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Profissionalizar a administração da cultura

Resumos

Após enunciar os princípios que devem nortear uma gestão cultural moderna e democrática, o artigo traça um panorama da área cultural pública brasileira entre 1986 e 1994. Examina o descaso de políticos, os critérios duvidosos na escolha de dirigentes de cúpula e a falta de qualificação de seus técnicos. Fornece pistas de como fazer avançar a racionalidade administrativa indispensável para que o Estado e empresas possam engajar-se em parcerias, como acontece na maioria dos países avançados.

administração cultural; administração pública; política cultural; profissionalismo


Four principIes seem to sum up what one might expect of an efflcient and democratic cultural policy: quality, diversity, preservation of identities and dissemination of values. To achieve these obiealves, a minimum of political and administrative continuity is necessary; a minimum of professionalization should be offered for the technical and concerned directing personnel. The article examines main challenges to the modernization cultural policy, in Brazil, since the end of military regime (7986) until nowadays.

culture management; public administration; cultural policy; professionalization


ORGANIZAÇÃO, RECURSOS HUMANOS E PLANEJAMENTO

Profissionalizar a administração da cultura

José Carlos Garcia Durand

Professor do Departamento de Fundamentos Sociais e Jurídicos da Administração e Coordenador do Centro de Estudos da Cultura e do Consumo da EAESP/FGV. E-mail cecc@eaesp.fgvsp.br

RESUMO

Após enunciar os princípios que devem nortear uma gestão cultural moderna e democrática, o artigo traça um panorama da área cultural pública brasileira entre 1986 e 1994. Examina o descaso de políticos, os critérios duvidosos na escolha de dirigentes de cúpula e a falta de qualificação de seus técnicos. Fornece pistas de como fazer avançar a racionalidade administrativa indispensável para que o Estado e empresas possam engajar-se em parcerias, como acontece na maioria dos países avançados.

Palavras-chave: administração cultural, administração pública, política cultural, profissionalismo.

ABSTRACT

Four principIes seem to sum up what one might expect of an efflcient and democratic cultural policy: quality, diversity, preservation of identities and dissemination of values. To achieve these obiealves, a minimum of political and administrative continuity is necessary; a minimum of professionalization should be offered for the technical and concerned directing personnel. The article examines main challenges to the modernization cultural policy, in Brazil, since the end of military regime (7986) until nowadays.

Key words: culture management, public administration, cultural policy, professionalization.

Texto completo disponível apenas em PDF.

Full text available only in PDF format.

Artigo recebido pela Redação da RAE em outubro/1995, avaliado em novembro/1995 e aprovado para publicação em março/1996.

Artigo apresentado no 11 Encuentro Internacional sobre Formación en Gestión Cultural, organizado pelo Convenio Andrés Bello, pela Subsecretaria de Cultura dei Ministerio de la Educación y Cultura dei Ecuador, e pela Organización de Los Estados Iberoamericanos. Quito, 24­28 de julho de 1995.

1. No Brasil, as leis de incentivo à cultura em vigor conseguem repassar efetivamente apenas entre 10 e 50% dos recursos colocados à disposição pelas empresas, por razões variadas. Estas abrangem desde a dificuldade de se encontrarem projetos em condições técnicas de serem aprovados, e também, de se montarem comissões de avaliação, até a necessidade de se encontrarem empresas dispostas a acrescentarem uma parcela de recursos próprios àquela dos impostos que deixam de recolher.

2. Elementos apresentados oralmente por Zarko Paic, da Open University da Croácia, em uma comunicação sob o tema "Postmodernism and cultural policy", feita na First World Culturelink Conference, ocorrida em Zagreb, Croácia, de 8 a 11 de junho de 1995; Ver também, a respeito: CHAUI, Marilena. Cidadania cultural como diretriz, Informativo do Instituto de Estudos Avançados da USP, p. 7, mar. 1995.

