Acessibilidade / Reportar erro

Ceramidas Plasmáticas na Estratificação de Risco das Doenças Cardiovasculares

Resumo

A produção de ceramida ocorre em todo o corpo e desempenha um papel importante na manutenção da fisiologia normal. No entanto, os níveis de ceramidas são alterados em estados de doença, principalmente durante o desenvolvimento de diabetes e dislipidemia. A produção de ceramidas também está associada à instabilidade das placas ateroscleróticas. Estudos recentes revelam que pacientes com doença arterial coronariana instável apresentam níveis plasmáticos aumentados de ceramidas (principalmente C16, C18 e C24:1). Atualmente, são consideradas biomarcadores emergentes nas doenças cardiovasculares, sendo utilizadas na predição de instabilidade da placa aterosclerótica e eventos cardiovasculares adversos de forma independente aos fatores de risco tradicionais. Com o objetivo de descrever e discutir o papel das ceramidas na estratificação das doenças cardiovasculares, o desenvolvimento desta revisão narrativa contextualiza a importância desse biomarcador no cenário atual da cardiologia.

Doenças Cardiovasculares; Doença da Arterial Coronariana; Ceramidas/uso terapêutico; Glicoesfingolipideos Neutros/uso terapêutico; Estratificação das Doenças; Diabetes Mellitus; Dislipidemias; Biomarcadores

Abstract

Ceramide production takes place throughout the body and plays a key role in the maintenance of normal physiology. However, ceramide levels are altered during disease states, particularly considering the development of diabetes and dyslipidemia. Ceramide production is also associated with atherosclerotic plaque instability. Recent studies revealed that patients with unstable coronary artery disease (CAD) presented increased plasma ceramide levels (especially C16, C18, and C24:1). These molecules are currently considered emerging biomarkers of cardiovascular diseases (CVD), being used for predicting atherosclerotic plaque instability and adverse cardiovascular events independently from traditional risk factors. With the aim of describing and discussing the role of ceramides in the stratification of cardiovascular diseases, this narrative review contextualizes the importance of this biomarker in the present cardiology scenario.

Cardiovascular Diseases; Coronary Artery Disease; Ceramides/therapeutic use; Diseases Stratification; Diabetes Mellitus Dyslipidemias; Biomarkers

Introdução

Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) demonstram que as doenças cardiovasculares (DCV) foram responsáveis por uma grande porcentagem dos 50 milhões de óbitos ocorridos na última década: cerca de 17 milhões de pessoas.11. Simao AF, Precoma DB, Andrade JP, Correa FH, Saraiva JFK, Oliveira GMM, et al. [I Brazilian Guidelines for cardiovascular prevention]. Arq Bras Cardiol. Dec 2013;101(6 Suppl 2):1-63. doi: 10.5935/abc.2013S012. Essa mortalidade é especialmente alta na fase aguda após um infarto agudo do miocárdio (IAM), com 10-15% de recorrência de eventos isquêmicos em 1 ano e taxas cumulativas de até 50% após 10 anos.22. Hamm CW, Bassand JP, Agewall S, Bt J, Boersma E, Caso P, et al. ESC Guidelines for the management of acute coronary syndromes in patients presenting without persistent ST-segment elevation: The Task Force for the management of acute coronary syndromes (ACS) in patients presenting without persistent ST-segment elevation of the European Society of Cardiology (ESC). Eur Heart J. Dec 2011;32(23):2999-3054. doi: 10.1093/eurheartj/ehr236.

Aproximadamente 50% dos pacientes submetidos a intervenção coronária percutânea primária (ICP) possuem doença multivascular que, de forma geral, apresenta-se como uma doença crônica progressiva e com altas taxas de mortalidade. Atualmente, não podemos prevenir com precisão a recorrência de eventos isquêmicos agudos, claramente demonstrando a grande necessidade de biomarcadores que possam prever a instabilidade da placa aterosclerótica coronariana.33. Park DW, Clare RM, Schulte PJ, Pieper KS, Shaw LK, Califf RM, et al. Extent, location, and clinical significance of non-infarct-related coronary artery disease among patients with ST-elevation myocardial infarction. JAMA. Nov 19 2014;312(19):2019-27. doi: 10.1001/jama.2014.15095.

Estudos recentes têm destacado o papel fisiopatológico de outras classes lipídicas além do colesterol de lipoproteína de baixa densidade (low density lipoprotein, LDL) na aterosclerose e no IAM, incluindo ceramidas, esfingomielina, fosfatidilcolinas e ésteres de colesterol.44. Wang DD, Toledo E, Hruby A, Rosnet BA, Willett WC, Sun Q, et al. Plasma Ceramides, Mediterranean Diet, and Incident Cardiovascular Disease in the PREDIMED Trial (Prevencion con Dieta Mediterranea). Circulation. May 23 2017;135(21):2028-40. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.116.024261.,55. Laaksonen R, Ekroos K, Sysi-Aho M, Hilvo M, Vihervaara T, Kauhanen D, et al. Plasma ceramides predict cardiovascular death in patients with stable coronary artery disease and acute coronary syndromes beyond LDL-cholesterol. Eur Heart J. Jul 1 2016;37(25):1967-76. doi: 10.1093/eurheartj/ehw148. As ceramidas participam de múltiplas vias envolvidas na sinalização de danos celulares, causando a liberação de citocinas pró-inflamatórias que modulam diretamente a apoptose por meio da expressão gênica de proteínas pró-apoptóticas.66. Scheiblich H, Schlutter A, Golenbock DT, Latz E, Martinez-Martinez P, Heneka MT. Activation of the NLRP3 inflammasome in microglia: the role of ceramide. J Neurochem. Dec 2017;143(5):534-50. doi: 10.1161/ATVBAHA.116.307497.

Nosso grupo tem trabalhado no desenvolvimento de biomarcadores lipídicos por meio de espectrometria de massa, entre outras técnicas de biologia molecular, para o desenvolvimento de um biomarcador plasmático capaz de diagnosticar a instabilidade da placa aterosclerótica e prever reinfartos cardíacos e a progressão para insuficiência cardíaca (IC) em pacientes com síndrome coronariana aguda (SCA).

A ceramida é um biomarcador lipídico com papel emergente no diagnóstico precoce e na estratificação de risco, atuando como biomarcador de eventos cardiovasculares (CVs) primários e secundários em pacientes com aterosclerose clínica e subclínica suscetíveis ao desenvolvimento de eventos isquêmicos agudos.55. Laaksonen R, Ekroos K, Sysi-Aho M, Hilvo M, Vihervaara T, Kauhanen D, et al. Plasma ceramides predict cardiovascular death in patients with stable coronary artery disease and acute coronary syndromes beyond LDL-cholesterol. Eur Heart J. Jul 1 2016;37(25):1967-76. doi: 10.1093/eurheartj/ehw148.,77. Havulinna AS, Sysi-Aho M, Hilvo M, Kauanen D, Hurme R, Ekroos K, et al. Circulating Ceramides Predict Cardiovascular Outcomes in the Population-Based FINRISK 2002 Cohort. Arterioscler Thromb Vasc Biol. Dec 2016;36(12):2424-30. doi: 10.1161/ATVBAHA.116.307497.

