, Oliveira LA, Nogueira LA. Evaluation of physiologic pain knowledge by physiotherapy students. Rev Dor. 2016;17(1):29-33..

Os achados deste estudo podem ser um reflexo da atual situação dos currículos dos cursos de graduação em fisioterapia, onde a maioria não possui disciplina específica sobre dor. Para mudar esse cenário, se faz necessária a revisão destes currículos e adoção de estratégias para aperfeiçoar o conhecimento dos alunos. O ensino sobre dor e habilidades adequada dos profissionais de saúde, baseado em evidências e atuação prática tem sido identificado como uma medida importante para melhorar a assistência da dor77 Sereza TW, Dellaroza MSG. O que está sendo aprendido a respeito da dor na UEL? Semina: Ciências Biológicas e da Saúde. 2003;24(1):55-66.,1212 Marques ES, Xarles T, Antunes TM, Silva KK, Reis FJ, Oliveira LA, Nogueira LA. Evaluation of physiologic pain knowledge by physiotherapy students. Rev Dor. 2016;17(1):29-33.. A implementação do currículo sobre dor para fisioterapia proposto pela SBED, baseado nas recomendações da IASP, nos cursos de fisioterapia, poderia ser uma estratégia eficaz para esse problema. O conteúdo do currículo aborda a natureza multidimensional da dor, ciência básica envolvendo neurofisiologia e tipos de dor, avaliação e tratamento, manuseio da dor e condições clínicas1313 DeSantana JM, Souza JB, Reis FJ, Gosling AP, Paranhos E, Barboza HF, Baptista AF. Currículo em dor para graduação em Fisioterapia no Brasil. Rev Dor. 2017;18(1):72-8..

Novos estudos podem abordar a comparação do QND entre alunos de graduação de universidades públicas e privadas, bem como, entre fisioterapeutas que realizaram ou não algum tipo de formação específica sobre dor. Apesar de possuir participantes de várias regiões do Brasil, a maioria dos voluntários do estudo era das regiões sul e sudeste, não sendo apropriado generalizar os resultados para todo o país, caracterizando uma limitação do estudo.

CONCLUSÃO

Por meio dos achados deste estudo, foi possível observar, que o nível de conhecimento sobre neurofisiologia da dor, e autopercepção de habilidades para atender indivíduos com dor, diferem entre os acadêmicos e profissionais de fisioterapia. A pontuação baixa do QND, identificada nos graduandos de fisioterapia, evidencia possíveis falhas curriculares sobre o tema durante a formação acadêmica. Ainda, foi possível identificar que não houve diferença significativa na pontuação do QND, e na autopercepção de habilidades para atender indivíduos com dor, entre os diferentes níveis de formação dos fisioterapeutas. Assim, acredita-se que a implementação curricular e capacitações específicas sobre dor, possam ser indispensáveis para ampliar o nível de conhecimento e habilidades dos fisioterapeutas no tratamento de indivíduos com dor.

  • Fontes de fomento: O presente estudo foi realizado com apoio da Pró-Reitoria de Extensão da Universidade Federal de Santa Catarina (PROEX).