3. Embora se trate de um mandato presidencial atípico, posto que terminado pelo vice-presidente, em virtude do Impeachment do presidente eleito, o governo Fernando Collor/Itamar Franco (março de 1990/dezembro de 1994) teve nada menos do que cinco ministros da cultura, cada um com perfil diverso do anterior. Vale citar também a situação com que se defrontou o atual governo do Estado de São Paulo, iniciado em janeiro de 1995, quando constatou na administração um número enorme de funcionários contratados irregularmente. Ou seja, contratados à margem da lei, por meio de uma empresa estatal de prestação de serviços chamada Baneser, filiada ao Banco do Estado de São Paulo. Na Secretaria Estadual de Cultura, apurou-se que 1.500 de seus 2.000 funcionários estavam nessa situação e acabaram sendo demitidos. Destes, 400 foram reaproveitados de modo precário, por meio da lei no 3.131, que obriga o Governo a renovar seus contratos trimestralmente. Nessa mudança, eles perderam mais da metade da remuneração que auferiam. Com tamanho corte, a programação da Secretaria teve que ser reduzida, mas se procurou intensificar parcerias com empresas para evitar cancelamento de programas.

4. Estima-se esse estoque em três milhões de pessoas, no Brasil.

5. DURAND, J. C. Business and culture in Brazil. In: MARTORELLA, Rosanne (org.). Business and culture: a global perspective, New York : Praeger (no prelo); MENDONÇA, Marcos. A delicada fronteira entre empresa e cultura. In: MENDONÇA, Marcos (org.). Lei de incentivo à cultura - uma saída para a arte. São Paulo: Carthago & Forte, 1994, p. 31-9.

6. Dois estudos esclarecem muito bem isso: VERGER, Annie. L'art d'estimer l'art - comment classer l'incomparable? Actes de la Recherche en Sciences Sociales, Paris, n. 66/67, mar.1987; CRANE, Diana. Avantgarde art and social change: the New York art world and the transformation of the reward system, 1940-1980. In: MOULlN, Raymonde (org.). Sociologie de l'art. Paris: La Documentation Française, 1986.

7. HUGHES, Robert Cultura da reclamação: o desgaste americano. São Paulo: Cia. das Letras, 1993.

8. Ou, segundo a sugestiva menção de um artista plástico, ouvida em entrevista: "Hoje em dia, 'para frente' pode ser para qualquer lado, inclusive para trás ".

9. A rede de agências de financiamento à ciência mantidas pelo governo federal e por alguns governos estaduais no Brasil é considerada bastante satisfatória. Ela assegura a um número grande de professores e pesquisadores brasileiros oportunidade de se titularem e de se reciclarem dentro e fora do pais. Todavia, é um sistema em que os cientistas têm autonomia plena para decidir o que deve ou não ser financiado.

10. É absolutamente necessário que o gestor cultural conheça as funções cumpridas pela indústria cultural nos sistemas culturais das sociedades complexas, como única saída para evitar que ele se confine na retórica conservadora e equivocada que tende a somente ver, na cultura de massa, mediocridade e estereotipação.

11. DONNAT, COGNEAU. Les pratiques culturelles des Français. 1973-1989. Paris: La Découvertel La Documentation Française, 1990.

12. CANCLlNI, Néstor Garcia. Culturas híbridas: estratégias para entrar y salir de la modemidad. Mexico: Consejo Nacional para la Cultura y las Artes, 1990.

13. Esta constatação é recente, mas a obsolescêncla de um megaevento como a Bienal Internacional de Artes Plásticas de São Paulo já vem sendo indicada faz um bom tempo. Ver, a respeito, a publicação a seguir, onde onde o autor imagina, com bom humor, as múltiplas atividades culturais que poderiam usar melhor a imensa área ocupada pela Bienal: KLlNTOWITZ, Jacob. 30 segundos de televisão valem mais do que dois meses de Bienal de São Paulo: isso é bom ou ruim? São Paulo: Summus, 1981.

14. As considerações que seguem resultam da experiência apurada nas aulas e debates ocorridos desde 1994, no Curso de Administração da Cultura, organizado pelo CECC na EAESP/ FGV, embora a responsabilidade deste artigo seja só do autor. Para uma descrição desse programa de ensino, ver: DURAND, J.C. Lazer, cultura e profissão. In: MARCELLlNO, Nelson C. (org.). Lazer: formação e atuação profissional. Campinas: Papirus, 1995, p. 55-62. (Coleção Lazer & Fazer).