Ceramida: uma breve revisão da fisiologia desse novo biomarcador lipídico.

As ceramidas e o colesterol LDL são lipídios estruturais da membrana que mantêm sua fluidez e integridade por meio da formação de poros seletivos, modulando a movimentação de compostos entre os espaços intra e extracelulares. A ceramida é um esfingolipídio formado pela associação de uma esfingosina com um ácido graxo, sendo um componente-chave na formação das membranas celulares8 e atuando como um importante intermediário na sinalização de processos que regulam a homeostase celular, tais como inflamação, apoptose e a resposta celular ao estresse.99. Edsfeldt A, Duner P, Stahlman M, Mollet IG, Ascinto G, Grulman H, et al. Sphingolipids Contribute to Human Atherosclerotic Plaque Inflammation. Arterioscler Thromb Vasc Biol. Jun 2016;36(6):1132-40. doi: 10.1161/ATVBAHA.116.305675.

As ceramidas se acumulam na placa de ateroma coronariana1010. Mukhin DN, Chao FF, Kruth HS. Glycosphingolipid accumulation in the aortic wall is another feature of human atherosclerosis. Arterioscler Thromb Vasc Biol. Oct 1995;15(10):1607-15. DOI: 10.1161/01.atv.15.10.1607 e em suas formas glicosiladas: as glicosilceramidas e as lactosilceramidas (Figura 1), que são abundantes na placa em desenvolvimento.1111. Chatterjee S. Sphingolipids in atherosclerosis and vascular biology. Arterioscler Thromb Vasc Biol. Oct 1998;18(10):1523-33. DOI: 10.1161/01.atv.15.10.1607,1212. Chatterjee SB, Dey S, Shi WY, Thomas K, Hutchins GM. Accumulation of glycosphingolipids in human atherosclerotic plaque and unaffected aorta tissues. Glycobiology. Feb 1997;7(1):57-65. DOI: 10.1093/glycob/7.1.57 Além disso, dados do nosso grupo mostraram que o próprio tecido miocárdico pode produzir ceramidas diretamente em resposta à isquemia e reperfusão.1313. de Carvalho LP, Tan SH, Ow GS, Tang Z, Ching J, Kovalik JP, et al. Plasma Ceramides as Prognostic Biomarkers and Their Arterial and Myocardial Tissue Correlates in Acute Myocardial Infarction. JACC Basic Transl Sci. Apr 2018;3(2):163-75. doi: 10.1016/j.jacbts.2017.12.005.

Figura 1
– Vias do metabolismo de esfingolipídios.

A ceramidase é uma enzima que quebra os ácidos graxos da ceramida para produzir esfingosina, a qual, por sua vez, é fosforilada pela esfingosina-1-fosfatase para formar esfingosina-1-fosfato. A síntese das ceramidas pode ocorrer através da hidrólise da esfingomielina (degradação), através da via de recuperação (reciclagem) na qual a esfingosina é fosforilada ou através de uma via de novo, na qual as diidroceramidas são dessaturadas.99. Edsfeldt A, Duner P, Stahlman M, Mollet IG, Ascinto G, Grulman H, et al. Sphingolipids Contribute to Human Atherosclerotic Plaque Inflammation. Arterioscler Thromb Vasc Biol. Jun 2016;36(6):1132-40. doi: 10.1161/ATVBAHA.116.305675.

Ceramidas: uma ligação entre aterosclerose, diabetes e dislipidemia

As ceramidas constituem aproximadamente 30% do colesterol LDL circulante. O aumento da concentração de ceramida altera a permeabilidade da membrana celular, facilitando o acúmulo de colesterol LDL na parede do vaso. Esse acúmulo amplifica o processo inflamatório da parede do vaso e promove a apoptose das células musculares lisas vasculares e a disfunção endotelial, ocasionando a instabilidade da placa aterosclerótica e sua ruptura1414. Cheng JM, Suoniemi M, Kardys I, Vihenvara T, de Boer SP, Akkerhuis KM, et al. Plasma concentrations of molecular lipid species in relation to coronary plaque characteristics and cardiovascular outcome: Results of the ATHEROREMO-IVUS study. Atherosclerosis. Dec 2015;243(2):560-6. doi: 10.1016/j.atherosclerosis.2015.10.022. (Figura 2).

Figura 2
– Ceramidas plasmáticas e ruptura de placa. ECAM = eventos cardiovasculares adversos maiores. Fonte: coleção do autor.

Além da placa aterosclerótica, o acúmulo de colesterol também ocorre na musculatura lisa esquelética, interferindo na expressão do transportador de glicose tipo 4, o que ocasiona defeito no transporte muscular de glicose e prejudica sua capacidade de síntese de glicogênio.1515. Sesti G. Pathophysiology of insulin resistance. Best Pract Res Clin Endocrinol Metab. Dec 2006;20(4):665-79. DOI: 10.1016/j.beem.2006.09.007 As ceramidas também estimulam a apoptose das células β pancreáticas, reduzindo diretamente a produção de insulina.1616. Lupi R, Dotta F, Marselli L, Del Guerra S, Masini M, Santangelo C, et al. Prolonged exposure to free fatty acids has cytostatic and pro-apoptotic effects on human pancreatic islets: evidence that beta-cell death is caspase mediated, partially dependent on ceramide pathway, and Bcl-2 regulated. Diabetes. May 2002;51(5):1437-42. doi: 10.2337/diabetes.51.5.1437. Major et al.,1717. Major CD, Gao ZY, Wolf BA. Activation of the sphingomyelinase/ceramide signal transduction pathway in insulin-secreting beta-cells: role in cytokine-induced beta-cell death. Diabetes. Jul 1999;48(7):1372-1380. doi: 10.2337/diabetes.48.7.1372. demonstraram que as ceramidas podem mimetizar os efeitos citotóxicos do fator de necrose tumoral, da interleucina 1 beta e do interferon-gama nas células β pancreáticas, desencadeando inflamação e apoptose.1717. Major CD, Gao ZY, Wolf BA. Activation of the sphingomyelinase/ceramide signal transduction pathway in insulin-secreting beta-cells: role in cytokine-induced beta-cell death. Diabetes. Jul 1999;48(7):1372-1380. doi: 10.2337/diabetes.48.7.1372. O acúmulo de ceramida nos tecidos resulta na disfunção metabólica de múltiplos órgãos e no desenvolvimento de complicações do diabetes. A Figura 3 demonstra os principais tecidos afetados pelas ceramidas.1818. Yaribeygi H, Bo S, Ruscica M, Sahebkar A. Ceramides and diabetes mellitus: an update on the potential molecular relationships. Diabet Med. Jan 2020;37(1):11-19. doi: 10.1111/dme.13943,1919. Li Z, Fan Y, Liu J, Li Y, Huan C, Bui HH, et al. Impact of sphingomyelin synthase 1 deficiency on sphingolipid metabolism and atherosclerosis in mice. Arterioscler Thromb Vasc Biol. Jul 2012;32(7):1577-84. doi: 10.1161/ATVBAHA.112.251538

Figura 3
– Ação das ceramidas em diferentes órgãos.