REFERENCES

  • 1
    O’Brien T, Christrup LL, Drewes AM, Fallon MT, Kress HG, McQuay HJ, Mikus G, Morlion BJ, Perez-Cajaraville J, Pogatzki-Zahn E, Varrassi G, Wells JC. European Pain Federation position paper on appropriate opioid use in chronic pain management. Eur J Pain. 2017;21(1):3-19.
  • 2
    de Souza JB, Grossmann E, Perissinotti DMN, de Oliveira Junior JO, da Fonseca PRB, Posso IP. Prevalence of chronic pain, treatments, perception, and interference on life activities: Brazilian Population-Based Survey. Pain Res Manag. 2017.2017:4643830.
  • 3
    Treede RD, Rief W, Barke A, Aziz Q, Bennett MI, Benoliel R, Cohen M, Evers S, Finnerup NB, First MB, Giamberardino MA, Kaasa S, Korwisi B, Kosek E, Lavand’homme P, Nicholas M, Perrot S, Scholz J, Schug S, Smith BH, Svensson P, Vlaeyen JWS, Wang SJ. Chronic pain as a symptom or a disease: the IASP Classification of Chronic Pain for the International Classification of Diseases (ICD-11). Pain. 2019;160(1):19-27.
  • 4
    Glare P, Aubrey KR, Myles PS. Transition from acute to chronic pain after surgery. Lancet. 2019;393(10180):1537-46.
  • 5
    Goldberg DS, McGee SJ. Pain as a global public health priority. BMC Public Health. 2011;11:770.
  • 6
    Cheatle MD. Biopsychosocial approach to assessing and managing patients with chronic pain. Med Clin North Am. 2016;100(1):43-53.
  • 7
    Sereza TW, Dellaroza MSG. O que está sendo aprendido a respeito da dor na UEL? Semina: Ciências Biológicas e da Saúde. 2003;24(1):55-66.
  • 8
    Alves RC, Tavares JP, Funes RA, Gasparetto GA, Silva KC, Ueda TK. Análise do conhecimento sobre dor pelos acadêmicos do curso de Fisioterapia em centro universitário. Rev Dor. 2013;14(4):272-9.
  • 9
    Capellini VK, Daré MF, Castral TC, Christoffel MMC, Leite AM, Scochi CGS. Conhecimento e atitudes de profissionais de saúde sobre avaliação e manejo da dor neonatal. Rev Eletrônca Enferm. 2014;16(2):361-9.
  • 10
    Santos LT, Otávio RV, Junior JLMM, Correa LA, Nogueira LAC. Avaliação do nível de conhecimento sobre neurofisiologia da dor em estudantes de fisioterapia - um estudo observacional. Cad Educ Saúde Fisioter. 2018;5(10).
  • 11
    Gomes AS, de Sá Ferreira A, Reis FJJ, de Jesus-Moraleida FR, Nogueira LAC, Meziat-Filho N. Association between low back pain and biomedical beliefs in academics of physiotherapy. Spine. 2020;45(19):1354-9.
  • 12
    Marques ES, Xarles T, Antunes TM, Silva KK, Reis FJ, Oliveira LA, Nogueira LA. Evaluation of physiologic pain knowledge by physiotherapy students. Rev Dor. 2016;17(1):29-33.
  • 13
    DeSantana JM, Souza JB, Reis FJ, Gosling AP, Paranhos E, Barboza HF, Baptista AF. Currículo em dor para graduação em Fisioterapia no Brasil. Rev Dor. 2017;18(1):72-8.
  • 14
    Venturine JS, Reis FJJ. O ensino sobre dor nos cursos de fisioterapia do Brasil: identificação e análise dos currículos. Cad Educ Saúde Fisioter. 2016;3(6).
  • 15
    Hoeger Bement MK, Sluka KA. The current state of physical therapy pain curricula in the United States: a faculty survey. J Pain. 2015;16(2):144-52.
  • 16
    Springer S, Gleicher H, Hababou H. Attitudes and beliefs about musculoskeletal pain and its association with pain neuroscience knowledge among physiotherapy students in Israel. Isr J Health Policy Res. 2018;7(1):67.
  • 17
    George SZ, Fritz JM, Silfies SP, Schneider MJ, Beneciuk JM, Lentz TA, Gilliam JR, Hendren S, Norman KS. Interventions for the management of acute and chronic low back pain: revision 2021. J Orthop Sports Phys Ther. 2021;51(11):CPG1-CPG60.
  • 18
    King R, Robinson V, Elliott-Button HL, Watson JA, Ryan CG, Martin DJ. Pain reconceptualisation after pain neurophysiology education in adults with chronic low back pain: a qualitative study. Pain Res Manag. 2018:3745651.
  • 19
    Alhowimel A, Alodiabi F, Alamam D, Alotaibi M, Fritz J. Current understanding of pain neurophysiology among physiotherapists practicing in Saudi Arabia. Healthcare. 2021;9(9):1242.
  • 20
    Alodaibi F, Alhowimel A, Alsobayel H. Pain neurophysiology knowledge among physical therapy students in Saudi Arabia: a cross-sectional study. BMC Med Educ. 2018;18(1):228.
  • 21
    Adillón C, Lozano È, Salvat I. Comparison of pain neurophysiology knowledge among health sciences students: a cross-sectional study. BMC Res Notes. 2015;8:592.
  • 22
    Mukoka G, Olivier B, Ravat S. Level of knowledge, attitudes and beliefs towards patients with chronic low back pain among final year School of Therapeutic Sciences students at the University of the Witwatersrand - A cross-sectional study. S Afr J Physiother. 2019;75(1):683.
  • 23
    Colleary G, O’Sullivan K, Griffin D, Ryan CG, Martin DJ. Effect of pain neurophysiology education on physiotherapy students’ understanding of chronic pain, clinical recommendations and attitudes towards people with chronic pain: a randomised controlled trial. Physiotherapy. 2017;103(4):423-9.
  • 24
    Nogueira LAC, Chaves AO, Oliveira N, Almeida RS, Reis JFF, Andrade FG, Catley MJ. Cross-cultural adaptation of the Revised Neurophysiology of Pain Questioannaire into Brazilian Portuguese language. J Bras Psiquiatr. 2018;67(4):273-7.
  • 25
    Cox T, Louw A, Puentedura EJ. An abbreviated therapeutic neuroscience education session improves pain knowledge in first-year physical therapy students but does not change attitudes or beliefs. J Man Manip Ther. 2016;25(1):11-21.
  • 26
    Hush JM, Nicholas M, Dean CM. Embedding the IASP pain curriculum into a 3-year pre-licensure physical therapy program: redesigning pain education for future clinicians. Pain Rep. 2018;3(2):e645.
  • 27
    Bareiss SK, Nare L, McBee K. Evaluation of pain knowledge and attitudes and beliefs from a pre-licensure physical therapy curriculum and a stand-alone pain elective. BMC Med Educ. 2019;19(1)375.
  • 28
    Fitzgerald K, Vaughan B, Fleischmann M, Austin P. Pain knowledge, attitudes and beliefs of Australian osteopaths drawn from a nationally representative sample of the profession. J Bodyw Mov Ther. 2020;24(4):43-50.
  • 29
    Middleton SJ, Barry AM, Comini M, Li Y, Ray P, Shiers S, Themistocleous AC, Uhelski ML, Yang X, Dougherty PM, Price TJ, Bennett DL. Studying human nociceptors: from fundamentals to clinic. Brain. 2021;144(5):1312-35.
  • 30
    Ribeiro MC, Costa IN, Ribeiro CJ, Nunes MS, Santos B, DeSantana JM. Knowledge of health professionals about pain and analgesia. Rev Dor. 2015;16(3):204=9.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Out 2023
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2023

Histórico

  • Recebido
    11 Out 2022
  • Aceito
    18 Jul 2023
Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor Av. Conselheiro Rodrigues Alves, 937 Cj2 - Vila Mariana, CEP: 04014-012, São Paulo, SP - Brasil, Telefones: , (55) 11 5904-2881/3959 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: dor@dor.org.br