15. As disposições pessoais que permitem definir aptidão para animador cultural (e, por extensão, a todo tipo de gestor cultural) estão muito bem apresentadas nestes dois textos de um mesmo autor: GARCIA, Erivelto Bust. Os novos militantes culturais. In: MARCELLlNO, Nelson C. Op. cit., p. 23-54. Radicais, conformistas e alternativos: aspectos da política de recursos humanos para o lazer do SESC de São Paulo. In: MARCELLlNO, Nelson C. Op. cit, p. 135-48.

16. COLBERT, François. Le marketing des artes et de la culture. Boucherville, Québec: Gaëtan Morin, 1993.

17. Para uma descrição das formas de manifestação da "ideologia do desinteresse", assim como de suas funções e conseqüências da glorificação da miséria econômica no campo artístico, ver: BORDIEU, Pierre. O mercado de bens simbólicos. In: MICELI, Sergio (org.). A economia das trocas simbólicas. S. Paulo: Perspectiva, 1974.

  • 2. Elementos apresentados oralmente por Zarko Paic, da Open University da Croácia, em uma comunicação sob o tema "Postmodernism and cultural policy", feita na First World Culturelink Conference, ocorrida em Zagreb, Croácia, de 8 a 11 de junho de 1995;
  • Ver também, a respeito: CHAUI, Marilena. Cidadania cultural como diretriz, Informativo do Instituto de Estudos Avançados da USP, p. 7, mar. 1995.
  • 5. DURAND, J. C. Business and culture in Brazil. In: MARTORELLA, Rosanne (org.). Business and culture: a global perspective, New York : Praeger (no prelo);
  • MENDONÇA, Marcos. A delicada fronteira entre empresa e cultura. In: MENDONÇA, Marcos (org.). Lei de incentivo à cultura - uma saída para a arte São Paulo: Carthago & Forte, 1994, p. 31-9.
  • 6. Dois estudos esclarecem muito bem isso: VERGER, Annie. L'art d'estimer l'art - comment classer l'incomparable? Actes de la Recherche en Sciences Sociales, Paris, n. 66/67, mar.1987;
  • CRANE, Diana. Avantgarde art and social change: the New York art world and the transformation of the reward system, 1940-1980. In: MOULlN, Raymonde (org.). Sociologie de l'art. Paris: La Documentation Française, 1986.
  • 7. HUGHES, Robert Cultura da reclamação: o desgaste americano. São Paulo: Cia. das Letras, 1993.
  • 11. DONNAT, COGNEAU. Les pratiques culturelles des Français. 1973-1989. Paris: La Découvertel La Documentation Française, 1990.
  • 13. Esta constatação é recente, mas a obsolescêncla de um megaevento como a Bienal Internacional de Artes Plásticas de São Paulo já vem sendo indicada faz um bom tempo. Ver, a respeito, a publicação a seguir, onde onde o autor imagina, com bom humor, as múltiplas atividades culturais que poderiam usar melhor a imensa área ocupada pela Bienal: KLlNTOWITZ, Jacob. 30 segundos de televisão valem mais do que dois meses de Bienal de São Paulo: isso é bom ou ruim? São Paulo: Summus, 1981.
  • 14. As considerações que seguem resultam da experiência apurada nas aulas e debates ocorridos desde 1994, no Curso de Administração da Cultura, organizado pelo CECC na EAESP/ FGV, embora a responsabilidade deste artigo seja só do autor. Para uma descrição desse programa de ensino, ver: DURAND, J.C. Lazer, cultura e profissão. In: MARCELLlNO, Nelson C. (org.). Lazer: formação e atuação profissional. Campinas: Papirus, 1995, p. 55-62. (Coleção Lazer & Fazer).
  • 16. COLBERT, François. Le marketing des artes et de la culture. Boucherville, Québec: Gaëtan Morin, 1993.
  • 17. Para uma descrição das formas de manifestação da "ideologia do desinteresse", assim como de suas funções e conseqüências da glorificação da miséria econômica no campo artístico, ver: BORDIEU, Pierre. O mercado de bens simbólicos. In: MICELI, Sergio (org.). A economia das trocas simbólicas. S. Paulo: Perspectiva, 1974.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Jul 2012
  • Data do Fascículo
    Jun 1996

Histórico

  • Aceito
    Mar 1996
  • Revisado
    Nov 1995
  • Recebido
    Out 1995
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