Portanto, além de determinar o grau de dislipidemia e o risco de aterosclerose através do valor do colesterol LDL, a dosagem da ceramida também auxilia o médico a determinar a resistência insulínica e a apoptose de células beta pancreáticas.

A implicação clínica da ceramida levou à patente desse biomarcador nos EUA e na Europa, estando atualmente disponível para uso clínico em hospitais de referência, como a Mayo Clinic.2020. Mayo Clinic. Ceramides: a class of lipids with links to heart disease. [Cited in 2020 June 12] Available at:https://www.mayoclinic.org
https://www.mayoclinic.org...

Os exames de rastreamento são necessários para o acompanhamento da aterosclerose subclínica?

Há uma lacuna significativa na detecção da doença aterosclerótica subclínica e na triagem e no acompanhamento custo-efetivos dessa condição, com muitos testes não invasivos sendo solicitados rotineiramente em populações com diferentes níveis de risco CV. Isso ocorre em todo o mundo e, apesar do avanço crescente dos testes não invasivos para a detecção da doença aterosclerótica, a estratificação de risco permanece imperfeita.2121. Pinto IMF. Uso racional dos exames diagnósticos em cardiologia. Rev So Cardiol Est São Paulo. 2017 2017;27:163-70. Considerando os custos crescentes com os cuidados de saúde, essa prática médica estereotipada deve, portanto, ser reavaliada.

A associação de dados clínicos e de imagem no apoio ao desenvolvimento de protocolos que incorporem escores de risco clássicos, como os escores de Framingham e INTERHEART, tem sido testada com o intuito de aprimorar a estratificação de risco CV. No entanto, esses métodos, quando aplicados à população em geral sem uma etapa de triagem, têm capacidade limitada na avaliação do risco CV por razões logísticas e de custo.2222. Azevedo CF, Rochitte CE, Lima JA. Coronary artery calcium score and coronary computed tomographic angiography for cardiovascular risk stratification. Arq Bras Cardiol. Jun 2012;98(6):559-68. doi: 10.1590/s0066-782x2012000600012.

O Multi-Ethnic Study of Atherosclerosis (MESA), um dos estudos mais relevantes na área, trouxe contribuições importantes para a compreensão do desenvolvimento e da progressão da DCV do estágio subclínico ao clínico. Em uma subanálise do MESA, um grande painel de biomarcadores de proteínas foi avaliado para encontrar marcadores preditivos de progressão de DCV. Em comparação aos fatores de risco CV clássicos, biomarcadores de proteína com vários painéis específicos de inflamação, resistência à insulina, lipídios, hemostasia, fibrinólise, dano oxidativo, estresse endotelial, entre outros, foram testados e apresentaram apenas um valor preditivo incremental limítrofe para eventos adversos CVs em longo prazo (AUC: 0,768 vs. 0,776, p = 0,003) e não apresentaram valor incremental na predição de eventos CVs adversos em médio prazo (AUC: 0,795 vs. 0,796, p = 0,627). Portanto, devido aos valores semelhantes da curva característica de operação do receptor (receiver operating characteristic, ROC), novos métodos de rastreamento e estratificação de risco são necessários para melhorar a detecção precoce da instabilidade da placa.2323. Tattersall MC, Gassett A, Korcarz CE, Gepner AD, Kaufman JD, Liu KJ, et al. Predictors of carotid thickness and plaque progression during a decade: the Multi-Ethnic Study of Atherosclerosis. Stroke. Nov 2014;45(11):3257-62. doi: 10.1161/STROKEAHA.114.005669

O desenvolvimento desse biomarcador possibilitaria a intervenção na progressão inicial da placa aterosclerótica, sendo, portanto, essencial para evitar o enorme custo adicional imposto pela fase sintomática da doença aterosclerótica. Essas considerações são importantes e devem ser avaliadas no desenvolvimento de plataformas de rastreamento de saúde populacional, objetivando uma boa relação de custo-efetividade.

Devemos dosar as ceramidas e o colesterol LDL?

A aterosclerose subclínica antecede a maioria dos eventos CVs e sua detecção pode melhorar a estratificação de risco CV.1111. Chatterjee S. Sphingolipids in atherosclerosis and vascular biology. Arterioscler Thromb Vasc Biol. Oct 1998;18(10):1523-33. DOI: 10.1161/01.atv.15.10.1607,1212. Chatterjee SB, Dey S, Shi WY, Thomas K, Hutchins GM. Accumulation of glycosphingolipids in human atherosclerotic plaque and unaffected aorta tissues. Glycobiology. Feb 1997;7(1):57-65. DOI: 10.1093/glycob/7.1.57 No entanto, uma incompatibilidade tem sido relatada entre perfis de fatores de risco convencionais aparentemente benignos e a presença de aterosclerose subclínica detectada por calcificação da artéria coronária ou medição da espessura da íntima no ultrassom de carótidas.1313. de Carvalho LP, Tan SH, Ow GS, Tang Z, Ching J, Kovalik JP, et al. Plasma Ceramides as Prognostic Biomarkers and Their Arterial and Myocardial Tissue Correlates in Acute Myocardial Infarction. JACC Basic Transl Sci. Apr 2018;3(2):163-75. doi: 10.1016/j.jacbts.2017.12.005.,1414. Cheng JM, Suoniemi M, Kardys I, Vihenvara T, de Boer SP, Akkerhuis KM, et al. Plasma concentrations of molecular lipid species in relation to coronary plaque characteristics and cardiovascular outcome: Results of the ATHEROREMO-IVUS study. Atherosclerosis. Dec 2015;243(2):560-6. doi: 10.1016/j.atherosclerosis.2015.10.022.

Estudos identificaram a presença de aterosclerose subclínica em quase 60% dos indivíduos de meia-idade classificados como de baixo risco CV de acordo com os escores de risco tradicionais; em 41% desses indivíduos, observaram-se múltiplos locais vasculares afetados.1515. Sesti G. Pathophysiology of insulin resistance. Best Pract Res Clin Endocrinol Metab. Dec 2006;20(4):665-79. DOI: 10.1016/j.beem.2006.09.007 Esses achados sugerem que outras variáveis além dos fatores de risco CV convencionais podem desempenhar um papel relevante na aterogênese.

Os pacientes com doença aterosclerótica são uma população muito heterogênea, com estratificação de risco complexa, sendo errôneo considerar todos esses pacientes com risco semelhante de eventos agudos. Atualmente, o uso de escores de risco CV é indicado pelas diretrizes como uma ferramenta de estratificação; no entanto, devido às limitações na precisão preditiva, principalmente em pacientes com alto risco CV, a otimização das ferramentas de risco por meio da recalibração de escores ou da associação com biomarcadores é frequentemente necessária para uma maior acurácia preditiva em diferentes populações.

O colesterol LDL é um fator de risco diretamente envolvido no desenvolvimento da placa aterosclerótica e, portanto, um importante alvo terapêutico na prática clínica. Dieta, mudanças no estilo de vida e medicamentos podem resultar em reduções significativas e sustentadas do colesterol LDL plasmático. No entanto, apesar disso, as DCVs continuam sendo uma das principais causas de morte em todo o mundo,2424. Yusuf S, Hawken S, Ounpuu S, Dans T, Avezum A, Lonas F, et al. Effect of potentially modifiable risk factors associated with myocardial infarction in 52 countries (the INTERHEART study): case-control study. Lancet. Sep 11-17 2004;364(9438):937-52. doi: 10.1161/STROKEAHA.114.005669 sugerindo que o controle convencional do colesterol LDL não é suficiente. A detecção e a prevenção precoces da instabilidade da placa aterosclerótica podem abrir caminhos para reduzir significativamente a progressão da doença.

As diretrizes atuais endossam o controle do colesterol LDL e a medição de marcadores inflamatórios inespecíficos, como a proteína C reativa, para a estratificação de risco CV. No entanto, a fisiopatologia da aterosclerose envolve a interseção complexa de dislipidemia, inflamação, disfunção endotelial e ativação plaquetária, entre outros fatores.2525. Xavier HT, Izar MC, Faria Neto JR, Assad MH, Rocha VZ, Sposito AC, et al. [V Brazilian Guidelines on Dyslipidemias and Prevention of Atherosclerosis]. Arq Bras Cardiol. Oct 2013;101(4 Suppl 1):1-20. doi: 10.5935/abc.2013S010. Dados recentes demonstram possíveis associações entre cada uma dessas vias com os níveis plasmáticos das ceramidas, indicando associação e causalidade plausíveis desse biomarcador em DCV aguda e instabilidade da placa aterosclerótica.

Além disso, o colesterol LDL plasmático não prediz com precisão eventos cardíacos adversos maiores e eventos cerebrovasculares (major adverse cardiac and cerebrovascular events, MACCE), exigindo, na prática clínica, avaliação médica criteriosa e uma série de testes não invasivos para acompanhar a progressão da placa aterosclerótica.26 Por outro lado, as concentrações plasmáticas de ceramidas são elevadas em várias condições relacionadas às doenças cardíacas, além do papel bioquímico na progressão da aterosclerose, também estudado por nosso grupo anteriormente. Observamos em estudos preliminares a liberação incremental de ceramidas na fase aguda do IAM e em placas humanas instáveis, correlacionando esses achados com dados pré-clínicos que mostraram a suprarregulação de enzimas produtoras de ceramidas no miocárdio, com aumento dos níveis plasmáticos nas primeiras 24 horas após um evento isquêmico agudo.55. Laaksonen R, Ekroos K, Sysi-Aho M, Hilvo M, Vihervaara T, Kauhanen D, et al. Plasma ceramides predict cardiovascular death in patients with stable coronary artery disease and acute coronary syndromes beyond LDL-cholesterol. Eur Heart J. Jul 1 2016;37(25):1967-76. doi: 10.1093/eurheartj/ehw148.

As ceramidas também estão associadas a um maior risco de evolução em pacientes com IC. Em 423 pacientes com IC aguda, as concentrações plasmáticas de ceramidas foram independentemente associadas à morte e à piora da função ventricular esquerda durante a hospitalização.2727. Yu J, Pan W, Shi R, Yang T, Li Y, Yu Y, et al. Ceramide is upregulated and associated with mortality in patients with chronic heart failure. Can J Cardiol. Mar 2015;31(3):357-63. doi: 10.1016/j.cjca.2014.12.007

A busca por evidências: ceramidas e predição de risco CV

Prevenção primária:

O estudo FINRISK incluiu pacientes sem eventos cardiovasculares prévios e mostrou que os níveis circulantes de ceramidas específicas (16:0, 18:0 e 24:1) estão significativamente associados a eventos cardiovasculares maiores subsequentes quando comparados a indivíduos que permaneceram assintomáticos. As associações univariadas significativas entre ceramidas e eventos fatais sugerem que elas desempenham um papel fundamental na ruptura das placas ateroscleróticas nessa população.77. Havulinna AS, Sysi-Aho M, Hilvo M, Kauanen D, Hurme R, Ekroos K, et al. Circulating Ceramides Predict Cardiovascular Outcomes in the Population-Based FINRISK 2002 Cohort. Arterioscler Thromb Vasc Biol. Dec 2016;36(12):2424-30. doi: 10.1161/ATVBAHA.116.307497.

Além disso, Petterson et al.,2828. Peterson LR, Xanthakis V, Duncan MS, Gross S, Friedrich N, Volzke H, et al. Ceramide Remodeling and Risk of Cardiovascular Events and Mortality. J Am Heart Assoc. May 3 2018;7(10):e007931. doi: 10.1161/JAHA.117.007931. demonstraram, ainda no contexto da prevenção primária, que a proporção de ceramidas C24:0/C16:0 e a concentração plasmática de ceramida C24:0 estão inversamente associadas a fatores de risco coronariano, como idade e tabagismo, e inversamente associadas ao desenvolvimento de DAC e IC.2828. Peterson LR, Xanthakis V, Duncan MS, Gross S, Friedrich N, Volzke H, et al. Ceramide Remodeling and Risk of Cardiovascular Events and Mortality. J Am Heart Assoc. May 3 2018;7(10):e007931. doi: 10.1161/JAHA.117.007931.

Doença arterial coronária:

Em uma análise post-hoc do Systolic Blood Pressure Intervention Trial (N = 9.631), Nguyen et al.,3131. Kaasenbrood L, Boekholdt SM, van der Graaf Y, Ray KK, Peters RJG, Kastelein JJP, et al. Distribution of Estimated 10-Year Risk of Recurrent Vascular Events and Residual Risk in a Secondary Prevention Population. Circulation. Nov 8 2016;134(19):1419-29. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.116.021314. demonstraram que os níveis plasmáticos de colesterol LDL não estavam associados ao desfecho composto primário (infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral, insuficiência cardíaca descompensada aguda e morte por causas CVs).2929. Nguyen LS, Procopi N, Salem JE, Squara P, Funck-Brentano C. Relation between baseline LDL-cholesterol and cardiovascular outcomes in high cardiovascular risk hypertensive patients: A post-hoc SPRINT data analysis. Int J Cardiol. Jul 1 2019;286:159-61. doi: 10.1016/j.ijcard.2019.01.048. Além disso, avaliando os pacientes em prevenção secundária de eventos CVs (N = 1.562), observou-se que o colesterol LDL foi apenas marginalmente associado à incidência de eventos CVs: taxa de risco ajustada: 1,005 (intervalo de confiança de 95% [IC95%] = 1,002-1,009; p = 0,005 [aumento de 1 mg/dL]), com baixa capacidade de discriminação de eventos cardiovasculares adversos maiores (MACE) (área ROC de 0,54; p = 0,087).2929. Nguyen LS, Procopi N, Salem JE, Squara P, Funck-Brentano C. Relation between baseline LDL-cholesterol and cardiovascular outcomes in high cardiovascular risk hypertensive patients: A post-hoc SPRINT data analysis. Int J Cardiol. Jul 1 2019;286:159-61. doi: 10.1016/j.ijcard.2019.01.048.

Embora estudos com inibidores de PCSK9, como o Odyssey Outcomes e Fourier,3030. Sabatine MS, Giugliano RP, Pedersen TR. Evolocumab in Patients with Cardiovascular Disease. N Engl J Med. Aug 24 2017;377(8):787-8. doi: 10.1056/NEJMoa1615664 reforcem o princípio “quanto menor, melhor”, significando que há uma associação entre níveis baixos de colesterol LDL e baixo risco de aterosclerose clínica, não há uma correlação de risco perfeita. Para preencher essa lacuna, o uso de métodos de medição de metabólitos por técnicas metabolômicas tem sido cada vez mais utilizado, pois esses métodos apresentam vantagens sobre os métodos clássicos devido à análise mais abrangente dos metabólitos e à capacidade de obtenção do perfil metabólico do tecido-alvo da doença de interesse.

Uma análise metabolômica não direcionada identificou três ceramidas plasmáticas significativamente associadas à mortalidade cardiovascular em uma coorte com DAC confirmada por angiografia. As ceramidas associadas à alta mortalidade cardiovascular nesse estudo foram: C16:0, C18:0 e C24:1. A associação ocorreu independentemente de idade, índice de massa corporal, tabagismo, uso de estatinas, triglicerídeos, LDL e colesterol total.1414. Cheng JM, Suoniemi M, Kardys I, Vihenvara T, de Boer SP, Akkerhuis KM, et al. Plasma concentrations of molecular lipid species in relation to coronary plaque characteristics and cardiovascular outcome: Results of the ATHEROREMO-IVUS study. Atherosclerosis. Dec 2015;243(2):560-6. doi: 10.1016/j.atherosclerosis.2015.10.022.

Kaasenbrood et al.,3131. Kaasenbrood L, Boekholdt SM, van der Graaf Y, Ray KK, Peters RJG, Kastelein JJP, et al. Distribution of Estimated 10-Year Risk of Recurrent Vascular Events and Residual Risk in a Secondary Prevention Population. Circulation. Nov 8 2016;134(19):1419-29. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.116.021314. tentaram melhorar a predição de eventos agudos nesse grupo de pacientes através do escore de risco SMART (manifestações secundárias de doença arterial).3131. Kaasenbrood L, Boekholdt SM, van der Graaf Y, Ray KK, Peters RJG, Kastelein JJP, et al. Distribution of Estimated 10-Year Risk of Recurrent Vascular Events and Residual Risk in a Secondary Prevention Population. Circulation. Nov 8 2016;134(19):1419-29. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.116.021314. Esse escore de risco compreende variáveis clínicas e laboratoriais (colesterol total, colesterol HDL, taxa de filtração glomerular estimada, proteína C reativa) e foi testado em várias coortes. Com base nos resultados obtidos, os autores sugeriram novos algoritmos de estimativa de risco CV para estratificar essa população individualmente e com maior precisão, demonstrando a capacidade de aprimoramento dos escores de risco pela incorporação de biomarcadores.3131. Kaasenbrood L, Boekholdt SM, van der Graaf Y, Ray KK, Peters RJG, Kastelein JJP, et al. Distribution of Estimated 10-Year Risk of Recurrent Vascular Events and Residual Risk in a Secondary Prevention Population. Circulation. Nov 8 2016;134(19):1419-29. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.116.021314.

No Mediterranean Diet Prevention (PREDIMED), um estudo de coorte prospectivo em pacientes com alto risco CV, ceramidas C24:0, C22:0 e C16:0 foram associadas a DCV.4 A razão de chance (odds ratio, OR) comparando os quartis extremos das concentrações plasmáticas de ceramidas C16: 0, C22: 0, C24: 0 e C24: 1 foram de 2,39 (1,49-3,83; p < 0,001), 1,91 (1,21-3,01; p = 0,003), 1,97 (1,21-3,01; p = 0,004) e 1,73 (1,09-2,74; p = 0,011), respectivamente. Em um estudo prospectivo de aproximadamente 500 pacientes submetidos a angiografia coronária eletiva, Meeusen et al. relataram que os níveis plasmáticos de C16:0, C18:0 e C24:1 foram independentemente associados a um risco aumentado de MACCE em um acompanhamento médio de 4 anos.3232. Meeusen JW, Donato LJ, Bryant SC, Baudhuin LM, Berger PB, Jaffe AS. Plasma Ceramides. Arterioscler Thromb Vasc Biol. Aug 2018;38(8):1933-9. doi: 10.1161/ATVBAHA.118.311199. O risco associado às ceramidas foi novamente independente dos fatores de risco tradicionais, incluindo idade, sexo, índice de massa corporal, tabagismo e colesterol. Além disso, o valor preditivo permaneceu significativo após ajustes adicionais para glicose sérica e história familiar de DAC. Esses resultados sugerem que, quando as ceramidas plasmáticas estão altas em pacientes com ou sem estenose significativa da artéria coronária, o risco de morte é alto em ambos os grupos.3232. Meeusen JW, Donato LJ, Bryant SC, Baudhuin LM, Berger PB, Jaffe AS. Plasma Ceramides. Arterioscler Thromb Vasc Biol. Aug 2018;38(8):1933-9. doi: 10.1161/ATVBAHA.118.311199.

Outro escore de risco envolvendo ceramidas é o CERT2, que foi desenvolvido no estudo The Western Norway Coronary Angiography Cohort (WECAC) e validado nos estudos Intervenção a Longo Prazo com Pravastatina em Doença Isquêmica (LIPID) e Langzeiterfolge der KARdiOLogischen Anschlussheilbehandlung (KAROLA).3333. Hilvo M, Meikle PJ, Pedersen ER, Tell GS, Dhar I, Bremer H, et al. Development and validation of a ceramide- and phospholipid-based cardiovascular risk estimation score for coronary artery disease patients. Eur Heart J. Jan 14 2020;41(3):371-80. doi: 10.1093/eurheartj/ehz387. Os resultados mostraram que a ferramenta de estimativa de risco CV desenvolvida com a incorporação da medição de ceramidas pode estratificar os MACE de forma confiável em pacientes com DAC estável. Evidências adicionais obtidas nos estudos WECAC e LIPID demonstraram que esses biomarcadores isoladamente estratificam de forma acurada o risco CV primário em pacientes com e sem diabetes; em indivíduos com diabetes, os únicos preditores com valor significativo no estudo WECAC foram o escore CERT2 e a troponina altamente sensível.

SCA

No estudo European Collaborative Project on Inflammation and Vascular Wall Remodeling in Atherosclerosis – Intravascular Ultrasound (N = 600 pacientes), Cheng et al. demonstraram que os níveis plasmáticos de C16:0, C18:0 e C24:1 foram significativamente associados à morfologia vulnerável da placa coronária em indivíduos com SCA. Além disso, os níveis plasmáticos mais elevados dessas ceramidas também foram significativamente associados a uma maior gravidade angiográfica de estenose coronariana,1414. Cheng JM, Suoniemi M, Kardys I, Vihenvara T, de Boer SP, Akkerhuis KM, et al. Plasma concentrations of molecular lipid species in relation to coronary plaque characteristics and cardiovascular outcome: Results of the ATHEROREMO-IVUS study. Atherosclerosis. Dec 2015;243(2):560-6. doi: 10.1016/j.atherosclerosis.2015.10.022.,3434. Mantovani A, Bonapace S, Lunardi G, Canali G, Dugo C, Vinco G, et al. Associations between specific plasma ceramides and severity of coronary-artery stenosis assessed by coronary angiography. Diabetes Metab. Apr 2020;46(2):150-7. bem como a uma menor perfusão da parede miocárdica pós-estresse em pacientes com DAC estabelecida ou suspeita que realizaram cintilografia de perfusão miocárdica.3535. Mantovani A, Bonapace S, Lunardi G, Canali G, Dugo C, Vinco G, et al. Association of Plasma Ceramides With Myocardial Perfusion in Patients With Coronary Artery Disease Undergoing Stress Myocardial Perfusion Scintigraphy. Arterioscler Thromb Vasc Biol. Dec 2018;38(12):2854-61. doi: 10.1016/j.diabet.2019.07.006.,3636. Mantovani A, Bonapace S, Lunardi G, Salgarello M, Deigo C, Canalli G, et al. Association between plasma ceramides and inducible myocardial ischemia in patients with established or suspected coronary artery disease undergoing myocardial perfusion scintigraphy. Metabolism. Aug 2018;85:305-12. doi: 10.1016/j.diabet.2019.07.006 Esses achados sugerem causalidade entre a elevação das ceramidas na placa aterosclerótica e sua instabilidade ou gravidade.

Recentemente, Pan, Dong, Sun et al. utilizando tomografia de coerência óptica (optical coherence tomography, OCT) em pacientes com STEMI e ruptura de placa, observaram níveis plasmáticos elevados de C16:0, C18:0 e C24:0 em comparação a indivíduos sem doença coronariana e pacientes com DAC estável (p < 0,001, p < 0,001, p < 0,001, p < 0,001, respectivamente). Esse foi o primeiro estudo utilizando OCT que provou uma associação positiva e independente entre as concentrações plasmáticas de ceramidas e a presença de ruptura de placa, sugerindo que as concentrações plasmáticas de ceramidas podem atuar como potenciais biomarcadores para a ruptura de placa.3737. Pan W, Dong H, Sun R, Zhao L, Sun M, Li L, et al. Plasma Ceramides in Relation to Coronary Plaque Characterization Determined by Optical Coherence Tomography. J Cardiovasc Transl Res. Mar 24 2021;14(1):140-9. doi: 10.1007/s12265-020-09978-3.

Mais evidências dessa associação foram obtidas no estudo de Laaksonen et al.,55. Laaksonen R, Ekroos K, Sysi-Aho M, Hilvo M, Vihervaara T, Kauhanen D, et al. Plasma ceramides predict cardiovascular death in patients with stable coronary artery disease and acute coronary syndromes beyond LDL-cholesterol. Eur Heart J. Jul 1 2016;37(25):1967-76. doi: 10.1093/eurheartj/ehw148. Em uma coorte prospectiva de pacientes com DAC estável, 81 dos 1.580 pacientes (Tabela 1) apresentaram elevação de ceramida sérica e, posteriormente, apresentaram MACE ao longo de 4,6 anos de acompanhamento. Essa proporção foi mantida mesmo após o ajuste para o tratamento com estatinas. As ceramidas foram preditivas em ambos os casos, com OR praticamente igual em pacientes com ou sem estatinas: 1,68 (1,31-2,15) vs. 1,7 (1,33-2,17), respectivamente. Nesse estudo, o nível plasmático de colesterol LDL não foi significativamente preditivo de MACE.55. Laaksonen R, Ekroos K, Sysi-Aho M, Hilvo M, Vihervaara T, Kauhanen D, et al. Plasma ceramides predict cardiovascular death in patients with stable coronary artery disease and acute coronary syndromes beyond LDL-cholesterol. Eur Heart J. Jul 1 2016;37(25):1967-76. doi: 10.1093/eurheartj/ehw148.

Tabela 1
– Escore de risco relativo envolvendo ceramidas em diferentes coortes

Laaksonen et al.,55. Laaksonen R, Ekroos K, Sysi-Aho M, Hilvo M, Vihervaara T, Kauhanen D, et al. Plasma ceramides predict cardiovascular death in patients with stable coronary artery disease and acute coronary syndromes beyond LDL-cholesterol. Eur Heart J. Jul 1 2016;37(25):1967-76. doi: 10.1093/eurheartj/ehw148. também analisaram o estudo SPUM-SCA (N = 1.637), realizado em pacientes com SCA, em que as ceramidas foram novamente preditoras de MACE independentemente do risco CV. Em 51 pacientes que morreram em até um ano após um evento cardíaco, as ceramidas plasmáticas mensuradas apresentaram níveis significativamente maiores em comparação aos pacientes que sobreviveram durante o acompanhamento.55. Laaksonen R, Ekroos K, Sysi-Aho M, Hilvo M, Vihervaara T, Kauhanen D, et al. Plasma ceramides predict cardiovascular death in patients with stable coronary artery disease and acute coronary syndromes beyond LDL-cholesterol. Eur Heart J. Jul 1 2016;37(25):1967-76. doi: 10.1093/eurheartj/ehw148.

Finalmente, De Carvalho et al.,1313. de Carvalho LP, Tan SH, Ow GS, Tang Z, Ching J, Kovalik JP, et al. Plasma Ceramides as Prognostic Biomarkers and Their Arterial and Myocardial Tissue Correlates in Acute Myocardial Infarction. JACC Basic Transl Sci. Apr 2018;3(2):163-75. doi: 10.1016/j.jacbts.2017.12.005. avaliaram pacientes com IAM em duas coortes de pacientes submetidos a estratificação invasiva, comparando as taxas de sobrevida livre de MACCE em pacientes de alto risco definidas pelo escore Global Registry of Acute Coronary Events (GRACE) ajustado para a população local. Nesse estudo, evidenciou-se que o escore GRACE apresentou menor capacidade de predição de sobrevida livre de eventos quando comparado ao desempenho preditivo de uma associação de 12 ceramidas plasmáticas medidas na fase aguda do IAM.1313. de Carvalho LP, Tan SH, Ow GS, Tang Z, Ching J, Kovalik JP, et al. Plasma Ceramides as Prognostic Biomarkers and Their Arterial and Myocardial Tissue Correlates in Acute Myocardial Infarction. JACC Basic Transl Sci. Apr 2018;3(2):163-75. doi: 10.1016/j.jacbts.2017.12.005. Esse estudo incluiu chineses, malaios e indianos, etnias que representam uma grande proporção da população mundial. Ainda, foi realizada revalidação externa do valor preditivo desses biomarcadores em uma população de caucasianos da Nova Zelândia, demonstrando o desenvolvimento de um biomarcador com potencial uso universal. Esses dados foram ainda corroborados com análise de biologia molecular de biópsias de placas ateroscleróticas de pacientes submetidos a cirurgia cardíaca com e sem infarto recentes, confirmando o aumento da produção de ceramidas em pacientes com placa aterosclerótica instável.

Os principais estudos que avaliaram a associação entre as ceramidas e o risco de eventos CV agudos estão demonstrados na Tabela 2.

Tabela 2
– Principais estudos que avaliaram a associação entre as ceramidas e o risco de eventos cardiovasculares agudos (publicação ordenada por ano)

Conclusão

As ceramidas plasmáticas são elevadas em pacientes com MACCE, e estudos pré-clínicos e clínicos demonstram uma associação desses lipídios com o processo de instabilidade da placa aterosclerótica.

A aferição das ceramidas possui valor incremental para a estratificação de risco, além dos fatores de risco clássicos, tanto na prevenção CV primária quanto na secundária. Medições consecutivas podem apresentar um valor preditivo incremental maior do que outros biomarcadores para a previsão de eventos adversos futuros. No entanto, precisamos de mais evidências obtidas através de estudos randomizados para avaliar o impacto prognóstico e do escalonamento terapêutico guiado pelos níveis plasmáticos de ceramidas.

Referências

  • 1
    Simao AF, Precoma DB, Andrade JP, Correa FH, Saraiva JFK, Oliveira GMM, et al. [I Brazilian Guidelines for cardiovascular prevention]. Arq Bras Cardiol. Dec 2013;101(6 Suppl 2):1-63. doi: 10.5935/abc.2013S012.
  • 2
    Hamm CW, Bassand JP, Agewall S, Bt J, Boersma E, Caso P, et al. ESC Guidelines for the management of acute coronary syndromes in patients presenting without persistent ST-segment elevation: The Task Force for the management of acute coronary syndromes (ACS) in patients presenting without persistent ST-segment elevation of the European Society of Cardiology (ESC). Eur Heart J. Dec 2011;32(23):2999-3054. doi: 10.1093/eurheartj/ehr236.
  • 3
    Park DW, Clare RM, Schulte PJ, Pieper KS, Shaw LK, Califf RM, et al. Extent, location, and clinical significance of non-infarct-related coronary artery disease among patients with ST-elevation myocardial infarction. JAMA. Nov 19 2014;312(19):2019-27. doi: 10.1001/jama.2014.15095.
  • 4
    Wang DD, Toledo E, Hruby A, Rosnet BA, Willett WC, Sun Q, et al. Plasma Ceramides, Mediterranean Diet, and Incident Cardiovascular Disease in the PREDIMED Trial (Prevencion con Dieta Mediterranea). Circulation. May 23 2017;135(21):2028-40. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.116.024261.
  • 5
    Laaksonen R, Ekroos K, Sysi-Aho M, Hilvo M, Vihervaara T, Kauhanen D, et al. Plasma ceramides predict cardiovascular death in patients with stable coronary artery disease and acute coronary syndromes beyond LDL-cholesterol. Eur Heart J. Jul 1 2016;37(25):1967-76. doi: 10.1093/eurheartj/ehw148.
  • 6
    Scheiblich H, Schlutter A, Golenbock DT, Latz E, Martinez-Martinez P, Heneka MT. Activation of the NLRP3 inflammasome in microglia: the role of ceramide. J Neurochem. Dec 2017;143(5):534-50. doi: 10.1161/ATVBAHA.116.307497.
  • 7
    Havulinna AS, Sysi-Aho M, Hilvo M, Kauanen D, Hurme R, Ekroos K, et al. Circulating Ceramides Predict Cardiovascular Outcomes in the Population-Based FINRISK 2002 Cohort. Arterioscler Thromb Vasc Biol. Dec 2016;36(12):2424-30. doi: 10.1161/ATVBAHA.116.307497.
  • 8
    Xia JY, Holland WL, Kusminski CM, Sun K, Sharma AX, Pearson MJ, et al. Targeted Induction of Ceramide Degradation Leads to Improved Systemic Metabolism and Reduced Hepatic Steatosis. Cell Metab. Aug 4 2015;22(2):266-78. doi: 10.1016/j.cmet.2015.06.007
  • 9
    Edsfeldt A, Duner P, Stahlman M, Mollet IG, Ascinto G, Grulman H, et al. Sphingolipids Contribute to Human Atherosclerotic Plaque Inflammation. Arterioscler Thromb Vasc Biol. Jun 2016;36(6):1132-40. doi: 10.1161/ATVBAHA.116.305675.
  • 10
    Mukhin DN, Chao FF, Kruth HS. Glycosphingolipid accumulation in the aortic wall is another feature of human atherosclerosis. Arterioscler Thromb Vasc Biol. Oct 1995;15(10):1607-15. DOI: 10.1161/01.atv.15.10.1607
  • 11
    Chatterjee S. Sphingolipids in atherosclerosis and vascular biology. Arterioscler Thromb Vasc Biol. Oct 1998;18(10):1523-33. DOI: 10.1161/01.atv.15.10.1607
  • 12
    Chatterjee SB, Dey S, Shi WY, Thomas K, Hutchins GM. Accumulation of glycosphingolipids in human atherosclerotic plaque and unaffected aorta tissues. Glycobiology. Feb 1997;7(1):57-65. DOI: 10.1093/glycob/7.1.57
  • 13
    de Carvalho LP, Tan SH, Ow GS, Tang Z, Ching J, Kovalik JP, et al. Plasma Ceramides as Prognostic Biomarkers and Their Arterial and Myocardial Tissue Correlates in Acute Myocardial Infarction. JACC Basic Transl Sci. Apr 2018;3(2):163-75. doi: 10.1016/j.jacbts.2017.12.005.
  • 14
    Cheng JM, Suoniemi M, Kardys I, Vihenvara T, de Boer SP, Akkerhuis KM, et al. Plasma concentrations of molecular lipid species in relation to coronary plaque characteristics and cardiovascular outcome: Results of the ATHEROREMO-IVUS study. Atherosclerosis. Dec 2015;243(2):560-6. doi: 10.1016/j.atherosclerosis.2015.10.022.
  • 15
    Sesti G. Pathophysiology of insulin resistance. Best Pract Res Clin Endocrinol Metab. Dec 2006;20(4):665-79. DOI: 10.1016/j.beem.2006.09.007
  • 16
    Lupi R, Dotta F, Marselli L, Del Guerra S, Masini M, Santangelo C, et al. Prolonged exposure to free fatty acids has cytostatic and pro-apoptotic effects on human pancreatic islets: evidence that beta-cell death is caspase mediated, partially dependent on ceramide pathway, and Bcl-2 regulated. Diabetes. May 2002;51(5):1437-42. doi: 10.2337/diabetes.51.5.1437.
  • 17
    Major CD, Gao ZY, Wolf BA. Activation of the sphingomyelinase/ceramide signal transduction pathway in insulin-secreting beta-cells: role in cytokine-induced beta-cell death. Diabetes. Jul 1999;48(7):1372-1380. doi: 10.2337/diabetes.48.7.1372.
  • 18
    Yaribeygi H, Bo S, Ruscica M, Sahebkar A. Ceramides and diabetes mellitus: an update on the potential molecular relationships. Diabet Med. Jan 2020;37(1):11-19. doi: 10.1111/dme.13943
  • 19
    Li Z, Fan Y, Liu J, Li Y, Huan C, Bui HH, et al. Impact of sphingomyelin synthase 1 deficiency on sphingolipid metabolism and atherosclerosis in mice. Arterioscler Thromb Vasc Biol. Jul 2012;32(7):1577-84. doi: 10.1161/ATVBAHA.112.251538
  • 20
    Mayo Clinic. Ceramides: a class of lipids with links to heart disease. [Cited in 2020 June 12] Available at:https://www.mayoclinic.org
    » https://www.mayoclinic.org
  • 21
    Pinto IMF. Uso racional dos exames diagnósticos em cardiologia. Rev So Cardiol Est São Paulo. 2017 2017;27:163-70.
  • 22
    Azevedo CF, Rochitte CE, Lima JA. Coronary artery calcium score and coronary computed tomographic angiography for cardiovascular risk stratification. Arq Bras Cardiol. Jun 2012;98(6):559-68. doi: 10.1590/s0066-782x2012000600012.
  • 23
    Tattersall MC, Gassett A, Korcarz CE, Gepner AD, Kaufman JD, Liu KJ, et al. Predictors of carotid thickness and plaque progression during a decade: the Multi-Ethnic Study of Atherosclerosis. Stroke. Nov 2014;45(11):3257-62. doi: 10.1161/STROKEAHA.114.005669
  • 24
    Yusuf S, Hawken S, Ounpuu S, Dans T, Avezum A, Lonas F, et al. Effect of potentially modifiable risk factors associated with myocardial infarction in 52 countries (the INTERHEART study): case-control study. Lancet. Sep 11-17 2004;364(9438):937-52. doi: 10.1161/STROKEAHA.114.005669
  • 25
    Xavier HT, Izar MC, Faria Neto JR, Assad MH, Rocha VZ, Sposito AC, et al. [V Brazilian Guidelines on Dyslipidemias and Prevention of Atherosclerosis]. Arq Bras Cardiol. Oct 2013;101(4 Suppl 1):1-20. doi: 10.5935/abc.2013S010.
  • 26
    Tippetts TS, Holland WL, Summers SA. The ceramide ratio: a predictor of cardiometabolic risk. J Lipid Res. Sep 2018;59(9):1549-50. doi: 10.1194/jlr.C088377.
  • 27
    Yu J, Pan W, Shi R, Yang T, Li Y, Yu Y, et al. Ceramide is upregulated and associated with mortality in patients with chronic heart failure. Can J Cardiol. Mar 2015;31(3):357-63. doi: 10.1016/j.cjca.2014.12.007
  • 28
    Peterson LR, Xanthakis V, Duncan MS, Gross S, Friedrich N, Volzke H, et al. Ceramide Remodeling and Risk of Cardiovascular Events and Mortality. J Am Heart Assoc. May 3 2018;7(10):e007931. doi: 10.1161/JAHA.117.007931.
  • 29
    Nguyen LS, Procopi N, Salem JE, Squara P, Funck-Brentano C. Relation between baseline LDL-cholesterol and cardiovascular outcomes in high cardiovascular risk hypertensive patients: A post-hoc SPRINT data analysis. Int J Cardiol. Jul 1 2019;286:159-61. doi: 10.1016/j.ijcard.2019.01.048.
  • 30
    Sabatine MS, Giugliano RP, Pedersen TR. Evolocumab in Patients with Cardiovascular Disease. N Engl J Med. Aug 24 2017;377(8):787-8. doi: 10.1056/NEJMoa1615664
  • 31
    Kaasenbrood L, Boekholdt SM, van der Graaf Y, Ray KK, Peters RJG, Kastelein JJP, et al. Distribution of Estimated 10-Year Risk of Recurrent Vascular Events and Residual Risk in a Secondary Prevention Population. Circulation. Nov 8 2016;134(19):1419-29. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.116.021314.
  • 32
    Meeusen JW, Donato LJ, Bryant SC, Baudhuin LM, Berger PB, Jaffe AS. Plasma Ceramides. Arterioscler Thromb Vasc Biol. Aug 2018;38(8):1933-9. doi: 10.1161/ATVBAHA.118.311199.
  • 33
    Hilvo M, Meikle PJ, Pedersen ER, Tell GS, Dhar I, Bremer H, et al. Development and validation of a ceramide- and phospholipid-based cardiovascular risk estimation score for coronary artery disease patients. Eur Heart J. Jan 14 2020;41(3):371-80. doi: 10.1093/eurheartj/ehz387.
  • 34
    Mantovani A, Bonapace S, Lunardi G, Canali G, Dugo C, Vinco G, et al. Associations between specific plasma ceramides and severity of coronary-artery stenosis assessed by coronary angiography. Diabetes Metab. Apr 2020;46(2):150-7.
  • 35
    Mantovani A, Bonapace S, Lunardi G, Canali G, Dugo C, Vinco G, et al. Association of Plasma Ceramides With Myocardial Perfusion in Patients With Coronary Artery Disease Undergoing Stress Myocardial Perfusion Scintigraphy. Arterioscler Thromb Vasc Biol. Dec 2018;38(12):2854-61. doi: 10.1016/j.diabet.2019.07.006.
  • 36
    Mantovani A, Bonapace S, Lunardi G, Salgarello M, Deigo C, Canalli G, et al. Association between plasma ceramides and inducible myocardial ischemia in patients with established or suspected coronary artery disease undergoing myocardial perfusion scintigraphy. Metabolism. Aug 2018;85:305-12. doi: 10.1016/j.diabet.2019.07.006
  • 37
    Pan W, Dong H, Sun R, Zhao L, Sun M, Li L, et al. Plasma Ceramides in Relation to Coronary Plaque Characterization Determined by Optical Coherence Tomography. J Cardiovasc Transl Res. Mar 24 2021;14(1):140-9. doi: 10.1007/s12265-020-09978-3.
  • Vinculação acadêmica
    Não há vinculação deste estudo a programas de pós-graduação.
    Aprovação ética e consentimento informado
    Este artigo não contém estudos com humanos ou animais realizados por nenhum dos autores.
  • Fontes de financiamento: O presente estudo não teve fontes de financiamento externas.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Abr 2022
  • Data do Fascículo
    Abr 2022

Histórico

  • Recebido
    02 Nov 2020
  • Revisado
    16 Fev 2021
  • Aceito
    24 Mar 2021
Sociedade Brasileira de Cardiologia - SBC Avenida Marechal Câmara, 160, sala: 330, Centro, CEP: 20020-907, (21) 3478-2700 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil, Fax: +55 21 3478-2770 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revista@cardiol.br